Continuous and bimonthly publication
ISSN (on-line): 1806-3756

Licença Creative Commons
8505
Views
Back to summary
Open Access Peer-Reviewed
Artigo Original

Infecção bacteriana crônica e indicadores ecocardiográficos de hipertensão pulmonar em pacientes com fibrose cística

Chronic bacterial infection and echocardiographic parameters indicative of pulmonary hypertension in patients with cystic fibrosis

Paula Maria Eidt Rovedder, Bruna Ziegler, Lilian Rech Pasin, Antônio Fernando Furlan Pinotti, Sérgio Saldanha Menna Barreto, Paulo de Tarso Roth Dalcin

ABSTRACT

Objectives: To examine the relationship between chronic bacterial infection and pulmonary hypertension, using Doppler echocardiography, in patients with cystic fibrosis (CF). Methods: A prospective cross-sectional study involving CF patients (≥ 16 years of age) admitted to a program for adults with the disease. The study included 40 patients with a mean age of 23.7 ± 6.3 years. Patients were submitted to clinical evaluation, Doppler echocardiography, pulmonary function tests, chest X-rays and sputum cultures of Pseudomonas aeruginosa and Burkholderia cepacia. Results: In terms of the following variables, no significant differences were found between P. aeruginosapositive patients and P. aeruginosa-negative patients: clinical score (p = 0.472); forced expiratory volume in one second (FEV1; p = 0.693); radiological score (p = 0.760); tricuspid regurgitant jet velocity (TRV, p = 0.330); diameter of the right ventricle (DRV, p = 0.191); and right ventricular/pulmonary artery (RV/PA) systolic acceleration time (SAT, p = 0.330). B. cepacia-positive patients presented significantly lower FEV1 than did B. cepacia-negative patients (p = 0.011). No significant differences were found between B. cepacia-positive patients and B. cepacia-negative patients regarding the following variables: clinical score (p = 0.080); radiological score (p = 0.760); TRV (p = 0.613); DRV (p = 0.429); and RV/PA SAT (p = 0.149). Conclusions: Chronic infection with P. aeruginosa or B. cepacia presented no association with pulmonary hypertension in adult CF patients. Pulmonary function was worse in B. cepacia-positive patients than in P. aeruginosa-positive patients.

Keywords: Cystic fibrosis; Bacterial infections; Hypertension, pulmonary; Echocardiography, Doppler.

RESUMO

Objetivo: Determinar as relações entre infecção bacteriana crônica e hipertensão pulmonar, avaliada por ecocardiografia Doppler, em pacientes com fibrose cística (FC). Métodos: Estudo transversal e prospectivo em pacientes com FC (idade ≥ 16 anos) atendidos por um programa para adultos com a doença. O estudo incluiu 40 pacientes com média de idade de 23,7 ± 6,3 anos. Os pacientes foram submetidos a avaliação clínica, ecocardiografia Doppler, testes de função pulmonar, exame radiológico do tórax e exames culturais do escarro de Pseudomonas aeruginosa e Burkholderia cepacia. Resultados: Não foram observadas diferenças entre os casos positivos para P. aeruginosa e os negativos para P. aeruginosa quanto às seguintes variáveis: escore clínico (p = 0,472); volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1; p = 0,693); escore radiológico (p = 0,760); velocidade de regurgitação tricúspide (VRT, p = 0,330); diâmetro do ventrículo direito (DVD, p = 0,191); e tempo de aceleração sistólica (TAS) do ventrículo direito/artéria pulmonar (VD/AP, p = 0,330). O VEF1 foi significativamente menor nos casos positivos para B. cepacia do que nos casos negativos para B. cepacia (p = 0,011). Não foram observadas diferenças entre os casos positivos para B. cepacia e os casos negativos para B. cepacia quanto às seguintes variáveis: escore clínico (p = 0,080); escore radiológico (p = 0,760); VRT (p = 0,613); DVD (p = 0,429); e TAS do VD/AP (p = 0,149). Conclusões: Não foi observada relação entre infecção crônica por P. aeruginosa e por B. cepacia com hipertensão pulmonar em pacientes adultos com FC. A função pulmonar foi pior nos pacientes positivos para B. cepacia do que nos pacientes positivos para P. aeruginosa.

Palavras-chave: Fibrose cística; Infecções bacterianas; Hipertensão pulmonar; Ecocardiografia Doppler.

Introdução

A fibrose cística é uma doença progressiva, hereditária, autossômica recessiva e observada mais comumente em indivíduos com etnia caucasiana. O defeito primário compromete a proteína reguladora de condutância transmembrana da fibrose cística, resultando em aumento da viscosidade das secreções glandulares exócrinas. Essas alterações acarretam, no epitélio respiratório, a diminuição do clearance mucociliar, alterações inflamatórias e predisposição à infecção respiratória(1,2)

Dessa forma, a doença está associada a infecções respiratórias recorrentes ou persistentes. O círculo vicioso entre inflamação, infecção e lesão pulmonar resulta no progressivo declínio da função pulmonar e em morte prematura. Inicialmente, os organismos patogênicos mais comumente encontrados na secreção pulmonar são Staphylococcus aureus e Haemophylus influenzae. Com a progressão da doença, Pseudomonas aeruginosa e, em alguns casos, Burkholderia cepacia passam a ter papel patogênico relevante na doença.(3,4)

A aquisição e a persistência de P. aeruginosa no trato respiratório inferior de pacientes com fibrose cística estão associadas com maior morbidade e mortalidade.(5,6) Inicialmente, as cepas isoladas têm a aparência não-mucóide e são multissensíveis aos antibióticos.(7) Essas cepas de infecção recente podem ser erradicadas através de tratamento antibiótico agressivo.(8,9) Entretanto, com o tempo, desenvolvem-se cepas de P. aeruginosa com fenótipo mucóide que se associam com um declínio mais acelerado na função pulmonar e maior risco de morte.(10-12)

Assim, frente à identificação inicial da P. aeruginosa, o tratamento precoce e agressivo para tentar a erradicação e prevenir a infecção crônica tem sido recomendado.(13,14)
A progressiva lesão do parênquima pulmonar leva à destruição da vasculatura pulmonar, hipoxemia e vasoconstrição pulmonar reflexa. Esse processo desencadeia aumento da resistência vascular pulmonar e conseqüente surgimento de hipertensão pulmonar.(15,16) A evidência de hipertensão pulmonar em pacientes com fibrose cística é indicador de pior prognóstico.(17,18)

A avaliação da função cardíaca direita é um processo relativamente simples e pode ser mensurada através da velocidade de regurgitação tricúspide, usando a ecocardiografia Doppler. Essa técnica não-invasiva tem sido utilizada na avaliação prognóstica dos pacientes com fibrose cística que apresentam doença pulmonar avançada.(17,19,20)

Um estudo prévio mostrou que a infecção por B. cepacia na fibrose cística se associou de forma significativamente mais freqüente com hipertensão pulmonar, contribuindo para a maior mortalidade nesse grupo de pacientes.(19)

O objetivo deste estudo foi estudar as associações da infecção crônica por P. aeruginosa e por B. cepacia com parâmetros ecocardiográficos de hipertensão pulmonar, em pacientes acompanhados por um programa de adultos com fibrose cística.

Métodos

O presente trabalho constituiu-se em um estudo transversal com pacientes acompanhados pelo programa de adultos com fibrose cística do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA) no período de setembro de 2004 a dezembro de 2005.

O projeto de base foi submetido e aprovado pela Comissão de Ética e Pesquisa do HCPA. Foram obtidos termos de consentimento pós-informação de todos os pacientes com idade igual ou superior a 18 anos ou de seus responsáveis no caso de pacientes com idade menor que 18 anos.

População do estudo

Foram incluídos os pacientes com diagnóstico de fibrose cística estabelecido de acordo com os critérios de consenso e com idade igual ou superior a 16 anos.(4) Os pacientes deveriam estar com estabilidade clínica da doença há pelo menos 30 dias, definida por ausência de achados clínicos de exacerbação, ausência de modificações no esquema terapêutico e ausência de internações no referido período.

Foram considerados como critérios de exclusão do estudo: pacientes que não aceitassem assinar o termo de consentimento pós-informação; pacientes sem um mínimo de três exames bacteriológicos do escarro em meio específico para P. aeruginosa e B. cepacia no ano precedente à inclusão no estudo.

Medidas e instrumentos

Foram utilizados questionários específicos para o registro das variáveis clínicas. O escore de avaliação clínica utilizado foi o de Shwachman-Kulczycki.(21) Em cada caso do estudo, o escore foi pontuado pelo membro mais graduado da equipe.

Os pacientes incluídos realizaram, no último ano, um mínimo de três exames bacteriológicos do escarro em meio específico para P. aeruginosa e para o complexo B. cepacia. Os exames bacteriológicos do escarro foram realizados no Serviço de Microbiologia do HCPA. A rotina de avaliação bacteriológica do escarro envolveu a coleta de uma amostra a cada consulta (em geral, a cada 60 dias) ou em cada internação hospitalar. A realização do exame bacteriológico do escarro seguiu a rotina descrita a seguir. O escarro foi semeado em seis tipos de meios de cultura (agar): brucela, azida sangue, chocolate, MacConkey, seletivo para B. cepacea e seletivo para P. aeruginosa. Após 24 h na estufa, foi feita uma triagem para averiguar se houve crescimento de colônias nos meios. Geralmente, o crescimento ideal das colônias ocorre com a incubação por 48 h para os meios Brucela, azida sangue e chocolate; para os meios MacConkey, seletivo para B. cepacea e seletivo para P. aeruginosa, o período de incubação ideal é de 72 h Para as bactérias gram-negativas, foi feita uma série bioquímica e um antibiograma. Para as bactérias não-fermentadoras, foi realizada uma semi-automação em aparelho específico (sistema Mini-API; bioMérieux, Marcy l'Étoile, França).

O último recurso para descartar B. cepacia e P.  ­aeruginosa foi a reação em cadeia da polimerase, feito no laboratório de biologia molecular.

Foram considerados portadores de B. cepacia ou de P. aeruginosa os pacientes com pelo menos duas amostras de escarro positivas para uma dessas bactérias no último ano de avaliação. Foram considerados não-portadores de B. cepacia ou de P. aeruginosa os pacientes cujos exames bacteriológicos do escarro (no mínimo, três amostras) não identificaram, no último ano, uma das referidas bactérias.

Todos os pacientes foram submetidos a um ecocardiograma transtorácico modo-M, bidimensional, com Doppler (ATL HDI 5000; Philips Medical Systems, Bothell, WA, EUA). O estudo ecocardiográfico foi realizado a partir da padronização das janelas paraesternal, apical e subcostal, com o paciente em repouso na posição semi-supino em decúbito lateral esquerdo, pelo mesmo observador cegado para o estado clínico do paciente. As medidas ecocardiográficas foram executadas de acordo com as recomendações da Sociedade Americana de Cardiologia.(22) A regurgitação de tricúspide foi avaliada pelo refluxo sangüíneo através da válvula tricúspide em cada contração do ventrículo direito, a partir do corte apical paraesternal das quatro câmaras. Um mínimo de cinco complexos seqüenciais foram registrados. O pico de velocidade do jato regurgitante tricúspide foi usado para estimar o gradiente sistólico da pressão com o uso da equação modificada de Bernoulli (Dp = 4v2, na qual Dp é a diferença do pico de pressão entre o ventrículo direito e o átrio direito, e v é a velocidade do pico de fluxo do jato de regurgitação tricúspide). Com a finalidade da análise, hipertensão pulmonar foi definida como uma velocidade do jato de regurgitação tricúspide maior que 3,0 m/s. Aqueles pacientes que não apresentaram nenhum traço de regurgitação tricúspide foram considerados normais. O tempo de aceleração sistólica (TAS) do ventrículo direito-artéria pulmonar (valor normal ≥ 120 m/s) foi calculado, a partir do traçado de fluxo anterógrado pulmonar, como o intervalo entre o início do fluxo na artéria pulmonar e a velocidade do pico de fluxo. A dimensão do ventrículo direito (DVD, valor normal entre 0,8 e 2,6 cm) foi medida no final da diástole a partir dos traços do modo M.

A espirometria foi realizada utilizando um espirômetro computadorizado (Jaeger-v4.31; Jaeger, Würzburg, Alemanha). Foram realizadas três tentativas, sendo a melhor delas registrada. Os parâmetros estudados foram capacidade vital forçada (CVF), volume expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1) e a relação VEF1/CVF. Todos os parâmetros foram expressos em porcentagem do previsto para idade, estatura e gênero.(23) Os fluxos aéreos foram analisados de acordo com os critérios das referidas Diretrizes para Testes de Função Pulmonar.(24)

A avaliação da saturação periférica de oxigênio (SpO2) foi realizada estando o paciente em repouso, através do oxímetro de pulso modelo NPB-40 (Nellcor Puritan Bennett, Pleasanton, CA, EUA).

Todos os pacientes realizaram o estudo ecocardiográfico com Doppler, os testes de função pulmonar e a avaliação da SpO2 dentro de um período máximo de uma semana.

Análise estatística

Os dados foram digitados em base de dados no programa Microsoft® Excel 2000, sendo processados e analisados com auxílio do programa Statistical Package for the Social Sciences, versão 13.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA). Os dados quantitativos foram apresentados como média ± desvio padrão ou como mediana e intervalo interquartílico. Os dados qualitativos foram expressos em número e porcentagem de todos os casos.

A análise dos dados quantitativos com distribuição normal foi realizada pelo teste t para amostras independentes. A análise dos dados contínuos sem distribuição normal foi realizada pelo teste U de Mann-Whitney. Os dados qualitativos foram analisados através do teste do qui-quadrado, utilizando, se necessário, correção de Yates ou teste exato de Fisher.

O nível de significância estatístico utilizado foi p < 0,05 e todos os testes utilizados foram bicaudais.

Resultados

No período de setembro de 2004 a dezembro de 2005, foram incluídos no estudo 40 dos 41 pacientes acompanhados pelo programa de adultos para fibrose cística do HCPA. Um paciente recusou-se a participar do estudo. Foram estudados 22 mulheres e 18 homens, sendo a média de idade de 23,7 ± 6,3 anos (16 a 47 anos).

A Tabela 1 sumariza as características clínicas, funcionais pulmonares, radiológicas e ecocardiográficas dos pacientes infectados por P. aeruginosa e dos não infectados por esta bactéria. Do total, 23 pacientes eram infectados por P. aeruginosa. Entre o grupo de pacientes infectados por P. ­aeruginosa e o grupo não-infectado, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas nas variáveis clínicas, espirométricas, radiológicas e ecocardiográficas (p > 0,05).




A Tabela 2 sumariza as características clínicas, funcionais pulmonares, radiológicas e ecocardiográficas dos pacientes infectados por B. cepacia e dos não infectados por esta bactéria. Do total, 10 pacientes eram infectados por B. cepacia. Os valores de VEF1 e CVF foram significativamente menores no grupo infectado por B. cepacia comparados com o grupo não infectado por esta bactéria (p = 0,011 e p = 0,008, respectivamente). As demais variáveis não apresentaram diferenças significativas entre os dois grupos (p > 0,05).



Discussão

Este estudo mostrou que, em pacientes atendidos por um programa de adultos com fibrose cística, a infecção crônica por P. aeruginosa e pelo complexo B. cepacia não se associaram aos indicadores de hipertensão pulmonar avaliados pela ecocardiografia Doppler.

P. aeruginosa é um dos agentes mais importantes na infecção crônica em pacientes adultos com fibrose cística. Sua ocorrência pode se dar muito precocemente na vida do paciente com fibrose cística e está associada com um declínio mais rápido na função pulmonar do que nos pacientes não infectados. Em séries norte-americanas, até 80% dos pacientes adultos são infectados cronicamente por esta bactéria.(25)

A infecção por B. cepacia tem grande impacto sobre a evolução da doença. Estudos recentes demonstraram que B. cepacia não é uma espécie única, mas sim um grupo de espécies relacionadas denominadas "genomovars". Assim, esse organismo deve ser chamado complexo B. cepacia. Pelo menos nove genomovars de B. cepacia foram identificados. Os pacientes infectados por esse complexo podem seguir três diferentes cursos clínicos: um primeiro grupo (aproximadamente 20% dos casos) desenvolve a denominada síndrome de B. cepacia, que se caracteriza por febre, bacteremia, progressão rápida da doença pulmonar, pneumonia necrosante e morte; um segundo grupo apresenta um declínio mais rápido do quadro pulmonar, porém sem aquela evolução dramática da síndrome de B. cepacia; e um terceiro grupo não sofre prejuízo na evolução de sua doença.(25,26)

Em nosso estudo, 23 pacientes (57,5%) eram infectados por P. aeruginosa e 10 pacientes (25%) eram infectados por B. cepacia. Em um estudo com 104 pacientes com fibrose cística acompanhados na Universidade de Campinas,(27) os autores encontraram uma prevalência de pacientes infectados por P. aeruginosa similar àquela encontrada em nosso estudo (51%). No entanto, a prevalência de pacientes infectados por B. cepacia foi menor do que em nosso estudo (5,2%). Em outro estudo realizado na cidade de Recife,(28) foram avaliados 36 pacientes com fibrose cística e a prevalência de infecção por B. cepacia foi de 29,2%, semelhante à encontrada em nosso estudo.

Apesar do amplo conhecimento sobre o papel fisiopatológico da infecção bacteriana crônica sobre a evolução da doença pulmonar na fibrose cística, poucos estudos têm investigado a relação entre infecção bacteriana crônica e hipertensão pulmonar. Foi realizado um estudo caso-controle, comparando as medidas ecocardiográficas de pacientes com fibrose cística infectados por B. cepacia com pacientes não-infectados.(19) Foram estudados 38 pacientes, com idade média de 14,6 anos, sendo identificados 7 pacientes com infecção crônica por B. cepacia. Os pacientes com B. cepacia foram comparados com os pacientes não infectados e apresentaram valores de pressão sistólica da artéria pulmonar (61,6 ± 17,2 vs. 37,3 ± 13,9 mmHg, respectivamente) e TAS do ventrículo direito-artéria pulmonar (77 ± 33 vs. 108 ± 25 ms, respectivamente,) mais elevados. Em contraste, nosso trabalho avaliou transversalmente 40 dos 41 pacientes atendidos em um programa de adultos, tendo como idade média 23 anos. Não foram evidenciadas associações significativas entre as medidas ecocardiográficas e a infecção bacteriana crônica por B. cepacia.

Em nosso trabalho, os pacientes infectados por B. cepacia apresentaram significativamente maior gravidade da doença pulmonar que os não infectados por essa bactéria. Ainda assim, os parâmetros de hipertensão pulmonar não diferiram entre os dois grupos.

Devem-se ressaltar dois fatores que podem interferir nas características clínicas dos pacientes acompanhados por um programa de adultos, diferenciando-os dos pacientes acompanhados pelas equipes pediátricas. O primeiro deles é o viés da sobrevivência. Os pacientes mais graves, inclusive muitos com infecção crônica por P. aeruginosa e B. cepacia, morreram na infância ou na adolescência, sendo que os sobreviventes na vida adulta têm aspectos de menor gravidade da doença. O segundo fator a ser considerado é a maior proporção de casos atípicos, com diagnóstico tardio e doença pulmonar menos grave.(29)

Esses fatores poderiam ter contribuído na diferença de achados entre o nosso trabalho e o de Faroux et al.(19)

O principal fator limitante em nosso estudo foi o pequeno tamanho amostral e a possibilidade de erro do tipo II. Entretanto, a nossa amostra era limitada em 41 pacientes, dos quais 40 foram estudados. Um outro possível fator limitante foi, nos pacientes com identificação de complexo B. cepacia, a não identificação do genomovars. Como alguns dos genomovars estão associados com pior evolução clínica, essa identificação teria sido relevante.

Como conclusão, em pacientes atendidos por um programa para adultos com fibrose cística, a infecção bacteriana crônica por P. aeruginosa e por B. cepacia não se associou com hipertensão pulmonar avaliada pela ecocardiografia Doppler. Os pacientes com B. cepacia apresentaram doença pulmonar mais grave que os não infectados por essa bactéria.

Existe a necessidade de estudos com maior tamanho amostral que avaliem, em pacientes com fibrose cística, o papel da infecção bacteriana crônica sobre o desenvolvimento de hipertensão pulmonar.

Agradecimentos

Agradecemos à Vânia Naomi Hirakata e à Daniela Benzano a análise estatística, assim como a todos os membros da Equipe de Adolescentes e Adultos com fibrose cística do HCPA a sua colaboração.

Referências

1. McKone EF, Emerson SS, Edwards KL, Aitken ML. Effect of genotype on phenotype and mortality in cystic fibrosis: a retrospective cohort study. Lancet. 2003;361(9370):1671-6.

2. Santos CI, Ribeiro JD, Ribeiro AF, Hessel G. Critical analysis of scoring systems used in the assessment of Cystic Fibrosis severity: State of the art. J Bras Pneumol. 2005;30(3):286-98.

3. Lyczak JB, Cannon CL, Pier GB. Lung infections associated with cystic fibrosis. Clin Microbiol Rev. 2002;15(2):194-222.

4. Yankaskas JR, Marshall BC, Sufian B, Simon RH, Rodman D. Cystic fibrosis adult care: consensus conference report. Chest. 2004;125(1 Suppl):S1-S39.

5. Frederiksen B, Koch C, Høiby N. Changing epidemiology of Pseudomonas aeruginosa infection in Danish cystic fibrosis patients (1974-1995). Pediatr Pulmonol. 1999;28(3):159-66.

6. Emerson J, Rosenfeld M, McNamara S, Ramsey B, Gibson RL. Pseudomonas aeruginosa and other predictors of mortality and morbidity in young children with cystic fibrosis. Pediatr Pulmonol. 2002;34(2):91-100.

7. Burns JL, Gibson RL, McNamara S, Yim D, Emerson J, Rosenfeld M, et al. Longitudinal assessment of Pseudomonas aeruginosa in young children with cystic fibrosis. J Infect Dis. 2001;183(3):444-52.

8. Frederiksen B, Koch C, Høiby N. Antibiotic treatment of initial colonization with Pseudomonas aeruginosa postpones chronic infection and prevents deterioration of pulmonary function in cystic fibrosis. Pediatr Pulmonol. 1997;23(5):330-5.

9. Nixon GM, Armstrong DS, Carzino R, Carlin JB, Olinsky A, Robertson CF, et al. Clinical outcome after early Pseudomonas aeruginosa infection in cystic fibrosis. J Pediatr. 2001;138(5):699-704.

10. Navarro J, Rainisio M, Harms HK, Hodson ME, Koch C, Mastella G, et al. Factors associated with poor pulmonary function: cross-sectional analysis of data from the ERCF. European Epidemiologic Registry of Cystic Fibrosis. Eur Respir J. 2001;18(2):298-305.

11. Pedersen SS, Høiby N, Espersen F, Koch C. Role of alginate in infection with mucoid Pseudomonas aeruginosa in cystic fibrosis. Thorax. 1992;47(1):6-13.

12. Henry RL, Mellis CM, Petrovic L. Mucoid Pseudomonas aeruginosa is a marker of poor survival in cystic fibrosis. Pediatr Pulmonol. 1992;12(3):158-61.

13. Döring G, Conway SP, Heijerman HG, Hodson ME, Høiby N, Smyth A, et al. Antibiotic therapy against Pseudomonas aeruginosa in cystic fibrosis: a European consensus. Eur Respir J. 2000;16(4):749-67.

14. Gibson RL, Burns JL, Ramsey BW. Pathophysiology and management of pulmonary infections in cystic fibrosis. Am J Respir Crit Care Med. 2003;168(8):918-51.

15. MacNee W. Pathophysiology of cor pulmonale in chronic obstructive pulmonary disease. Part two. Am J Respir Crit Care Med. 1994;150(4):1158-68.

16. MacNee W. Pathophysiology of cor pulmonale in chronic obstructive pulmonary disease. Part One. Am J Respir Crit Care Med. 1994;150(3):833-52.

17. Fraser KL, Tullis DE, Sasson Z, Hyland RH, Thornley KS, Hanly PJ. Pulmonary hypertension and cardiac function in adult cystic fibrosis: role of hypoxemia. Chest. 1999;115(5):1321-8.

18. Yankaskas JR, Egan TM, Mauro M. Major complications. In: Yankaskas JR, Knowles MR, editors. Cystic fibrosis in adults. Philadelphia: Lippincott-Raven; 1999. p. 175-94.

19. Fauroux B, Hart N, Belfar S, Boulé M, Tillous-Borde I, Bonnet D, et al. Burkholderia cepacia is associated with pulmonary hypertension and increased mortality among cystic fibrosis patients. J Clin Microbiol. 2004;42(12):5537-41.

20. Ionescu AA, Ionescu AA, Payne N, Obieta-Fresnedo I, Fraser AG, Shale DJ. Subclinical right ventricular dysfunction in cystic fibrosis. A study using tissue Doppler echocardiography. Am J Respir Crit Care Med. 2001;163(5):1212-8.

21. Shwachman H, Kulczycki LL. Long-term study of one hundred five patients with cystic fibrosis; studies made over a five- to fourteen-year period. AMA J Dis Child. 1958;96(1):6-15.

22. Quiñones MA, Otto CM, Stoddard M, Waggoner A, Zoghbi WA; Doppler Quantification Task Force of the Nomenclature and Standards Committee of the American Society of Echocardiography. Recommendations for quantification of Doppler echocardiography: a report from the Doppler Quantification Task Force of the Nomenclature and Standards Committee of the American Society of Echocardiography. J Am Soc Echocardiogr. 2002;15(2):167-84.

23. Miller MR, Hankinson J, Brusasco V, Burgos F, Casaburi R, Coates A, et al. Standardisation of spirometry. Eur Respir J. 2005;26(2):319-38.

24. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. Diretrizes para Testes de Função Pulmonar. J Pneumol. 2002;28(Supl 3):S1-S238.

25. Gilligan PH. Microbiology of Cystic Fibrosis Lung Disease. In: Yankaskas JR, Knowles MR, editors. Cystic fibrosis in adults. Philadelphia: Lippincott-Raven; 1999. p. 93-114.

26. Gibson RL, Burns JL, Ramsey BW. Pathophysiology and management of pulmonary infections in cystic fibrosis. Am J Respir Crit Care Med. 2003;168(8):918-51.

27. Alvarez AE, Ribeiro AF, Hessel G, Bertuzzo CS, Ribeiro JD. Cystic fibrosis at a Brazilian center of excellence: clinical and laboratory characteristics of 104 patients and their association with genotype and disease severity J Pediatr. (Rio J). 2004;80(5):371-379.

28. Magalhães M, Britto MC, Bezerra PG, Veras A. Prevalência de bactérias potencialmente patogênicas em espécimes respiratórios de fibrocísticos do Recife. J Bras Patol Med Lab. 2004;40(4):223-227.

29. Gilljam M, Ellis L, Corey M, Zielenski J, Durie P, Tullis DE. Clinical manifestations of cystic fibrosis among patients with diagnosis in adulthood. Chest. 2004;126(4):1215-24.

____________________________________________________________________________________________________________________
Trabalho realizado no Serviço de Pneumologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Porto Alegre (RS) Brasil.
1. Professora Assistente do Curso de Fisioterapia. Centro Universitário Metodista Instituto Porto Alegre - IPA - Porto Alegre (RS) Brasil.
2. Fisioterapeuta do Programa de Adultos com Fibrose Cística do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Porto Alegre (RS) Brasil.
3. Médica. Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS) Brasil.
4. Cardiologista do Serviço de Cardiologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Porto Alegre (RS) Brasil.
5. Professor Titular. Departamento de Medicina Interna, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS) Brasil.
6. Professor Adjunto. Departamento de Medicina Interna, Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre (RS) Brasil.
Endereço para correspondência: Paula Maria Eidt Rovedder. Rua Domingos Crescêncio, 185/502, Bairro Santana, CEP 90650-090, Porto Alegre, RS, Brasil.
Tel 55 51 3210-8241. E-mail: larove_@hotmail.com
Apoio financeiro: Este trabalho foi financiado pelo Fundo de Incentivo à Pesquisa (FIPE) e pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
Recebido para publicação em 13/4/2007. Aprovado, após revisão, em 21/9/2007.

Indexes

Development by:

© All rights reserved 2024 - Jornal Brasileiro de Pneumologia