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Isolamento de Pseudomonas aeruginosa e fatores de risco de infecção das vias aéreas pela bactéria em pacientes com bronquiectasias não fibrocísticas

Isolation of and risk factors for airway infection with Pseudomonas aeruginosa in patients with non-cystic fibrosis bronchiectasis

Mara Rúbia Figueiredo1,2, Isabella Lomonaco3, Amanda Souza Araújo1,2, Fernando Lundgren4, Eanes Delgado Barros Pereira3

DOI: 10.36416/1806-3756/e20210017

ABSTRACT

Objective: To identify microorganisms in sputum samples of patients with stable non-cystic fibrosis bronchiectasis and to determine risk factors related to the isolation of Pseudomonas aeruginosa (PA) in those patients. Methods: Consecutive patients were recruited from a tertiary hospital outpatient clinic in the city of Fortaleza, Brazil. The patients were submitted to spirometry, six-minute walk test, HRCT, and sputum collection. Data on serum fibrinogen levels, disease severity, sputum color, and history of azithromycin treatment were collected. Results: The study included 112 patients, and females predominated (68%). The mean age was 51.6 ± 17.4 years. Most patients presented with mild-to-moderate disease (83%). The mean six-minute walk distance was 468.8 ± 87.9 m. Mean FEV1 and FVC, in % of predicted values, were 60.4 ± 21.8% and 69.9 ± 18.5%, respectively. The mean serum fibrinogen level was 396.1 ± 76.3 mg/dL. PA was isolated in 47 patients, other potentially pathogenic microorganisms (PPMs) were isolated in 31 patients, and non-PPMs were isolated in 34 patients. Purulent sputum was identified in 77 patients (68%). The patients with PA, when compared with those without it, presented with more severe disease, higher serum fibrinogen levels, and lower FVC%. In addition, purulent sputum and long-term azithromycin treatment were more common in those with PA. The multivariate regression analysis showed that the independent factors associated with PA were serum fibrinogen level > 400 mg/dL (OR = 3.0; 95% CI: 1.1-7.7) and purulent sputum (OR = 4.3; 95% CI: 1.6-11.3). Conclusions: In our sample, the prevalence of PA in sputum was 42%. Sputum color and inflammatory markers were able to predict the isolation of PA, emphasizing the importance of routine sputum monitoring.

Keywords: Bronchiectasis; Pseudomonas aeruginosa; Sputum/microbiology.

RESUMO

Objetivo: Identificar microrganismos em amostras de escarro de pacientes com bronquiectasia não fibrocística estável e determinar os fatores de risco relacionados com o isolamento de Pseudomonas aeruginosa (PA) nesses pacientes. Métodos: Pacientes consecutivos foram recrutados em um ambulatório de um hospital terciário em Fortaleza (CE). Os pacientes foram submetidos a espirometria, teste de caminhada de seis minutos, TCAR e coleta de escarro. Foram coletados dados referentes ao fibrinogênio sérico, gravidade da doença, cor do escarro e histórico de tratamento com azitromicina. Resultados: O estudo incluiu 112 pacientes, com predomínio do sexo feminino (68%). A média de idade foi de 51,6 ± 17,4 anos. A maioria dos pacientes apresentou doença leve a moderada (83%). A média da distância percorrida no teste de caminhada de seis minutos foi de 468,8 ± 87,9 m. A média do VEF1 em % do previsto foi de 60,4 ± 21,8%, e a da CVF em % do previsto foi de 69,9 ± 18,5%. A média do fibrinogênio sérico foi de 396,1 ± 76,3 mg/dL. PA foi isolada em 47 pacientes; outros microrganismos potencialmente patogênicos (MPP) foram isolados em 31; não MPP foram isolados em 34. Escarro purulento foi identificado em 77 pacientes (68%). Os pacientes com PA, em comparação com aqueles sem, apresentaram doença mais grave, fibrinogênio sérico mais elevado e menor CVF%. Além disso, escarro purulento e tratamento prolongado com azitromicina foram mais comuns naqueles com PA. A análise de regressão multivariada mostrou que os fatores independentes relacionados com PA foram fibrinogênio sérico > 400 mg/dL (OR = 3,0; IC95%: 1,1-7,7) e escarro purulento (OR = 4,3; IC95%: 1,6-11,3). Conclusões: Em nossa amostra, a prevalência de PA no escarro foi de 42%. A cor do escarro e os marcadores inflamatórios foram capazes de prever o isolamento de PA, o que enfatiza a importância do monitoramento rotineiro do escarro.

Palavras-chave: Bronquiectasia; Pseudomonas aeruginosa; Escarro/microbiologia.

INTRODUÇÃO
 
A bronquiectasia é um problema de saúde crescente em todo o mundo. A prevalência da doença aumentou mais de 40% na Europa e nos EUA nos últimos 10 anos. (1) A bronquiectasia não fibrocística é caracterizada por dilatação brônquica irreversível, geralmente acompanhada de tosse, produção de escarro e infecções respiratórias recorrentes.(2)
 
Infecções bacterianas crônicas são frequentes em pacientes com bronquiectasias e contribuem para a manutenção do círculo vicioso de inflamação e destruição progressiva das vias aéreas. A inflamação sistêmica é fundamental para a progressão da doença, e isso pode estar relacionado com mais eventos adversos e desfechos piores. Existem vários marcadores inflamatórios que podem ser usados para avaliar a progressão da doença: interleucinas, TNF-α, proteína C reativa (PCR) e fibrinogênio.(3) A inflamação está relacionada com infecção bacteriana das vias aéreas e pode ser responsável pela destruição das vias aéreas e perda da função pulmonar. Haemophilus influenzae e Pseudomonas aeruginosa têm sido as bactérias potencialmente patogênicas mais comuns na bronquiectasia.(3,4)
 
Murray et al.(5) elaboraram um método qualitativo rápido e fácil para identificar a cor do escarro em pacientes com bronquiectasia estável. A cartela de cores do escarro usa fotografias do escarro de pacientes com bronquiectasia e representa de modo preciso as três principais cores do escarro; a cartela apresentou boa confiabilidade interobservadores (médicos e pacientes). A infecção bacteriana causa um aumento pronunciado dos marcadores inflamatórios que pode ser refletido pela purulência do escarro. Essa característica pode ser explorada pelos clínicos com a cartela de cores do escarro.
 
Os efeitos da P. aeruginosa na destruição das vias aéreas podem ser refletidos indiretamente pelo comprometimento da função pulmonar.(6) Guan et al.(7) relataram que um grupo de 144 pacientes com bronquiectasias e isolados de P. aeruginosa ou infecção pela bactéria apresentou resultados espirométricos piores. Um estudo recente com 186 pacientes acompanhados em um centro terciário de referência para o tratamento de bronquiectasias em Portugal relatou pior função pulmonar em pacientes com infecção bacteriana crônica do que naqueles sem esse tipo de infecção.(8)
 
A maioria dos estudos sobre o tema abordou a diversidade de isolados de microrganismos potencialmente patogênicos (MPP).(9,10) Em pacientes com bronquiectasias, os poucos dados disponíveis baseiam-se principalmente na infecção por P. aeruginosa.(11) Não se sabe o suficiente sobre a infecção por P. aeruginosa, suas associações e métodos clínicos úteis para distinguir P. aeruginosa de outros MPP.
 
Em virtude da importância de identificar pacientes com bronquiectasias potencialmente infectados por P. aeruginosa, foram elaborados novos escores de gravidade, tais como o FACED (FEV1, Age, Chronic colonization with P. aeruginosa, Extent [of CT findings], and Dyspnea), que avalia o VEF1, idade, colonização crônica por P. aeruginosa, extensão dos achados tomográficos e dispneia.(12)
 
Com base na hipótese de que pacientes infectados por P. aeruginosa formam um grupo distinto dentro do grupo de pacientes com bronquiectasias não fibrocísticas, o objetivo do presente estudo foi avaliar a prevalência de isolamento de P. aeruginosa e infecção pela bactéria em pacientes ambulatoriais com bronquiectasias. Além disso, havia a expectativa de que resultados positivos pudessem estar relacionados com fatores como marcadores inflamatórios e cor do escarro, bem como com parâmetros clínicos, radiológicos e de função pulmonar.
 
MÉTODOS
 
Trata-se de um estudo transversal com um grupo de pacientes adultos com bronquiectasias não fibrocísticas, selecionados consecutivamente em um ambulatório de um hospital terciário entre março de 2018 e outubro de 2019. O diagnóstico de bronquiectasia baseou-se na TCAR de tórax realizada nos 12 meses anteriores. Para que pudessem participar do estudo, os pacientes não podiam apresentar exacerbações durante quatro semanas. Foi considerada exacerbação a presença ou piora de três ou mais dos seguintes sintomas-chave durante pelo menos 48 h: tosse, escarro com volume/consistência elevados, escarro purulento, falta de ar, intolerância ao exercício, fadiga, mal-estar e hemoptise.(2) O protocolo do estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da instituição (Protocolo n. 1.844.662). Todos os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido.
 
Foram coletados os seguintes dados: dados demográficos; histórico de infecções respiratórias na infância (coqueluche, pneumonia e sarampo); histórico de tuberculose pulmonar; diagnóstico de asma, DPOC, doenças do tecido conjuntivo e deficiências imunológicas; tabagismo; histórico de uso prolongado de azitromicina; tratamento no momento da última avaliação em fase clinicamente estável. Os participantes foram avaliados quanto à percepção da dispneia (pontuação na escala modificada de dispneia do Medical Research Council), purulência/cor do escarro (cartela de cores do escarro),(5) gravidade das bronquiectasias (escore FACED)(12) e função pulmonar (espirometria). A avaliação clínica foi realizada pelo médico assistente. Os níveis séricos de fibrinogênio também foram medidos e compilados.
 
Foram coletadas amostras de escarro espontâneo de todos os pacientes na manhã da consulta clínica. As amostras com coloração de Gram mostrando ≥ 25 leucócitos/campo e ≤ 10 células epiteliais/campo (aumento: 100×) foram consideradas amostras de escarro válidas e processadas para cultura qualitativa de bactérias (inclusive BAAR) e fungos. Todas as amostras microbiológicas foram semeadas em ágar sangue, ágar chocolate, ágar Wilkins-Chalgren, meio de Löwenstein-Jensen e ágar Sabouraud. Além disso, foram preparados esfregaços para coloração de Ziehl-Neelsen. As culturas foram avaliadas quanto ao crescimento após 48 h. As culturas bacterianas negativas foram descartadas após 5 dias, as culturas fúngicas negativas foram descartadas após quatro semanas, e as culturas negativas em meio de Löwenstein-Jensen foram descartadas após seis semanas. Calculava-se a carga bacteriana/fúngica (×105 UFC/mL) quando se isolava um MPP. Com base nos resultados da cultura, os pacientes foram divididos nos seguintes grupos: PA (P. aeruginosa), MPP (que não P. aeruginosa) e não MPP. A cartela de cores do escarro(5) foi mostrada aos pacientes para que pudessem identificar a cor de seu escarro entre as três típicas: claro (mucoide), amarelo-claro/verde-claro (mucopurulento) e amarelo-escuro/verde-escuro (purulento).(5)
 
A TCAR foi avaliada quanto ao número de lobos envolvidos (a língula foi considerada um lobo separado) e o tipo mais comum de dilatação brônquica (cilíndrica, varicosa ou cística).(13)
 
A espirometria foi realizada com um espirômetro eletrônico (WinDX; Creative BioMedics Inc., San Clemente, CA, EUA) em conformidade com as diretrizes da American Thoracic Society/European Respiratory Society,(14) e os resultados de VEF1 e CVF foram coletados e analisados.
 
A capacidade de exercício foi avaliada por meio do teste de caminhada de seis minutos, que mede a distância que um participante é capaz de percorrer em um corredor plano de 30 m em seis minutos. (15) Os pacientes, sob supervisão direta de um dos pesquisadores, foram orientados a caminhar o mais rápido possível de uma ponta a outra do corredor, tantas vezes quanto possível, dentro do tempo estabelecido. Todos os pacientes realizaram dois testes, com intervalo mínimo de 30 min, e o melhor resultado foi registrado.
 
O escore FACED já foi usado para avaliar a gravidade da bronquiectasia.(12) Conforme mencionado anteriormente, o escore incorpora cinco variáveis dicotômicas, e os pontos de cada variável são somados para que se obtenha a pontuação total, que pode variar de 0 a 7 pontos. A pontuação total classifica a bronquiectasia em três níveis de gravidade: leve (0-2 pontos), moderada (3-4 pontos) e grave (5-7 pontos). O escore FACED já foi validado para uso no Brasil.(16)
 
Tamanho da amostra
 
Um estudo anterior mostrou que a prevalência de P. aeruginosa e de outros microrganismos em pacientes com bronquiectasia foi de 15% e 40%, respectivamente. (17) Para a análise de regressão logística multivariada, a variável dependente foi dicotomizada: grupo PA e grupo não PA (isto é, grupo MPP + grupo não MPP), presumindo-se que as taxas desses grupos seriam de 15% e 40%, respectivamente. Com α < 0,05 e β < 0,20, seriam necessários pelo menos 57 participantes para um braço.
 
Análise estatística
 
As variáveis categóricas foram descritas como frequência absoluta e relativa, ao passo que as variáveis contínuas foram descritas como média e desvio-padrão, quando apropriado.
 
A ANOVA de uma via foi usada para comparar as médias dos três grupos individualmente, e foi seguida de análise post hoc com correção de Bonferroni para esclarecer as diferenças entre os pares de grupos (PA vs. MPP; PA vs. não MPP e MPP vs. não MPP). Para comparar as proporções, o teste do qui-quadrado com análise post hoc para comparações pareadas foi usado com valor de p ajustado pela correção de Bonferroni. (18) Conforme mencionado anteriormente, a variável dependente foi dicotomizada: grupo PA e grupo não PA. Os fatores independentes selecionados para a análise multivariada foram aqueles considerados clinicamente relevantes ou possíveis fatores de confusão para a identificação de isolados de PA: sexo (feminino); CVF (< 80% do valor previsto); cor do escarro(5) (purulento); fibrinogênio sérico (> 400 mg/dL) e pontuação total no FACED(12) (≥ 5). A multicolinearidade foi avaliada pelo fator de inflação da variância (FIV); um FIV < 2,5 significou a exclusão de qualquer interação significativa.(19) Os resultados foram relatados em forma de OR e IC95%. O nível de significância adotado foi de p < 0,05. Todas as análises estatísticas foram realizadas com o programa IBM SPSS Statistics, versão 21.0 (IBM Corporation, Armonk, NY, EUA).
 
RESULTADOS
 
O fluxograma de recrutamento de pacientes é apresentado na Figura 1. Um total de 122 pacientes consecutivos com bronquiectasias não fibrocísticas foram inicialmente incluídos no estudo. Destes, 10 não preencheram os critérios de inclusão e foram excluídos. Portanto, a amostra consistiu em 112 pacientes.

 
A Tabela 1 mostra que 77 pacientes (68%) eram do sexo feminino. A média de idade foi de 51,7 ± 17,4 anos. Pela pontuação no FACED, 83% dos pacientes apresentavam doença leve a moderada. Predominou o escarro mucopurulento/purulento (n = 77; 68%). Dos 77 pacientes com escarro mucopurulento/purulento, 70 (62% da amostra) foram submetidos a tratamento prolongado com azitromicina (500 mg, três vezes/semana).


 
A etiologia das bronquiectasias foi determinada por meio da análise dos prontuários médicos clínicos. Uma etiologia subjacente foi identificada em 65% dos pacientes. Em 35% dos pacientes, não se estabeleceu nenhuma causa (bronquiectasias idiopáticas). As demais etiologias foram bronquiectasias pós-tuberculose (em 30%), bronquiectasias pós-infecção (em 5%), síndrome de Kartagener (em 8%) e outras etiologias (em 22%).
 
A Tabela 2 apresenta os microrganismos identificados no escarro dos pacientes. A Tabela 3 mostra a comparação entre os grupos (PA, MPP e não MPP) quanto às variáveis selecionadas. Foram observadas diferenças significativas quanto às seguintes variáveis: fibrinogênio sérico, que foi maior no grupo PA que no grupo MPP (425,4 ± 78,3 mg/dL vs. 380,5 ± 72,2 mg/dL; p = 0,04) e no grupo não MPP (425,4 ± 78,3 mg/dL vs. 357,4 ± 75,5 mg/dL; p = 0,001); CVF em % do previsto, que foi menor no grupo PA que no grupo MPP (64,3% ± 16,5% vs. 75,9% ± 14,7%; p = 0,02); proporção de pacientes com escarro purulento, que foi maior no grupo PA que no grupo MPP (66,0% vs. 32,3%; p = 0,003) e no grupo não MPP (66,0% vs. 14,7%; p < 0,001); bronquiectasia grave, que foi maior no grupo PA que no grupo não MPP (29,8% vs. 2,9%; p = 0,002); tratamento prolongado com azitromicina, que foi mais comum no grupo PA que no grupo não MPP (80,9% vs. 41,2%; p < 0,001).


 
A análise de regressão logística multivariada foi realizada para determinar os fatores relacionados com isolados de P. aeruginosa (Tabela 4). As variáveis independentes foram sexo, pontuação no FACED, fibrinogênio sérico, CVF% e classificação do escarro conforme a cor. Todos os fatores apresentaram FIV < 2,0. Os fatores independentes relacionados com o isolamento de P. aeruginosa foram fibrinogênio > 400 mg/dL (OR = 3,00; IC95%: 1,10-7,77) e escarro purulento (OR = 4,33; IC95%: 1,60-11,38).
 

DISCUSSÃO
 
O presente estudo transversal mostrou que, em pacientes com bronquiectasia estável, 47 (42%) apresentavam P. aeruginosa nas vias aéreas. A taxa de isolados de P. aeruginosa foi significativamente maior do que a de H. influenzae, o que corrobora os achados de Guan et al.(7) A análise de regressão logística multivariada revelou que níveis elevados de fibrinogênio sérico e escarro purulento apresentavam relação com o isolamento de P. aeruginosa. Gostaríamos de enfatizar que o uso da cartela de cores do escarro por Murray et al.(5) forneceu novas evidências a respeito dessa maneira rápida e prática de prever a presença de P. aeruginosa nas vias aéreas e distingui-la de outros estados microbiológicos. Essa ferramenta útil indica a gravidade da inflamação, destruição das vias aéreas e atividade enzimática proteolítica/presença de doença neutrofílica das vias aéreas, como bronquiectasia não fibrocística, bem como DPOC ou asma.(20-22)
 
A correlação entre a cor do escarro e culturas positivas não está muito clara; há relatos de relações positivas e negativas.(22-24) Uma meta-análise recente(25) de seis estudos sobre coloração do escarro e culturas positivas em pacientes com DPOC mostrou que é menos provável que ocorra o isolamento de bactérias no escarro quando este é classificado em mucoide. Mais pacientes com escarro purulento apresentaram colonização bacteriana do que pacientes com escarro mucopurulento ou mucoide.
 
Observamos uma relação entre a presença de resposta inflamatória sistêmica (evidenciada por níveis elevados de fibrinogênio circulante) e o isolamento de P. aeruginosa. Os níveis de fibrinogênio foram maiores no grupo PA que nos grupos MPP e não MPP, o que pode explicar o papel da P. aeruginosa na inflamação sistêmica. Estudos anteriores revelaram que vias aéreas que abrigam P. aeruginosa apresentam inflamação significativamente maior.(7,26-29)
 
Menéndez et al.(29) realizaram um estudo observacional prospectivo e observaram aumentos progressivos dos níveis de citocinas pró-inflamatórias sistêmicas e PCR em pacientes hospitalizados com bronquiectasias nos quais P. aeruginosa foi isolada durante as fases aguda e crônica das exacerbações. O nível de inflamação sistêmica permaneceu alto após a fase aguda. Jin et al.(30) observaram que marcadores inflamatórios sistêmicos, incluindo PCR e fibrinogênio, estavam significativamente elevados em pacientes com DPOC com bronquiectasias. O uso de outros marcadores inflamatórios é necessário para detectar a gravidade da inflamação de modo a melhorar o tratamento oferecido a pacientes com bronquiectasias. Decidimos medir os níveis séricos de fibrinogênio porque o fibrinogênio sérico é um biomarcador cuja medida está disponível na rotina da prática clínica.
 
Ergan Arsava & Cöplü(31) estudaram 50 pacientes com bronquiectasia estável e constataram que os níveis de fibrinogênio e PCR foram maiores naqueles com colonização das vias aéreas do que naqueles sem. Em um subgrupo de pacientes colonizados por P. aeruginosa, os níveis de fibrinogênio e PCR foram ainda mais elevados do que nos demais.
 
Em nosso estudo, a presença de P. aeruginosa nas vias aéreas dos pacientes relacionou-se com CVF reduzida. Isso pode ser explicado pelos efeitos da P. aeruginosa na inflamação e destruição das vias aéreas. Estudos mostram que quando P. aeruginosa ou H. influenzae dominam o microbioma de pacientes com bronquiectasias, sua função pulmonar diminui significativamente.(10,32)
 
A frequência de exacerbações e hospitalizações no ano anterior em nossos pacientes com P. aeruginosa não foi estatisticamente significativa. Isso pode ser explicado pelo uso prolongado de azitromicina por esses pacientes. Um ensaio clínico realizado por Richardson et al.(32) demonstrou uma redução significativa do número de exacerbações em pacientes tratados com eritromicina em comparação com aqueles tratados com placebo. Uma meta-análise de nove estudos (530 pacientes) demonstrou que o uso de macrolídeos reduziu o número de pacientes com exacerbações e o número de exacerbações por paciente.(33) É provável que tenha havido uma relação entre o pequeno número de hospitalizações e o pequeno número de exacerbações em nosso estudo.
 
A doença mais grave, medida pela pontuação obtida no FACED, relacionou-se com o isolamento de P. aeruginosa. Isso é esperado porque o FACED mede a colonização por P. aeruginosa, enfatizando a importância da infecção crônica na gravidade da bronquiectasia.(12)
 
Não observamos relação entre o número de lobos afetados na TC e o isolamento de P. aeruginosa. Portanto, não podemos nem negar nem confirmar que a presença de P. aeruginosa seja um fator relacionado com maior dano estrutural radiológico nesses pacientes.
 
As limitações do presente estudo são as seguintes: i) a amostra foi pequena, mas conseguimos identificar variáveis com plausibilidade biológica; ii) os pacientes foram recrutados em um centro de referência, o que dificulta a extrapolação de nossos resultados para outras realidades; iii) o período de acompanhamento foi curto, e não foram usados métodos moleculares para compreender o papel que cada microrganismo desempenha na progressão da doença; iv) o desenho transversal observacional torna difícil estabelecer a ordem temporal e a direção causal.
 
O presente estudo é relevante porque podemos pressupor que um método clínico útil como a cartela de cores do escarro(5) é capaz de prever a infecção das vias aéreas por P. aeruginosa. Identificar a cor do escarro e sua relação com manifestações clínicas de infecção pode ser uma estratégia útil para que os clínicos gerenciem esses pacientes enquanto aguardam os resultados formais da microbiologia do escarro. Além disso, o uso do fibrinogênio sérico como marcador é um método simples e confiável para identificar pacientes infectados e, portanto, deveria fazer parte da prática clínica rotineira. Estudos longitudinais multicêntricos maiores são necessários para melhorar a caracterização de outros MPP e seu impacto clínico individual.
 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
IL e AA: desenho do estudo; coleta de dados; pesquisa bibliográfica; aprovação da versão final. MRF: desenho do estudo; coleta de dados; pesquisa bibliográfica; redação do manuscrito; aprovação da versão final. FL: redação do manuscrito; aprovação da versão final. EDBP: desenho do estudo; redação do manuscrito; revisão final; aprovação da versão final.
 
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