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Relato de Caso

Tuberculose do timo

Tuberculosis of the thymus

Mauro Tadeu Ajaj Saieg, Fabíola del Carlo Bernardi, Roberto Gonçalves, Márcio Botter, Roberto Saad Junior, Geanete Pozzan

ABSTRACT

Tumors of the anterior mediastinum include several entities with different radiological and clinical manifestations, constituting a heterogeneous group of congenital, inflammatory, and neoplastic conditions. Among these lesions, the most common primary tumor of the mediastinum is thymoma, nearly followed by germ cell tumors and lymphomas. Tuberculosis of the thymus, an extremely rare condition, typically involves the mediastinal lymph nodes. We present, in this study, pathological, radiological, and clinical findings of one case of tuberculosis of the thymus in an 18-year-old patient who presented thoracic pain, dyspnea upon minimal effort, and progressive worsening of the symptoms in one week. The chest X-ray showed a large mass in the mediastinum, and computed tomography scans indicated that it was located anteriorly. The patient was submitted to surgery in order to excise the mass. Microscopy revealed a massive inflammatory response and granulomas in the thymic tissue. Ziehl-Neelsen staining for acid-fast bacilli yielded positive results, and a diagnosis of tuberculosis was made. Surgeons and pathologists should remain alert for this condition and should include it in the differential diagnosis of mediastinal masses.

Keywords: Thymus; Tuberculosis; Thoracic surgery; Pathology.

RESUMO

Os tumores do mediastino anterior incluem várias entidades com diferentes manifestações radiológicas e clínicas, consistindo em um grupo heterogêneo de condições congênitas, inflamatórias ou neoplásicas. Entre essas lesões, o tumor primário mais comum do mediastino é o timoma, seguido de perto por tumores de células germinativas e linfomas. A tuberculose do timo é extremamente rara, embora o envolvimento dos linfonodos mediastinais por essa entidade seja comum. Apresentamos aqui achados patológicos, radiológicos e clínicos de um caso de tuberculose tímica em um paciente de 18 anos de idade, que apresentou dor torácica, dispnéia a pequenos esforços e piora contínua dos sintomas em uma semana. A radiografia torácica mostrou uma grande massa no mediastino e a tomografia computadorizada mostrou que a localização era anterior. O paciente foi operado, sendo feita a exérese da massa, com aspecto microscópico de uma reação inflamatória maciça e presença de granulomas no tecido tímico. A pesquisa de bacilos álcool ácido resistentes pelo método de Ziehl-Neelsen foi positiva e o diagnóstico de tuberculose foi fechado. Portanto, o cirurgião e o patologista devem estar alertas quanto à essa entidade, bem como incluí-la na lista de diagnósticos diferenciais de massas mediastinais.

Palavras-chave: Timo; Tuberculose; Cirurgia torácica; Patologia.

Introdução

O mediastino situa-se na porção central do tórax, entre as duas cavidades pleurais, o diafragma e a porção superior do tórax. É dividido em porções anterior, média e posterior, a fim de situar e classificar os tumores e as entidades que acometem essa região.

O mediastino anterior é definido como a região posterior ao esterno e anterior ao coração e os vasos braquiocefálicos. Ele se estende da porção superior do tórax ao diafragma, e contém o timo, gordura e linfonodos.

Os tumores do mediastino anterior incluem várias entidades com manifestações radiológicas e clínicas diferentes, com padrões císticos ou sólidos, sendo um grupo heterogêneo de condições congênitas, inflamatórias ou neoplásicas. Os tumores neurais, timomas e cistos benignos consistem em 60% das lesões tratadas cirurgicamente, e os linfomas, tumores de células germinativas e doenças inflamatórias correspondem a 30%. Os outros 10% incluem lesões vasculares, principalmente aneurismas aórticos.(1)

Entre essas lesões, o tumor primário mais comum do mediastino é o timoma, sendo seguido pelos tumores de células germinativas e linfomas.

A tuberculose (TB) no timo é extremamente rara, embora o envolvimento dos linfonodos mediastinais na TB seja comum.(2) Há somente quatro casos relatados na literatura, sendo dois nos últimos 30 anos,(3,4) mas somente um deles mostrou presença de bacilos.(3) Apresentamos aqui achados patológicos, radiológicos e clínicos de um caso de TB no timo em um paciente de 18 anos de idade.

Relato de caso

Paciente do sexo masculino, 18 anos, apresentou dor no peito, dispnéia a esforços médios e piora contínua em um ano. O paciente foi admitido no hospital com falência respiratória, piora súbita, evoluindo com intubação e apoio ventilatório algumas horas após admissão no pronto socorro. O paciente tinha como antecedente pessoal história de cardiopatia desde a infância. O exame físico do tórax revelou crepitações bilaterais nas bases pulmonares . A radiografia do tórax mostrou um grande tumor no mediastino e a tomografia computadorizada (TC) mostrou que a lesão se localizava no mediastino anterior, bem delimitada, sem invasão de pulmões adjacentes à lesão (Figura 1a).

Devido à grande urgência do estado de saúde do paciente e à necessidade de uma resolução imediata, optou-se pelo tratamento cirúrgico, mesmo sem a solicitação prévia da biópsia.

A incisão cirúrgica foi uma toracotomia póstero-lateral esquerda, conseguindo-se uma abordagem ampla do tumor, com sua completa exérese. O tumor ocupava metade da cavidade torácica esquerda e parte da direita, assim como o mediastino anterior, além de circundar parcialmente o hilo pulmonar esquerdo e as estruturas mediastinais.

Macroscopicamente, era um tumor de 20,0 cm x 11,0 cm x 4,0 cm, com áreas esbranquiçadas e esponjosas na superfície de corte, além de cavidades e focos de necrose. Não foram evidenciadas áreas com aparência macroscópica de timo, porém o formato do tumor lembrava o do órgão (Figura 1b).





Microscopicamente, havia uma reação inflamatória intensa, com acúmulo de granulomas formados por células gigantes ao redor de áreas de necrose caseosa, com um anel de células epitelióides e linfócitos. A coloração de Ziehl-Neelsen (ZN) para Bacilos Álcool Ácido Resistentes (BAAR) foi positiva no tecido examinado e, portanto, foi feito o diagnóstico final de TB (Figura 2a). Não foram realizados testes de reação de polimerase em cadeia na hora da cirurgia. Devido à alta incidência de TB em nosso meio, somente o exame microscópico aliado à coloração de ZN positiva para BAAR é suficiente para o diagnóstico. O fundo do tecido era formado por um tecido linfóide, com áreas que lembravam corpúsculos de Hassal. A reação imunohistoquímica para AE1/AE3 mostrou que essas áreas eram epiteliais, confirmando o diagnóstico de timo (Figura 2b).





A evolução do paciente foi satisfatória, ficando na unidade de terapia intensiva por dois dias após a cirurgia. O paciente teve alta do hospital em dez dias. O tratamento para TB começou no terceiro dia após a cirurgia, estendendo-se por seis meses.

Discussão

O diagnóstico de TB do timo é extremamente raro, mesmo com o fato de a incidência da TB ter aumentado com a síndrome da imunodeficiência adquirida. Este é o quinto caso relatado na literatura, sendo o segundo nesta década. Em nosso caso, demonstramos a presença de BAAR no interior de granulomas pela técnica histoquímica de ZN. Além do processo inflamatório caracterizado pela presença dos granulomas, não havia evidência microscópica de tecido tímico, mas houve evidência dos corpúsculos de Hassal através do exame imunohistoquímico pelo AE1/AE3, um marcador específico para elementos epiteliais. A presença desses componentes, aliada aos granulomas típicos e aos bacilos, levou-nos ao diagnóstico de TB do timo.

Assim como no caso apresentado por alguns autores em 1997,(3) nosso caso mostrou uma imagem radiológica compatível com um tumor sólido que, aliado à falta de achados clínicos ou laboratoriais da TB, sugeriram uma lesão de etiologia neoplásica, possível tumor de células germinativas, linfoma ou timoma, com a cirurgia subseqüente.

A exérese dessas massas no mediastino constitui um dilema para o cirurgião, já que a TC é útil na avaliação da extensão dessas lesões, mas não estabelece diagnóstico diferencial. Nesses casos, a mediastinoscopia ou toracoscopia pode ser de grande valor para estabelecer o diagnóstico desses tumores do mediastino, associada à biópsia da lesão. Em nosso caso, a urgência não permitiu que esses métodos fossem aplicados. No caso de outros autores,(3) o diagnóstico foi realizado com uma aspiração por agulha fina. Contudo, o papel desse método é controverso. Como a conduta dos tumores de mediastino anterior varia de acordo com a sua hipótese diagnóstica, exames intra-operatórios de congelação são importantes para estabelecer o diagnóstico diferencial dessas várias entidades e determinar o tratamento, já que a terapia cirúrgica é a escolha para timoma e tumores benignos de células germinativas, e clínica para linfoma e tumores de células germinativas malignos.(5,6)

Portanto, o cirurgião e o patologista devem estar alertas quanto à TB do timo e devem incluir esse diagnóstico na lista de diagnósticos diferenciais de massas mediastinais.

Referências

1. Strollo DC, Rosado de Christenson ML, Jett JR. Primary Mediastinal Tumors. Part 1: Tumors of the anterior mediastinum. Chest. 1997;112(2):511-22.

2. Duprez A, Cordier R, Schmitz P. Tuberculoma of the thymus. First case of surgical excision. J Urol Nephrol (Paris). 1962; 44:115-20

3. Simmers TA, Jie C and Sie MC. Thymic tuberculosis: a case report. Neth J Med. 1997;51(2):87-90.

4. FitzGerald JM, Mayo JR, Miller RR, Jamieson WR, Baumgartner F. Tuberculosis of the thymus. Chest. 1992; 102(5):1604-5.

5. Ferguson MK, Lee E, Skinner DB, Little AG. Selective operative approach for diagnosis and treatment of anterior mediastinal masses. Ann Thorac Surg. 1987;44(6):583-6.

6. Trastek VF. Management of mediastinal tumors. Ann Thorac Surg 1987;44(3):227-8.
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* Trabalho realizado na Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
1. Doutorando em Patologia. Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.
2. Professora Assistente. Departamento de Patologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - FCMSCSP - São Paulo (SP) Brasil.
3. Pós graduando em Cirurgia. Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - FCMSCSP - São Paulo (SP) Brasil.
4. Médico Assistente. Departamento de Cirurgia da Santa Casa de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
5. Professor Titular. Departamento de Cirurgia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - FCMSCSP - São Paulo (SP) Brasil.
6. Professora Assistente. Departamento de Patologia da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo - FCMSCSP - São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Mauro Tadeu Ajaj Saieg. Av. dos Jamaris, 291, apto. 101, Moema, CEP 04078-000, São Paulo, SP, Brasil.
Tel 55 11 5051-8714. E-mail: maurosaieg@yahoo.com
Recebido para publicação em 4/4/2006. Aprovado, após revisão, em 1/6/2006.

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