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Relato de Caso

Derrame pleural incomum: metástase pleuropulmonar de tumor neuroectodérmico primitivo

Uncommon pleural effusion: pleuropulmonary metastasis from primitive neuroectodermal tumor

Leila Antonangelo, Adriana Gonçalves Rosa, Aline Pivetta Corá, Milena Marques Pagliarelli Acencio, Luís César Moreira, Francisco Vargas Suso

ABSTRACT

Primitive neuroectodermal tumor is an invasive neoplasm with neuronal differentiation, which frequently results in metastasis in various organs. We report the case of a patient with primitive neuroectodermal tumor whose primary site was the axilla. The patient presented with metastases in the lung, pleura, bone, iliac muscle and bone marrow. We highlight the uncommon finding in the pleural fluid cytology.

Keywords: Neuroectodermal tumors, primitive; Neoplasm metastasis; Cytology; Pleural effusion.

RESUMO

O tumor neuroectodérmico primitivo é uma neoplasia com diferenciação neural de comportamento invasivo que origina metástases para diversos órgãos. Relatamos um caso de tumor neuroectodérmico primitivo primário em axila com metástases para pulmão, pleura, osso, músculo ilíaco e medula óssea. Enfatizamos o achado incomum da análise citológica do líquido pleural.

Palavras-chave: Tumores neuroectodérmicos primitivos; Metástase neoplásica; Citologia; Derrame pleural.

Introdução

As neoplasias neuroectodérmicas primitivas são originadas de células que migram da crista neural e se classificam de acordo com o grau de diferenciação. Desta forma, denomina-se como sarcoma de Ewing o tumor cujas células são indiferenciadas ou como primitive ­neuroectodermal tumor (PNET, tumor neuroectodérmico primitivo) aquele com células apresentando diferenciação neural. Histologicamente, se apresentam como tumores de células redondas azuis e, do ponto de vista citogenético, caracterizam-se por apresentar a translocação t(11;22)
(q24;q12) em 85% dos casos.(1)

Tumores neuroectodérmicos primitivos com localização extraóssea são mais comuns entre 10 e 30 anos de idade, com igual incidência entre os sexos, sendo raro antes dos 5 e após os 40 anos. A maioria dos casos se origina em tecidos moles profundos, particularmente no tronco, com preferência pela região paravertebral ou membros inferiores.
Aproximadamente 10% destes tumores se originam de um nervo identificável.(2)

É uma neoplasia de comportamento invasivo que pode originar metástases para diversos órgãos (sistema esquelético, pulmão, pleura, medula óssea, sistema nervoso central, cadeia simpática, glândulas suprarrenais, fígado e órbita). A sobrevida em 5 anos de pacientes com PNET extraesquelético não excede 20-30% na maioria dos centros.(3)

Neste artigo, relatamos um caso de PNET primário em axila com metástases para pulmão, pleura, osso, músculo ilíaco e medula óssea, com ênfase para o achado incomum da análise citológica do líquido pleural.

Relato de caso

Paciente do sexo masculino, 26 anos, natural de Rondônia. Apresentava história prévia de tabagismo, com relato de boa saúde até iniciar com um quadro de perda dos movimentos no membro superior à direita e aparecimento de massa palpável em axila direita. Após quatro meses de piora progressiva, procurou o pronto-socorro para avaliação.

Ao exame físico, apresentava musculatura de braço e antebraço direito atrófica, com diminuição de força e da sensibilidade local. Presença de massa palpável de consistência endurecida na região axilar direita, que foi submetida à biópsia e análise imuno-histoquímica. O laudo anatomopatológico e imuno-histoquímico foi compatível com PNET (Tabela 1).(4)





Com esse diagnóstico, iniciou-se esquema de quimioterapia com vincristina, doxorrubicina e ciclofosfamida por cinco meses (6 ciclos), tendo havido redução da massa tumoral. Entretanto, o paciente persistiu com perda dos movimentos no membro superior direito e intensa dor no membro, tendo sido submetido à amputação interescápulo-umeral à direita. Reiniciado esquema quimioterápico de segunda linha, paliativa (topotecano e ciclofosfamida).

Oito meses após a cirurgia, apresentou recidiva local (cavo axilar direito) e metástase para o pulmão. Evoluiu com dispneia progressiva e dor na articulação coxofemoral esquerda. O exame físico e radiológico (TC de tórax) evidenciou derrame pleural volumoso à direita, com frequentes nódulos pleurais. O derrame foi drenado e a análise do líquido pleural ­demonstrou características de exsudato (proteínas: 4,2 g/dL e desidrogenase lática: 2.456 UI/L) com citologia oncótica positiva para células neoplásicas dispostas em agrupamentos coesos, sem sobreposição, sugerindo tratar-se de linhagem neuronal (Figura 1). O estudo tomográfico do abdome e pelve mostrou metástase tumoral em osso e músculo ilíaco direito. O aspirado de medula óssea mostrou infiltração medular. O paciente permanece até esta data em quimioterapia paliativa.



Discussão

O PNET é um tumor extremamente agressivo que afeta principalmente os tecidos moles profundos. O diagnóstico diferencial entre os tumores de células redondas da infância e da adolescência inclui o sarcoma de Ewing, o neuroblastoma, os linfomas, o rabdomiossarcoma e o PNET. A distinção entre esses subtipos é feita através de reações imuno-histoquímicas, estudos citogenéticos e de biologia molecular. O grau de diferenciação neural no PNET geralmente é sutil e, muitas vezes, é detectado apenas por imuno-histoquímica. Esses tumores frequentemente apresentam positividade para marcadores neurais, entre eles, a enolase neuroespecífica, o Leu-7 (CD57), a sinaptofisina, a cromogranina e a proteína S-100. A detecção de positividade desses marcadores é mais evidente se o tumor apresentar as rosetas de Homer-Wright ou de Flexner-Wintersteiner bem definidas ou se apresentar um padrão ultraestrutural de diferenciação neural.

Os PNETs são geralmente positivos para o CD99 (sensibilidade superior a 95%), embora esse marcador não seja específico e possa também aparecer no linfoma linfoblástico, no sarcoma sinovial, em alguns carcinomas neuroendócrinos e, mais raramente, no rabdomiossarcoma do tipo alveolar.

No caso em questão, apenas o CD99 foi positivo. Entretanto, o quadro clínico e o aspecto morfológico e estrutural das células tumorais foram fundamentais para a definição diagnóstica.

O paciente aqui relatado evoluiu com metástase para osso, músculo ilíaco, medula óssea, pulmão e pleura. Embora o derrame pleural seja um achado radiológico relativamente comum quando o tumor está localizado na parede torácica (tumor de Askin), ressaltamos o fato de que as características do líquido pleural raramente são conhecidas, sendo incomum a demonstração de células neoplásicas no líquido pleural.

Referências

1. Saxena R, Sait S, Mhawech-Fauceglia P. Ewing sarcoma/primitive neuroectodermal tumor of the kidney: a case report. Diagnosed by immunohistochemistry and molecular analysis. Ann Diagn Pathol. 2006;10(6):363-6.

2. Carvajal R, Meyers P. Ewing's sarcoma and primitive neuroectodermal family of tumors. Hematol Oncol Clin North Am. 2005;19(3):501-25, vi-vii.

3. Kurashima K, Muramoto S, Ohta Y, Fujimura M, Matsuda T. Peripheral neuroectodermal tumor presenting pleural effusion. Intern Med. 1994;33(12):783-5.

4. Devoe K, Weidner N. Immunohistochemistry of small round-cell tumors. Semin Diagn Pathol. 2000;17(3):216-24.




Sobre os autores

Leila Antonangelo
Médica Chefe do Setor de Citologia. Divisão de Laboratório Central, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Adriana Gonçalves Rosa
Médica Residente em Patologia Clínica. Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Aline Pivetta Corá
Médica Residente em Patologia Clínica. Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Milena Marques Pagliarelli Acencio
Biologista Chefe do Laboratório Experimental de Doenças Pleurais. Disciplina de Pneumologia, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Luís César Moreira
Biologista Chefe do Setor de Citologia. Divisão de Laboratório Central, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Francisco Vargas Suso
Professor Titular. Disciplina de Pneumologia, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.



Trabalho realizado no Departamento de Patologia, Divisão de Laboratório Central, Laboratório de Investigação Médica 3 - LIM 03 - e na Divisão de Pneumologia, Instituto do Coração - InCor- Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Francisco Vargas Suso. Rua Itapeva, 500, conjunto 4C, Bela Vista, CEP 04011-011, São Paulo, SP, Brasil.
Tel/Fax 55 11 3069-5695. E-mail: l.antonangelo@hcnet.usp.br ou l.antonangelo@uol.com.br
Apoio financeiro: Este estudo recebeu apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Recebido para publicação em 22/10/2008. Aprovado, após revisão, em 28/11/2008.

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