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ISSN (on-line): 1806-3756

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Cartas ao Editor

A importância de fazer a pergunta correta

The importance of asking the right question

Eduarda Seixas1, Sónia Guerra2, Marta Pinto3,4, Raquel Duarte3,5,6,7

DOI: 10.36416/1806-3756/e20220063

AO EDITOR,
 
Em 2014, a Organização Mundial da Saúde adotou a estratégia Fim da TB (tuberculose), que “visa a prevenção, cuidados e controle da tuberculose após 2015”. As principais metas eram reduzir as mortes por tuberculose em 95%, reduzir os novos casos de tuberculose em 90% entre 2015 e 2035 e garantir que nenhuma família enfrente custos catastróficos devido à tuberculose até 2035.(1)
 
A investigação de contatos é uma ferramenta essencial para encontrar casos adicionais de tuberculose na comunidade, prevenindo a progressão para doença ativa e auxiliando no início da quimioprofilaxia em crianças e pacientes imunossuprimidos. A busca ativa de casos tem melhor rendimento na detecção de casos de tuberculose do que a detecção passiva.(2-4)
 
Apesar de Portugal ter apresentado uma redução da taxa de notificação e incidência da tuberculose nos últimos 10 anos e alcançado, em 2015, a meta de diminuir a incidência da doença (20 casos por 100.000 habitantes por ano), continua a ser um dos países da UE com as maiores taxas de incidência de tuberculose (16,5 casos/100.000 habitantes).(5)
 
Os Centros de Diagnóstico Pneumológico são unidades de saúde de ambulatório diferenciadas e especializadas na abordagem da TB. Essas unidades são responsáveis por diagnosticar, tratar e rastrear populações de alto risco para a doença.
 
Normalmente, o rastreamento de contatos é fundamentado no rastreio direto, que se baseia na localização de contatos após a infecção que o caso índice pode ter infectado. Por outro lado, o rastreamento de contatos inverso identifica como o caso índice foi infectado. Essa estratégia retrocede no tempo e lembra onde e quando a exposição ao organismo infeccioso ocorreu. Tal abordagem amplia o número de indivíduos rastreáveis e promove o entendimento epidemiológico de ambientes de alto risco, uma vez que locais de transmissão com origem comum são mais propensos a serem identificados.(6)
 
No presente estudo, utilizamos ambas as estratégias de rastreamento de contatos para investigar e compreender as diferenças entre o número de contatos de risco identificados pelos pacientes.
 
Foram analisados todos os pacientes com tuberculose pulmonar atendidos no Centro de Diagnóstico Pneumológico de Gaia, Portugal, entre março de 2019 e março de 2021. Somente aqueles com tuberculose infecciosa  (comprometimento pulmonar) foram incluídos. Considerou-se como o período contagioso os 3 meses anteriores à apresentação sintomática, baciloscopia positiva ou radiografia com cavitação pulmonar. Em casos onde o diagnóstico foi estabelecido por cultura positiva, o tempo infeccioso foi considerado as 4 semanas anteriores à coleta da amostra.(7)
 
A coleta de dados foi realizada por meio de consulta telefônica, e todos os pacientes consentiram remotamente em participar do estudo. A análise dos dados foi realizada por meio do software IBM SPSS Statistics 25.0. As variáveis categóricas foram apresentadas como frequências e porcentagens e as variáveis contínuas como médias e desvios-padrão. A diferença entre as duas questões quanto ao número de contatos e aos locais públicos visitados foi avaliada por meio do teste T, com um valor-p de 0,05 indicando significância estatística.
 
Um total de 76 pacientes foram elegíveis para o estudo; no entanto, dezenove foram excluídos (6 morreram, 12 estavam não contatáveis e um era menor de idade). Esse subgrupo apresentou características semelhantes aos pacientes incluídos: idade média de 50,9 anos (DP ± 26,7 anos), a maioria era do sexo masculino (73,7%) e a maioria tinha tuberculose pulmonar isolada (78,9%), seguida de tuberculose disseminada (21,1%). Dois pacientes eram HIV positivos (10,5%).
 
A amostra final incluiu 57 pacientes, com média de idade de 45,1 anos (DP ± 16,4 anos), sendo a maioria do sexo masculino (68,4% versus 31,6% do sexo feminino). Quanto à infecção por HIV, cinco foram positivos (8,8%). A maioria dos pacientes apresentava tuberculose pulmonar (n = 47, 82,5%), seguida da forma disseminada da doença (n = 6, 10,5%). Dois pacientes apresentavam tuberculose pleuropulmonar e dois tuberculose pulmonar, com disseminação linfática local. A maioria dos pacientes tinha tuberculose sensível a medicamentos (96,5%).
 
Ao utilizar o rastreamento de contatos direto, o número médio de contatos identificados por paciente foi de 5,4 (DP ± 6,7), com mínimo de 0 contatos e máximo de 40. Portanto, a maioria dos pacientes teve contato com 2 (n = 10) ou 4 (n = 10) indivíduos. A maioria (78,9%) não referiu ter estado em áreas públicas durante o período infeccioso; o número médio de locais públicos visitados pelos pacientes durante a fase contagiosa foi de 0,3 (DP ± 0,7).
 
Em contrapartida, ao utilizar o rastreamento de contatos inverso, os pacientes identificaram um risco médio de contato com 11 pessoas (DP ± 9,3) e 1,5 espaços públicos (DP ± 1,0), referente à presença deles em áreas públicas onde outras pessoas tinham risco de exposição.
 
Houve uma diferença estatística significante (valor - p < 0,001) entre o número de pessoas contatadas e os locais públicos visitados, obtido através das duas perguntas distintas feitas na consulta telefônica.
 
Neste estudo, os pacientes identificaram mais contatos de risco quando a estratégia de rastreamento de contatos inverso foi usada. Esse tipo de investigação de contatos pode ser aplicado rotineiramente, possibilitando uma maior e mais rápida identificação de casos, evitando assim o surgimento de novos casos na comunidade.
 
Fazer as perguntas certas pode fazer a diferença para alcançar os objetivos da estratégia Fim da TB e, eventualmente, acabar com a epidemia global de tuberculose.
 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
ES esteve envolvida em todos os aspectos do estudo e contribuiu na sua concepção, na coleta e análise dos dados e na interpretação dos resultados, além da redação do manuscrito. SG contribuiu na coleta de dados, no desenho do estudo e na redação do manuscrito. MP contribuiu na interpretação dos resultados e supervisionou a redação do manuscrito. RD foi a pesquisadora sênior do estudo e esteve envolvida em todos os seus aspectos: concepção, análise, interpretação dos resultados e supervisão da redação do manuscrito. Todos os autores leram e aprovaram a versão final do manuscrito.
 
REFERÊNCIAS
 
1.            World Health Organization. WHO/HTM/TB/2015.19. The End TB Strategy.
2.            Borgen K, Koster B, Meijer H Kuyvenhoven V, van der Sande M, Cobelens F. Evaluation of a large-scale tuberculosis contact investigation in the Netherlands. Eur Respir J. 2008; 32(2):419-425. https://doi.org/10.1183/09031936.00136607.
3.            Cavany SM, Sumner T, Vynnycky E, Flach C, White RG, Thomas HL et al. An evaluation of tuberculosis contact investigations against national standards. Thorax. 2017 Aug;72(8):736-745. https://doi.org/10.1136/thoraxjnl-2016-209677.
4.            Khaparde K, Jethani P, Dewan PK, Nair SA, Deshpande MR, Satyanarayana S et al. Evaluation of TB Case Finding through Systematic Contact Investigation, Chhattisgarh, India. Tuberc Res Treat. 2015;2015:670167. https://doi.org/10.1155/2015/670167.
5.            DGS. Programa Nacional para a infeção VIH, SIDA e Tuberculose – 2017. Direção-Geral da Saúde (2017). Available from: www.dgs.pt.
6.            Endo A, Leclerc QJ, Knight GM, Medley GF, Atkins KE, Funk S et al. Implication of backward contact tracing in the presence of overdispersed transmission in COVID-19 outbreaks. Wellcome Open Res. 2021;5:239. https://doi.org/10.12688/wellcomeopenres.16344.3.
7.            Erkens CG, Kamphorst M, Abubakar I, Bothamley GH, Chemtob D, Haas W et al. Tu-berculosis contact investigation in low prevalence countries: a European consensus. Eur Respir J. 2010;36(4):925–949. https://doi.org/10.1183/09031936.00201609.

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