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ISSN (on-line): 1806-3756

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Artigo Original

PET/TC e mediadores inflamatórios na doença pulmonar intersticial associada à esclerose sistêmica

PET/CT and inflammatory mediators in systemic sclerosis-associated interstitial lung disease

Andréa L Bastos1, Gilda A Ferreira2, Marcelo Mamede1, Eliane V Mancuzo3, Mauro M Teixeira4, Flávia P S T Santos5, Cid S Ferreira6, Ricardo A Correa3

DOI: 10.36416/1806-3756/e20210329

ABSTRACT

Objective: To investigate the correlation of HRCT findings with pulmonary metabolic activity in the corresponding regions using 18F-FDG PET/CT and inflammatory markers in patients with systemic sclerosis (SSc)-associated interstitial lung disease (ILD). Methods: This was a cross-sectional study involving 23 adult patients with SSc-associated ILD without other connective tissue diseases. The study also involved 18F-FDG PET/CT, HRCT, determination of serum chemokine levels, clinical data, and pulmonary function testing. Results: In this cohort of patients with long-term disease (disease duration, 11.8 ± 8.7 years), a nonspecific interstitial pneumonia pattern was found in 19 (82.6%). Honeycombing areas had higher median standardized uptake values (1.95; p = 0.85). Serum levels of soluble tumor necrosis factor receptor 1, soluble tumor necrosis factor receptor 2, C-C motif chemokine ligand 2 (CCL2), and C-X-C motif chemokine ligand 10 were higher in SSc patients than in controls. Serum levels of CCL2-a marker of fibroblast activity-were correlated with pure ground-glass opacity (GGO) areas on HRCT scans (p = 0.007). 18F-FDG PET/CT showed significant metabolic activity for all HRCT patterns. The correlation between serum CCL2 levels and GGO on HRCT scans suggests a central role of fibroblasts in these areas, adding new information towards the understanding of the mechanisms surrounding cellular and molecular elements and their expression on HRCT scans in patients with SSc-associated ILD. Conclusions: 18F-FDG PET/CT appears to be unable to differentiate the intensity of metabolic activity across HRCT patterns in chronic SSc patients. The association between CCL2 and GGO might be related to fibroblast activity in these areas; however, upregulated CCL2 expression in the lung tissue of SSc patients should be investigated in order to gain a better understanding of this association.

Keywords: Tomography; Lung diseases, interstitial; Scleroderma, systemic; Cytokines.

RESUMO

Objetivo: Investigar a correlação entre achados de TCAR e a atividade metabólica pulmonar nas regiões correspondentes por meio de PET/TC com 18F-FDG e marcadores inflamatórios em pacientes com doença pulmonar intersticial (DPI) associada à esclerose sistêmica (ES). Métodos: Estudo transversal envolvendo 23 pacientes adultos com DPI associada à ES sem outras doenças do tecido conjuntivo. O estudo também envolveu PET/TC com 18F-FDG, TCAR, dosagem sérica de quimiocinas, dados clínicos e testes de função pulmonar. Resultados: Nessa coorte de pacientes com doença de longa duração (11,8 ± 8,7 anos), 19 (82,6%) apresentaram o padrão de pneumonia intersticial não específica. A mediana dos valores padronizados de captação foi maior nas áreas de faveolamento (1,95; p = 0,85). Os níveis séricos de soluble tumor necrosis factor receptor 1, soluble tumor necrosis factor receptor 2, C-C motif chemokine ligand 2 (CCL2) e C-X-C motif chemokine ligand 10 foram maiores nos pacientes com ES que nos controles. Os níveis séricos de CCL2 — um marcador de atividade fibroblástica — correlacionaram-se com áreas de opacidade em vidro fosco (OVF) pura na TCAR (p = 0,007). A PET/TC com 18F-FDG mostrou atividade metabólica significativa para todos os padrões de TCAR. A correlação entre níveis séricos de CCL2 e OVF na TCAR sugere que os fibroblastos desempenham um papel fundamental nessas áreas, acrescentando novas informações para a compreensão dos mecanismos que envolvem elementos celulares e moleculares e sua expressão na TCAR em pacientes com DPI associada à ES. Conclusões: A PET/TC com 18F-FDG aparentemente não consegue diferenciar a intensidade da atividade metabólica nos diferentes padrões de TCAR em pacientes com ES crônica. A associação entre CCL2 e OVF pode estar relacionada à atividade fibroblástica nessas áreas; entretanto, a expressão suprarregulada de CCL2 no tecido pulmonar de pacientes com ES deve ser investigada para que se compreenda melhor essa associação.

Palavras-chave: Tomografia; Doenças pulmonares intersticiais; Escleroderma sistêmico; Citocinas.

INTRODUÇÃO
 
Em pacientes com esclerose sistêmica (ES), a doença pulmonar intersticial (DPI) e a hipertensão pulmonar são as principais causas de comprometimento da qualidade de vida e mortalidade. A DPI associada à ES envolve atividade de autoanticorpos, inflamação, obstrução de pequenos vasos e deposição tecidual de colágeno que evolui para fibrose.(1) Frequentemente ocorre na forma cutânea difusa e pode assumir expressões variadas ao longo de sua evolução.(2) Predomina o padrão histológico de pneumonia intersticial não específica (PINE); pneumonia intersticial usual (PIU) e pneumonia em organização (PO) são raramente observadas.(1,3) Um padrão recentemente descrito de acometimento pulmonar intersticial é a fibrose centrolobular, que tem sido associada à aspiração pulmonar crônica por refluxo gastroesofágico.(4) O exame anatomopatológico pulmonar é o método padrão ouro para uma classificação precisa da DPI. A biópsia pulmonar a céu aberto é um procedimento invasivo indicado em apenas alguns casos, em virtude dos riscos potenciais. Em virtude da forte correlação entre padrão reticular e fibrose, a TCAR assumiu um papel fundamental na determinação da natureza do acometimento pulmonar intersticial e no estabelecimento de critérios de encaminhamento para biópsias e outros procedimentos em casos selecionados.(5) No entanto, a TCAR é menos precisa em casos de opacidade em vidro fosco (OVF) porque esse padrão pode estar relacionado tanto a inflamação como a fibrose intersticial.(6,7)
 
A literatura relata a utilidade da PET/TC com 18F-FDG na avaliação de doenças não neoplásicas e do tecido conjuntivo,(8) bem como de doenças pulmonares inflamatórias(9,10) e fibróticas.(11-13) Para a avaliação do metabolismo pulmonar, a PET/TC com 18F-FDG tem a vantagem de ser uma técnica não invasiva e permitir a avaliação quantitativa de todo o pulmão durante a aquisição das imagens. No entanto, a exposição à radiação deve ser levada em consideração. Embora a exposição à radiação na PET ocorra principalmente em virtude da incorporação de radiofármacos, o uso de PET e TCAR em conjunto pode aumentar essa exposição. No entanto, na maioria dos casos, os benefícios (isto é, as informações obtidas) superam os riscos e justificam o uso do método tanto na prática clínica como na pesquisa. Além disso, a exposição à radiação deve ser otimizada de modo que se use a menor dose possível de radiação.
 
Na ES, a ativação de macrófagos e células T na corrente sanguínea e nos tecidos é responsável pelo dano característico que ocorre à custa da produção de mediadores que regulam a inflamação e a fibrose. Esses mediadores têm sido investigados como possíveis substitutos da atividade inflamatória e fibrótica.(14) Mediadores inflamatórios provenientes de diversas fontes, tais como o epitélio alveolar, macrófagos, linfócitos T ativados e o endotélio, estão relacionados ao dano intersticial.(14,15) Já foram investigados os seguintes mediadores: soluble tumor necrosis factor receptor 1 (sTNFR1), soluble tumor necrosis factor receptor 2 (sTNFR2), C-X-C motif chemokine ligand 8 (CXCL8), macrophage migration inhibitory factor (MIF), C-C motif chemokine ligand 2 (CCL2), C-X-C motif chemokine ligand 9 (CXCL9) e C-X-C motif chemokine ligand 10 (CXCL10).(15)
 
O objetivo deste estudo foi investigar a correlação entre achados de TCAR e a atividade metabólica pulmonar nas regiões correspondentes por meio de PET/TC com 18F-FDG e marcadores inflamatórios em pacientes com DPI associada à ES.
 
MÉTODOS
 
Trata-se de um estudo transversal realizado nos Departamentos de Pneumologia e Reumatologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo Horizonte (MG). Foram recrutados pacientes adultos (com idade > 18 anos) com ES e acometimento pulmonar intersticial na TCAR. O diagnóstico de DPI associada à ES foi feito em conformidade com os critérios de 2013 do American College of Rheumatology.(16) O estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da instituição, e todos os participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido. Os critérios de exclusão foram os seguintes: a presença de outra(s) doença(s) do tecido conjuntivo além da ES, tabagismo atual ou prévio, diagnóstico de doença pulmonar ocupacional, doença pulmonar infecciosa aguda ou crônica, exposição conhecida a antígenos ambientais tóxicos ou medicamentos tóxicos, uso prévio de quimioterapia antineoplásica, pulsoterapia com ciclofosfamida e/ou metilprednisolona até seis meses antes da inclusão no estudo e sinais de aspiração pulmonar na TCAR. Níveis séricos de mediadores inflamatórios, dados clínicos e dados referentes à função pulmonar foram coletados juntamente com os exames de imagem.
 
A PET/TC com 18F-FDG e a TCAR foram realizadas com um tomógrafo de PET/TC (Discovery 690; GE Healthcare, Milwaukee, WI, EUA) acoplado a um tomógrafo de 64 canais (LightSpeed VCT; GE Healthcare). Os participantes do estudo jejuaram durante no mínimo 6 h, sendo medida a glicemia antes da administração intravenosa de 3,7 MBq/kg (0,1 mCi/kg) do radiofármaco 18F-FDG.(11,12)
 
Aproximadamente 50 min depois da administração de 18F-FDG, a TCAR foi realizada do ápice à base pulmonar em decúbito dorsal e apneia inspiratória máxima, sendo usados os seguintes parâmetros: espessura de corte = 0,6 mm, voltagem = 120 kV e corrente = 200 mA. Os dados foram reconstruídos com algoritmos específicos para estudo do pulmão e mediastino e avaliados com janela para o pulmão (nível: −700 UH; largura: 1.200 UH) e o mediastino (nível: 40 UH; largura: 400 UH).(8)
 
As imagens de PET/TC com 18F-FDG foram adquiridas com um tomógrafo helicoidal do crânio à coxa e um protocolo de baixa dose de radiação (voltagem: 90 kV; corrente modulada) para criar um mapa de atenuação e localizar as regiões anatômicas de interesse. Em seguida foi realizada a aquisição de imagens moleculares nas regiões correspondentes; as imagens foram adquiridas com tempo de aquisição de 2 min por posição no leito e reconstruídas em conformidade com o protocolo iterativo do fabricante, com 24 subgrupos e 4 iterações.(8,12)
 
A captação do radiofármaco foi considerada anormal quando foi maior que a captação mediastinal.(8,12) Esse procedimento foi realizado e interpretado por um médico nuclear sênior que desconhecia tanto o estado clínico dos pacientes como os padrões radiológicos, e que usou o maximum standardized uptake value corrected for lean body mass (SULmax, valor padronizado de captação máximo corrigido pela massa magra) no plano axial. Foram registrados os valores máximos para cada segmento pulmonar.
 
A atividade metabólica basal do parênquima pulmonar também foi calculada em regiões normais na TCAR, sendo usada para determinar a captação pulmonar de fundo e calcular a target-to-background ratio (TBR, relação alvo-fundo) conforme descrito por Groves et al.(16) Para quantificar a média de atividade metabólica em cada lobo pulmonar, o volume de interesse foi avaliado visualmente nas imagens de TC por um radiologista torácico, sendo o mean standardized uptake value corrected for lean body mass (SULmean, valor padronizado de captação médio corrigido pela massa magra) calculado com o software PMOD, versão 3.609 (Bruker Corporation, Billerica, MA, EUA).
 
As imagens de TCAR foram analisadas por dois radiologistas seniores com mais de 20 anos de experiência em radiologia torácica e no diagnóstico de DPI, e que desconheciam os resultados da PET/TC com 18F-FDG. Todas as imagens foram interpretadas em estações de trabalho exclusivas. As diferenças de opinião foram decididas por consenso entre os radiologistas. Os padrões de pneumonia intersticial crônica na TCAR avaliados no presente estudo foram PINE, PIU e PO. Além disso, foi também analisada a presença de OVF pura (isto é, sem alterações pulmonares intersticiais concomitantes), faveolamento, OVF com fibrose (padrão reticular, bronquiectasia ou faveolamento) e consolidação, cujas definições já foram estabelecidas.(17) Segmentos sem lesões foram considerados normais. Os padrões reticulares foram considerados em conjunto com as demais variáveis que sugeriam a presença de doença fibrosante porque os participantes apresentavam doença pulmonar avançada. O SULmax e o SULmean de cada lobo pulmonar foram comparados aos padrões de TCAR identificados.
 
Os testes de função pulmonar foram realizados por um pneumologista sênior. O teste de caminhada de seis minutos foi realizado em conformidade com normas internacionais.(18) Os volumes pulmonares e a DLCO foram obtidos por meio de um sistema Collins (Ferraris Respiratory, Louisville, CO, EUA), e os resultados foram relatados em forma de números absolutos e porcentagens em relação aos valores previstos para a população brasileira.(19)
 
Para determinar os níveis séricos de mediadores inflamatórios, foram colhidas, antes da realização da PET/TC, amostras de sangue dos pacientes com ES e de controles emparelhados por sexo e idade, já que ainda não há valores de referência. As quimiocinas foram quantificadas por ELISA sanduíche conforme as instruções do fabricante (R&D Systems, Minneapolis, MN, EUA). Os níveis séricos de sTNFR1, sTNFR2 e MIF também foram medidos.(14) Os critérios de inclusão de controles foram os seguintes: idade > 18 anos, sem doença inflamatória crônica, sem doença maligna, sem uso de imunomoduladores nas seis semanas anteriores à coleta de sangue, sem cirurgia no mês anterior, sem trauma extenso no mês anterior, sem insuficiência renal ou hepática e sem gravidez.
 
A normalidade da distribuição dos dados foi verificada por meio do teste de Kolmogorov-Smirnov com correção de Lilliefors, do teste de Shapiro-Wilk e de análise gráfica. As variáveis foram apresentadas em forma de mediana (mínimo e máximo). As associações entre as variáveis categóricas foram avaliadas por meio do teste do qui-quadrado ou do teste exato de Fisher, conforme apropriado. A comparação univariada de médias e medianas foi realizada por meio do teste U de Mann-Whitney. As correlações entre variáveis contínuas foram avaliadas por meio do coeficiente de correlação de Pearson ou Spearman, e o teste de Kruskal-Wallis foi usado para comparar medianas em mais de dois grupos com distribuição não paramétrica. A concordância interobservadores foi medida pelo coeficiente kappa de Cohen. Todos os testes foram realizados com nível de significância (α) de 0,05, com o programa Predictive Analytics Software, versão 18.0 para Windows (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA).
 
RESULTADOS
 
Dos 27 pacientes avaliados entre novembro de 2013 e novembro de 2014, 2 foram excluídos em virtude de um padrão exclusivo de pequenas vias aéreas na TCAR, 1 foi excluído em virtude do desenvolvimento de doença neoplásica, e 1 foi excluído em virtude da retirada do consentimento. Portanto, foram incluídos no estudo 23 pacientes. Destes, 78% eram do sexo feminino, e a média de idade foi de 47 anos. Os principais dados clínicos e dados referentes à função pulmonar são apresentados na Tabela 1. No momento da inclusão no estudo, 6 pacientes estavam em tratamento com prednisona (dose média: 8,7 ± 4,0 mg; intervalo: 5,0-15,0 mg), outros 6 estavam em tratamento com azatioprina, e 5 estavam em tratamento com metotrexato. Os resultados dos testes de função pulmonar mostraram que 7 pacientes (30,4%) apresentavam CPT normal e 15 (65,1%) apresentavam função pulmonar alterada. Destes, 9 (39,1%) apresentavam distúrbio ventilatório restritivo, 5 (21,7%) apresentavam distúrbio ventilatório misto e 1 (4,3%) apresentava distúrbio ventilatório obstrutivo. Um paciente não conseguiu realizar as manobras necessárias para medir os volumes pulmonares.


 
Análise da TCAR
 
A TCAR revelou maior acometimento dos lobos inferiores, com predomínio de OVF com bronquiectasias (90,0%), seguida de OVF pura (65,4%). Além disso, padrões de PINE, PIU e PO foram observados em 19 (82,7%), 3 (13,0%) e 1 (4,3%) dos pacientes, respectivamente. A concordância interobservadores foi de 0,82.
 
Análise da PET/TC com 18F-FDG
 
A atividade metabólica foi analisada por meio da determinação do SULmax e do SULmean nos lobos pulmonares, da captação pulmonar de fundo em áreas normais e da TBR. Foram analisados 414 segmentos pulmonares, dos quais 140 (33,8%) apresentavam atividade metabólica suficiente para que se medisse o SULmax (Figura 1).


 
As medianas do SULmean, SULmax e TBR foram de 0,81 (0,44-1,69), 2,7 (1,50-5,30) e 4,91 (3,71-11,52), respectivamente. A média de captação pulmonar de fundo foi de 0,51 (0,083). Embora os maiores valores de captação de 18F-FDG tenham sido observados no faveolamento, não houve diferenças significativas entre faveolamento e OVF quanto aos valores de captação de 18F-FDG. As correlações entre os padrões de TCAR e os valores de captação de 18F-FDG são apresentadas na Tabela 2.


 
Dos 13 lobos pulmonares com achados normais na TCAR, 12 (92,3%) não apresentavam atividade metabólica significativa para que se medisse a captação. Além disso, a mediana do SULmean (0,63) foi semelhante ao SULmax basal (0,51). Não houve correlação entre os valores de captação de 18F-FDG e variáveis clínicas e funcionais ou terapia concomitante (dados não apresentados). Além disso, não houve diferença entre os valores de SULmean e SULmax em pacientes com e sem dispneia (dados não apresentados). Não houve correlações entre as variáveis clínicas ou funcionais e os achados da PET/TC com 18F-FDG, os achados da TCAR e os parâmetros de biomarcadores.
 
Mediadores inflamatórios
 
A Figura 2 mostra a comparação entre o grupo DPI associada à ES e o grupo controle quanto aos mediadores inflamatórios. As medianas das concentrações séricas de sTNFR1, sTNFR2, CCL2 e CXCL10 foram significativamente maiores no grupo DPI associada à ES do que no grupo controle. Por outro lado, houve diferenças significativas entre os padrões de TCAR no que tange aos níveis séricos de sTNFR2 (p = 0,017), CCL2 (p = 0,001), CXCL10 (p = 0,049), CXCL9 (p = 0,011) e MIF (p = 0,023 ; Figura 3).




 
Nas comparações múltiplas desses mediadores inflamatórios, o teste U de Mann-Whitney com correção de Bonferroni foi aplicado ao nível de significância, que foi fixado em 0,01. Como se pode observar na Figura 4, os níveis séricos de CCL2 foram significativamente maiores para OVF do que para faveolamento (p = 0,007). Os marcadores inflamatórios e os valores de captação de 18F-FDG não apresentaram correlação significativa. Houve correlação negativa moderada entre a duração da doença e os mediadores inflamatórios (p < 0,05).


 
DISCUSSÃO
 
Aumentou recentemente o número de estudos nos quais se empregou a PET/TC com 18F-FDG na avaliação de DPI.(10,11,13) O presente estudo envolveu pacientes com DPI associada à ES e o uso de PET/TC com 18F-FDG. Os resultados mostraram atividade metabólica significativa para todos os padrões de TCAR. No entanto, houve notável atividade metabólica para faveolamento (um padrão de TCAR frequentemente associado a doença fibrótica) e OVF.(7) Além disso, observou-se uma correlação entre OVF e níveis séricos de CCL2.
 
O padrão de OVF é conhecido como marcador de doença ativa ou em estágio inicial(7); entretanto, a associação entre OVF e doença fibrótica na ES foi previamente sugerida por Shah et al.,(20) em uma coorte de 41 pacientes submetidos a TCAR seriada em um período de cinco anos. Os autores observaram que a progressão da fibrose foi mais comum do que a regressão das lesões após o tratamento com D-penicilamina, ciclofosfamida, ciclofosfamida + D-penicilamina ou prednisona em pacientes com OVF na TCAR.(20)
 
Chen et al.(12) demonstraram a sensibilidade da PET/TC com 18F-FDG na avaliação da inflamação aguda do parênquima pulmonar.(12) Os autores avaliaram a resposta neutrofílica induzida pela instilação direta de endotoxina em um segmento pulmonar em indivíduos saudáveis e mostraram que a PET/TC com 18F-FDG permitiu a quantificação da resposta inflamatória.(12) Groves et al.(11) estudaram a atividade metabólica do parênquima pulmonar em 36 pacientes com fibrose, incluindo fibrose idiopática com achados típicos na TCAR (18 pacientes) e fibrose relacionada a outras doenças pulmonares difusas. Segundo os autores, a média de SULmax foi de 2,8, e houve predomínio de atividade em áreas de faveolamento.
 
No presente estudo, a PET não foi útil para monitorar a DPI em pacientes com ES, pois não demonstrou diferenças significativas entre atividade inflamatória e áreas fibróticas, como sugerem os achados de captação semelhante para imagens de OVF e faveolamento. No entanto, se levarmos em consideração que a ES é uma doença caracterizada por envolvimento difuso do parênquima, a ausência de captação significativa de 18F-FDG em segmentos pulmonares que apresentam lesões parenquimatosas sugere que a PET/TC com 18F-FDG é útil para demonstrar a estabilidade da doença. Recentemente, três estudos retrospectivos avaliaram imagens de PET/TC de pacientes com ES sob investigação de doença neoplásica; os estudos mostraram que a captação pulmonar de 18F-FDG na linha de base foi significativamente maior em pacientes com DPI progressiva do que naqueles com DPI estável.(21-23) Como demonstraram Peelen et al., a PET/TC com 18F-FDG pode distinguir pacientes com DPI associada à ES de pacientes com ES sem DPI porque em seu estudo a captação pulmonar de 18F-FDG foi significativamente maior na DPI associada à ES do que na ES sem DPI.(21)
 
A quantificação da captação de 18F-FDG no parênquima pulmonar é desafiadora e altamente dependente dos movimentos respiratórios e do sinal dos compartimentos de sangue e água. O método ideal para quantificar a captação pulmonar de 18F-FDG deveria refletir exclusivamente a atividade metabólica nas células pulmonares para determinar seu papel patogênico. Embora alguns métodos tenham sido testados, nenhum foi capaz de fornecer essa informação. Assim, a comparação com dados clínicos é necessária para interpretar corretamente os parâmetros de quantificação da PET.(24)
 
Poucos estudos avaliaram o papel da correção das frações de ar e sangue vs. imagens não corrigidas de PET/TC com 18F-FDG. Embora não tenhamos feito essas correções, há relatos de que são importantes,(12,25) e o fato de não as termos feito poderia explicar por que não observamos uma relação clara entre o sinal de PET com 18F-FDG e outras medidas.
 
A identificação visual de pequenas variações na captação de 18F-FDG no parênquima pulmonar é frequentemente difícil, especialmente quando há lesões parenquimatosas altamente heterogêneas. (20,26,27) A TBR é uma medida da variação na captação pulmonar de 18F-FDG. Quando próxima de 1, a TBR pode indicar captação uniforme de 18F-FDG, e recentemente se estabeleceu uma relação entre TBR elevada e sobrevida curta na fibrose pulmonar idiopática.(28) No presente estudo, observamos TBR elevada nos padrões de fibrose e OVF, especialmente em áreas de faveolamento (TBR = 4,02). Portanto, consideramos apropriado adicionar o valor de captação de 18F-FDG ao do de todo o pulmão por meio da determinação do SULmean por segmentação volumétrica dos lobos pulmonares, além de medir o SULmax qualitativamente nas áreas de interesse.(13) Os valores de SULmax estão incluídos nessa análise volumétrica (SULmean), que resulta em valores muito mais baixos.
 
Bonnela et al.(15) fizeram uma revisão do papel de biomarcadores na DPI associada a doenças do tecido conjuntivo. Embora tenham relatado várias correlações entre níveis aumentados de proteínas e quimiocinas derivadas do pulmão e a presença ou gravidade da DPI nesses pacientes, os autores afirmaram que individualmente não têm valor preditivo, e que é possível que a previsão da doença dependa principalmente da análise combinatória de muitos desses mediadores.(15)
 
No presente estudo, os mediadores inflamatórios cujos níveis séricos foram maiores nos pacientes com DPI associada à ES do que nos controles, isto é, sTNFR1, sTNFR2, CCL2 e CXCL10, estão diretamente envolvidos na etiopatogenia da ES. De fato, Hasegawa et al. relataram que os níveis de CXCL10, CXCL9 e CCL2 foram maiores em pacientes com ES do que em controles, e que as variações de CCL2 ao longo dos três anos de estudo indicam atividade de doença cutânea e pulmonar na ES.(29)
 
No que tange à associação entre citocinas e padrões de TCAR, níveis mais elevados de CCL2 foram observados quando predominou a OVF (p = 0,007). A CCL2 é uma quimiocina conhecida por estimular a inflamação e a produção de colágeno por meio da ativação de fibroblastos e inibição da produção de prostaglandina E2 pelas células epiteliais alveolares, o que por sua vez resulta em maior proliferação de fibroblastos, corroborando assim seu importante papel na gênese da fibrose.(30-32) Assim, a correlação entre CCL2 e OVF pode indicar um predomínio de atividade fibrótica nessas áreas em virtude de fibroblastos ativos provavelmente presentes no acometimento pulmonar precoce. O impacto da atividade fibroblástica na captação pulmonar de 18F-FDG é apoiado por um estudo pré-clínico de Bondue et al., que demonstraram captação pulmonar de 18F-FDG em um estágio fibrótico tardio e uma importante redução do recrutamento de leucócitos marcados em um modelo de fibrose pulmonar em camundongos.(33)
 
As principais limitações do presente estudo incluem o pequeno tamanho da amostra, em virtude do fato de se tratar de um estudo realizado em um único centro, e o alto custo da PET com 18F-FDG, dificultando a realização de outras análises; não obstante, critérios rigorosos de seleção foram adotados para garantir a homogeneidade da amostra. Por outro lado, a análise segmentar do parênquima pulmonar melhorou a análise dos padrões da TCAR e sua correspondência com os resultados da PET/TC com 18F-FDG. Outro ponto a ser considerado é que o uso de imunomoduladores por alguns pacientes pode ter influenciado os níveis de citocinas e a captação de 18F-FDG na PET/TC; entretanto, os medicamentos não puderam ser interrompidos, em virtude dos possíveis riscos de sua retirada. Pelo mesmo motivo, o exame anatomopatológico pulmonar não foi usado como referência na comparação dos métodos estudados. Correlações entre padrões de TCAR, atividade metabólica, mediadores inflamatórios e variáveis clínicas e funcionais não puderam ser demonstradas neste estudo, provavelmente em virtude do pequeno tamanho da amostra.
 
Vale a pena mencionar que estudos transversais impedem que se estabeleçam relações causais. Como corolário, o significado desses efeitos não pode ser intuído em pacientes em estágios de doença anteriores aos aqui investigados. No entanto, a homogeneidade da amostra, a aquisição simultânea de imagens de TCAR, o uso de PET/TC com 18F-FDG, a coleta contemporânea de mediadores inflamatórios séricos e os testes de função pulmonar tornaram os resultados adequados aos objetivos do estudo.
 
CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES
 
ALB, RAC e GAP: concepção e desenho do estudo. ALB, RAC, GAP, MM, EVM, MT e FPSTS e CSF: interpretação e análise dos dados. ALB, RAC, GAP, EVM e MM: redação e revisão do manuscrito do conteúdo intelectual importante. Todos os autores aprovaram a versão final do manuscrito.
 
CONFLITOS DE INTERESSE
 
Nenhum conflito declarado.
 
REFERÊNCIAS
 
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