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Artigo Original

Comparação da variação de resposta ao broncodilatador através da espirometria em portadores de asma ou doença pulmonar obstrutiva crônica

Comparison of spirometric changes in the response to bronchodilators of patients with asthma or chronic obstructive pulmonary disease

Isabella Correia Silvestri, Carlos Alberto de Castro Pereira, Sílvia Carla Sousa Rodrigues

ABSTRACT

Objective: Making the differential diagnosis between asthma and chronic obstructive pulmonary disease (COPD) based on the response to inhaled bronchodilators by means of spirometry is controversial.The objective of this study was to identify the most useful spirometric variables in order to distinguish between asthma and COPD. Methods: Retrospective study conducted from April of 2004 to January of 2006, comparing the spirometric parameters of 103 nonsmoking patients with asthma to those of 108 patients with COPD who were smokers for more than 10 pack-years. All of the patients included in the study were older than 40 and presented stable disease at the time of the test. Results: Initial forced expiratory volume in one second (FEV1) was the same in the two groups (pre-bronchodilator FEV1 = 51%). However, patients with COPD were older (66 ± 9 years vs. 59 ± 11 years, p < 0.001) and more frequently male (73% vs. 27%, p < 0,001).After the use of the bronchodilator, the median absolute difference in FEV1 was 0.25 L (range, −0.09 to 1.13 L) in patients with asthma and 0.09 L (range, −0.1 to 0.73 L) in those with COPD (p < 0.001).The highest sensitivity (55%), specificity (91%) and likelihood ratio (6.1) for asthma diagnosis was obtained when the percentage increase in postbronchodilator FEV1 in relation to the predicted FEV1 (Δ%predFEV1) was equal to or greater than 10%.Isolated significant increases in forced vital capacity were more common in patients with COPD. Conclusions: In patients over the age of 40 and presenting obstructive lung disease, a Δ%predFEV1 ≥ 10% is the best spirometric parameter to distinguish asthma from COPD.

Keywords: Spirometry; Respiratory function tests; Lung diseases, obstructive.

RESUMO

Objetivo: O diagnóstico diferencial entre asma e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) através da resposta aos broncodilatadores inalatórios na espirometria ainda é controverso. O objetivo deste estudo foi detectar quais variáveis espirométricas melhor diferenciam asma de DPOC. Métodos: Estudo retrospectivo realizado entre abril de 2004 e janeiro de 2006, comparando-se os parâmetros espirométricos de 103 pacientes asmáticos, não fumantes, com os de 108 pacientes portadores de DPOC, fumantes de mais de 10 anos-maço. Todos os pacientes tinham mais de 40 anos e apresentavam doença estável no momento do exame. Resultados: O volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1) pré-broncodilatador foi igual nos dois grupos (VEF1 = 51%), mas os portadores de DPOC eram mais velhos (66 ± 9 anos vs. 59 ± 11 anos, p < 0,001) e, na sua maioria, do sexo masculino (73% vs. 27%, p < 0,001). A mediana da variação absoluta do VEF1 pós-broncodilatador foi de 0,25 L (intervalo, −0,09 a 1,13 L) nos pacientes com asma e de 0,09 L (intervalo, −0,1 a 0,73 L) nos com DPOC (p < 0,001). A melhor combinação de sensibilidade (55%), especificidade (91%) e razão de verossimilhança (6,1) para o diagnóstico de asma foi obtida quando a percentagem de incremento do VEF1 pós-broncodilatador em relação ao VEF1 previsto foi igual ou maior que 10% (p < 0,001). Variações significativas isoladas da capacidade vital forçada foram mais comuns nos pacientes com DPOC. Conclusões: Em portadores de doenças pulmonares obstrutivas com mais de 40 anos, a Δ%prevVEF1 ≥ 10% constitui o melhor parâmetro espirométrico para diferenciar asma de DPOC.

Palavras-chave: Espirometria; Testes de função respiratória; Pneumopatias obstrutivas.

Introdução

O diagnóstico diferencial entre asma e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) pela resposta aos broncodilatadores inalatórios através da espirometria ainda é controverso. No consenso estabelecido pela American Thoracic Society (ATS) e pela European Respiratory Society (ERS) sobre DPOC afirma-se que, embora algum grau de broncodilatação possa estar presente em pacientes com DPOC, um grande aumento no volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1) pós-broncodilatador suporta o diagnóstico de asma.(1) No consenso Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD), em sua versão recente, recomenda-se que o grau de reversibilidade da limitação ao fluxo aéreo não deva ser utilizado no diagnóstico diferencial entre DPOC e asma.(2)

A resposta ao broncodilatador é comumente determinada por variações no VEF1 e na capacidade vital forçada (CVF) pré- e pós-broncodilatador. O VEF1 é considerado o parâmetro funcional mais importante na avaliação da resposta ao broncodilatador. No entanto, alguns pacientes, sobretudo aqueles com obstrução grave, podem mostrar aumentos isolados da CVF, que devem ser valorizados por melhor se correlacionarem com a melhora da dispnéia e com o desempenho de exercício.(3-5)

Existem diversas formas para se expressar a resposta ao broncodilatador.(6-8) Diferentes pontos de corte têm sido propostos para definir o que é uma resposta broncodilatadora significante em indivíduos com distúrbios obstrutivos.(7,8) Além disso, a resposta ao broncodilatador pode variar longitudinalmente.(9)

As divergências entre os resultados de estudos prévios, em que se tentou diferenciar asma de DPOC pela resposta ao broncodilatador, podem ser explicadas por diversos motivos: amostragem pequena, presença de tabagistas entre os indivíduos asmáticos, uso de baixas doses de salbutamol inalatório, inclusão de jovens com asma e maior grau de obstrução entre os pacientes com DPOC.(10-12)

Este estudo teve a finalidade de avaliar os diferentes padrões espirométricos que melhor expressam a resposta ao broncodilatador na diferenciação entre asma e DPOC, tentando-se evitar as limitações dos estudos prévios.

Métodos

Este estudo baseou-se na análise retrospectiva dos padrões espirométricos de pacientes portadores de asma ou DPOC, regularmente acompanhados no Ambulatório de Pneumologia do Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo, com aprovação, sem restrições, pelo comitê de ética médica do referido hospital.

Os testes espirométricos preencheram os critérios de aceitabilidade e reprodutibilidade exigidos pela Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia (SBPT).(7) Os exames foram realizados utilizando-se dois espirômetros (SensorMedics, Yorba Linda, CA, EUA e MultiSpiro Inc., Irvine, CA, EUA) e consistiram de uma fase pré-broncodilatador e uma fase pós-broncodilatador, obtida 15 min após a administração de 400 mcg de salbutamol por nebulímetro pressurizado com o auxílio de uma câmara de expansão. Os limites de referência foram calculados de acordo com equações recentemente sugeridas para a população brasileira.(13) Foram consideradas apenas as provas que demonstraram obstrução ao fluxo aéreo (com ou sem redução da CVF), caracterizadas pela relação VEF1/CVF abaixo do limite inferior da normalidade.

O diagnóstico de asma ou DPOC foi determinado pelos médicos assistentes da especialidade, de acordo com os critérios clínicos sugeridos pela SBPT,(14,15) no atendimento de rotina. No total, 1061 resultados de espirometrias realizadas entre abril de 2004 e janeiro de 2006 foram estudados: 620 indicando o diagnóstico de asma e 441 indicando o diagnóstico de DPOC. Dentre as provas com diagnóstico de asma, foram selecionados 284 exames nos quais os pacientes tinham mais de 40 anos de idade, doença estável no momento do exame e ausência de história pessoal de tabagismo. Dentre as provas com diagnóstico de DPOC, foram selecionados 346 exames nos quais os pacientes tinham mais de 40 anos de idade, doença estável no momento do exame e história atual ou pregressa de tabagismo com consumo mínimo de 10 anos‑maço. Após essa seleção inicial, o registro geral dos pacientes foi utilizado para um levantamento de prontuários, a fim de confirmar os diagnósticos, além de excluir pacientes com outras doenças pulmonares concomitantes e com manifestações pulmonares de doenças sistêmicas. Os casos nos quais houve mudança de diagnóstico na análise de prontuário também foram excluídos. No final, 103 resultados de espirometria de pacientes com asma e 108 resultados de espirometria de pacientes com DPOC foram selecionados para o estudo.

A resposta ao broncodilatador foi avaliada de quatro formas diferentes: 1) percentagem de incremento do VEF1 pós-broncodilatador em relação ao basal (Δ%basalVEF1); 2) percentagem de incremento do VEF1 pós-broncodilatador em relação ao previsto (Δ%prevVEF1); 3) diferença absoluta entre o VEF1 pós-broncodilatador e o valor basal (ΔabsVEF1); 4) diferença absoluta entre a CVF pós-broncodilatador e o valor basal (ΔabsCVF).

A sensibilidade, a especificidade, os valores preditivos e a razão de verossimilhança foram calculados para as diversas expressões de resposta.(6,7) Recentemente em um estudo sobre ­espirometria, avaliou-se o VEF1 e a CVF antes e após o uso de broncodilatador em indivíduos normais.(16) Neste estudo verificou-se, de modo geral, que o VEF1 após o uso de broncodilatador pode elevar-se até 0,30 L em homens com mais de 40 anos e até 0,20 L em mulheres com mais de 40 anos. Esta expressão de resposta também foi avaliada no presente estudo.

As respostas ao broncodilatador foram classificadas da seguinte forma: 1) ausente - sem elevação significativa tanto do VEF1 quanto da CVF; 2) resposta isolada de VEF1 - aumento absoluto do VEF1 ≥ 0,30 L em homens ou 0,20 L nas mulheres; 3) resposta isolada de CVF - caracterizada por aumento absoluto da CVF ≥ 0,35 L em ambos os sexos; 4) resposta de VEF1 e CVF - com elevação significativa tanto do VEF1 quanto da CVF.

A análise estatística foi feita com o auxílio do software Statistical Package for the Social Sciences, versão 10 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA) para Windows 95. Os valores foram expressos como média ± desvio padrão ou como mediana e variação. As variações das respostas ao broncodilatador foram comparadas dentro do mesmo grupo por teste t pareado. Para variações das mesmas entre os grupos, utilizou-se teste t ou o teste de Mann-Whitney, para amostras independentes, ou o teste do qui-quadrado (χ2). A sensibilidade, especificidade e os valores preditivos positivo e negativo para os diferentes padrões qualitativos de resposta ao broncodilatador foram calculados, tomando-se a asma como referência. As diferentes expressões de resposta ao broncodilatador foram correlacionadas com o valor basal do VEF1 e a idade através do coeficiente de Spearman (rs). Foi realizada uma análise de covariância correlacionando o diagnóstico clínico e o sexo com a resposta broncodilatadora, expressa por ∆absVEF1. Valores de p foram considerados significativos se ≤0,05.

Resultados

Dos 211 pacientes envolvidos no estudo, 103 (49%) tinham diagnóstico de asma e 108 (51%) tinham diagnóstico de DPOC. Embora tenham sido incluídos apenas pacientes com idade acima de 40 anos, os portadores de DPOC eram mais velhos (66 ± 9 anos vs. 59 ± 11 anos, t = 5,47, p < 0,001) e em sua maioria do sexo masculino (73% vs. 27%, χ2 = 52,2, p < 0,001). A mediana do tabagismo entre os portadores de DPOC foi de 50 anos-maço (15 a 234 anos-maço). Os valores de percentagem de VEF1 pré-broncodilatador foram estatisticamente semelhantes nos dois grupos estudados (Tabela 1).



Após o uso de broncodilatador, a CVF aumentou em média de 2,39 L para 2,68 L nos pacientes com asma (p < 0,001) e de 2,91 L para 3,09 L nos pacientes com DPOC (p < 0,001). O VEF1 aumentou em média de 1,32 L para 1,59 L nos pacientes com asma (p < 0,001) e de 1,49 L para 1,61 L nos pacientes com DPOC (p < 0,001). Os demais parâmetros estudados também apresentaram variações estatisticamente significantes nos valores das medianas obtidas para cada uma das variáveis estudadas em ambos os grupos (Tabela 2).



Quando as respostas espirométricas foram avaliadas separadamente de acordo com as variações de VEF1, CVF ou ambas, 86% das respostas isoladas de VEF1 ocorreram em portadores de asma e, inversamente, 83% das respostas isoladas de CVF ocorreram em portadores de DPOC (Tabela 3). Quando ambas as respostas estavam presentes, 84% dos casos ocorreram em portadores de asma, sendo estas diferenças estatisticamente significantes (χ2 = 52,41, p < 0,001). Os pacientes com resposta isolada da CVF tinham menor percentagem de VEF1 inicial, em comparação aos demais grupos (39% vs. valores médios acima de 50% nos demais grupos, F = 5,07, p = 0,002). Houve correlação inversa significativa, porém pobre, entre a percentagem de CVF pré-broncodilatador e a ΔabsCVF (rs = -0,23, p = 0,001). Dentre os pacientes com DPOC, três casos apresentaram variações absolutas no VEF1 superiores a 400 mL (440, 640 e 730 mL). Nestes três casos, a análise de prontuário revelou enfisema à tomografia de tórax e ausência de melhora clínico-espirométrica após tratamento com corticosteróides inalatórios.



Na Tabela 4, a sensibilidade, especificidade, valores preditivos e razão de verossimilhança são mostrados para as diversas expressões de resposta ao broncodilatador, tomando-se a asma como referência.



A expressão ideal de resposta ao broncodilatador não deve variar com a magnitude do VEF1 inicial. Considerando-se todos os pacientes, as seguintes expressões não demonstraram dependência em relação ao VEF1 basal: ∆absVEF1 (rs = 0,096; p = 0,167) e ∆%prevVEF1 (rs = 0,080; p = 0,246). A ∆%basalVEF1 mostrou-se dependente do VEF1 basal (rs = -0,200; p = 0,004). Em ambos os grupos, a variação absoluta do VEF1 mostrou correlação inversa com a idade: rs = -0,31 (p = 0,001) para asma e rs = -0,296 (p = 0,002) para DPOC. Por análise de covariância, o diagnóstico clínico e o sexo influenciaram a resposta ao broncodilatador, expressa pela variação absoluta do VEF1.

Discussão

Nosso estudo demonstra que é possível diferenciar asma e DPOC pela resposta broncodilatadora na espirometria. Um aumento maior ou igual a 10% do VEF1 em relação ao valor previsto mostrou o melhor poder discriminatório para diferenciar asma de DPOC.

Asma e DPOC resultam da interação entre fatores genéticos e ambientais. A hipótese holandesa propõe que asma, bronquite crônica e enfisema devam ser considerados expressões diferentes de uma mesma doença. Dentre outros fatores, a hiperresponsividade brônquica e mutações dos beta-receptores são fatores de risco tanto para o desenvolvimento de asma como de DPOC.(17,18) Embora a obstrução variável ao fluxo aéreo seja proposta como uma característica definidora de asma, ela nem sempre diferencia asma de DPOC, especialmente em pessoas idosas com doença de longa duração. Por outro lado, existem diferenças fundamentais entre asma e DPOC que influenciam seu manejo e prognóstico.(19,20)

Na tentativa de diferenciar asma de DPOC, podem-se utilizar vários recursos. Dentre os testes de função pulmonar, a medida da difusão do monóxido de carbono e a resposta ao broncodilatador são os métodos mais relevantes.(21,22) No entanto, não há acordo entre os estudiosos a respeito de qual seria o melhor índice para expressar a resposta ao broncodilatador, nem que valor deveria ser utilizado para considerar-se tal resposta positiva.

Em nosso estudo, apesar dos grupos terem sido semelhantes quanto ao grau de obstrução inicial, foram diferentes quanto à idade e ao sexo. Estes fatores influenciaram a resposta ao broncodilatador.

A asma com obstrução persistente ao fluxo aéreo é mais comum em mulheres idosas, o que amplia a dificuldade do diagnóstico diferencial com a DPOC.(23) Em nossa casuística, apenas não fumantes foram incluídos no grupo com asma, e todos os portadores de DPOC eram fumantes, reduzindo a chance de classificação incorreta. Entretanto, estas restrições reduzem a validade externa do estudo.

Diversas expressões de resposta ao broncodilatador, com diversos pontos de corte, foram descritas. Dois tipos de estudos derivaram pontos de corte para caracterizar a resposta significativa ao broncodilatador. As variações pós-broncodilatador podem ser consideradas significantes se excederem a variação observada pós-broncodilatador em indivíduos normais, ou se excederem a variação espontânea ou aquela observada após o uso de placebo, em pacientes com limitação ao fluxo aéreo. Em três estudos com indivíduos normais, encontraram-se limites superiores de resposta pós-broncodilatador (8, 9 e 10%, respectivamente).(7) Em um estudo recente, demonstrou-se que as respostas em indivíduos normais caem com a idade, mas, em geral, variações acima de 0,20 L para o sexo feminino e acima de 0,30 L para o sexo masculino constituiriam os limites de resposta em indivíduos acima dos 40 anos.(16) No presente estudo, um valor de 10% de incremento do VEF1 em relação ao valor previsto teve o melhor poder discriminatório entre asma e DPOC, reforçando que nos asmáticos o tônus brônquico é verdadeiramente elevado. Respostas acima de 0,20 L em mulheres e 0,30 L em homens tiveram desempenho levemente inferior. Em dois estudos,(8,24) a melhor diferenciação entre asma e DPOC foi obtida pelo incremento do VEF1 ≥ 10% do previsto, após o uso de broncodilatador. Em um estudo com 660 pacientes com DPOC encontrou-se um aumento do VEF1 acima de 9% do previsto em 23% dos pacientes, sendo que este número variou com a repetição dos testes.(25)

Variações funcionais, que excedem aquelas observadas após placebo, estabelecem variações acima das observadas ao acaso. São incluídas neste grupo variações absolutas do VEF1 acima de 0,20 L, variações percentuais do VEF1 em relação ao basal acima de 12%, a combinação destas duas variações, ou ainda variações percentuais do VEF1 acima de 7% do previsto.(7) Embora estas respostas sejam mais freqüentemente observadas em portadores de asma, são também freqüentes em portadores de DPOC. Não é surpreendente, portanto, que estas ­expressões de resposta tenham maior sensibilidade para a detecção de asma, mas com menor especificidade.(9-12) Um autor(12) sugeriu que ΔabsVEF1 ≥ 200 mL seria a expressão mais eficiente para diferenciar asma de DPOC, mas a razão de verossimilhança foi maior para variações do VEF1 acima de 9% do previsto.

Dentre as formas de expressão de resposta ao broncodilatador, a Δ%basalVEF1 mostra maiores respostas aparentes quando o VEF1 é menor, superestimando a resposta.(25) No presente estudo, houve a preocupação de emparelhar-se a gravidade da obstrução ao fluxo aéreo nos dois grupos, para minimizar-se a influência do VEF1 inicial na taxa de resposta ao broncodilatador. Já a Δ%prevVEF1 e a ΔabsVEF1 não mostraram correlação com o valor basal de VEF1. A inclusão simultânea de variações absolutas e percentuais, expressa pela variação simultânea acima de 12% do valor basal e 0,20 L para o VEF1, retira em parte a influência dos valores iniciais sobre a resposta. No presente estudo, esta expressão de resposta teve sensibilidade semelhante ao incremento de 10% do VEF1 previsto, porém com menor especificidade e menor razão de verossimilhança, o que pode ser explicado pelo maior número de mulheres no grupo com asma. Variações acima de 0,20 L no sexo feminino são indicativas de tônus brônquico anormal.(16)

No presente estudo, três pacientes com DPOC apresentaram variações absolutas no VEF1 superiores a 400 mL após o uso do broncodilatador. Nestes casos, a tomografia de tórax revelou extenso enfisema e não houve melhora após o tratamento com corticosteróides inalatórios. Um estudo correlacionou a hiperresponsividade brônquica com os achados estruturais em pacientes diagnosticados com DPOC que foram encaminhados para ressecção de nódulos pulmonares.(26) A concentração de metacolina que provocou queda de 20% do VEF1, após correção para o valor basal, se correlacionou diretamente com a retração elástica pulmonar e com a espessura das vias aéreas, aí incluída a massa muscular lisa. Estes dois fatores, portanto, se correlacionam com maior grau de hiperresponsividade brônquica. Os pacientes mais responsivos tinham também menor número de ligações alveolares nas paredes externas das vias aéreas. Pacientes eventuais com enfisema poderão ter respostas acentuadas ao broncodilatador, por provável amplificação destes mecanismos. Um outro paciente observado por nós, portador de extenso enfisema, com acentuadas variações do VEF1 pós-broncodilatador, foi submetido à cirurgia redutora de volume e, após a cirurgia , a resposta ao broncodilatador desapareceu, o que poderia ser explicado pelo aumento da tração radial das vias aéreas após o procedimento.(27)

Pacientes com DPOC, especialmente aqueles com obstrução acentuada, podem mostrar uma elevação significativa apenas da CVF pós-broncodilatador, o que se correlaciona com a redução da dispnéia e maior capacidade de exercício.(3,4) Variações maiores ou iguais a 0,35 L da CVF excedem o 95º percentil de variação ao acaso.(7) Variações acima de 12% e 0,20 L para a CVF, à semelhança do proposto para o VEF1, continuam a ser erroneamente sugeridas como significativas.(28) Não é surpreendente que este ponto de corte tenha poder discriminatório pobre para diferenciar asma de DPOC.(12)

No presente estudo, variações isoladas significativas da CVF foram mais freqüentes em pacientes com DPOC e foram associadas com maior grau de obstrução. Respostas isoladas de volume ao broncodilatador em pacientes com DPOC se associam com enfisema acentuado e provavelmente resultam de um efeito alterado da inflação pulmonar sobre o calibre das vias aéreas.(29) Pacientes asmáticos também podem exibir resposta isolada da CVF pós-broncodilatador. Nestes pacientes há provavelmente um aumento do volume residual por fechamento de pequenas vias aéreas, as quais se abrem após o uso de broncodilatador.

As respostas ao broncodilatador podem ser classificadas como respostas de fluxo e respostas de volume.(30) Variações no VEF1, quando proporcionais às variações na CVF, com a relação VEF1/CVF inalterada ou reduzida após o uso do broncodilatador, podem simplesmente refletir recrutamento de volume pulmonar, e deveriam ser consideradas respostas de volume.(3) Ambos, VEF1 e CVF, são medidas de volume, porém suas variações pós-broncodilatador podem refletir aumento dos fluxos expiratórios. Quando há variação isolada do VEF1 pós-broncodilatador, provavelmente houve dilatação brônquica preferencial de vias aéreas centrais e, quando há variação isolada da CVF, houve dilatação brônquica preferencial de vias aéreas periféricas, de modo que ambas refletem também uma melhora dos fluxos, embora em diferentes segmentos da árvore brônquica. Dessa forma, preferimos denominar as respostas como respostas de VEF1, de CVF, ou de ambos, ao invés de denominá-las como respostas de fluxo ou volume.

Concluímos que, em indivíduos com mais de 40 anos e portadores de doenças pulmonares obstrutivas, é possível diferenciar asma de DPOC pela resposta broncodilatadora durante a espirometria. Um aumento maior ou igual a 10% do VEF1 em relação ao valor previsto demonstrou o melhor poder discriminatório para diferenciar asma de DPOC. Alternativamente, a expressão criada com base no trabalho de Johannessen et al. (∆absVEF1 ≥ 0,30 L para o sexo masculino e ∆absVEF1 ≥ 0,20 L para o sexo feminino) também pode ser utilizada. Salientamos, contudo, a necessidade de que novos estudos sejam realizados em portadores de asma e DPOC pareados por sexo e idade, a fim de que os resultados obtidos possam ser ainda mais específicos.

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Trabalho realizado no Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo - HSPE/SP - São Paulo (SP) Brasil.
1. Pós-graduanda em Ciências da Saúde. Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo - HSPE/SP - São Paulo (SP) Brasil.
2. Chefe do Departamento de Doenças do Aparelho Respiratório. Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo - HSPE/SP - São Paulo (SP) Brasil.
3. Chefe do Laboratório de Função Pulmonar. Hospital do Servidor Público Estadual de São Paulo - HSPE/SP - São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Isabella Correia Silvestri. Rua Pedro de Toledo, 1800, Bloco F, 3º andar, Laboratório de Função Pulmonar, CEP 04029-000, São Paulo, SP, Brasil.
Tel 55 11 6163-0622. E-mail: isabellasilvestri@uol.com.br
Suporte financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 22/10/2007. Aprovado, após revisão, em 23/1/2008.

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