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ISSN (on-line): 1806-3756

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Cartas ao Editor

Acompanhamento de longa duração e mortalidade de pacientes com doenças da parede torácica

Long-term follow-up and mortality of patients with chest wall diseases on noninvasive ventilation

Joana Almeida Borges1, Cidália Rodrigues1, Fátima Fradinho1

DOI: https://dx.doi.org/10.36416/1806-3756/e20230002

 
AO EDITOR,
 
As doenças da parede torácica (DPT) caracterizam-se por diminuição da complacência da parede torácica e comprometimento da mecânica ventilatória,(1,2) levando à insuficiência respiratória hipercápnica crônica (IRHC). Pacientes com cifoescoliose e sequelas pós-tuberculose (STb) apresentam maior risco de IRHC, dependendo do grau de deformidade e da idade de início.(3) A apresentação clínica das DPT geralmente é inespecífica, com padrão pulmonar restritivo, e os distúrbios respiratórios do sono frequentemente ocorrem com a hipoventilação durante o sono precedendo a insuficiência respiratória diurna.(4)
 
A ventilação não invasiva (VNI) é comumente utilizada para tratar as DPT que resultam em IRHC combinada com sintomas de hipoventilação (fadiga, cefaleia matinal, hipersonolência, cansaço ou dispneia) ou com o desenvolvimento de complicações relacionadas. A VNI melhora os sintomas de hipoventilação, a gasometria arterial e os resultados dos testes de função pulmonar (TFP) e prolonga a sobrevida.(5-8) Dados sobre os benefícios da VNI de curta duração estão disponíveis principalmente em ensaios não controlados ou estudos com amostras maiores e mais consistentes de pacientes com distúrbios neuromusculares. Em uma meta-análise, nenhuma diferença significativa foi encontrada entre VNI ciclada a volume e ciclada a pressão em termos de sobrevida.(2) A oxigenoterapia de longa duração (OLD), isoladamente, se associou à pior sobrevida de pacientes com DPT em comparação com a VNI.(7,8)
 
A sobrevida esperada para pacientes com IRHC por cifoescoliose e STb é de 8 e 3 anos, respectivamente. Fatores como sexo feminino, menor idade, maior IMC, maior PaO2 e menor PaCO2 parecem ser fatores prognósticos favoráveis independentes em pacientes com DPT tratados com VNI ou OLD.(9)
 
O presente estudo teve como objetivo caracterizar e avaliar a sobrevida de pacientes com DPT em acompanhamento, após iniciarem a VNI. O desfecho primário foi o tempo de sobrevida desde o início do tratamento com VNI.
 
Os autores realizaram uma análise descritiva retrospectiva envolvendo pacientes adultos com DPT em VNI domiciliar, acompanhados em um ambulatório de pneumologia entre janeiro de 2010 e janeiro de 2022.
 
Dados clínicos com informações sobre tratamento e mortalidade foram coletados dos prontuários dos pacientes. Resultados de TFP e polissonografia (no momento basal) e de gasometria arterial (no momento basal e durante o tratamento com VNI) também foram obtidos. As comorbidades foram classificadas por meio do Índice de Comorbidade de Charlson (ICC), que prevê mortalidade utilizando um escore que atribui pesos (1, 2, 3 ou 6) a cada condição que o paciente apresenta.(10)
 
A análise estatística foi realizada por meio do programa IBM SPSS Statistics, versão 28 (IBM Corporation, Armonk, NY, EUA). O nível de significância estatística adotado foi de p < 0,05. As variáveis categóricas e quantitativas foram descritas como frequência absoluta e relativa ou como média ± desvio-padrão. As comparações entre sobreviventes e não sobreviventes foram realizadas com testes t para amostras independentes para as variáveis contínuas e com testes do qui-quadrado para as variáveis categóricas. Para analisar a amostra total e comparar os sobreviventes de acordo com o diagnóstico, foram utilizados os testes de Mantel-Cox, Breslow e Tarone-Ware. O modelo de riscos proporcionais de Cox foi empregado para o ajuste das variáveis. A seleção das variáveis independentes para o modelo multivariado de Cox foi baseada na significância estatística e nas curvas que apresentaram riscos proporcionais na análise univariada.
 
Durante os 12 anos do período de estudo, 39 pacientes com DPT em VNI foram acompanhados. A média de idade foi de 60,2 ± 16,4 anos, com predomínio do sexo feminino (51,3%) e de não fumantes (82,1%). Nesta coorte de pacientes com DPT e IRHC, foram diagnosticadas cifoescoliose idiopática (em 66,7%) e anomalias adquiridas da caixa torácica, principalmente STb (em 33,3%). A média do ICC foi de 2,1 ± 1,1, considerando que as DPT são doenças pulmonares crônicas. Estatísticas descritivas resumidas e comparações entre sobreviventes e não sobreviventes são apresentadas na Tabela 1.
 

 
Padrão pulmonar restritivo e diagnóstico simultâneo de apneia obstrutiva do sono foram encontrados em 51,3% e 23,1% da amostra total, respectivamente. No momento basal (antes do tratamento com VNI), a gasometria arterial revelou IRHC (PaO2 = 61,1 ± 9,7 mmHg; e PaCO2 = 59,5 ± 13,0 mmHg). Após o início da VNI, tanto a PaO2 (aumento de 14,8 ± 14,5 mmHg) quanto a PaCO2 (diminuição de 15,1 ± 11,7 mmHg) melhoraram.
 
A VNI foi iniciada na presença de sintomas de hipoventilação mais IRHC e na de insuficiência respiratória hipercápnica aguda em 53,8% e 46,2% da amostra, respectivamente. Pacientes com hipoventilação causada por outras doenças respiratórias foram excluídos do estudo. A maioria dos pacientes foi submetida ao modo de VNI direcionado à pressão (87,2%) e usou máscaras faciais (79,5%). A OLD foi utilizada simultaneamente com a VNI em 66,7% dos pacientes, com fluxo médio de 1,8 ± 0,8 L/min.
 
Em nossa amostra, as taxas de mortalidade em 12 e 5 anos foram de 46% e 15%, respectivamente. As taxas de mortalidade foram maiores nos pacientes com STb do que naqueles com cifoescoliose (54% vs. 42%). A mediana de sobrevida desde o início da VNI foi de 146,0 ± 19,4 meses, não havendo diferenças entre os grupos de diagnóstico.
 
Os não sobreviventes apresentaram mais comorbidades, menor CVF e VEF1 em % dos valores previstos, menor índice de distúrbios respiratórios e maior PaCO2 no momento basal do que os sobreviventes. Pacientes mais velhos e do sexo feminino em uso de OLD apresentaram tendência a maior mortalidade, mas a diferença não foi estatisticamente significativa.
 
A análise univariada de Cox identificou as seguintes variáveis como preditores significativos de mortalidade: ICC (hazard ratio [HR] = 1,70; p = 0,02), PaO2 após o início da VNI (HR = 0,95; p = 0,05) e PaCO2 no momento basal (HR = 1,03; p = 0,01). Não foram encontradas diferenças significativas em relação a variáveis demográficas, diagnóstico, resultados de TFP, resultados de polissonografia, modo de VNI, uso de máscara e uso de OLD. Na análise multivariada de Cox, menor PaO2 após o início da VNI (HR = 0,93; p = 0,01) e maior PaCO2 no momento basal (HR = 1,07; p = 0,01) se associaram à mortalidade.
 
Este estudo retrospectivo ajuda a apoiar os benefícios da VNI de longa duração na morbidade e mortalidade em pacientes com DPT. Este estudo mostrou uma mediana de sobrevida de 12 e 13 anos, respectivamente, para pacientes com cifoescoliose e STb tratados com VNI; portanto, a sobrevida foi estendida em 4 e 10 anos, respectivamente, em comparação com evidências anteriores.(9)
 
Alguns dos potenciais pontos fortes do desenho deste estudo foram a homogeneidade da coorte e o longo período de acompanhamento. Até onde sabemos, esta é a maior coorte de pacientes com DPT em VNI relatada por um centro português. Este estudo apresenta limitações, como o pequeno tamanho da amostra, e os efeitos da VNI na qualidade de vida e na função pulmonar não foram avaliados. Os dados aqui apresentados refletem a experiência clínica de uma única instituição e podem não ser totalmente representativos de instituições de outros locais.
 
Em conclusão, os achados do presente estudo sugerem que pacientes com DPT em VNI podem ter o risco de mortalidade reduzido, o que pode ser previsto com base na PaCO2 no momento do diagnóstico e na PaO2 após o início da VNI.
 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
JAB: concepção e desenho do estudo; coleta de dados; análise estatística; redação e revisão do manuscrito. CR e FF: revisão crítica do manuscrito. Todos os autores aprovaram a versão final do manuscrito.
 
CONFLITOS DE INTERESSE
 
Nenhum declarado.
 
REFERÊNCIAS
 
1.            Duiverman ML, Wijkstra PJ. Chronic NIV in chest wall disorders. In: Simonds AK, editor. ERS Practical Handbook Noninvasive Ventilation. Sheffield, UK: European Respiratory Society; 2015. p.182-189.
2.            Annane D, Orlikowski D, Chevret S. Nocturnal mechanical ventilation for chronic hypoventilation in patients with neuromuscular and chest wall disorders. Cochrane Database Syst Rev. 2014;2014(12):CD001941. https://doi.org/10.1002/14651858.CD001941.pub3
3.            Casas A, Pavía J, Maldonado D. Respiratory muscle disorders in chest wall diseases [Article in Spanish]. Arch Bronconeumol. 2003;39(8):361-366. https://doi.org/10.1016/S0300-2896(03)75404-0
4.            Hilbert J. Sleep-Disordered Breathing in Neuromuscular and Chest Wall Diseases. Clin Chest Med. 2018;39(2):309-324. https://doi.org/10.1016/j.ccm.2018.01.009
5.            Clinical indications for noninvasive positive pressure ventilation in chronic respiratory failure due to restrictive lung disease, COPD, and nocturnal hypoventilation--a consensus conference report. Chest. 1999;116(2):521-534. https://doi.org/10.1378/chest.116.2.521
6.            McKim DA, Road J, Avendano M, Abdool S, Cote F, Duguid N, et al. Home mechanical ventilation: a Canadian Thoracic Society clinical practice guideline. Can Respir J. 2011;18(4):197-215. https://doi.org/10.1155/2011/139769
7.            Gustafson T, Franklin KA, Midgren B, Pehrsson K, Ranstam J, Ström K. Survival of patients with kyphoscoliosis receiving mechanical ventilation or oxygen at home. Chest. 2006;130(6):1828-1833. https://doi.org/10.1378/chest.130.6.1828
8.            Buyse B, Meersseman W, Demedts M. Treatment of chronic respiratory failure in kyphoscoliosis: oxygen or ventilation?. Eur Respir J. 2003;22(3):525-528. https://doi.org/10.1183/09031936.03.00076103
9.            Chailleux E, Fauroux B, Binet F, Dautzenberg B, Polu JM. Predictors of survival in patients receiving domiciliary oxygen therapy or mechanical ventilation. A 10-year analysis of ANTADIR Observatory. Chest. 1996;109(3):741-749. https://doi.org/10.1378/chest.109.3.741
10.          Charlson ME, Pompei P, Ales KL, MacKenzie CR. A new method of classifying prog-nostic comorbidity in longitudinal studies: development and validation. J Chronic Dis. 1987;40(5):373-383. https://doi.org/10.1016/0021-9681(87)90171-8

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