Continuous and bimonthly publication
ISSN (on-line): 1806-3756

Licença Creative Commons
7671
Views
Back to summary
Open Access Peer-Reviewed
Artigo de Revisão

Treinamento de membros superiores e atividades da vida diária em pacientes com DPOC: revisão sistemática de ensaios controlados randomizados

Upper limb exercise training and activities of daily living in patients with COPD: a systematic review of randomized controlled trials

Christos Karagiannis1a, Christos Savva1a, Ioannis Mamais1a, Tonia Adamide2a, Andreas Georgiou2a, Theodoros Xanthos3a

ABSTRACT

Objective: To investigate the efficacy of upper limb exercise training (ULExT) in improving the performance of activities of daily living (ADL) that involve the upper limbs (UL) in patients with COPD. Methods: The Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses guidelines were used in this systematic review. PubMed and EBSCOhost databases were searched to identify randomized controlled trials involving adults with COPD who underwent ULExT, compared with those who underwent other types of exercise or no exercise, in order to assess the performance of ADL that involve the UL. The methodological quality of the selected studies was assessed using the Physiotherapy Evidence Database scale. Results: Five studies, with a total sample of 173 subjects, met the inclusion criteria. The results of the selected studies showed that ULExT is safe and can significantly improve the performance of ADL that involve the UL in patients with COPD. However, there were inconsistencies in the results, especially regarding the perception of symptoms during ADL. The small number of studies included and their methodological quality do not allow for firm conclusions. Conclusions: The findings of this review revealed that ULExT is a safe therapeutic approach and can improve the performance of ADL that involve the UL in patients with COPD, but the results are unclear. Further investigation through well-designed randomized trials is warranted to determine the effectiveness of ULExT in improving the performance of ADL that involve the UL in patients with COPD.

Keywords: Upper extremity; Pulmonary disease, chronic obstructive; Activities of daily living, Exercise therapy.

RESUMO

Objectivo: Investigar a eficácia do treinamento de membros superiores (MMSS) na melhora na execução de atividades da vida diária (AVD) que envolvem os MMSS em pacientes com DPOC. Métodos: Nesta revisão sistemática foram utilizadas as diretrizes do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses. Os bancos de dados PubMed e EBSCOhost foram pesquisados para identificar ensaios controlados randomizados envolvendo adultos com DPOC submetidos a treinamento de MMSS, comparados àqueles submetidos a outros tipos de exercício ou a nenhum exercício, a fim de avaliar a execução de AVD que envolvem os MMSS. A qualidade metodológica dos estudos selecionados foi avaliada por meio da escala do Physiotherapy Evidence Database. Resultados: Cinco estudos, com uma amostra total de 173 indivíduos, preencheram os critérios de inclusão. Os resultados dos estudos selecionados mostraram que o treinamento de MMSS é seguro e pode melhorar significativamente a execução de AVD que envolvem os MMSS em pacientes com DPOC. No entanto, houve inconsistências nos resultados, especialmente em relação à percepção de sintomas durante as AVD. O pequeno número de estudos incluídos e a qualidade metodológica desses estudos não permitem conclusões firmes. Conclusões: Os achados desta revisão revelaram que o treinamento de MMSS é uma abordagem terapêutica segura e pode melhorar a execução de AVD que envolvem os MMSS em pacientes com DPOC, mas os resultados não são claros. São necessárias mais investigações, por meio de ensaios aleatorizados bem desenhados, para determinar a eficácia do treinamento de MMSS na melhora na execução de AVD que envolvem os MMSS em pacientes com DPOC.

Palavras-chave: : Extremidade superior; Doença pulmonar obstrutiva crônica; Atividades cotidianas; Terapia por exercício.

INTRODUÇÃO

A DPOC é uma doença respiratória crônica que apresenta altas taxas de mortalidade e morbidade.(1) A dispneia é um dos principais sintomas dos pacientes com DPOC, limitando sua atividade física e afetando sua capacidade de realizar atividades da vida diária (AVD).(2) Mais especificamente, atividades que exigem elevação dos membros superiores (MMSS) acima da altura dos ombros podem interromper a respiração normal e causar hiperinsuflação,(3) que é associada à ocorrência de dispneia.(2) Nesses pacientes, foi demonstrado que tarefas de AVD utilizando os MMSS aumentam os custos metabólicos e ventilatórios, avaliados pela relação consumo de oxigênio/consumo máximo de oxigênio (expressa em porcentagem), pela relação ventilação minuto/ventilação voluntária máxima (expressa em porcentagem) e pelo pulso de oxigênio. Esses incrementos podem explicar o cansaço e estar associados ao aumento da percepção de dispneia, o que leva à limitação das AVD.(4) Além disso, algumas alterações musculares patológicas (tais como fraqueza e perda de massa) que podem ocorrer em pacientes com DPOC(5) também contribuem para o aumento da dispneia e fadiga precoce.(6,7) Por todos esses motivos, pacientes com DPOC têm falta de ar durante AVD quando utilizam os MMSS,(8-10) tais como ao cozinhar ou dirigir, e podem tentar evitar essas AVD para evitar a dispneia.

Foi demonstrado que programas de reabilitação pulmonar, incluindo o treinamento físico, são capazes de reduzir a dispneia e a fadiga em pacientes com DPOC e melhorar sua capacidade de exercício e qualidade de vida.(11) No entanto, diretrizes recentes para reabilitação pulmonar não são claras sobre se exercícios de MMSS devem ser realizados como parte do treinamento físico.(11,12)

A melhora na execução de AVD deve ser um dos objetivos mais importantes da reabilitação, pois pode afetar a capacidade de autocuidado dos pacientes. Por esse motivo, o presente estudo realizou uma revisão sistemática de ensaios controlados aleatorizados para investigar se o treinamento de MMSS pode melhorar a execução de AVD em pacientes com DPOC e se o treinamento de MMSS é seguro para esses pacientes.

MÉTODOS

O processo de seleção de artigos foi realizado de acordo com as diretrizes do Preferred Reporting Items for Systematic Reviews and Meta-Analyses guidelines(13,14) na presente revisão sistemática. Foram pesquisados os seguintes bancos de dados eletrônicos (desde seu início até maio de 2019): PubMed e EBSCOhost (CINAHL Plus e SPORTDiscus). A pesquisa foi limitada à literatura escrita em inglês. Os descritores selecionados tinham relação com DPOC ("COPD"; "chronic obstructive pulmonary disease"; "chronic obstructive lung disease"; "chronic obstructive airway disease"; "emphysema"; "chronic airflow limitation"; e "chronic airway obstruction"), MMSS ("arm"; "upper extremity"; e "upper limb"), exercício ("exercise therapy"; "exercise"; "respiratory rehabilitation"; "pulmonary rehabilitation"; "physical exercise"; "physiotherapy"; "physical therapy"; "training"; "exercise capacity"; "exercise test"; e "exercise endurance") e sintomas ("dyspnea" e "fatigue"). Os artigos obtidos foram examinados em busca de outras referências relevantes.

O fruto da pesquisa foi inicialmente avaliado por dois revisores independentes para exclusão de duplicatas e para análise dos títulos e resumos dos artigos potencialmente relevantes. O texto completo dos artigos foi obtido quando o título ou o resumo não fornecia informações suficientes para justificar a inclusão dos artigos. Em casos de discordância, chegou-se a um consenso por meio de discussão, e, se necessário, um terceiro revisor tomou a decisão quanto à inclusão/exclusão dos artigos.

Para serem incluídos em nossa revisão sistemática, os artigos tinham que preencher critérios desenvolvidos de acordo com a abordagem PICOS - acrônimo para População de interesse, Intervenção, Comparação, Outcome (desfecho) e Study design (desenho do estudo). Na presente revisão, os critérios foram os seguintes: P = homens e mulheres com mais de 18 anos de idade, diagnosticados com DPOC (independentemente da gravidade); I = qualquer forma de programa de treinamento de MMSS; C = três tipos de comparação (treinamento de MMSS vs. nenhum treinamento de MMSS; treinamento de MMSS e treinamento de membros inferiores vs. apenas treinamento de membros inferiores; e comparação entre dois tipos de treinamento de MMSS); O = execução de AVD; e S = ensaios controlados randomizados.

Vale ressaltar que o desfecho primário da presente revisão foi a execução de AVD que envolvem os MMSS. A capacidade de realizar diversas AVD é influenciada pelos sintomas de dispneia e fadiga em pacientes com DPOC. Por esse motivo, a percepção desses sintomas foi um desfecho secundário nesta revisão. A segurança do treinamento de MMSS também foi um desfecho secundário, sendo que os estudos incluídos foram examinados quanto à presença de relatos de eventos adversos relacionados ao programa de exercícios.

Uma pasta de trabalho Excel personalizada foi utilizada para a extração de dados com base em uma recente revisão sistemática sobre treinamento de MMSS na DPOC,(15) incluindo métodos (desenho do estudo, duração total do estudo, detalhes sobre qualquer período de run-in, número de centros de estudo e respectivas localizações, local do estudo, perdas e data do estudo); participantes (número, média de idade, sexo, gravidade da DPOC, critérios diagnósticos, função pulmonar inicial, histórico de tabagismo, critérios de inclusão e critérios de exclusão); intervenções (intervenção e grupos de comparação); desfechos (desfechos primários e secundários e momentos relatados); resultados dos desfechos avaliados; e observações (financiamento e conflitos de interesse).

A qualidade e o risco de viés dos estudos foram avaliados com base em alguns critérios metodológicos e estatísticos (por exemplo, randomização, cegamento, comparação dos dados antes e após a intervenção e entre os grupos, etc.). A qualidade metodológica de cada estudo foi avaliada de forma independente por dois investigadores utilizando a escala do Physiotherapy Evidence Database (PEDro), que é baseada nos critérios da Lista de Delphi(16) e considerada válida e confiável. (17,18) Um estudo com pontuação ≥ 7 na escala PEDro é considerado de alta qualidade metodológica, enquanto os com pontuação entre 4 e 6 e os com pontuação ≤ 3, respectivamente, são considerados de qualidade metodológica intermediária e ruim.

RESULTADOS

Durante a pesquisa inicial nos bancos de dados eletrônicos, foram encontrados 201 artigos. Apenas cinco estudos preencheram todos os critérios de inclusão mencionados acima e possuíam os dados necessários para a investigação da eficácia do treinamento de MMSS em pacientes com DPOC (Figura 1).(19-23)



De acordo com a escala PEDro, a qualidade metodológica dos estudos era moderada (dois estudos) a alta (três estudos), com pontuações variando de 4 a 9 (Tabela 1). Todos os estudos se referiram à comparação dos desfechos avaliados entre os grupos. Em dois dos ensaios, não houve qualquer forma de cegamento (nem para os participantes, nem para os pesquisadores ou examinadores).



O tamanho total da amostra de cada estudo variou de 22 a 50 pacientes, com o número de participantes por grupo variando de 6 a 25. Os cinco estudos juntos envolveram 173 pacientes. A maioria dos pacientes nos estudos era do sexo masculino. Em um dos estudos, todos os participantes eram homens.(20) A média geral de idade dos participantes foi de 66 anos. Em um dos estudos, o sexo e a idade dos pacientes não estavam disponíveis.(19) As características dos participantes são apresentadas na Tabela 2.



No geral, os pacientes apresentavam DPOC moderada a muito grave segundo os critérios da Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease.(24) Em todos os estudos, apresentar DPOC estável foi critério de inclusão, enquanto a presença de exacerbação três semanas a dois meses antes do estudo foi considerada critério de exclusão na maioria dos estudos.(20-23)

Dos cinco estudos, quatro relataram que o diagnóstico da DPOC foi baseado nos resultados da espirometria, e um não especificou como a DPOC foi diagnosticada. (19) Além disso, dois dos estudos também incluíram a presença de dispneia ou fadiga durante AVD como critério de inclusão.(22,23)

Em todos os estudos, as amostras foram divididas em grupos, dos quais pelo menos um grupo seguiu o programa de treinamento de MMSS. As amostras foram divididas em dois grupos em três estudos(21-23) e em três grupos em dois estudos.(19,20) O grupo intervenção realizou exercício de resistência de MMSS não sustentados (ou seja, utilizando diversos pesos, tais como halteres e pesos de mão) em todos os estudos. (19-23) Os grupos controle realizaram exercícios de respiração,(23) higiene respiratória,(20) ou participaram de um programa de reabilitação pulmonar sem treinamento de MMSS.(19,21) Em um dos estudos, o grupo controle realizou exercícios simulados de MMSS que incluíam exercícios de flexibilidade e alongamento.(22)

A duração total dos programas de treinamento variou de três a oito semanas. Na maioria dos estudos, houve três sessões de treinamento por semana.(20,22,23) Em um estudo, a duração total do programa de treinamento foi de três semanas (cinco sessões de treinamento por semana).(21) Em outro estudo, a primeira semana de treinamento consistiu em uma sessão diária, seguida por duas sessões diárias durante as semanas seguintes. (19) A maioria dos programas de treinamento era de programas supervisionados; no entanto, os participantes foram supervisionados "aproximadamente uma vez por semana" em um estudo.(19)

Diversos parâmetros foram utilizados para determinar a intensidade do exercício. Nos programas de treinamento de força, a intensidade do exercício foi determinada pela carga de pesos (em libras)(19) e pelo número de séries e repetições.(20-23) Em um dos estudos, eles também utilizaram o número de movimentos de braços por expiração para determinar a intensidade do exercício. (19) Em todos os estudos, houve aumento gradual da intensidade do exercício levando em consideração a capacidade dos pacientes de completar todo o programa (séries e repetições) sem interrupção. (19) A intensidade do exercício foi aumentada com base na ausência de dispneia, fadiga ou dor muscular em três estudos.(21-23) Por fim, em um dos estudos, a carga de treinamento foi ajustada com base no teste de dez repetições máximas no meio do programa.(20) As características dos programas de treinamento são apresentadas na Tabela 3.



Embora a perda de seguimento tenha sido relatada em quatro dos estudos,(19,20,22,23) o abandono do programa de treinamento foi mencionado apenas em dois (1 paciente cada).(19,22) Os motivos do abandono e dos eventos adversos relatados em cada estudo foram investigados para avaliar a segurança do treinamento de MMSS em pacientes com DPOC. O total de desistentes foi de 35 pacientes: 2 apresentaram exacerbação(22,23) durante o programa de treinamento (a qual foi relatada como não relacionada ao programa de treinamento em 1)(22); 13 desistiram por motivos médicos não relacionados à DPOC ou ao programa de treinamento, tais como câncer de próstata (em 1),(23) e 1 apresentou dor nas costas, provavelmente relacionada ao programa de treinamento(19); 9 desistiram por motivos não médicos (sendo 2 casos de não aderência); 3 não puderam participar da avaliação final(23); e 7 tiveram perda de seguimento (sem maiores informações).(20) Além disso, 3 apresentaram queixa de dor ou dispneia grave (no entanto, não ficou claro se essas queixas estavam ou não relacionadas ao programa de treinamento; entretanto, nenhum deles interrompeu o programa, que foi adaptado a suas necessidades).(22)

A execução de AVD que envolvem os MMSS foi um desfecho avaliado em quatro estudos.(19-21,23) A avaliação da execução de AVD incluiu apagar a lousa,(19-21,23) lavar a louça,(19,21,23) guardar as compras em prateleiras ou levantar peso(19-21,23) e trocar lâmpadas.(21,23) Solicitou-se aos pacientes que realizassem as atividades em um determinado intervalo de tempo(20,21,23) ou registrou-se o tempo necessário para completar as tarefas de AVD. (19) Em um estudo, o teste de AVD Glittre(25,26) também foi utilizado para avaliar a execução de AVD.(23) A escala de Borg foi utilizada para determinar a percepção de dispneia ou fadiga antes, durante e após as simulações. Dois estudos utilizaram ferramentas específicas para a avaliação de atividades de MMSS, tais como a Escala de AVD Milliken(23) e uma versão modificada do Disabilities of the Arm, Shoulder and Hand questionnaire,(22) para avaliar as AVD. Por fim, em um estudo, solicitou-se aos pacientes que classificassem sua percepção de dispneia durante as simulações utilizando o domínio dispneia do Chronic Respiratory Disease Questionnaire. (22) Em um dos estudos, houve redução significativa do tempo necessário para completar o teste de AVD, sendo observada maior redução no grupo treinamento de MMSS submetido à facilitação neuromuscular proprioceptiva.(19) Além disso, dois estudos(21,23) que utilizaram um teste de AVD semelhante ao do estudo acima(19) mostraram aumento significativo do número de ciclos completados no grupo treinamento de MMSS em comparação com o grupo controle(21) ou o com momento inicial.(23) Outro estudo avaliou a resposta metabólica durante os testes de AVD e revelou que a relação ventilação minuto/ventilação voluntária máxima e a relação consumo de oxigênio/consumo máximo de oxigênio diminuíram durante a limpeza da lousa no grupo treinamento de MMSS.(20) Um estudo mostrou melhora significativa das pontuações obtidas na Escala de AVD Milliken no grupo treinamento de MMSS.(23) No entanto, não foram encontradas alterações significativas nos resultados do teste de AVD Glittre(23) ou nas pontuações obtidas no Disabilities of the Arm, Shoulder and Hand questionnaire.(22)

Em três estudos a percepção de dispneia não mostrou alterações significativas nas simulações de AVD relacionadas aos MMSS.(19,20,23) Em apenas um estudo a percepção de dispneia melhorou significativamente em ambos os grupos.(21) Em outro estudo, houve redução significativa da percepção de dispneia durante o teste de AVD Glittre no grupo treinamento de MMSS.(23) Por fim, a percepção de dispneia durante os testes de AVD alterou-se significativamente em ambos os grupos em um estudo.(22)

A fadiga durante a avaliação de AVD não apresentou alterações significativas em dois estudos.(19,23) Apenas em um estudo a fadiga de MMSS apresentou melhora significativa durante a simulação de AVD no grupo intervenção.(21) Os resultados dos grupos treinamento de MMSS são apresentados na Tabela 4.



DISCUSSÃO

O objetivo da presente revisão sistemática foi investigar a potencial eficácia do treinamento de MMSS na melhora na execução de AVD que envolvem os MMSS em pacientes com DPOC. Nossos resultados indicam que o treinamento de MMSS é uma abordagem terapêutica segura para esses pacientes. Além disso, melhoras significativas na execução de AVD que envolvem os MMSS foram encontradas no grupo treinamento de MMSS em comparação com o momento inicial(20,23) ou com o grupo controle.(21) No entanto, o treinamento de MMSS apresenta resultados contraditórios na percepção de sintomas durante AVD que envolvem os MMSS.

As AVD, especialmente as atividades envolvendo os MMSS, ficam comprometidas em pacientes com DPOC. Os resultados de quatro dos estudos que examinaram o efeito do treinamento de MMSS em simulações de AVD relacionadas aos MMSS mostraram que o treinamento de MMSS pode proporcionar melhoras significativas (Tabela 4).(19-21,23) Em um estudo, houve redução significativa do tempo total gasto para completar as tarefas de AVD.(19) Esse achado também foi observado em dois outros estudos, nos quais houve aumento significativo do número de ciclos completados durante a simulação de AVD em um período de dez minutos no grupo treinamento de MMSS.(21,23) Por fim, em outro estudo, observou-se redução significativa da demanda metabólica e ventilatória durante a limpeza da lousa apenas no grupo treinamento de MMSS.(20)

Embora melhoras significativas tenham sido observadas nos grupos intervenção, houve alguns achados contraditórios em alguns desses estudos. Em um dos estudos, no qual houve diferença significativa na interação grupo-tempo no tempo total gasto para completar as tarefas de AVD, não houve efeito significativo dos fatores grupo e tempo.(19) Esse achado pode ser atribuído ao fato de que o tempo gasto para completar o teste de AVD no momento inicial foi maior no grupo submetido à facilitação neuromuscular proprioceptiva do que nos outros grupos; no entanto, não foram encontradas diferenças significativas.(19) Em outro estudo, houve aumento significativo do número de ciclos completados durante a simulação de AVD tanto no grupo intervenção quanto no grupo controle.(23)

A percepção de sintomas pode explicar a melhora na execução das AVD durante os testes. Sabe-se bem que a ocorrência de sintomas de dispneia e fadiga pode restringir as atividades de MMSS.(9) Um estudo relatou que melhora na percepção de sintomas se correlacionou com melhora na execução de AVD.(21) No entanto, em um estudo, nenhuma melhora significativa na percepção de dispneia ou fadiga durante as simulações de AVD foi relatada, embora o número de ciclos completados durante os testes tenha aumentado significativamente nos grupos intervenção e controle.(23) Esse fenômeno pode ser atribuído aos exercícios respiratórios que ambos os grupos realizaram.(27) Sabe-se bem que o uso dos MMSS pode causar hiperinsuflação,(3,10) que é associada a ocorrência de dispneia(2) e disfunção das propriedades contráteis intrínsecas dos músculos respiratórios.(28) No entanto, a hiperinsuflação não é a única causa de dispneia. Diversos estudos mostram claramente que a dispneia é um sintoma complexo e é desencadeada por muitos fatores, tais como emoções, cognição, contexto e fisiopatologia.(29) De acordo com esses achados, parece lógico que o treinamento de MMSS e exercícios respiratórios possam melhorar a hiperinsuflação e a função pulmonar durante atividades de MMSS sem necessariamente melhorar a percepção de dispneia. Essa suposição parece ser confirmada em um dos estudos incluídos nesta revisão, no qual houve redução da demanda metabólica e ventilatória durante a limpeza da lousa, mas nenhuma mudança significativa na percepção de dispneia no grupo treinamento de MMSS.(20)

Em alguns casos, as AVD foram avaliadas por meio de testes ou questionários. Em um estudo, o teste de AVD Glittre foi utilizado, mas não foram encontradas alterações significativas dentro ou entre os grupos. (23) Esse teste requer sair de uma cadeira, andar dez metros, subir e descer uma escada carregando uma mochila pesada e mover objetos em uma estante.(25,26) A ausência de resultados significativos com o uso desse teste pode ser atribuída ao fato de que ele requer a execução de atividades que envolvem os membros inferiores (tal como caminhar); exercícios envolvendo os membros inferiores não foram incluídos no treinamento de MMSS no estudo mencionado.(23) No entanto, atividades como limpar a casa e lavar roupa apresentaram alterações significativas de acordo com as pontuações obtidas no questionário de AVD.(23) Contudo, questionários têm a desvantagem de fornecer respostas subjetivas que nem sempre são reais.

Embora melhoras significativas tenham sido encontradas em alguns dos estudos incluídos na presente revisão, os achados mencionados acima não podem ser generalizados em razão de algumas limitações quantitativas e qualitativas desses estudos. O número de estudos incluídos foi pequeno (apenas cinco), o que não parece suficiente para proporcionar resultados claros. Além disso, de acordo com a escala PEDro, a qualidade metodológica dos estudos era moderada, em dois estudos, e alta, em três estudos, e não houve cegamento dos pesquisadores em dois estudos.(19,20) Nesses casos, crenças pessoais a favor ou contra uma intervenção podem alterar os resultados (viés de informação).(30,31)

Na maioria dos estudos incluídos nesta revisão, o tamanho da amostra não foi determinado por meio de análise de poder estatístico, e, em alguns casos, o número de participantes em cada grupo foi menor que 11 pacientes (estudos piloto). Além disso, a maioria das amostras era composta por homens. A gravidade da DPOC, segundo os critérios da Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease, variou de moderada a muito grave; nenhum paciente com DPOC leve foi incluído em qualquer um dos ensaios.

Além das limitações no desenho metodológico, houve várias diferenças em relação ao treinamento de MMSS entre os estudos selecionados, tais como a frequência das sessões de treinamento de MMSS (de três vezes por semana a duas vezes ao dia), a duração total do programa (variando de três a oito semanas), a duração das sessões, o tipo de exercício e a intensidade do exercício. Além disso, as atividades propostas para os grupos controle eram diferentes. Outra limitação envolve a avaliação das AVD. Quatro estudos utilizaram simulações não validadas para avaliar as AVD.(19-21,23) Além do mais, houve diferenças nos métodos de avaliação e nos desfechos utilizados para avaliar as AVD, sendo que o número de tarefas de AVD foi de duas tarefas em um ensaio,(20) três em outro ensaio(19) e quatro em dois ensaios.(21,23) Por fim, o desfecho avaliado nas simulações de AVD foi o tempo, medido em segundos, em um estudo,(19) ou o número de ciclos completados em dez minutos, em dois estudos.(21,23) Todas essas limitações impedem a generalização dos achados dos estudos. Em razão dessas discrepâncias, não se pôde realizar uma meta-análise.

Três revisões sistemáticas anteriores investigaram o treinamento de MMSS e a capacidade de realizar AVD que envolvem os MMSS em pacientes com DPOC.(15,32,33) O número de ensaios incluídos nas revisões foi menor que o número de ensaios em nosso estudo, variando de um a três. O desfecho avaliado foi a execução de AVD ou sintomas durante AVD. Uma das três revisões concluiu que o treinamento de MMSS não deve ser recomendado,(32) e duas concluíram que não havia evidências clínicas para apoiar a eficácia do treinamento de MMSS na melhora dos sintomas durante AVD,(15,33) uma das quais relatou melhora geral da dispneia mas não durante AVD.(15) Os ensaios incluídos nas revisões mencionadas(15,32,33) também foram incluídos na presente revisão sistemática, com a adição de outros dois estudos. Nossa revisão demonstrou que, em quatro dos cinco estudos incluídos, a execução de AVD que envolvem os MMSS no grupo treinamento de MMSS melhorou significativamente em comparação com o momento inicial(19,20,23) ou com o grupo controle.(21) Redução da percepção de dispneia durante AVD no grupo treinamento de MMSS foi relatada em três estudos,(21-23) enquanto redução significativa da fadiga no grupo treinamento de MMSS, em comparação com o grupo controle, foi relatada em apenas um estudo.(21)

O treinamento de MMSS pode ser considerado seguro para pacientes com DPOC, pois nenhuma deterioração da doença ou quaisquer outros efeitos adversos graves, que poderiam levar à internação ou morte, foram relatados.

Um dos principais objetivos da reabilitação pulmonar, especialmente do treinamento de MMSS, é a melhora na execução de AVD em pacientes com DPOC. Os achados desta revisão revelaram que o treinamento de MMSS é seguro e pode melhorar significativamente a execução de AVD que envolvem os MMSS nesses pacientes. No entanto, as limitações dos estudos selecionados e seus resultados contraditórios referentes aos sintomas de dispneia e fadiga durante AVD que envolvem os MMSS trazem incerteza quanto aos resultados. São necessárias mais pesquisas, por meio de ensaios controlados randomizados bem desenhados, para definir a eficácia do treinamento de MMSS e os parâmetros adequados para esse tipo de treinamento em pacientes com DPOC.

CONTRIBUIÇÕES DOS AUTORES

Todos os autores contribuíram para a preparação do manuscrito (desenho do estudo, interpretação dos achados e esboço, redação e revisão do manuscrito) e leram e aprovaram a versão final para submissão.

REFERÊNCIAS

1. Vestbo J, Hurd SS, Agusti AG, Jones PW, Vogelmeier C, Anzueto A, et al. Global strategy for the diagnosis, management, and prevention of chronic obstructive pulmonary disease: GOLD executive summary. Am J Respir Crit Care Med. 2013;187(4):347-365. https://doi.org/10.1164/rccm.201204-0596PP
2. O'Donnell DE, Laveneziana P. Dyspnea and activity limitation in COPD: mechanical factors. COPD. 2007;4(3):225-236. https://doi.org/10.1080/15412550701480455
3. Gigliotti F, Coli C, Bianchi R, Grazzini M, Stendardi L, Castellani C, et al. Arm exercise and hyperinflation in patients with COPD: effect of arm training. Chest. 2005;128(3):1225-1232. https://doi.org/10.1378/chest.128.3.1225
4. Velloso M, Stella SG, Cendon S, Silva AC, Jardim JR. Metabolic and ventilatory parameters of four activities of daily living accomplished with arms in COPD patients. Chest. 2003;123(4):1047-1053. https://doi.org/10.1378/chest.123.4.1047
5. Maltais F, Decramer M, Casaburi R, Barreiro E, Burelle Y, Debigaré R, et al. An official American Thoracic Society/European Respiratory Society statement: update on limb muscle dysfunction in chronic obstructive pulmonary disease. Am J Respir Crit Care Med. 2014;189(9):e15-e62. https://doi.org/10.1164/rccm.201402-0373ST
6. Kobayashi A, Yoneda T, Yoshikawa M, Ikuno M, Takenaka H, Fukuoka A, et al. The relation of fat-free mass to maximum exercise performance in patients with chronic obstructive pulmonary disease. Lung. 2000;178(2):119-127. https://doi.org/10.1007/s004080000014
7. Gea J, Orozco-Levi M, Barreiro E, Ferrer A, Broquetas J. Structural and functional changes in the skeletal muscles of COPD patients: the "compartments" theory. Monaldi Arch Chest Dis. 2001;56(3):214-224.
8. Tangri S, Woolf CR. The breathing pattern in chronic obstructive lung disease during the performance of some common daily activities. Chest. 1973;63(1):126-127. https://doi.org/10.1378/chest.63.1.126
9. Breslin EH. Dyspnea-limited response in chronic obstructive pulmonary disease: reduced unsupported arm activities. Rehabil Nurs. 1992;17(1):12-20. https://doi.org/10.1002/j.2048-7940.1992.tb01254.x
10. Lima VP, Iamonti VC, Velloso M, Janaudis-Ferreira T. Physiological Responses to Arm Activity in Individuals With Chronic Obstructive Pulmonary Disease Compared With Healthy Controls: A SYSTEMATIC REVIEW. J Cardiopulm Rehabil Prev. 2016;36(6):402-412. https://doi.org/10.1097/HCR.0000000000000190
11. Bolton CE, Bevan-Smith EF, Blakey JD, Crowe P, Elkin SL, Garrod R, et al. British Thoracic Society guideline on pulmonary rehabilitation in adults. Thorax. 2013;68 Suppl 2:ii1-ii30. https://doi.org/10.1136/thoraxjnl-2013-203808
12. Spruit MA, Singh SJ, Garvey C, ZuWallack R, Nici L, Rochester C, et al. An official American Thoracic Society/European Respiratory Society statement: key concepts and advances in pulmonary rehabilitation [published correction appears in Am J Respir Crit Care Med. 2014 Jun 15;189(12):1570]. Am J Respir Crit Care Med. 2013;188(8):e13-e64.
13. Liberati A, Altman DG, Tetzlaff J, Mulrow C, Gotzsche PC, Ioannidis JP, et al. The PRISMA statement for reporting systematic reviews and meta-analyses of studies that evaluate health care interventions: explanation and elaboration. PLoS Med. 2009;6(7):e1000100. https://doi.org/10.1371/journal.pmed.1000100
14. Moher D, Liberati A, Tetzlaff J, Altman DG; PRISMA Group. Preferred reporting items for systematic reviews and meta-analyses: the PRISMA statement [published correction appears in Int J Surg. 2010;8(8):658]. Int J Surg. 2010;8(5):336-341. https://doi.org/10.1016/j.ijsu.2010.02.007
15. McKeough ZJ, Velloso M, Lima VP, Alison JA. Upper limb exercise training for COPD. Cochrane Database Syst Rev. 2016;11(11):CD011434. https://doi.org/10.1002/14651858.CD011434.pub2
16. Verhagen AP, de Vet HC, de Bie RA, Kessels AG, Boers M, Bouter LM, et al. The Delphi list: a criteria list for quality assessment of randomized clinical trials for conducting systematic reviews developed by Delphi consensus. J Clin Epidemiol. 1998;51(12):1235-1241. https://doi.org/10.1016/S0895-4356(98)00131-0
17. Maher CG, Sherrington C, Herbert RD, Moseley AM, Elkins M. Reliability of the PEDro scale for rating quality of randomized controlled trials. Phys Ther. 2003;83(8):713-721. https://doi.org/10.1093/ptj/83.8.713
18. de Morton NA. The PEDro scale is a valid measure of the methodological quality of clinical trials: a demographic study. Aust J Physiother. 2009;55(2):129-133. https://doi.org/10.1016/S0004-9514(09)70043-1
19. Ries AL, Ellis B, Hawkins RW. Upper extremity exercise training in chronic obstructive pulmonary disease. Chest. 1988;93(4):688-692. https://doi.org/10.1378/chest.93.4.688
20. Marrara KT, Marino DM, de Held PA, de Oliveira Junior AD, Jamami M, Di Lorenzo VA. Different physical therapy interventions on daily physical activities in chronic obstructive pulmonary disease. Respir Med. 2008;102(4):505-511. https://doi.org/10.1016/j.rmed.2007.12.004
21. Costi S, Crisafulli E, Degli Antoni F, Beneventi C, Fabbri LM, Clini EM. Effects of unsupported upper extremity exercise training in patients with COPD: a randomized clinical trial. Chest. 2009;136(2):387-395. https://doi.org/10.1378/chest.09-0165
22. Janaudis-Ferreira T, Hill K, Goldstein RS, Robles-Ribeiro P, Beauchamp MK, Dolmage TE, et al. Resistance arm training in patients with COPD: A Randomized Controlled Trial. Chest. 2011;139(1):151-158. https://doi.org/10.1378/chest.10-1292
23. Calik-Kutukcu E, Arikan H, Saglam M, Vardar-Yagli N, Oksuz C, Inal-Ince D, et al. Arm strength training improves activities of daily living and occupational performance in patients with COPD. Clin Respir J. 2017;11(6):820-832. https://doi.org/10.1111/crj.12422
24. Vogelmeier CF, Criner GJ, Martinez FJ, Anzueto A, Barnes PJ, Bourbeau J, et al. Global Strategy for the Diagnosis, Management, and Prevention of Chronic Obstructive Lung Disease 2017 Report. GOLD Executive Summary. Am J Respir Crit Care Med. 2017;195(5):557-582. https://doi.org/10.1164/rccm.201701-0218PP
25. Skumlien S, Hagelund T, Bjørtuft O, Ryg MS. A field test of functional status as performance of activities of daily living in COPD patients. Respir Med. 2006;100(2):316-323. https://doi.org/10.1016/j.rmed.2005.04.022
26. Dechman G, Scherer SA. Outcome Measures in Cardiopulmonary Physical Therapy: Focus on the Glittre ADL-Test for People with Chronic Obstructive Pulmonary Disease. Cardiopulm Phys Ther J. 2008;19(4):115-118. https://doi.org/10.1097/01823246-200819040-00003
27. Borge CR, Hagen KB, Mengshoel AM, Omenaas E, Moum T, Wahl AK. Effects of controlled breathing exercises and respiratory muscle training in people with chronic obstructive pulmonary disease: results from evaluating the quality of evidence in systematic reviews. BMC Pulm Med. 2014;14:184. https://doi.org/10.1186/1471-2466-14-184
28. O'Donnell DE, Webb KA, Neder JA. Lung hyperinflation in COPD: applying physiology to clinical practice. COPD Research Pract. 2015;1:4. https://doi.org/10.1186/s40749-015-0008-8
29. Hayen A, Herigstad M, Pattinson KT. Understanding dyspnea as a complex individual experience. Maturitas. 2013;76(1):45-50. https://doi.org/10.1016/j.maturitas.2013.06.005
30. Karanicolas PJ, Farrokhyar F, Bhandari M. Practical tips for surgical research: blinding: who, what, when, why, how?. Can J Surg. 2010;53(5):345-348.
31. Schulz KF, Grimes DA. Blinding in randomised trials: hiding who got what. Lancet. 2002;359(9307):696-700. https://doi.org/10.1016/S0140-6736(02)07816-9
32. Costi S, Di Bari M, Pillastrini P, D'Amico R, Crisafulli E, Arletti C, et al. Short-term efficacy of upper-extremity exercise training in patients with chronic airway obstruction: a systematic review. Phys Ther. 2009;89(5):443-455. https://doi.org/10.2522/ptj.20070368
33. Pan L, Guo YZ, Yan JH, Zhang WX, Sun J, Li BW. Does upper extremity exercise im-prove dyspnea in patients with COPD? A meta-analysis. Respir Med. 2012;106(11):1517-1525. https://doi.org/10.1016/j.rmed.2012.08.002

Indexes

Development by:

© All rights reserved 2024 - Jornal Brasileiro de Pneumologia