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Artigo Original

Disfunção diafragmática e mortalidade em pacientes portadores de DPOC

Diaphragmatic dysfunction and mortality in patients with COPD

Wellington Pereira dos Santos Yamaguti, Elaine Paulin, João Marcos Salge, Maria Cristina Chammas, Alberto Cukier, Celso Ricardo Fernandes de Carvalho

ABSTRACT

Objective: To determine whether COPD patients with diaphragmatic dysfunction present higher risk of mortality than do those without such dysfunction. Methods: We evaluated pulmonary function, diaphragm mobility and quality of life, as well as determining the Body mass index, airway Obstruction, Dyspnea, and Exercise capacity (BODE) index, in 42 COPD patients. The patients were allocated to two groups according to the degree to which diaphragm mobility was impaired: low mobility (LM; mobility ≤ 33.99 mm); and high mobility (HM; mobility ≥ 34.00 mm). The BODE index and the quality of life were quantified in both groups. All patients were followed up prospectively for up to 48 months in order to determine the number of deaths resulting from respiratory complications due to COPD. Results: Of the 42 patients evaluated, 20 were allocated to the LM group, and 22 were allocated to the HM group. There were no significant differences between the groups regarding age, lung hyperinflation or quality of life. However, BODE index values were higher in the LM group than in the HM group (p = 0.01). During the 48-month follow-up period, there were four deaths within the population studied, and all of those deaths occurred in the LM group (15.79%; p = 0.02). Conclusions: These findings suggest that COPD patients with diaphragmatic dysfunction, characterized by low diaphragm mobility, have a higher risk of death than do those without such dysfunction.

Keywords: Pulmonary disease, chronic obstructive/mortality; Diaphragm; Exercise tolerance; Quality of life.

RESUMO

Objetivo: Verificar se indivíduos portadores de DPOC com disfunção diafragmática apresentam maior risco de mortalidade quando comparados àqueles sem disfunção diafragmática. Métodos: Foi avaliada a função pulmonar, a mobilidade diafragmática, a qualidade de vida e o índice conhecido como Body mass index, airway Obstruction, Dyspnea, and Exercise capacity (BODE) em 42 pacientes portadores de DPOC. Os pacientes foram alocados em dois grupos de acordo com a gravidade do acometimento da mobilidade do diafragma: grupo de baixa mobilidade (BM; mobilidade ≤ 33,99 mm) e grupo de alta mobilidade (AM; mobilidade ≥ 34,00 mm). O índice BODE e a qualidade de vida foram quantificados nos dois grupos. Todos os pacientes foram acompanhados prospectivamente por um período de até 48 meses a fim de identificarmos o número de óbitos decorrentes de complicações respiratórias devido a DPOC. Resultados: Dos 42 pacientes avaliados, 20 foram classificados no grupo BM, e 22 foram alocados no grupo AM. Não houve diferenças significativas quanto à faixa etária, hiperinsuflação pulmonar e fatores relacionados à qualidade de vida entre os grupos. Entretanto, o grupo BM apresentou maior pontuação no índice BODE em relação ao grupo AM (p = 0,01). O acompanhamento dos pacientes ao longo de 48 meses permitiu identificar quatro óbitos na população estudada, sendo todos os casos no grupo BM (15,79%; p = 0,02). Conclusões: Esses resultados sugerem que pacientes portadores de DPOC com disfunção diafragmática, caracterizada por uma baixa mobilidade do diafragma, apresentam maior risco de mortalidade quando comparados àqueles sem disfunção diafragmática.

Palavras-chave: Doença pulmonar obstrutiva crônica/mortalidade; Diafragma; Tolerância ao exercício; Qualidade de vida.

Introdução

A DPOC é definida como um estado de doença caracterizado pela presença de limitação ao fluxo aéreo que não é totalmente reversível.(1) O aumento da resistência das vias aéreas pode desencadear, ao longo do processo evolutivo da doença, outras alterações pulmonares, ­identificadas pelo aumento dos volumes pulmonares estáticos. Esse processo dinâmico e progressivo, reconhecido clinicamente como aprisionamento aéreo, tem sido demonstrado como um importante fator limitante da função diafragmática em pacientes portadores de DPOC.(2)

Nos últimos anos, a avaliação da mobilidade do músculo diafragma começou a ser compreendida como mais um parâmetro de identificação da disfunção diafragmática em pacientes com pneumopatias crônicas.(3,4) Os estudos têm evidenciado que o acometimento da mobilidade diafragmática pode estar associado a alterações dos principais parâmetros da função pulmonar como, por exemplo, VEF1.(2,5) A mensuração isolada do VEF1 tem sido reconhecida como uma ferramenta útil para predizer o estado de saúde, a frequência de exacerbação e o risco de mortalidade em pacientes com DPOC.(6) No entanto, as manifestações sistêmicas da doença não são refletidas por esse parâmetro.

Nesse sentido, um novo sistema de graduação multidimensional - Body mass index, airway Obstruction, Dyspnea, and Exercise capacity (BODE) index - tem sido proposto para fornecer informações úteis de prognóstico em pacientes com DPOC.(7) Esse índice incorpora quatro importantes parâmetros de avaliação funcional que refletem as alterações pulmonares e sistêmicas da DPOC: quantificação da dispneia, índice de massa corpórea (IMC), capacidade de exercício pelo teste de caminhada de seis minutos (TC6) e função pulmonar por VEF1. O índice BODE tem sido reportado como um importante preditor de mortalidade (melhor que o VEF1 isoladamente),(7) além de ter sido utilizado também como indicador de avaliação de programas de reabilitação pulmonar,(8) preditor de hospitalizações(9) e preditor da piora da qualidade de vida.(10)

Nosso grupo, recentemente, descreveu uma classificação da disfunção diafragmática, baseada no índice de mobilidade do diafragma, na qual subgrupos de pacientes, com maior ou menor acometimento da sua mobilidade, pudessem ser caracterizados em relação a parâmetros funcionais.(11) Esse estudo revelou que os indivíduos alocados no grupo com mobilidade do diafragma ≤ 33,99 mm apresentaram maior sensação de dispneia após o esforço físico e pior desempenho no TC6 quando comparados ao grupo com mobilidade ≥ 34,00 mm. Apesar dessa classificação de gravidade da disfunção diafragmática ter sido discriminatória quanto a parâmetros funcionais, nenhuma característica relacionada à incidência de mortalidade ou à qualidade de vida foi descrita em relação a esses dois subgrupos de pacientes.

O objetivo principal do presente estudo foi avaliar se indivíduos
portadores de DPOC com disfunção diafragmática apresentam maior risco de mortalidade quando comparados àqueles sem tal disfunção. Além disso, também tivemos como objetivos secundários comparar os valores do índice BODE e fatores relacionados à qualidade de vida entre os dois grupos de pacientes classificados de acordo com a mobilidade do diafragma.

Métodos

De um total de 277 pacientes em acompanhamento clínico no ambulatório de doenças pulmonares obstrutivas da instituição, foram selecionados 42 pacientes portadores de DPOC (32 homens) que preencheram os critérios de inclusão e exclusão para participar do estudo. O diagnóstico de DPOC foi estabelecido com base na história clínica, no exame físico e na prova de função pulmonar (VEF1/CVF < 0,7 mensurada após o uso de broncodilatador).(1) Todos os pacientes eram ex-tabagistas, estavam em tratamento clínico-medicamentoso otimizado e apresentavam condições clínicas estáveis há pelo menos 30 dias da realização das avaliações (sem exacerbação dos sintomas ou internação hospitalar). Foram considerados como critérios de exclusão: resposta pulmonar significante ao uso de broncodilatador (aumento do VEF1 maior que 15% do valor basal ou maior que 200 mL); inabilidade para realizar qualquer um dos exames solicitados; dependência de oxigênio; presença de outras doenças cardiopulmonares e/ou hepáticas conhecidas; e realização de procedimento cirúrgico abdominal e/ou torácico prévio. O estudo foi aprovado pelo comitê de ética do hospital sob o número 914/04, e todos os indivíduos participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido.

Os pacientes foram submetidos a um protocolo de avaliação composto pela prova de função pulmonar completa, mensuração ultrassonográfica da mobilidade diafragmática, índice BODE e fatores relacionados à qualidade de vida. Os exames foram realizados em um intervalo máximo de duas semanas, e todos os pacientes mantiveram-se clinicamente estáveis durante o período de avaliação.

Os pacientes foram alocados em dois grupos de acordo com a classificação de gravidade do acometimento da mobilidade do diafragma: grupo de baixa mobilidade (BM; mobilidade ≤ 33,99 mm) e grupo de alta mobilidade (AM; mobilidade ≥ 34,00 mm),(11) sendo os pacientes pertencentes ao grupo BM considerados indivíduos com disfunção diafragmática. O índice BODE e os fatores relacionados à qualidade de vida foram quantificados nas duas populações. Além disso, todos os pacientes foram acompanhados, prospectivamente, por um período de até 48 meses a partir da data de avaliação a fim de identificar a ocorrência de óbitos decorrentes de complicações respiratórias devido a DPOC.
Os pacientes também foram agrupados de acordo com os valores obtidos na classificação proposta pelo Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD) e no índice BODE para comparar a sensibilidade e a especificidade desses índices como preditores de mortalidade. No caso do GOLD, os pacientes foram classificados como GOLD baixo (classes I e II) e GOLD alto (classes III e IV). Em relação ao índice BODE, os pacientes foram considerados como pertencentes ao grupo de BODE baixo (quartis I e II) e BODE alto (quartis III e IV). Os indivíduos alocados nos grupos GOLD alto e BODE alto representariam os pacientes com maior acometimento pulmonar e funcional e, portanto, com maior risco de mortalidade.(12)

Os testes de função pulmonar foram realizados no Laboratório de Função Pulmonar da instituição, utilizando um pletismógrafo de corpo inteiro (Collins GS II, Collins, Braintree, MA, EUA). Foram mensurados os parâmetros espirométricos, os volumes pulmonares estáticos, a resistência das vias aéreas e a DLCO de acordo com a técnica recomendada pela American Thoracic Society e pela European Respiratory Society(13) e baseada nos critérios de reprodutibilidade e aceitabilidade (variabilidade < 5%). Os valores de referência para a espirometria foram aqueles descritos por Knudson et al.(14)

A mensuração da mobilidade diafragmática foi realizada utilizando um aparelho de ultrassom (Logic 500 Pro Series; General Electric Medical Systems, Milwaukee, WI, EUA) no modo B. O método de avaliação utilizado nesse estudo quantifica o deslocamento crânio-caudal do ramo esquerdo da veia porta como medida do deslocamento do diafragma. Esse método foi recentemente validado(15) e demonstrou ser sensível para detectar pequenas variações do padrão de movimento diafragmático com as mudanças de posicionamento corporal.(16) Uma descrição detalhada do método já foi realizada em estudos prévios.(2,11,16)

O índice BODE foi utilizado como preditor do risco de mortalidade, e, para o seu cálculo, foram avaliados o IMC, o valor do VEF1 expresso em porcentagem do previsto, a sensação de dispneia quantificada pela escala Modified Medical Research Council (MMRC) e a distância percorrida no TC6, realizado de acordo com as recomendações da American Thoracic Society.(17) Os pacientes receberam notas pré-­determinadas de acordo com os valores dos parâmetros obtidos, utilizando-se uma tabela de pontuação que pode apresentar variação de 0 a 10 pontos. No índice BODE, altos valores numéricos estão associados a um maior risco de mortalidade.(7)

Os fatores relacionados à qualidade de vida foram avaliados utilizando-se o questionário Saint George's Respiratory Questionnaire (SGRQ),(18)
traduzido para a língua portuguesa e validado para o uso no Brasil.(19)

Esse questionário é específico para doenças respiratórias, sendo composto por 76 questões divididas em três domínios: sintomas, atividade e impacto. Há notas pré-determinadas para cada domínio, e o escore total corresponde à somatória dos escores dos três domínios. O escore total pode variar de 0 a 100. Quanto menor o valor obtido, melhor é a qualidade de vida do paciente.

Todos os dados estão apresentados como média ± dp. Foi utilizado o teste de Kolmogorov-Smirnov para verificar a normalidade de variância dos dados. Para a comparação dos parâmetros entre os dois grupos, foi utilizado o teste t de Student (dados paramétricos) ou o teste de Mann Whitney (dados não-paramétricos). A análise da curva de Kaplan-Meyer foi utilizada para descrever a distribuição de sobrevida dos grupos, e a significância estatística foi avaliada utilizando o teste log-rank. Foram verificadas a sensibilidade e a especificidade da mobilidade diafragmática e dos índices BODE e GOLD para a predição de mortalidade dos pacientes estudados. Considerando-se que a presença de disfunção diafragmática poderia estar associada com um pior prognóstico, os pacientes classificados como pertencentes ao grupo BM foram referidos como aqueles que apresentaram um teste positivo no cálculo da sensibilidade e da especificidade.(20) As análises foram realizadas utilizando-se o pacote estatístico SigmaStat, versão 3.5 (Systat Software Inc., San Jose, CA, EUA), e adotou-se um nível de significância estatística de p < 0,05 para todos os testes.

Resultados

Foram estudados 42 pacientes (32 homens) portadores de DPOC com obstrução das vias aéreas de leve a grave (VEF1 = 49,88 ± 18,36% do previsto). As características funcionais e antropométricas dos pacientes encontram-se descritas na Tabela 1. O número de pacientes distribuídos nos estágios I-IV da classificação de gravidade da DPOC definida pelo GOLD e a média do índice BODE em cada categoria estão demonstrados na Tabela 2.








Dos 42 pacientes avaliados, 20 e 22 foram classificados no grupo BM e AM, respectivamente. Na Tabela 3, estão ilustrados os resultados referentes às variáveis antropométricas, pulmonares e funcionais nos dois grupos de pacientes. Os grupos foram comparáveis em relação à faixa etária e à hiperinsuflação pulmonar avaliada pela capacidade pulmonar total. Não houve diferenças significantes em nenhum domínio do SGRQ entre os grupos BM e AM. Entretanto, o grupo BM apresentou maior pontuação no índice BODE, com diferença significante em relação ao grupo AM (p = 0,01). O acompanhamento dos pacientes, ao longo de 48 meses, permitiu constatar a incidência de quatro óbitos, sendo todos os casos pertencentes ao grupo BM (15,79%) e decorrentes de complicações pulmonares devido à DPOC. A Figura 1 ilustra a curva de sobrevida de Kaplan-Meier para os dois grupos de mobilidade do diafragma. A análise do teste log-rank demonstrou diferença significante na incidência de mortalidade entre os grupos estudados (p = 0,02).






A sensibilidade e a especificidade da classificação da disfunção diafragmática como preditor de mortalidade na população estudada foi de 100% e 58%, respectivamente. Esse cálculo também foi realizado para as classificações de acordo com o GOLD e o índice BODE, e os resultados estão sumarizados na Tabela 4.



Discussão

O presente estudo demonstrou que pacientes portadores de DPOC com disfunção diafragmática (mobilidade do diafragma ≤ 33,99 mm) tiveram maior pontuação no índice BODE, indicando um maior risco de mortalidade em relação aos indivíduos sem disfunção diafragmática. A incidência de mortalidade, identificada prospectivamente, nos indivíduos com disfunção diafragmática, foi significativamente maior que nos indivíduos sem essa disfunção, fortalecendo a utilização do índice BODE como um preditor de mortalidade. Por outro lado, a classificação da disfunção diafragmática não apresentou poder discriminatório em relação à quantificação dos fatores relacionados à qualidade de vida.

A redução da mobilidade do diafragma tem sido identificada em pacientes portadores de DPOC e associada ao declínio dos parâmetros da função pulmonar.(21) Em um estudo prévio, demonstramos que existe uma relação entre a disfunção diafragmática e o aprisionamento aéreo.(2) Outros autores também têm descrito uma associação entre a redução do VEF1 e o comprometimento da mobilidade do diafragma.(4,5) Esses resultados, vistos conjuntamente, fortalecem a hipótese de que a presença de disfunção diafragmática está relacionada com a gravidade da doença pulmonar.

Apesar do VEF1 ser considerado um importante marcador da gravidade da obstrução pulmonar, esse parâmetro não reflete adequadamente as manifestações sistêmicas da DPOC.(22) Portanto, a utilização de outro parâmetro, como a capacidade de exercício submáximo avaliada pelo TC6, tem sido proposta para melhorar a compreensão das alterações funcionais nesses indivíduos.(23) A associação entre a disfunção diafragmática e a limitação da tolerância ao exercício físico também foi previamente demonstrada.(11) Considerando os resultados desses estudos que identificaram uma associação entre a limitação da mobilidade do diafragma com o declínio de pelo menos dois determinantes do índice BODE, ou seja, VEF1 e capacidade de exercício,(2,11) formulamos a hipótese de que o maior acometimento pulmonar e funcional presente nos indivíduos com disfunção diafragmática poderia refletir uma maior gravidade da doença e, consequentemente, um maior risco de mortalidade.

Para testar essa hipótese, o índice BODE foi calculado nos dois subgrupos de pacientes classificados de acordo com a mobilidade diafragmática, e os resultados evidenciaram que os indivíduos com disfunção diafragmática apresentaram uma maior pontuação no índice BODE, visto que esses pacientes também apresentaram pior desempenho no TC6, maior obstrução pulmonar e menor IMC quando comparados aos indivíduos sem tal disfunção. Entre os domínios que compõe o índice BODE, apenas a sensação de dispneia avaliada pela escala MMRC não mostrou diferença significante entre os grupos. Esses dados sugerem que a maior pontuação do índice BODE identificada no grupo de pacientes com disfunção diafragmática pode estar associada a um pior prognóstico. O poder preditivo do índice BODE como um indicador de risco de mortalidade foi confirmado quando foi demonstrada uma maior incidência de mortalidade no grupo de pacientes com disfunção diafragmática, acompanhados prospectivamente por um período de 48 meses.

A sensibilidade da mobilidade do diafragma para a identificação de mortalidade foi semelhante à do índice BODE (100%). Isso indica que o reconhecimento de indivíduos com disfunção diafragmática ou com pontuação maior do índice BODE foi igualmente capaz de identificar os pacientes que verdadeiramente evoluíram para o óbito ao longo de 48 meses. Entretanto, a especificidade do índice BODE foi maior (71%) do que aquela da classificação da mobilidade do diafragma (58%), mostrando que uma pontuação menor do índice BODE foi mais exata do que a ausência de disfunção diafragmática como um indicador de sobrevida. Tanto a sensibilidade quanto a especificidade da classificação proposta pelo GOLD foram menores quando comparadas às do índice BODE e da mobilidade do diafragma. Esses dados corroboram resultados descritos anteriormente, mostrando que a utilização de um único fator indicador de gravidade pulmonar (VEF1) parece não ser o mais adequado na compreensão das alterações sistêmicas e do prognóstico de pacientes com DPOC.(6,8)

Em alguns estudos prévios, investigou-se a associação isolada de diversos fatores relacionados à mortalidade de pacientes com DPOC, como, por exemplo, a obstrução das vias aéreas,(6) a capacidade de exercício,(24) o grau de dispneia,(25) a qualidade de vida(26) e sintomas de ansiedade e depressão.(27) Embora esses estudos tenham demonstrado a relação desses fatores com a mortalidade desses pacientes, nenhum estudo analisou essa relação utilizando uma variável que quantificasse a disfunção dos músculos respiratórios. No presente estudo, utilizamos a avaliação da mobilidade do diafragma como parâmetro de caracterização da disfunção diafragmática e constatamos que a presença de disfunção diafragmática também esteve associada com maiores valores do índice BODE e maior incidência de mortalidade. Os resultados do presente estudo fortalecem a utilização de ambas as medidas como indicadores de mortalidade, muito embora o índice BODE seja mais viável na prática clínica, por conter parâmetros facilmente obtidos no dia-a-dia.

Nas últimas décadas, a quantificação dos fatores relacionados à qualidade de vida passou a ser um foco de interesse dos pesquisadores na investigação do impacto da DPOC na vida diária desses indivíduos. Alguns estudos têm demonstrado que ocorre uma piora gradual e progressiva da qualidade de vida em pacientes com DPOC à medida que a gravidade da doença pulmonar aumenta.(28,29) Um estudo recente evidenciou uma associação entre a qualidade de vida e o índice BODE em indivíduos com DPOC grave, mostrando que esse índice pode ser um bom preditor de qualidade de vida.(9) Porém, nossos resultados demonstraram que a classificação da disfunção diafragmática, apesar de ter discriminado os pacientes em relação ao índice BODE, não foi capaz de diferenciá-los quanto aos fatores relacionados à qualidade de vida e, portanto, a presença de disfunção diafragmática parece não estar associada com a deterioração da qualidade de vida desses pacientes.
O treinamento físico de pacientes portadores de DPOC tem demonstrado resultados benéficos em alguns componentes do índice BODE, como a melhora da sensação de dispneia e da capacidade de exercício.(30)

Nesse sentido, foi demonstrado recentemente que os pacientes participantes de um programa de exercícios físicos apresentaram melhoras no resultado do índice BODE e menor mortalidade quando comparados aos indivíduos não-participantes do programa.(7) Os autores discutem que a modificação dos valores do índice BODE, constatada no grupo submetido à intervenção, fornece dados importantes de prognóstico, refletindo uma maior sobrevida desses pacientes. Considerando que a redução da mobilidade diafragmática também está associada a um maior risco de mortalidade, é possível que as modalidades específicas de treinamento que visam aumentar a mobilidade do diafragma e da caixa torácica possam ter um impacto também sobre o índice BODE e, consequentemente, na sobrevida desses pacientes. Para tanto, essa especulação merece ser investigada em futuros estudos.

Uma limitação do presente estudo foi o número reduzido de pacientes envolvidos, dificultando a realização das análises nos subgrupos de pacientes alocados de acordo com o índice BODE e GOLD. Como a proporção de indivíduos alocados nos diferentes quartis foi relativamente baixa, fez-se necessário utilizar um critério mais simples de divisão, considerando-se apenas dois grupos, ou seja, um grupo de menor e um de maior acometimento. Acreditamos que isso não tenha tido grande influência nos resultados, visto que houve, entre os pacientes desses grupos, diferenças significantes dos parâmetros que determinaram a classificação (índice BODE e VEF1), caracterizando os pacientes, de fato, como pertencentes a grupos distintos de gravidade (dados não descritos). Apesar dessas limitações, o presente estudo apresentou uma contribuição inédita ao apresentar a utilização de um parâmetro de avaliação muscular como um índice preditor de mortalidade, sendo esse fator avaliado diretamente através de um acompanhamento clínico prospectivo.

Os resultados do presente estudo sugerem que pacientes portadores de DPOC com disfunção diafragmática, caracterizada por uma baixa mobilidade do diafragma, apresentam maior mortalidade do que os pacientes sem disfunção diafragmática. O comprometimento dos fatores relacionados à qualidade de vida parece não estar associado com o declínio da função diafragmática em pacientes com DPOC.



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Trabalho realizado na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil e na Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis (SC) Brasil.
Endereço para correspondência: Celso Ricardo Fernandes Carvalho. Avenida Dr. Arnaldo, 455, sala 1210, CEP 01246-903, São Paulo, SP, Brasil.
Tel 55 11 3061-7317. Fax 55 11 3091-7462. E-mail: cscarval@usp.br ou wellpsy@yahoo.com.br
Apoio financeiro: Este estudo recebeu apoio financeiro da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq)
Recebido para publicação em 28/3/2009. Aprovado, após revisão, em 4/8/2009.



Sobre os autores


Wellington Pereira dos Santos Yamaguti
Fisioterapeuta Supervisor de Aprimoramento. Hospital Sírio Libanês, São Paulo (SP) Brasil.

Elaine Paulin
Professora Adjunta. Universidade do Estado de Santa Catarina, Florianópolis (SC) Brasil.

João Marcos Salge
Médico Pneumologista. Setor de Função Pulmonar, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - HCFMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Maria Cristina Chammas
Diretora. Setor de Ultrassonografia. Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - HCFMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Alberto Cukier
Médico Pneumologista Assistente. Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - HCFMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Celso Ricardo Fernandes de Carvalho
Professor. Universidade de São Paulo - USP - São Paulo (SP) Brasil.

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