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ISSN (on-line): 1806-3756

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Educação Continuada: Fisiologia Respiratória

Uso do laboratório de função pulmonar para auxiliar no manejo de doenças: DPOC

Using the pulmonary function laboratory to assist in disease management: COPD

José Alberto Neder1, Danilo Cortozi Berton2, Denis E O’Donnell1

DOI: https://dx.doi.org/10.36416/1806-3756/e20230171

 
CONTEXTO
 
Este é o primeiro de uma série de manuscritos concisos voltados para a melhor forma de utilizar o laboratório de função pulmonar para o diagnóstico, avaliação da gravidade de doenças/estimativa de risco e seleção de estratégias de tratamento em doenças respiratórias e não respiratórias prevalentes. Começamos com uma doença pulmonar heterogênea na qual os testes de função pulmonar (TFP) assumem um papel fundamental em cada um desses domínios: a DPOC.(1)
 
VISÃO GERAL
 
Um homem de 61 anos, com histórico de tabagismo de 21 anos-maço, foi encaminhado à Respirologia por apresentar dispneia “desproporcional” (pontuação na escala modificada de dispneia do Medical Research Council [mMRC] = 2-3) em relação a VEF1 e VEF1/CVF preservados e resposta de volume (CVF) ao broncodilatador de curta duração não significativa. Em virtude dos achados não obstrutivos na espirometria e da falta de melhora após o tratamento com dois long-acting muscarinic antagonists (LAMAs, antagonistas muscarínicos de longa duração) diferentes, o médico que fez o encaminhamento não tinha certeza do diagnóstico de DPOC. A repetição dos TFP mostrou baixo FEF25-75%, “concavidade” da curva expiratória de fluxo-volume em baixos volumes pulmonares, baixa capacidade inspiratória (CI), aumento leve mas consistente do volume residual e da capacidade residual funcional (absoluto ou relativo à CPT), elevada resistência específica das vias aéreas, baixa DLco e baixa relação volume alveolar/CPT. O teste de exercício cardiopulmonar mostrou ventilação excessiva e hiperinsuflação dinâmica levando a restrições inspiratórias e dispneia limitante. A DPOC foi confirmada, e o tratamento prescrito foi terapia dupla com long-acting β2 agonist (LABA, β2-agonista de longa duração) e LAMA. A terapia dupla por dois meses resultou em melhora da dispneia (pontuação na mMRC = 1), permitindo que o paciente se inscrevesse em um programa estruturado de exercícios de recondicionamento.
 
Lamentavelmente, o papel dos TFP no manejo da DPOC tem sido progressivamente desvalorizado em diretrizes influentes. O documento da GOLD de 2023, por exemplo, confirma as versões anteriores ao recomendar a espirometria forçada apenas para o diagnóstico.(2) Apesar de sugerir a graduação do comprometimento do VEF1, pouca ênfase é dada ao seu uso (ou ao de qualquer outro marcador funcional) nas escolhas terapêuticas. A mera adesão a um ponto de corte de VEF1/CVF rígido para o diagnóstico pode levar a interpretações errôneas, exigindo individualização cuidadosa.(3) Achados de redução do espaço disponível para expansão do volume corrente (ou seja, baixa CI) e/ou aumento dos volumes pulmonares “estáticos” fornecem percepções únicas sobre a gênese e a gravidade da dispneia causada pela DPOC. Há grande variabilidade nos determinantes-chave da falta de ar em um determinado VEF1: a gravidade do comprometimento da mecânica pulmonar (determinada pela medição dos volumes pulmonares) e da ineficiência das trocas gasosas (avaliada por meio da DLco e do coeficiente de transferência de monóxido de carbono) é muito mais informativa.(4) Como se pode observar no Quadro 1, esse conhecimento pode ter importantes implicações no tratamento farmacológico e não farmacológico. Testes simples de capacidade funcional de exercício, como o teste de caminhada de seis minutos, podem ser úteis na quantificação do comprometimento do paciente, na determinação da potencial necessidade de suplementação de oxigênio durante o esforço e na estimativa prognóstica em índices multiparamétricos. Como aqui mostrado, o teste de exercício cardiopulmonar incremental pode indicar que “os pulmões” de fato contribuem para a dispneia aos esforços, levando, assim, à otimização do tratamento em casos duvidosos.(5)
 



 
MENSAGEM CLÍNICA
 
É provável que o manejo clínico e cirúrgico da DPOC jamais prescinda de dados funcionais. O pneumologista deve combinar as informações fornecidas pelos TFP com dados clínicos (gravidade da dispneia, carga de exacerbação), dados de exame de sangue (contagem de eosinófilos, níveis de IgE e de alfa-1 antitripsina) e achados estruturais (carga e distribuição do enfisema, doença das vias aéreas) para decidir quais as melhores abordagens de tratamento clínico ou cirúrgico (Quadro 1).

 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
Todos os autores contribuíram para a conceituação, redação, revisão e edição.
 
CONFLITOS DE INTERESSE
 
Nenhum declarado.
 
REFERÊNCIAS
 
1.            Neder JA, de-Torres JP, Milne KM, O’Donnell DE. Lung Function Testing in Chronic Obstructive Pulmonary Disease. Clin Chest Med. 2020;41(3):347-366. https://doi.org/10.1016/j.ccm.2020.06.004
2.            Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD). Bethesda: GOLD; c2023 [cited 2023 May 1]. Global strategy for the diagnosis, management and prevention of Chronic Obstructive Pulmonary Disease: 2023 report. Available from: https://goldcopd.org/2023-gold-report-2
3.            Neder JA. Functional respiratory assessment: some key misconceptions and their clinical implications. Thorax. 2021;76(7):644-646. https://doi.org/10.1136/thoraxjnl-2020-215287
4.            Neder JA, Berton DC, O’Donnell DE. The Lung Function Laboratory to Assist Clinical Decision-making in Pulmonology: Evolving Challenges to an Old Issue. Chest. 2020;158(4):1629-1643. https://doi.org/10.1016/j.chest.2020.04.064
5.            O’Donnell DE, Milne KM, Vincent SG, Neder JA. Unraveling the Causes of Unexplai-ned Dyspnea: The Value of Exercise Testing. Clin Chest Med. 2019;40(2):471-499. https://doi.org/10.1016/j.ccm.2019.02.014

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