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ISSN (on-line): 1806-3756

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Educação Continuada: Fisiologia Respiratória

O papel do laboratório de função pulmonar na investigação da disfunção diafragmática

Role of the pulmonary function laboratory in investigating diaphragm dysfunction

Leticia Zumpano Cardenas1, Pauliane Vieira Santana2,3, André Luís Pereira de Albuquerque3

DOI: https://dx.doi.org/10.36416/1806-3756/e20240015

VISÃO GERAL
 
Uma mulher de 33 anos, previamente saudável, foi submetida a segmentectomia do lobo superior esquerdo para resseção de um tumor mesenquimal mediastinal maligno. A cirurgia foi complicada por uma lesão da artéria subclávia; a hemostasia foi alcançada por meio da abertura do pericárdio. O pós-operatório transcorreu sem intercorrências, e a paciente recebeu alta da UTI. No entanto, ela foi readmitida na UTI no 5º dia do pós-operatório em virtude de insuficiência respiratória, tratada por meio de ventilação não invasiva (VNI) contínua. A avaliação complementar descartou congestão pulmonar, infecção e tromboembolismo. A radiografia de tórax revelou elevação do hemidiafragma esquerdo, o que levantou a suspeita de disfunção diafragmática (DD). Essa suspeita foi corroborada por extensas avaliações complementares,(1,2) que incluíram o seguinte:
 
1.            Os testes de função pulmonar (TFP) revelaram um padrão restritivo (queda considerável da CVF e do VEF1). Infelizmente, os TFP não foram realizados na posição supina.
2.            Redução da força muscular inspiratória em testes volitivos (redução da PImáx e da pressão inspiratória nasal durante a fungada) e não volitivos (redução significativa da pressão transdiafragmática de contração esquer-da, porém apenas ligeira da pressão transdiafragmática de contração direita), além de queda paradoxal da pressão gástrica durante a inspiração.
3.            Aumento do recrutamento de músculos inspiratórios extradiafragmáticos (escaleno e esternocleidomastoideo) na eletromiografia de superfície.
4.            Assincronia toracoabdominal (ângulo de fase de 180° indicando padrão paradoxal) na pletismografia respira-tória por indutância.
 
A ultrassonografia do diafragma (USD) confirmou a suspeita de DD. A USD mostrou redução acentuada da mobilidade do hemidiafragma esquerdo (durante a respiração tranquila e a respiração profunda), além de movimento paradoxal durante a fungada voluntária (sniffing). No entanto, o hemidiafragma esquerdo estava fino (espessura reduzida), com espessamento inspiratório reduzido. O hemidiafragma direito apresentava movimentos respiratórios profundos levemente reduzidos, embora sua espessura e espessamento permanecessem inalterados.(3)
 
RESUMO DO CASO
 
Nossa paciente apresentou DD causada por lesão traumática bilateral do nervo frênico durante a cirurgia cardíaca aberta, com DD mais grave no lado esquerdo. A dispneia foi aliviada pela VNI e pode ser explicada pela DD bilateral, uma vez que a DD unilateral pode ser assintomática. O fato de a paciente ter sido progressivamente desmamada da VNI sugere que houve recuperação da função do diafragma.
 
Há relatos de disfunção do nervo frênico na cirurgia cardíaca aberta, por hipotermia (resfriamento cardíaco tópico), estiramento mecânico do nervo frênico pelo afastador esternal ou ambos. A paralisia do nervo frênico é uma complicação incomum após a cirurgia cardíaca; ela geralmente afeta apenas o nervo frênico esquerdo e resolve completamente em quase todos os casos.(4)
 
MENSAGENS CLÍNICAS
 
A DD permanece subdiagnosticada em virtude de sua apresentação inespecífica e da dificuldade em diagnosticá-la. Quando houver suspeita de DD, exames complementares podem ser solicitados para confirmar ou descartar o diagnóstico.(2)
 
Dispneia inexplicável (particularmente ortopneia), diafragma elevado em exames de imagem, padrão restritivo em TFP e PImáx reduzida podem levantar a suspeita de DD. Os testes diagnósticos de DD incluem eletromiografia de superfície, pletismografia respiratória por indutância e medição da pressão transdiafragmática durante a estimulação magnética bilateral do nervo frênico (twitch, isto é, contração muscular); entretanto, esses testes raramente estão disponíveis, e a medição da pressão transdiafragmática durante a contração muscular tem a desvantagem adicional de ser um teste invasivo.(2) A USD, por outro lado, tem muitas vantagens, incluindo sua disponibilidade, sua reprodutibilidade e o fato de ser um teste não invasivo.(5)
 
Os seguintes achados da USD podem ajudar a confirmar o diagnóstico de DD, sugerindo a presença de paralisia diafragmática(5):
 
•              mobilidade ausente durante a respiração tranquila e a profunda, além de mobilidade ausente ou movimento paradoxal durante a fungada voluntária
•              espessura reduzida do diafragma (diafragma fino e atrófico), além de ausência de espessamento inspiratório do diafragma
•              A espessura normal do diafragma na presença de espessamento reduzido sugere a presença de paralisia dia-fragmática aguda ou subaguda.
 
Os seguintes achados da USD são diagnósticos de fraqueza do diafragma:
 
•              redução da mobilidade e espessura do diafragma, além de redução do espessamento inspiratório do diafragma (abaixo do limite inferior da normalidade em indivíduos saudáveis, levando-se em conta o sexo e a posição do corpo)


 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
Os autores contribuíram igualmente para este estudo.
 
CONFLITOS DE INTERESSE
 
Nenhum declarado.
 
REFERÊNCIAS
 
1.            Caruso P, Albuquerque AL, Santana PV, Cardenas LZ, Ferreira JG, Prina E, et al. Diagnostic methods to assess inspiratory and expiratory muscle strength. J Bras Pneumol. 2015;41(2):110-123. https://doi.org/10.1590/S1806-37132015000004474
2.            Laveneziana P, Albuquerque A, Aliverti A, Babb T, Barreiro E, Dres M, et al. ERS statement on respiratory muscle testing at rest and during exercise. Eur Resp J. 2019;53(6):1801214. https://doi.org/10.1183/13993003.01214-2018
3.            Caleffi-Pereira M, Pletsch-Assunção R, Cardenas LZ, Santana PV, Ferreira JG, Iamonti VC, et al. Unilateral diaphragm paralysis: a dysfunction restricted not just to one hemidiaphragm. BMC Pulm Med. 2018;18(1):126. https://doi.org/10.1186/s12890-018-0698-1
4.            Aguirre VJ, Sinha P, Zimmet A, Lee GA, Kwa L, Rosenfeldt F. Phrenic nerve injury during cardiac surgery: mechanisms, management and prevention. Heart Lung Circ. 2013;22(11):895-902. https://doi.org/10.1016/j.hlc.2013.06.010
5.            Santana PV, Cardenas LZ, Albuquerque ALP, Carvalho CRR, Caruso P. Diaphragmatic ultra-sound: a review of its methodological aspects and clinical uses. J Bras Pneumol. 2020;46(6):e20200064. https://doi.org/10.36416/1806-3756/e20200064

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