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Artigo de Revisão

Tratamento farmacológico da DPOC

Pharmacological treatment of COPD

Ana Maria Baptista Menezes, Silvia Elaine Cardozo Macedo, Ricardo Bica Noal, Jussara Fiterman, Alberto Cukier, José Miguel Chatkin, Frederico Leon Arrabal Fernandes, Grupo de Trabalho da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia, Grupo de Trabalho do Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia da

ABSTRACT

Approximately seven million Brazilians over 40 years of age have COPD. In recent years, major advances have been made in the pharmacological treatment of this condition. We performed a systematic review including original articles on pharmacological treatments for COPD. We reviewed articles written in English, Spanish, or Portuguese; published between 2005 and 2009; and indexed in national and international databases. Articles with a sample size < 100 individuals were excluded. The outcome measures were symptoms, pulmonary function, quality of life, exacerbations, mortality, and adverse drug effects. Articles were classified in accordance with the Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease criteria for the determination of the level of scientific evidence (grade of recommendation A, B, or C). Of the 84 articles selected, 40 (47.6%), 18 (21.4%), and 26 (31.0%) were classified as grades A, B, and C, respectively. Of the 420 analyses made in these articles, 236 were regarding the comparison between medications and placebos. Among these 236 analyses, the most commonly studied medications (in 66, 48, and 42 analyses, respectively) were long-acting anticholinergics; the combination of long-acting 2 agonists and inhaled corticosteroids; and inhaled corticosteroids in isolation. Pulmonary function, adverse effects, and symptoms as outcomes generated 58, 54, and 35 analyses, respectively. The majority of the studies showed that the medications evaluated provided symptom relief; improved the quality of life and pulmonary function of patients; and prevented exacerbations. Few studies analyzed mortality as an outcome, and the role that pharmacological treatment plays in this outcome has yet to be fully defined. The medications studied are safe to use in the management of COPD and have few adverse effects.

Keywords: Pulmonary disease, chronic obstructive/therapy; Pulmonary disease, chronic obstructive/mortality; Review.

RESUMO

Aproximadamente sete milhões de brasileiros acima de 40 anos são acometidos pela DPOC. Nos últimos anos, importantes avanços foram registrados no campo do tratamento medicamentoso dessa condição. Foi realizada uma revisão sistemática incluindo artigos originais sobre tratamento farmacológico da DPOC publicados entre 2005 e 2009, indexados em bases de dados nacionais e internacionais e escritos em inglês, espanhol ou português. Artigos com tamanho amostral menor de 100 indivíduos foram excluídos. Os desfechos sintomas, função pulmonar, qualidade de vida, exacerbações, mortalidade e efeitos adversos foram pesquisados. Os artigos foram classificados segundo o critério da Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease para nível de evidência científica (grau de recomendação A, B e C). Dos 84 artigos selecionados, 40 (47,6%), 18 (21,4%) e 26 (31,0%) foram classificados com graus A, B e C, respectivamente. Das 420 análises oriundas desses artigos, 236 referiam-se à comparação de fármacos contra placebo nos diversos desfechos estudados. Dessas 236 análises, os fármacos mais frequentemente estudados foram anticolinérgicos de longa duração, a combinação 2-agonistas de longa duração + corticosteroides inalatórios e corticosteroides inalatórios isolados em 66, 48 e 42 análises, respectivamente. Nas mesmas análises, os desfechos função pulmonar, efeitos adversos e sintomas geraram 58, 54 e 35 análises, respectivamente. A maioria dos estudos mostrou que os medicamentos aliviaram os sintomas, melhoraram a qualidade de vida, a função pulmonar e preveniram as exacerbações. Poucos estudos contemplaram o desfecho mortalidade, e o papel do tratamento medicamentoso nesse desfecho ainda não está completamente definido. Os fármacos estudados são seguros no manejo da DPOC, com poucos efeitos adversos.

Palavras-chave: Doença pulmonar obstrutiva crônica/terapia; Doença pulmonar obstrutiva crônica/mortalidade; Revisão.

Introdução

Nos últimos anos, a DPOC passou a ter um papel de destaque no cenário internacional. Em uma série temporal americana realizada entre 1970 e 2002,(1) o assombroso aumento da mortalidade por DPOC, comparado à redução da mortalidade por várias outras doenças, e o entendimento de que a DPOC havia sido erroneamente rotulada como progressiva, irreversível e não tratável foram alguns dos pontos-chave responsáveis pelo interesse da comunidade científica.(2) Na última década, surgiu um novo paradigma em relação à DPOC, fazendo com que a mesma fosse alvo de mais investigações, assim como de maior reconhecimento e identificação, por parte dos profissionais da saúde, com novas perspectivas para seu tratamento. No Brasil, segundo um estudo,(3) estima-se que a DPOC acometa cerca de sete milhões de adultos de 40 anos ou mais. Apesar disso, somente 2% dessa população relata diagnóstico médico da doença, e apenas 18% refere estar sendo tratada.(3) Mesmo dentre os casos mais graves de DPOC - estágios III e IV segundo o Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD),(4) - a medicação é utilizada apenas por aproximadamente metade dos pacientes.(5) Esse dado preocupante também é observado em países de alta renda.(6,7) A falta do tratamento adequado e precoce da DPOC leva a consequências desastrosas para o paciente, como perda de função pulmonar e aumento da mortalidade.(8)Nos últimos anos, vivemos um aumento da oferta de medicações específicas para o tratamento da DPOC, que agem sobre vários pontos na sua fisiopatologia. A quantidade de publicações avaliando os diversos desfechos e as opções de tratamento medicamentoso tem aumentado recentemente. Em razão disso, julgamos apropriada uma revisão sistemática de artigos publicados nos últimos anos sobre o tratamento farmacológico para essa doença.

Processo de seleção dos artigos

As publicações originais e os níveis de evidência científica foram os pontos norteadores da presente revisão. Avaliou-se a eficácia/efetividade dos fármacos sobre vários desfechos, tendo como finalidade contribuir para a atualização de profissionais e a futura elaboração de consensos, diretrizes e algoritmos para o tratamento farmacológico dos pacientes com DPOC. Frente à diversidade de tratamentos para a DPOC, a busca foi limitada ao conceito de tratamento farmacológico. Itens do tratamento, como o uso de oxigênio, de ventilação assistida e de antibióticos durante as exacerbações, assim como o tratamento específico para a prevenção da doença relacionado à dependência ao tabagismo e à utilização de vacinas, não foram objeto desta revisão.

A busca dos artigos foi realizada em cinco bases de dados - PubMed, Web of Science, EMBASE, Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL) e LILACS - selecionando-se artigos publicados no período entre 2005 e 2009, com limite de três idiomas (inglês, espanhol e português). Utilizou-se a combinação dos termos DPOC com vários fármacos descritos na literatura. Os critérios de inclusão e exclusão foram aplicados para a seleção dos artigos conforme o objetivo principal da presente revisão. As principais siglas utilizadas para os fármacos nesta revisão estão descritas no Quadro 1. A descrição dos resultados baseou-se nos seis desfechos avaliados nesta revisão: sintomas, função pulmonar, exacerbação, qualidade de vida, mortalidade e efeitos adversos. Para cada desfecho, foram avaliados os fármacos e suas combinações. Inicialmente, são apresentados os resultados dos diferentes fármacos comparados a placebos e, posteriormente, dos fármacos entre si. Os resultados das comparações dos fármacos contra placebo também estão apresentados sob forma de figuras, tendo, no eixo x, o número de análises e, no eixo y, os nomes dos fármacos. Os níveis de evidência científica (grau de recomendação A, B ou C) estão ressaltados nas figuras, sendo que cada seção de resultados é seguida por uma discussão da evidência recente, elaborada por especialistas. Cada discussão utilizou, além de artigos originais, outras revisões sistemáticas e meta-análises pertinentes ao tema. A metodologia da revisão sistemática está detalhada no suplemento online, o qual pode ser acessado pelo link

http://www.jornaldepneumologia.com.br/portugues/artigo_detalhes.asp?id=1785


Através desse processo, foram incluídos, na presente revisão, 84 artigos originais; sendo que muitos desses abordavam mais de um fármaco e diferentes desfechos, o que originou 420 análises; 236 sobre o tratamento farmacológico contra placebo e 184 sobre a comparação dos medicamentos entre si. O texto a seguir aborda as respectivas análises para cada um dos seis desfechos estudados.

Desfechos

Sintomas

O alívio dos sintomas decorrentes da DPOC é um dos anseios imediatos dos pacientes portadores da doença. Os resultados da presente revisão mostram que os fármacos mais estudados para o alívio sintomático da DPOC vs. placebo são aqueles destinados ao tratamento dos estádios moderado e grave da doença, ou seja, LABA, LAMA e ICS. A maioria dos estudos mostrou que esses fármacos, sozinhos ou em combinação, foram efetivos no alívio dos sintomas (Figura 1). De todos os estudos sobre as medicações comparadas com placebos nesta revisão, os LABA, isolados ou em associação com ICS, foram aqueles que demonstraram, de forma mais consistente, uma melhoria dos sintomas da DPOC. Embora os LAMA tenham sido efetivos na redução dos sintomas, não foi relatado um efeito benéfico em 4 análises, sendo que 3 dessas avaliaram pacientes com DPOC de grau leve a moderado.(9-11) Em quatro de cinco estudos, o uso isolado de ICS determinou um efeito benéfico dos sintomas em longo prazo. Vestbo et al.,(12) no entanto, ao avaliarem a redução dos sintomas em duas semanas, detectaram um efeito benéfico somente nos pacientes que utilizaram ICS associados a LABA. Ainda pode ser observado na Figura 1 que o uso de iPDE4 e da combinação LAMA + ICS também mostrou um efeito benéfico nos sintomas em estudos bem conduzidos, embora tenham sido poucas as análises para esses fármacos. A comparação entre fármacos revela que não houve diferenças no efeito sobre a redução dos sintomas ou no uso de medicamentos de resgate dentro das diferentes classes de SABA(13) e de LABA.(14-16) Em relação aos broncodilatadores de classe distintas, Griffin et al., em uma coorte, observaram uma redução no uso de fármacos de resgate entre os pacientes do grupo que estava recebendo LAMA em comparação ao grupo recebendo a associação SAMA + SABA.(17) Em pacientes com DPOC moderada ou grave de acordo com a classificação GOLD, a associação salmeterol + fluticasona foi superior em relação à combinação SABA + SAMA(18) e ao uso isolado de salmeterol.(19-21) Não houve diferenças na comparação da associação salmeterol + fluticasona contra formoterol + budesonida naqueles pacientes com DPOC grave ou muito grave segundo a classificação GOLD, tanto para a redução dos sintomas, quanto para o uso de medicamentos de resgate.(22) Celik et al.(23) observaram que o uso de um antagonista de receptores de leucotrienos associado ao tratamento com um broncodilatador (brometo de ipratrópio e formoterol) produziu uma redução no escore de dispneia quando comparado com o uso isolado de broncodilatadores. O efeito da associação de iPDE4 com LABA e LAMA, comparado a outros fármacos, foi avaliado por Fabri et al.(24)
Naquele estudo, o uso de iPDE4 produziu um efeito benéfico nos sintomas e uma redução do uso de fármacos de resgate quando iPDE4 foi associado a LAMA, mas não quando combinado a LABA. O uso dessas medicações, isoladas ou em associação, ainda deve ser mais estudado para a definição de seu papel no alívio sintomático de portadores da DPOC.





A redução da mortalidade e do número de exacerbações, assim como a melhora funcional, são desfechos importantes quando se estuda uma abordagem terapêutica para DPOC. No entanto, o desejo imediato do paciente é o alívio dos sintomas de dispneia, com melhora da tosse e da capacidade de exercício. Um medicamento isolado ou combinação que traga esses benefícios melhora a aderência e a confiança no tratamento. Apesar de sua relevância, ainda são raros os estudos em que o desfecho principal seja o alívio sintomático, o que dificulta a interpretação desse desfecho na literatura.

A revisão sistemática da literatura recente reforça a importância dos broncodilatadores de ação prolongada (LABA e LAMA) no alívio sintomático dos estádios mais avançados da DPOC. O uso de LABA produziu um efeito mais consistente que o de LAMA na redução da dispneia; no entanto, não existe consenso na literatura sobre a superioridade de um em relação ao outro para o alívio sintomático da doença moderada ou grave. O efeito dos LABA e da combinação LABA + ICS parece ser um efeito de classe, não existindo, na literatura recente, uma demonstração da superioridade de quaisquer das formulações comerciais. Adicionar ICS ao tratamento parece ter um efeito positivo marginal em relação à monoterapia com LABA ou LAMA, esse último avaliado em apenas um estudo. Entretanto, deve ser considerado o aumento dos efeitos colaterais, como pneumonia e candidíase oral, que essa medicação acarreta. A literatura dos últimos anos sedimentou, portanto, a indicação de broncodilatadores de longa ação (LAMA e LABA) como primeira linha para o alívio sintomático na DPOC com classificação GOLD II, III ou IV. Existem lacunas a ser preenchidas, como o papel da nova geração de LABA, de iPDE4 e da associação de broncodilatadores com ICS e mucolíticos na melhora da dispneia. Essas dúvidas serão sanadas através de estudos que avaliem a sintomatologia de forma objetiva e como desfecho primário.

Função pulmonar

O tratamento farmacológico da DPOC pode impactar de duas formas na função pulmonar. A primeira é o aumento do VEF1 e da CVF, atenuando a obstrução ou o aprisionamento aéreo presentes nessa condição. O segundo efeito é a redução da perda progressiva de função pulmonar. Esses dois desfechos foram avaliados em 58 análises (Figura 2). Em relação ao efeito dos fármacos na melhora da função pulmonar, o uso de ICS, seja isoladamente ou em combinação (23 análises no total), mostrou um efeito benéfico nos pacientes com DPOC. A ausência de efeito sobre a função pulmonar foi evidenciada em apenas um ensaio clínico não randomizado, no qual se utilizou a combinação LABA + ICS em um subgrupo de pacientes com doença grave.(25) Foi observada uma melhora na função pulmonar com o uso de LAMA em 14 de 17 análises. Esse tipo de fármaco não se mostrou superior ao placebo em 3 análises em pacientes com doença moderada.(26) Campbell et al. demonstraram a superioridade da associação SABA + LABA na melhora da função pulmonar ao avaliarem a combinação de fármacos contra placebo.(27)Da mesma forma, Hodder et al.(28) detectaram a superioridade das associações LAMA + ICS e LABA + ICS em relação a placebo na melhora da função pulmonar (VEF1, CVF), durante os seis meses do estudo em pacientes com classificação segundo GOLD moderada e grave. O uso de mucolíticos(29) e antioxidantes (N-acetilcisteína)(30) determinaram um resultado na função pulmonar semelhante ao de placebo. O efeito de iPDE4 demonstrou uma superioridade em relação à função pulmonar comparado ao de placebo.(31) Quando comparadas classes de fármacos entre si, dois ensaios clínicos mostraram que os LAMA foram superiores aos LABA na melhora da função pulmonar.(28,32) Por outro lado, Aaron et al. não encontraram benefícios adicionais na função pulmonar entre o uso isolado de LAMA e sua combinação com LABA.(33) Já a associação LAMA + LABA + ICS foi superior ao uso isolado de LAMA no mesmo estudo.(33) Houve também um efeito benéfico na função pulmonar com a associação de iPDE4 com LAMA ou LABA, comparativamente ao uso isolado dessas medicações.(24) Em relação à taxa de declínio da função pulmonar, uma análise posterior de um estudo demonstrou que, nos pacientes com DPOC moderada e grave, houve redução da taxa de declínio com o uso de ICS, de LABA e da associação LABA + ICS,(34) comparativamente a placebo, sem diferença entre essas medicações quando comparadas entre si. O uso de LAMA não reduziu a taxa de declínio da função pulmonar em uma avaliação global.(35) Quando avaliados os portadores de doença moderada, houve uma discreta, porém significativa, redução de 6 mL por ano na taxa de declínio do VEF1 após o uso de broncodilatador.(26)





A análise dos recentes estudos mostra que existe uma melhora, ainda que incipiente, dos parâmetros de função pulmonar nos portadores de DPOC com o uso de medicações inalatórias. O uso isolado de LAMA, LABA e ICS, assim como suas combinações, mostraram um incremento no VEF1, que variou de 60 a 190 mL em períodos de seguimento diversos (de semanas a anos). Considerando que o painel da American Thoracic Society/European Respiratory Society para a normatização de espirometria(36) sugere que apenas mudanças no VEF1 de 20%, em curto prazo, e de 15%, em longo prazo, são significativas, a magnitude do incremento em VEF1 observada nos estudos recentes é limítrofe, e sua relevância clínica ainda está aberta a debate. A terapia combinada dos três agentes aparentemente leva a um maior incremento funcional do que o uso isolado de cada um desses. Também houve um aumento significativo do VEF1, em relação ao uso de placebo, com o uso de iPDE4. Em termos absolutos, avaliado em 24 ou 52 semanas, o aumento foi discreto, variando de 24 a 74 mL. Essa nova medicação ainda deve ser mote de ensaios clínicos que definirão seu papel no tratamento da DPOC. Os resultados dos artigos sobre mucolíticos/antioxidantes publicados no período estudado foram negativos, o que reforça a opinião vigente nos consensos nacionais e internacionais da limitada aplicação dessas classes de fármacos no incremento da função pulmonar na DPOC. A queda progressiva da função pulmonar na DPOC é um importante marcador prognóstico. Atuar sobre a taxa de redução do VEF1 parece ser uma maneira de mudar a evolução natural da DPOC. No final da década de 90 e no início deste século, vários estudos avaliaram esse desfecho com diferentes regimes terapêuticos, destacando dois estudos que avaliaram, respectivamente, o uso de N-acetilcisteína e de fluticasona.(30,37) O resultado desses estudos e de outros sobre a taxa de declínio da função pulmonar foi negativo.(38) Dois estudos se diferenciam daqueles do início da década por duas razões(26,34): pelo número de pacientes randomizados e pelo tempo de seguimento significativamente maior. Análises post hoc desses dois estudos mostraram uma redução da queda do VEF1 da ordem de 13 mL/ano nos três braços de tratamento em um dos estudos(34) e de 6 mL/ano em pacientes com doença moderada no outro.(26) Esses achados têm sido utilizados pelos partidários do início precoce do tratamento farmacológico da DPOC; no entanto, a discussão sobre o momento apropriado para iniciar o uso da medicação ainda não tem resposta definitiva.(39)

Exacerbação

Um dos principais objetivos do tratamento adequado do paciente com DPOC é prevenir e tratar suas exacerbações, já que as mesmas pioram a qualidade de vida, aceleram a queda progressiva da função pulmonar e aumentam a mortalidade.(4,40) Na presente revisão, o efeito dos fármacos para a prevenção das exacerbações da DPOC foi estudado em relação a placebo em 35 análises (Figura 3). A maioria das análises que estudaram o efeito de LAMA - em pacientes com classificação GOLD ao menos moderada - sugeriram uma redução no número ou no tempo para uma nova exacerbação. Dois grupos de autores(41,42) não encontraram efeitos benéficos, o que pode ter acontecido devido à seleção de pacientes com apenas uma exacerbação no último ano ou às maiores perdas no grupo não tratado. Em relação ao uso de LABA, Campbell et al.(27) não encontraram efeitos quanto ao número de exacerbações entre o grupo que utilizou formoterol em relação ao grupo com placebo. No entanto, Calverley et al.(43) observaram uma redução no número de exacerbações nos indivíduos tratados com salmeterol em relação aos que receberam placebo; cabe destacar que foram encontradas apenas duas análises em relação ao uso dessa medicação. Em relação ao uso da associação LABA + SABA, demonstrou-se que esses fármacos não reduziram o número de exacerbações, mas houve uma menor utilização de medicações de resgate comparativamente ao grupo placebo.(27) Quanto às hospitalizações, o uso de SAMA e da associação SABA + LABA não mostrou benefício;(44) porém, o estudo tem grau de recomendação C. Das 7 análises que investigaram o efeito de ICS em relação às exacerbações, 4 observaram uma redução no número de exacerbações em comparação ao grupo placebo. Choudhury et al.(45) observaram, exclusivamente, um aumento do tempo até a próxima exacerbação. Por sua vez, Macie et al.(44) não encontraram efeitos nas hospitalizações (exacerbações) por doença cardiovascular entre os pacientes utilizando ICS ou placebo, enquanto o estudo de Ernst et al.(46) mostrou que o risco de hospitalizações por pneumonia foi maior em pacientes com DPOC que utilizavam ICS. Todas as análises que avaliaram o efeito da associação LABA + ICS observaram uma redução no número de exacerbações em relação ao uso de placebo. Segundo Rennard et al.,(47) a associação formoterol + budesonida aumentou o tempo para uma nova exacerbação e reduziu o seu número em cerca de 40% em relação ao uso de placebo. A maioria das análises sobre o efeito de iPDE4 na redução da ocorrência de exacerbações da DPOC observou efeito benéfico. Calverley et al.,(48) em 2007, estudando pacientes com DPOC grave e muito grave, não observaram diferenças em relação ao uso de placebo. No entanto, o mesmo grupo,(31) em 2009, utilizando uma amostra maior, encontrou uma redução de 17% na taxa de exacerbações moderadas a graves por paciente por ano em relação ao grupo placebo, especificamente nos casos sintomáticos. Além disso, observaram um maior tempo livre de exacerbações e uma menor necessidade de uso de corticosteroides e antimicrobianos para o tratamento das exacerbações. Ainda pode ser observado na Figura 3 que, em 2 de 3 análises, o uso de mucolíticos e de antioxidantes mostraram um efeito benéfico na prevenção das exacerbações, estudos esses com grau de recomendação A. Quanto à comparação entre fármacos, Aaron et al.(33) estudaram pacientes com DPOC moderada ou grave pela classificação GOLD em relação ao uso de LAMA associado a outros fármacos. Naquele estudo, os autores observaram que a proporção de pacientes no grupo LAMA que apresentou exacerbações com necessidade de uso de corticosteroides sistêmicos ou de antimicrobianos não diferiu daqueles que utilizaram as associações LAMA + LABA ou LAMA + LABA + ICS. Em contrapartida, em comparação com o grupo LAMA isolado, a associação LAMA + LABA + ICS reduziu a taxa de hospitalizações por DPOC em quase 40%. Não se encontraram estudos comparando o uso de formoterol e salmeterol em relação a exacerbações. Donohue et al.(16) não observaram uma diferença significativa no número de exacerbações em um ano entre pacientes tratados com formoterol ou com salmeterol. Nas análises avaliadas, o uso da combinação LABA + ICS mostrou superioridade em relação aos usos isolados de LABA ou ICS nos seguintes desfechos: número de exacerbações, exacerbações graves com necessidade de internação e uso de corticosteroides sistêmicos.(19-21,43,47)




Aproximadamente, metade do custo do tratamento da DPOC é decorrente do manejo das exacerbações, em especial daquelas com necessidade de hospitalização.(49) Além disso, as exacerbações podem piorar a qualidade de vida, reduzir a função pulmonar e aumentar a mortalidade nessa condição.(4,40) A falta de uma definição consensual para exacerbação da DPOC e da graduação da sua gravidade são responsáveis por alguns resultados díspares entre os estudos clínicos.(50) Por esses motivos, alguns estudos incluíram apenas as exacerbações caracterizadas por aumento dos sintomas por pelo menos três dias, implicando no uso de corticosteroides sistêmicos, antibióticos ou na necessidade de internação.(35,43) O tratamento farmacológico com broncodilatadores isolados ou com corticosteroides pode acarretar uma redução da frequência das exacerbações ou o aumento do intervalo entre as mesmas ou ainda a redução de sua gravidade. Em nossa revisão, houve grande heterogeneidade entre os estudos quanto ao tamanho da amostra, doses e combinações de fármacos, gravidade da DPOC, duração do seguimento e parâmetros utilizados para avaliar a resposta ao tratamento. O número de análises sobre o uso de LABA ou SAMA ou SABA + LABA foi pequeno e mostrou resultados conflitantes, havendo apenas 1 análise com relato de efeito benéfico em relação às exacerbações com o uso de LABA. Uma revisão publicada em 2008, com estudos realizados antes de 2005, mostrou que o uso isolado de LABA reduziu em 22% a taxa de exacerbações quando comparado ao uso de placebo.(51) O ICS tem um efeito benéfico sobre as exacerbações, embora uma revisão recente aponte que seu benefício é modesto, ocorrendo apenas nos pacientes graves.(52) Diretrizes de manejo da DPOC sugerem o uso de ICS apenas para os pacientes com DPOC grave e com duas ou mais exacerbações por ano.(4,40) Embora várias análises da presente revisão tenham demonstrado um maior benefício sobre as exacerbações com a associação ICS + LABA em relação ao uso isolado dessas drogas, a relevância clínica é discutível. A proporção de redução das exacerbações em relação ao uso de placebo foi de 25% com LABA + ICS em um estudo(34) e de 15% com LAMA em outro.(26) Segundo Cazzola et al.,(50) essas diferenças estatísticas só teriam valor clínico quando houvesse a redução de uma exacerbação por ano ou uma redução de 22%. Os estudos que avaliaram os efeitos de iPDE4, em sua maioria, também mostraram efeitos benéficos. Cabe ressaltar que a redução na ocorrência de exacerbações com o uso de iPDE4 ocorreu apenas em pacientes com características clínicas de bronquite crônica intensa associada à presença de tosse crônica e várias exacerbações. O número de análises provenientes de estudos comparando os diversos fármacos foi relativamente pequeno na revisão aqui apresentada. Aaron et al. não identificaram diferenças na proporção de exacerbações entre os pacientes que usaram LAMA, associação LAMA + LABA e associação LAMA + LABA + ICS.(33) A taxa de hospitalizações foi menor com o uso dos três fármacos em relação ao uso isolado de LAMA, sendo necessários mais estudos para conclusões definitivas. A escolha dos fármacos para a redução das exacerbações, em uso isolado ou em associação, deve ser individualizada e levar em conta a gravidade da doença, os efeitos adversos e seus custos.(4,40) A combinação de fármacos com outras medidas, como reabilitação pulmonar, vacinação e cessação do tabagismo, é muito importante para o sucesso do tratamento.

Qualidade de vida

A DPOC é uma condição associada à incapacidade e à baixa qualidade de vida. Muitos estudos na literatura têm avaliado a qualidade de vida como um dos desfechos no sucesso ou no insucesso do tratamento da DPOC. Das 32 análises na presente revisão, comparando fármacos contra placebo (Figura 4), observou-se que o uso de ICS isolado e o de LABA e LAMA isolados ou em associação com ICS melhoram a qualidade de vida dos pacientes com DPOC, avaliada, preferencialmente, pela escala St. George's Respiratory Questionnaire (SGRQ). O uso de antioxidantes e de mucolíticos, assim como da combinação LABA + SABA e de iPDE4, não mostraram benefícios nesse desfecho, ressaltando-se o pequeno número de análises para esses últimos fármacos. Nos pacientes com DPOC de grau moderado a muito grave, o uso de LAMA mostrou um efeito benéfico na qualidade de vida, em relação ao uso de placebo, em 6 análises.(9,26,35,41,53,54) Entretanto, dois grupos de autores(11,42) que avaliaram pacientes com DPOC de grau leve a moderado segundo a classificação GOLD não encontraram esse efeito. A combinação LAMA + ICS foi avaliada em um único estudo, sendo demonstrada uma superioridade dessa associação em relação ao uso de placebo, durante os seis meses de duração do estudo.(28) O uso de LABA isoladamente produziu um efeito benéfico na qualidade de vida em 4 das 6 análises avaliadas (contra placebo), sendo que em 2 não houve efeito benéfico (todos esses estudos tinham grau de recomendação A). Independentemente da associação estudada, todas as análises que avaliaram LABA + ICS contra placebo encontraram efeitos positivos na qualidade de vida. A comparação entre diferentes classes de fármacos foi estudada por Aaron et al.,(33) que observaram que tanto a adição de LABA quanto de LABA + ICS a LAMA, em relação ao uso isolado de LAMA, produziram efeitos benéficos na qualidade de vida em pacientes com DPOC de grau moderado a grave. Resultados similares foram descritos por Welte et al.(55) comparando LAMA com sua associação a LABA + ICS.
No entanto, Hanania et al.(56) não encontraram efeitos benéficos na qualidade de vida com a associação LABA + LAMA vs. LAMA isolado.



A qualidade de vida relacionada à saúde tem adquirido importância crescente nas avaliações de efetividade/eficácia das intervenções terapêuticas. A utilização de questionários doença-específicos, como o SGRQ, apresenta a vantagem de se obter resultados com a detecção de pequenas mudanças no curso da doença após intervenções. No caso do SGRQ, variações iguais ou superiores a quatro pontos, em qualquer domínio, ou na soma total dos pontos, são consideradas clinicamente significativas. Em uma meta-análise comparando LAMA a placebo,(57) encontrou-se um efeito benéfico do primeiro sobre a qualidade de vida tanto naqueles estudos que avaliaram a diferença da média do escore do SGRQ, como naqueles que examinaram a proporção de pacientes que obtiveram uma redução no escore maior ou igual a quatro pontos. Em outra meta-análise, avaliando o efeito de LABA em portadores de DPOC com obstrução pouco reversível,(58) foram encontradas diferenças significativas a favor do uso de LABA, quando comparado ao de placebo, na qualidade de vida avaliada pelo SGRQ, mas com resultados conflitantes quando essa foi avaliada através de outros instrumentos. Yang et al.(59) observaram uma menor taxa de declínio da qualidade de vida em uma meta-análise de estudos comparando ICS ao uso de placebo. De maneira geral, os resultados dessa e de outras revisões mostram um efeito benéfico do uso de LABA, LAMA e ICS, esse último isolado ou associado a LABA ou LAMA, sobre a qualidade de vida em portadores de DPOC. Entretanto, esses resultados devem ser interpretados com cautela. Apesar de estatisticamente significante, a maioria dos estudos mostrou que a redução da média do escore do SGRQ é inferior àquela considerada clinicamente significativa (≥ quatro pontos). Outro dado importante que reforça a necessidade de cuidado na interpretação dos dados recentes da literatura é que, exceto pelo estudo de Tonnel et al.,(54) a qualidade de vida não foi avaliada como desfecho primário em nenhum estudo.

Mortalidade

Embora as evidências demonstrem que muitas das medicações preconizadas para o tratamento da DPOC sejam efetivas em relação a vários aspectos de relevância clínica nessa doença, seus efeitos em relação à mortalidade não estão ainda bem definidos. Conforme ilustrado na Figura 5, 22 análises avaliaram o efeito do tratamento sobre a mortalidade na DPOC, sendo que mais da metade dessas avaliou o uso de ICS ou LAMA isolados ou LABA + ICS contra placebo. Embora, em algumas análises, tenha havido redução da mortalidade e, em 2, aumento da mesma, a maioria das análises não demonstrou efeitos da medicação na mortalidade. Entre as análises nas quais foi evidenciada uma redução na mortalidade em relação ao uso de placebo, as medicações avaliadas foram ICS isoladamente, LAMA e a combinação LABA + ICS. Em relação ao uso de ICS comparado ao uso de placebo, estudos de coorte e de caso-controle revelaram um efeito benéfico na mortalidade com o uso desses fármacos.(60-62) Esses resultados, entretanto, não foram confirmados por ensaios clínicos prospectivos.(43,63) Deve ser ressaltado que Ernst et al. descreveram um aumento na mortalidade por pneumonia, em um estudo de caso-controle, no qual um ICS (fluticasona) foi comparado ao tratamento com placebo.(46) No ensaio clínico de Calverley et al.,(43) com pacientes sob uso da combinação LABA + ICS comparados ao grupo que recebeu placebo, não se observou redução da mortalidade, embora o nível de significância estatística tenha sido limítrofe (p = 0,052). Uma análise posterior daquele estudo revelou uma redução da mortalidade com a combinação salmeterol + fluticasona, restrita aos pacientes com DPOC em estágios II e III (moderados e graves), mas não em pacientes com DPOC muito grave.(64) Em relação ao uso de LAMA, dois ensaios clínicos não encontraram efeitos benéficos na mortalidade por DPOC em relação ao uso de placebo.(26,35) Uma análise posterior de um dos ensaios clínicos, no entanto, revelou uma redução da mortalidade, restrita aos pacientes com doença em estágio GOLD II e III (moderados e graves), a qual não se manteve após 30 dias do término do estudo.(65) O uso regular isolado de SABA foi avaliado comparativamente ao de placebo em um único estudo de caso-controle, sendo detectado um aumento na mortalidade no grupo de pacientes tratados.(66) Ainda em estudos contra placebo, o uso de LABA(43) ou de iPDE4(31) não modificou a mortalidade dos pacientes com DPOC. As evidências atuais não são conclusivas no que se refere à comparação entre os diferentes broncodilatadores na mortalidade por DPOC. Um estudo de coorte revelou uma redução de 20% na mortalidade em seis meses em pacientes pós-alta hospitalar, utilizando LAMA comparado ao uso de LABA,(67) resultado que foi ainda mais expressivo quando esses fármacos foram associados a ICS. Outro estudo longitudinal, no entanto, não evidenciou diferenças entre o uso desses dois fármacos.(68) Por outro lado, um ensaio clínico comparando LABA + ICS e LAMA detectou uma redução da mortalidade em dois anos com a associação de LABA + ICS.(69) A comparação do uso de SABA com o de LABA, associados ou não a ICS, em estudos observacionais, revela uma superioridade de LABA em relação à mortalidade.(70,71) Não existem evidências de efeitos na mortalidade por DPOC com o uso de xantinas vs. SABA.(71)





Por muitos anos, a cessação do tabagismo e a oxigenoterapia para portadores de hipoxemia grave foram consideradas as únicas intervenções que modificavam a mortalidade na DPOC. Um salto de qualidade na farmacopeia tem ocorrido desde o final da década de 90, disponibilizando novas modalidades de tratamento para essa condição. Mesmo com o advento de grandes estudos prospectivos controlados, apenas um teve a mortalidade como desfecho primário, falhando em alcançar significância estatística entre os grupos com um valor limítrofe (p = 0,052).(43) Nos outros estudos, a mortalidade foi um desfecho secundário ou um marcador de segurança. Análises post hoc e de subgrupos de dois estudos(26,34) mostraram um benefício para a redução da mortalidade com o uso de LABA + ICS e LAMA, especialmente em pacientes com doença moderada e grave (GOLD II e III). Muitas críticas metodológicas permeiam a interpretação desses dados. A acentuada perda de pacientes nos grupos controle pode ter contaminado os resultados, dificultando a detecção desse benefício nos grupos de tratamento. Duas recentes meta-análises compararam diversos regimes terapêuticos (ICS, LABA, LABA + ICS e LAMA), com resultados discordantes. A primeira, comparando LABA com LABA + ICS, não mostrou melhora na mortalidade com a associação de ICS à terapia habitual.(51) A segunda(72) concluiu que apenas LABA + ICS conferem um discreto benefício de mortalidade (risco relativo = 0,80 [IC95%: 0,69-0,94]), resultado que foi consistente mesmo quando excluídos os pacientes de outro estudo incluído na análise.(34) Na presente revisão sistemática, dos 22 artigos analisados, apenas 7 demonstram indícios de benefício na mortalidade. Todas as análises positivas provenientes dos artigos incluídos se baseiam em análises post hoc ou de subgrupos, na maioria das vezes avaliando a mortalidade como desfecho secundário. As duas meta-análises e o nosso levantamento demonstraram que, mesmo se o tratamento farmacológico tiver algum impacto na mortalidade, esse benefício é discreto. Cabe agora determinar se o tratamento dos estágios mais precoces da doença pode vir a reduzir a mortalidade, assim como qual a vantagem de se focar a terapia em fenótipos específicos, como pacientes com exacerbações frequentes ou aqueles com marcadores de inflamação sistêmica aumentados. O tratamento agressivo de comorbidades, especialmente cardiovasculares, assim como reabilitação e terapias para a redução de volumes pulmonares, associados à otimização do uso de medicações, também devem ser estudados como forma de reduzir a mortalidade na DPOC.

Efeitos adversos


Os efeitos adversos determinados pelo uso das medicações comumente utilizadas no tratamento da DPOC foram avaliados em 54 análises contra placebo (Figura 6). A maioria dos efeitos adversos observados nos estudos não foi grave, com exceção de algumas análises, com relatos de arritmias,(73) efeitos cardíacos isquêmicos(74) e fraturas.(75-77) Em 21 dessas análises, os efeitos adversos observados foram piores do que com o uso de placebo. Apenas 3 análises, sendo 2 com o uso de LAMA(35) e 1 com o uso de ICS,(78) evidenciaram efeitos benéficos sobre os efeitos adversos quando comparados ao uso de placebo. As análises do uso de iPDE4, SABA ou corticosteroides sistêmicos, todos contra placebo, apresentaram efeitos maléficos sobre o desfecho. Apesar de 1 análise ter apontado piora dos efeitos adversos com o uso de LABA, na maioria dos estudos não houve diferenças nos efeitos adversos entre o tratamento com LABA comparado ao com placebo, assim como o uso da combinação SABA + LABA ou uso de mucolíticos e antioxidantes. O uso de ICS isolado ou combinado (LABA + ICS), em vários ensaios clínicos, determinou um aumento dos efeitos adversos, principalmente no risco de pneumonia, quando comparado ao de placebo,(43,64,79) embora um estudo, avaliando as mesmas combinações farmacológicas, não tenha mostrado efeitos sobre o risco de pneumonia.(47) O uso de ICS não demonstrou aumentos do risco de fratura,(76,77,80) exceto em um estudo.(75) O uso de corticosteroides sistêmicos, entretanto, mostrou um maior risco de fraturas.(75,76) Cabe ressaltar que a maioria dessas análises é proveniente de estudos observacionais, reforçando a necessidade de ensaios clínicos específicos para responder essa questão. A comparação entre os broncodilatadores de longa duração quanto aos efeitos adversos não é conclusiva. Briggs et al.(32) relataram que a comparação do uso de LAMA com o de salmeterol, em um ensaio clinico randomizado, determinou uma maior prevalência de efeitos adversos leves, como boca seca, ao passo que houve uma redução na prevalência de efeitos adversos sérios, particularmente relacionados ao trato respiratório baixo.(32) Em contrapartida, a comparação desses dois fármacos em um estudo observacional não demonstrou diferenças quanto a efeitos cardíacos isquêmicos, arritmias e pneumonias.(68) O uso de fluticasona, comparado ao uso isolado de salmeterol(19,20,43,79) ou de LAMA,(69) demonstrou um aumento do risco de pneumonia.




Os atuais fármacos para o controle da DPOC, baseando-se nas análises da presente revisão, mostraram-se seguros, com efeitos adversos considerados mínimos, e sua manutenção não teve implicações na continuidade do tratamento na maioria dos estudos. Entretanto, os efeitos adversos com drogas ativas foram mais frequentes do que com placebo, cabendo destacar os ICS e corticosteroides sistêmicos. No estudo de Ernst et al.,(46) observou-se um aumento do risco de hospitalizações devido à pneumonia. Uma grande revisão sobre o assunto mostrou um risco relativo para pneumonia de 1,57 no grupo que recebeu ICS, sem haver aumento da mortalidade.(81) Os idosos e os pacientes mais graves tiveram um risco maior de pneumonia. Os maiores questionamentos sobre esses estudos foram a falta de definição precisa para pneumonia e a surpreendente ausência de aumento sobre a mortalidade em pacientes com DPOC acometidos de pneumonia. Em um estudo,(82) o uso de ICS demonstrou efeitos locais, como candidíase oral. Em relação aos efeitos sistêmicos dos ICS, diversos ensaios randomizados prospectivos detectaram uma maior frequência de equimoses e catarata.(83,84) Achados em outro estudo(43) apontaram um maior número de casos não fatais de pneumonia no grupo que recebeu ICS quando comparado aos pacientes que não receberam ICS. É geralmente aceito que o uso de doses iguais ou menores que 800 mg/dia de budesonida (ou equivalentes) não determinem um risco maior de redução da densidade óssea ou de fratura. Tais riscos tornam-se significativos com o uso de > 1.000 mg/dia de budesonida.(83) A demonstração da diminuição da densidade óssea especificamente em pacientes com DPOC tem apontado resultados conflitantes, possivelmente pela dificuldade no ajuste para fatores de confusão, tais como uso de esteroides orais, tabagismo, sedentarismo, dieta e tipo de ICS. Efeitos adversos associados ao uso de LABA são geralmente pouco importantes.(85) Durante algum tempo, houve questionamentos sobre a segurança cardiovascular dessas drogas. Recentemente, em dois grandes ensaios clínicos, um avaliando LABA(86) e outro LAMA,(87) esse problema não foi considerado grave, mesmo após um período de acompanhamento de 3 e 4 anos, respectivamente. Entretanto, em avaliação posterior, com a correção de algumas informações, demonstrou-se que o grupo que recebeu LAMA apresentou um maior risco de infarto agudo do miocárdio e de acidente vascular cerebral. Dentre os efeitos adversos do uso de iPDE4, os mais frequentes têm sido diarreia e náuseas. A perda de peso também é relativamente comum, ocorrendo em 6-12% contra 1-3% do grupo placebo, com emagrecimento médio de 2 kg, a maior parte ocorrendo nos primeiros meses de tratamento. Arritmias cardíacas e efeitos cardiovasculares tiveram frequências similares às do grupo placebo no estudo de Cazzola et al.(88) A Tabela 1 sumariza o efeito dos diferentes fármacos para o tratamento da DPOC em relação aos principais desfechos de interesse e os respectivos níveis de evidência científica. O resumo apresentado na Tabela 1 refere-se tanto a análises de fármacos contra placebo como contra outros fármacos.




Considerações finais

A presente revisão sistemática de artigos originais, publicados no período entre 2005 e 2009, avaliou os fármacos LABA, LAMA, ICS, ICS, mucolíticos, antioxidantes, iPDE4 e associações para os desfechos sintomas, função pulmonar, exacerbação, qualidade de vida, mortalidade e efeitos adversos na DPOC. Dos 84 artigos originais selecionados, resultaram 420 análises, aproximadamente 55% dessas sendo análises de fármacos contra placebo. Dos fármacos estudados, os mucolíticos e os antioxidantes foram as categorias menos estudadas, provavelmente devido ao papel pouco significativo desses fármacos na DPOC. Já os iPDE4 também não apresentaram um grande número de análises em razão de ser um grupo de fármacos novos; isso nos fez conferir aos mucolíticos + antioxidantes e a iPDE4 um grau de recomendação B para as análises realizadas com os mesmos. Os broncodilatadores mais estudados foram os de ação prolongada, como LABA e SAMA, não havendo evidências científicas conclusivas da superioridade de um sobre o outro. Os ICS apresentaram efeitos positivos e negativos, dependendo do desfecho estudado, com alguns efeitos adversos. A mortalidade, de todos os desfechos estudados, foi o desfecho ainda sem evidências conclusivas, com grau de recomendação A, para quaisquer um dos fármacos avaliados na presente revisão.

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Trabalho realizado no Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia, Departamento de Medicina Social, Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Pelotas, Pelotas (RS) Brasil.
Endereço para correspondência: Ana M B Menezes. Avenida Domingos de Almeida, 1146, casa 25, CEP 96085-470, Pelotas, RS, Brasil.
Tel/ Fax: 55 53 3284-1300. E-mail: anamene@terra.com.br
Apoio financeiro: Este estudo recebeu apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Recebido para publicação em 13/6/2011. Aprovado, após revisão, em 21/6/2011.



Sobre os autores

Ana Maria Baptista Menezes
Professora Titular de Pneumologia. Departamento de Clínica Médica, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas (RS) Brasil.

Silvia Elaine Cardozo Macedo
Professora Adjunta de Pneumologia. Departamento de Clínica Médica, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas (RS) Brasil.

Ricardo Bica Noal
Doutorando. Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia, Departamento de Medicina Social, Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Pelotas, Pelotas (RS) Brasil.

Jussara Fiterman
Professora. Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS) Brasil.

Alberto Cukier
Professor Livre-Docente. Disciplina de Pneumologia, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.

José Miguel Chatkin
Professor Titular de Medicina Interna e Pneumologia. Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS) Brasil.

Frederico Leon Arrabal Fernandes
Médico Assistente. Instituto do Coração, Hospital das Clínicas, Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.

Grupo de trabalho da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia: Adalberto S. Rubin, Antonio George de M. Cavalcante, Carlos Alberto Pereira, Cyntia M. S. Viana, Emilio Pizzichini, José R. B. Jardim, Julio C. Abreu, Luis Fernando Pereira, Marcelo Rabahi, Márcia Pizzichini, Marli Knorst, Oliver Nascimento e Marina Andrade Lima

Grupo de trabalho do Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia da Universidade Federal de Pelotas: David A. González, Maria de Fátima Maia, Fernando César Wehrmeister, Jeovany Martinez-Mesa e Samuel C. Dumith.

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