Continuous and bimonthly publication
ISSN (on-line): 1806-3756

Licença Creative Commons
6667
Views
Back to summary
Open Access Peer-Reviewed
Artigo Original

Tendência da prevalência de asma autorreferida no Brasil de 2003 a 2013 em adultos e fatores associados à prevalência

Trend of self-reported asthma prevalence in Brazil from 2003 to 2013 in adults and factors associated with prevalence

Felipe Moraes dos Santos1,a, Karynna Pimentel Viana1,b, Luciana Tarbes Saturnino1,c, Evelyn Lazaridis1,d, Mariana Rodrigues Gazzotti1,e, Rafael Stelmach2,f, Claudia Soares1,g

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37562017000000328

ABSTRACT

Objectives: To determine the trend of self-reported asthma diagnosed prevalence and to describe the factors associated with asthma in Brazilian adults. Method: Epidemiological cross-sectional study based on databases analysis from three national household surveys: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2003, PNAD 2008 and Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013. Participants between 18-45 years old were included. Trend analysis of asthma diagnosed prevalence was conducted using a logistic general linear model. A hierarchical logistic regression model was used to select factors significantly associated with asthma prevalence. Results: Asthma diagnosed prevalence was 3.6% (2003), 3.7% (2008) and 4.5% (2013), showing a statistically significant increased trend. Asthma diagnosed prevalence also increased when analysed by gender (annual change for men: 2.47%, p < 0.003; women: 2.16%, p < 0.001), urban area (annual change for urban: 2.15%, p < 0.001; rural: 2.69%, p = 0.072), healthcare insurance status (annual change without healthcare insurance: 2.18%, p < 0.001; with healthcare insurance: 1.84%, p = 0.014), and geographic regions (annual change North: 4.68%, p < 0.001; Northeast: 4.14%, p < 0.001; and Southeast: 1.84%, p = 0.025). Female gender, obesity, living in urban areas and depression were associated with asthma diagnosed prevalence. Discussion: PNAD and PNS surveys allow for a very large, representative community-based sample of the Brazilian adults to investigate the asthma prevalence. From 2003 to 2013, the prevalence of self-reported physician diagnosis of asthma increased, especially in the North and Northeast regions. Gender, region of residence, household location (urban/rural), obesity, and depression diagnosis seem to play significant roles in the epidemiology of asthma in Brazil.

Keywords: Adults; Asthma; Logistic models; Prevalence; Risk factors.

RESUMO

Objetivos: Determinar a tendência da prevalência de diagnóstico de asma autorreferida e descrever os fatores associados à asma em adultos brasileiros. Método: Estudo transversal de análise de dados de três pesquisas domiciliares nacionais: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2003, PNAD 2008 e Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013. Participantes entre 18 e 45 anos foram incluídos. A análise de tendência da prevalência do diagnóstico de asma foi realizada utilizando modelo logístico linear. Aplicou-se o modelo de regressão logística hierárquico para selecionar fatores significativamente associados à prevalência de asma. Resultados: A prevalência do diagnóstico de asma foi de 3,6% (2003), 3,7% (2008) e 4,5% (2013), apresentando tendência de elevação significativa. A prevalência do diagnóstico de asma também se elevou quando analisada por sexo (variação anual entre homens: 2,47%, p < 0,003; mulheres: 2,16%, p < 0,001), área urbana (variação anual: 2,15% p < 0,001), plano de saúde (variação anual sem plano: 2,18%, p < 0,001; com plano: 1,84%, p = 0,014) e regiões geográficas (variação anual Norte: 4,68%, p < 0,001; Nordeste 4,14%, p < 0,001; e Sudeste 1,84%, p = 0,025). Sexo feminino, obesidade, viver em áreas urbanas e depressão foram associados positivamente com a prevalência de diagnóstico de asma. Discussão: PNAD e PNS são bases populacionais representativas de adultos brasileiros que possibilitam a investigação da prevalência de asma. De 2003 a 2013, a prevalência de diagnóstico autorreferido de asma aumentou, especialmente nas regiões Norte e Nordeste. Sexo, região geográfica e área de residência (urbana/rural), obesidade e diagnóstico de depressão parecem desempenhar papéis significativos na epidemiologia da asma no Brasil.

Palavras-chave: Adultos; Asma; Modelos logísticos; Prevalência; Fatores de risco.

INTRODUÇÃO

A asma é uma doença crônica heterogênea caracterizada por ataques recorrentes de falta de ar e chiado, que variam em gravidade e frequência de pessoa para pessoa.(1,2) Os fatores de risco comuns da asma incluem alergias, poluição do ar, obesidade, infecções respiratórias virais e exposições ocupacionais.(3) A asma é um problema de saúde global importante, e estima-se que 235 milhões de pessoas vivem com a condição no mundo. Mais de 80% das mortes por asma ocorrem em países de renda baixa ou média-baixa. A prevalência de asma varia de acordo com a localização geográfica, clima, estilo de vida e desenvolvimento econômico de uma região específica do mundo.(1,2) No Brasil, estima-se que cinco pacientes morrem por dia(4) por causa da asma, e que há uma média de 100.000 internações por ano no sistema público de saúde, o que reforça o impacto da doença.(4)

Ainda que a asma afete todas as faixas etárias,(2) o foco da pesquisa no Brasil tem estado principalmente em populações de crianças e adolescentes até o momento. Por exemplo, no Brasil, a Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) indicou alta prevalência de sintomas de asma (23,2%) e diagnóstico anterior de asma (12,4%) em crianças e adolescentes.(5) Três das cinco capitais da PeNSE apresentaram prevalência crescente dos sintomas de asma quando comparadas com o estudo internacional International Study of Asthma and Allergies in Childhood (ISAAC).(5) Existem apenas duas publicações com dados sobre adultos; uma foi realizada em 2002-2003, incluindo pessoas de 18 a 45 anos, e a outra utilizou a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) em 2013, para indivíduos com mais de 18 anos.(6,7) Até hoje, nenhum estudo analisou as tendências da prevalência de asma na população adulta.

Estudos locais, majoritariamente derivados da pesquisa ISAAC, reportaram que a prevalência de asma em adolescentes esteve associada ao sexo feminino, ao fato de ter animais de estimação, pais fumantes, rinite e outros fatores.(8) Porém, só há dois estudos que descrevem os fatores associados à asma em adultos, que estão restritos à área urbana de Pelotas, no sul do Brasil, realizados em 2000 e em 2010.(7,9)

Para melhorar o entendimento sobre a magnitude da asma em adultos brasileiros, e sobre as tendências da prevalência de asma, este estudo objetivou:
Determinar a tendência da prevalência de diagnóstico de asma autorreferido no Brasil, de 2003 a 2013, em adultos por sexo, plano de saúde, local de moradia (urbano e rural) e região geográfica
Descrever os fatores associados à prevalência de diagnóstico de asma autorreferido em adultos brasileiros.

MÉTODO

Este é um estudo epidemiológico e transversal, que tem como base a análise de três pesquisas nacionais: Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) 2003,(10) PNAD 2008(11) e Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2013.(12) Os dados da PNAD e da PNS estão disponíveis ao público pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no site www.ibge.gov.br.

A PNAD é uma pesquisa domiciliar realizada desde 1967 no Brasil, sendo aplicada anualmente desde 1971. A partir de 1988, passou a incluir um suplemento de saúde, coletando dados sobre os aspectos da saúde dos residentes em intervalos de cinco anos. O suplemento de saúde da PNAD tornou-se uma pesquisa independente em 2013, e deu origem à PNS. Tanto a PNAD quanto a PNS têm amostragem complexa. Para a PNAD, foram coletadas informações sobre todos os moradores dos domicílios da amostra,(13) enquanto na PNS somente um residente com 18 anos ou mais foi selecionado por amostragem aleatória simples.(14) Mais informações sobre os métodos amostrais da PNAD e da PNS podem ser encontrados na literatura.(13,14)

Resumidamente, a PNAD 2003 e a PNAD 2008 possuem uma amostragem probabilística dos domicílios. No primeiro estágio, os municípios foram selecionados; alguns foram classificados como autorrepresentativos, com 100% da seleção probabilística, e outros como não representativos, sendo que a seleção probabilística foi proporcional à população residente. No segundo estágio, os setores censitários foram selecionados, sendo que a seleção probabilística era proporcional ao número de domicílios existentes nos setores censitários. No terceiro estágio, os domicílios foram amostrados com probabilidade igual em cada setor do censo. Foram coletados dados sobre todos os moradores dos domicílios selecionados.

Por outro lado, a amostra da PNS de 2013 é uma subamostra das pesquisas domiciliares integradas do IBGE. As unidades amostrais primárias (PSUs) formaram-se por unidades de área, que foram selecionadas para se adequar a diferentes pesquisas de domicílio integradas do IBGE. As PSUs foram estratificadas usando quatro critérios:
administrativo: capital, área metropolitana ou região integrada de desenvolvimento econômico, e unidade federativa;
geográfico: subdivisão de capitais e outras grandes cidades em mais estratos;
situação: urbana ou rural;
estatístico: estratos homogêneos usando informações sobre a renda total dos domicílios e o número de domicílios permanentes, para melhorar a precisão das estimativas.

Finalmente, a amostra da PNS foi selecionada em três estágios. O primeiro estágio da seleção foi uma subamostra da PSU, com probabilidade proporcional ao tamanho (considerando o número de domicílios permanentes em cada unidade, usando o Censo 2010 como referência), em cada estrato da amostra total. No segundo estágio, houve uma seleção de domicílios por amostragem aleatória simples em cada PSU selecionada no primeiro estágio. Na última fase, um adulto do domicílio (≥ 18 anos) foi selecionado por meio da amostragem aleatória simples para responder a versão completa da entrevista. Informações básicas sobre todos os residentes também foram coletadas.

Os indivíduos que participaram dos questionários responderam as perguntas em uma entrevista conduzida por entrevistadores treinados. Para 2008 e 2013, os entrevistadores usaram um assistente digital (PDA) para ajudá-los nas entrevistas.

Os três questionários representam a população brasileira, suas regiões, unidades federativas e nove regiões metropolitanas, exceto a PNAD 2003, cujas amostras não incluíram domicílios localizados na zona rural da região Norte, fornecendo uma fonte de dados única para gerar estimativas nacionais e regionais sobre a prevalência da asma.

De acordo com os objetivos do estudo, uma análise de tendência foi realizada usando os três estudos brasileiros já mencionados; os fatores associados à prevalência da asma diagnosticada foram investigados usando somente a pesquisa de 2013. Todos os participantes com idades entre 18 e 45 anos que participaram dessas pesquisas foram incluídos no estudo. Excluímos da análise aqueles com mais de 45 anos devido à alta prevalência de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) em adultos mais velhos, com diagnóstico errado entre asma e DPOC, o que poderia gerar um viés nos resultados da prevalência de asma. As amostras da PNAD e da PNS foram compostas da seguinte forma:
384.834 indivíduos de 133.255 domicílios foram analisados na PNAD 2003;
391.868 indivíduos de 150.591 domicílios foram analisados na PNAD 2008;
60.202 indivíduos de 64.348 domicílios foram analisados na PNS 2013.
Os casos de asma foram identificados com as seguintes questões:
"Um medico ou professional de saúde já disse que você tem bronquite ou asma?" (PNAD 2003(10) e 2008);(11)
"Algum medico já diagnosticou você com asma (ou bronquite asmática)?" (PNS 2013).(12)

A pergunta usada na PNS 2013 foi mais específica para avaliar a prevalência de asma diagnosticada em comparação às outras duas pesquisas, já que não incluiu a bronquite, e o diagnóstico estava limitado a algum realizado somente por um médico, e não por outro profissional de saúde, como em 2003 e em 2008.

As taxas de prevalência de diagnóstico de asma autorreferido foram calculadas pela proporção de adultos que reportaram "Sim" para qualquer uma das duas perguntas pelo total da população adulta para cada ano (2003, 2008 e 2013). A média anual de mudança na prevalência foi calculada pela média geométrica com as taxas entre 2003 e 2013.

Inicialmente, equações de estimativa generalizadas com uma matriz de identidade foram consideradas para analisar as tendências da prevalência de asma. Porém, as correlações foram muito baixas entre o tempo e todas as variáveis do estudo (ρ < 0,06), então, um modelo logístico linear geral foi utilizado. A análise de tendência da prevalência de asma foi conduzida de modo geral e estratificada por sexo, status do plano de saúde, localização do domicílio e regiões geográficas. Testes de Wald (t) foram aplicados para testar a significância das tendências observadas.

O modelo de regressão hierárquico logístico foi utilizado para avaliar estatisticamente os fatores significativos associados à prevalência de asma diagnosticada. O grupo de variáveis selecionadas consideraram uma versão adaptada do modelo conceitual desenvolvido por Bernat et al.(15) para sintomas respiratórios e disponibilidade das variáveis nas bases de dados da PNAD/PNS. Sexo (masculino/feminino), idade (18-25/26-35/36-45 anos), raça/etnia (branco/preto/outros), localização do domicílio (urbano/rural) e região (Norte/Nordeste/Sul/Sudeste/Centro-Oeste) foram selecionados como variáveis demográficas (primeiro bloco de variáveis). Nível de escolaridade (nenhuma instrução/educação básica ou equivalente/ensino médio completo ou equivalente/faculdade ou equivalente) e plano de saúde (sim/não) foram selecionados como fatores socioeconômicos (segundo bloco de variáveis). Aspectos comportamentais, estado de saúde e características do domicílio compuseram o terceiro bloco de variáveis: material da casa (acabamento/outros), tipo de fogão (gás de cozinha, gás encanado ou eletricidade/outros), fumante ou não (fumante atual/ex-fumante/nunca foi fumante), acesso ao sistema de saúde nas últimas duas semanas (sim/não), índice de massa corporal (IMC) (baixo peso (< 18,5 kg/m2), eutrofia (18,5-24,9 kg/m2), acima do peso (25-29,9 kg/m2), e obesidade (≥ 30 kg/m2), depressão (sim/não) e doença mental (sim/não).

O método backward de seleção foi utilizado, e incluiu todas as variáveis do primeiro bloco, retendo todas as covariáveis quando p < 0,05. Depois, todas as variáveis do segundo bloco foram adicionadas e retidas se p < 0,05; as variáveis do primeiro bloco não foram retiradas do modelo, mesmo se ocorresse perda de significância estatística. Este processo foi repetido para as variáveis do terceiro bloco. A razão de chance (RC), e o respectivo intervalo de confiança de 95% (IC95%) derivaram do modelo final de regressão ajustado.

Os dados foram analisados considerando os pesos amostrais e, também, a informação estrutural do plano de amostragem da PNAD/PNS - ou seja, os pesos amostrais foram usados para corrigir as medidas de variância de acordo com o plano amostral de cada questionário, permitindo a comparabilidade entre a PNAD e a PNS.
A versão 19 do Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) foi usada para a análise.

Este estudo apresenta análises de bases de dados de três pesquisas nacionais de domicílio, cujos dados não estão identificados. Além disso, não houve interação com pessoas para coletar dados adicionais, sendo utilizados exclusivamente os dados apresentados nas bases de dados do IBGE. Então, não foi necessário buscar aprovação de um comitê de ética para conduzir a pesquisa e elaborar o estudo.

RESULTADOS

A prevalência de asma diagnosticada no Brasil era de 3,6% em 2003; 3,7% em 2008; e 4,5% em 2013, representando um crescimento médio anual de 2,3% entre 2003 e 2013 (p < 0,001). A prevalência mais alta de asma foi observada entre mulheres do que entre homens, em todos os anos, embora a mudança anual tenha sido maior para os homens (2,5%), em comparação às mulheres (2,2%) (Figura 1).
 




A prevalência da asma diagnosticada também cresceu nas áreas urbanas (2,2%) e rurais (2,7%), embora o aumento não tenha sigo estatisticamente significante nas áreas rurais (Figura 2). Tanto aqueles com (1,8%) como os sem (2,2%) plano de saúde demonstraram aumento na prevalência da asma (Figura 3).
 



 



Aumentos significativos na prevalência da asma foram observados no Norte, Nordeste e Sudeste, mas não no Sul e no Centro-Oeste (Figura 4).
 



Em relação aos fatores associados à prevalência da asma, a depressão foi o fator mais fortemente associado (Tabela 1). Em seguida, morar em áreas urbanas, ser do Sul, Sudeste e Nordeste, do sexo feminino e com obesidade também estiveram associados à prevalência de asma. A idade avançada esteve inversamente associada. Outras variáveis, incluindo raça/etnia, escolaridade, tipo de fogão e material usado na casa, ser ou não fumante e ter tido acesso ao sistema de saúde nas últimas duas semanas não estavam incluídas no modelo final.
 



DISCUSSÃO

Os resultados do nosso estudo demonstraram aumento da prevalência de asma entre os adultos brasileiros - de modo geral e estratificados por sexo, plano de saúde, localização do domicílio (urbano ou rural) e região geográfica. A análise de regressão multivariável mostrou associação positiva entre a prevalência de asma e a depressão, o fato de morar em áreas urbanas, ser do Nordeste, Sudeste ou Norte, do sexo feminino e ter obesidade.

A prevalência crescente de asma foi descrita entre adultos de outros países.(16-19) Porém, no Brasil, antes do presente estudo, resultados semelhantes só foram descritos para crianças(20) e adolescentes.(5)

Uma possível explicação para o crescimento da prevalência de asma no Brasil é a melhoria geral nos diagnósticos dos serviços primários de saúde, e também das equipes de saúde da família ao longo do tempo.(21) O aumento no acesso à saúde nos últimos anos pode explicar o aumento da prevalência da asma, já que mais pessoas com asma estariam sendo diagnosticadas. Outra hipótese é a expansão da urbanização,(18,22) já que evidências mostram que a asma e seus sintomas ocorrem mais frequentemente em áreas urbanas em relação às rurais. Esta associação também foi encontrada no nosso estudo. Estudos anteriores sugeriram que esta observação pode ter relação a diferenças em termos de exposição a riscos ambientais, classe socioeconômica e acesso ao sistema de saúde.(18)

É importante lembrar que a prevalência de asma diagnosticada em adultos variou consideravelmente entre as regiões. Taxas mais altas foram observadas no Sul e no Sudeste, mas o aumento na prevalência foi mais expressivo no Norte e no Nordeste. Porém, não houve evidência de que a melhoria no acesso à saúde no Norte e no Nordeste tenha sido maior do que em outras regiões nos últimos anos. Na verdade, Nunes et al.(23) avaliaram a tendência de tempo da demanda e da falta de acesso aos serviços públicos de saúde no Brasil de 1998 a 2013, e a maior melhoria no acesso foi demonstrada nas regiões Sudeste e Sul. Além disso, o aumento da urbanização de 2000 a 2010(24) no Norte, Nordeste e Sul foram semelhantes, de acordo com relatórios estatísticos nacionais, o que é o oposto do nosso estudo, que mostrou aumento mais significativo da asma nas regiões Norte e Nordeste. Nossos achados reforçam a importância de realizar outros estudos especificamente investigando as mudanças geográficas na prevalência de asma no Brasil, preferencialmente considerando as disparidades de cada região. Isso é especialmente importante, já que a prevalência é influenciada por taxas de mortalidade, que são diferentes entre as regiões.(25)

A associação positiva da asma entre as mulheres também esteve descrita em outros estudos.(5,7,26) Uma possível explicação para este fato pode ser atribuída a mudanças hormonais e comportamentais relacionadas ao tempo de puberdade e polimorfismos genéticos, que podem levar as mulheres a estarem mais suscetíveis à asma na vida adulta.(5,26) Porém, como nosso estudo avaliou a prevalência de asma diagnosticada, o aumento da prevalência em mulheres pode estar relacionado ao maior uso do sistema de saúde por elas.(27)

Com relação à associação entre asma e depressão, há 2,1 vezes mais chances de ocorrer relato de asma diagnosticada em pacientes com depressão. Porém, não foi possível avaliar temporalidade entre depressão e asma, que é uma limitação inerente do desenho transversal do estudo. Porém, uma meta-análise de estudos prospectivos(28) apontaram a depressão como um marcador para o início da asma em adultos. Esta descoberta enfatiza a importância de médicos e profissionais da saúde estarem conscientes deste potencial para o aparecimento de asma em seus pacientes com depressão.

Os resultados também mostraram que a obesidade esteve associada com a asma. A relação entre obesidade e asma foi observada em outros estudos, e é complexa.(29-32) Um estudo transversal recente(33) mostrou que o IMC médio aumentou significativamente em grupos de asmáticos com idades entre 18 e 60 anos, em comparação ao grupo controle de pacientes saudáveis, e o resultado foi estatisticamente significante (p < 0,001). Em alguns casos, pacientes com asma, por conta de seu estilo de vida cada vez mais sedentário e o uso de corticoides, desenvolvem obesidade mais tarde, causando a piora da doença.(31,34) Outros estudos também mostraram que a obesidade pode afetar a expressão da asma,(35) a exacerbação da asma, reduzindo o controle da doença e a resposta a esteroides. Por exemplo, um estudo realizado no Brasil com uma coorte de pacientes obesos com asma moderada a grave, mostrou um ganho no controle da asma depois de intervenções na dieta, nos medicamentos e na reabilitação.(36,37) Além disso, estudos sugerem que programas que aumentam oportunidades de realizar atividades físicas e escolha de alimentos saudáveis podem diminuir a prevalência da obesidade e podem afetar diretamente a prevalência e a gravidade da asma.(34)

A PNAD 2003, PNAD 2008 e a PNS 2013 são pesquisas nacionalmente representativas desenhadas para avaliar o estado de saúde da população brasileira, e sua representatividade é uma força em nosso estudo. Porém, há algumas limitações. O aumento da prevalência de asma observado em nosso estudo provavelmente está subestimado devido a duas mudanças na questão adotada na PNS 2013, em comparação à pergunta da PNAD 2003 e da PNAD 2008. A questão usada na PNS 2013 forneceu uma definição mais específica para a avaliação da prevalência de asma diagnosticada, já que não incluiu o termo bronquite e restringiu a asma ao diagnóstico de um médico, em vez de um profissional de saúde de modo geral - como foi na PNAD 2003 e 2008. Mesmo com uma pergunta mais específica no último questionário, observamos um aumento na prevalência de asma nos últimos anos. Além disso, para evitar a inclusão de outras doenças respiratórias, por exemplo, DPOC, limitamos a análise a pacientes com idades entre 18 e 45 anos, já que a prevalência de DPOC nesta faixa etária é menor do que em pacientes mais velhos.

Outra limitação da nossa análise foi que a exclusão da área rural na PNAD 2003 pode ter superestimado a prevalência no Norte em 2003, já que somente as áreas urbanas foram incluídas. Apesar disso, a prevalência de asma observada na região Norte em 2003 foi menor do que 2008 e 2013.

A causalidade reversa é outra limitação deste estudo, já que a temporalidade não pôde ser verificada em estudos transversais. Mudanças no tempo de exposição podem gerar vieses nas associações observadas. Por exemplo, indivíduos com asma morando nas áreas rurais/urbanas ou em regiões brasileiras podem ter vivido em um local durante a infância e, depois, na vida adulta, em outro local. Isso é importante porque a maioria (81,1%) dos pacientes com asma identificados na PNS 2013 foram diagnosticados na infância (dados não demonstrados). Além disso, é importante reforçar que o aumento na prevalência de asma pode não significar que mais pessoas tenham sido afetadas pela asma, mas sim ser resultado de mais pessoas terem acesso aos serviços de saúde e diagnóstico. Outros estudos avaliando não somente o diagnóstico de asma autorreferido em adultos são necessários para entender se a prevalência do diagnóstico de asma autorreferido aumenta devido a mudanças no acesso ou outras causas durante o ano.

Nosso estudo sugere que a prevalência de asma diagnosticada aumentou no Brasil, o que pode gerar impacto para a sociedade e para o sistema de saúde por conta da asma e suas complicações. Também identificamos que as tendências da prevalência de asma variam de acordo com a região geográfica, e estiveram associadas a fatores como depressão, obesidade, sexo feminino e áreas urbanas. Esses resultados podem ajudar a refletir sobre o desenvolvimento de intervenções efetivas para o diagnóstico precoce da asma e estratégias preventivas para o controle da doença nesses grupos. Devido ao tamanho do país e da geografia diferenciada, a criação de um programa de manejo da doença, melhorias nas capacidades dos profissionais de saúde primária, e um aumento na conscientização sobre a asma na sociedade são iniciativas possíveis.(25)

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem o apoio editorial e da revisão, realizados por Oscar David Díaz-Sotelo, from Random Ltd.; os serviços de análise estatística realizados por Fábio Hoki, da LEE; e Cinthia Torreão e Danielle Silva, pelo apoio operacional como funcionárias da GlaxoSmithKline (GSK). O apoio de LEE e Random foi financiado pela GSK.

REFERÊNCIAS

1. World Health Organization. Chronic respiratory diseases: asthma. Geneva: WHO; 2016 [cited 2017 Mar. 15]. Available from: http://www.who.int/respiratory/asthma/en/
2. Global Initiative for Asthma. Report 2017. Global Initiative for Asthma; 2017 [cited 2017 Apr. 27]. Available from: www.ginasthma.org
3. Alhassan S, Hattab Y, Bajwa O, Bihler E, Singh AC. Asthma. Crit Care Nurs Q. 2016;39(2):110-23. https://doi.org/10.1097/CNQ.0000000000000104
4. Cardoso TA, Roncada C, Silva ERD, Pinto LA, Jones MH, Stein RT, et al. The impact of asthma in Brazil: a longitudinal analysis of data from a Brazilian national database system. J Bras Pneumol. 2017;43(3):163-8. https://doi.org/10.1590/S1806-37562016000000352
5. Barreto ML, Ribeiro-Silva RC, Malta DC, Oliveira-Campos M, Andreazzi MA, Cruz AA. Prevalence of asthma symptoms among adolescents in Brazil: National Adolescent School-based Health Survey (PeNSE 2012). Rev Bras Epidemiol. 2014;17(Suppl. 1):106-15. https://doi.org/10.1590/1809-4503201400050009
6. Menezes AM, Wehrmeister FC, Horta B, Szwarcwald CL, Vieira ML, Malta DC. Prevalence of asthma medical diagnosis among Brazilian adults: National Health Survey, 2013. Rev Bras Epidemiol. 2015;18(Suppl. 2):204-13. https://doi.org/10.1590/1980-5497201500060018
7. Macedo SEC, Menezes AMB, Knorst M, Dias-da-Costa JS, Gigante DP, Olinto MTA, et al. Fatores de risco para a asma em adultos, Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. Cad Saúde Pública. 2007;23(4):863-74. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2007000400014
8. Solé D, Camelo-Nunes IC, Wandalsen GF, Mallozi MC. Asthma in children and adolescents in Brazil: contribution of the International Study of Asthma and Allergies in Childhood (ISAAC). Rev Paul Pediatr. 2014;32(1):114-25. https://dx.doi.org/10.1590%2FS0103-05822014000100018
9. Fiori NS, Gonçalves H, Dumith SC, Cesar MADC, Menezes AMB, Macedo SEC. Ten-year trends in prevalence of asthma in adults in southern Brazil: comparison of two population-based studies. Cad Saúde Pública. 2012;28(1):135-44. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012000100014
10. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2003. Rio de Janeiro: IBGE; 2003 [cited 2017 Mar. 15]. Available from: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2003/default.shtm
11. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2008. Rio de Janeiro: IBGE; 2008 [cited 2017 Mar. 15]. Available from: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2008/default.shtm
12. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Rio de Janeiro: IBGE; 2013 [cited 2017 Mar. 15]. Available from: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/pns/2013/default.shtm
13. Silva PLN, Pessoa DGC, Lila MF. Análise estatística de dados da PNAD: incorporando a estrutura do plano amostral. Ciên Saúde Coletiva. 2002;7(4):659-70. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232002000400005
14. Souza-Júnior PRB, Freitas MPS, Antonaci GA, Szwarcwald CL. Desenho da amostra da Pesquisa Nacional de Saúde 2013. Epidemiol Serv Saúde. 2015;24(2):207-16. https://doi.org/10.5123/S1679-49742015000200003
15. Bernat AC, Oliveira MC, Rocha GC, Boing AF, Peres KG. Prevalence of respiratory symptoms and associated factors: a population-based study in adults from Lages, Santa Catarina State, Brazil. Cad Saúde Pública. 2009;25(9):1907-16. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2009000900005
16. Lundbäck B, Backman H, Lötvall J, Rönmark E. Is asthma prevalence still increasing? Expert Rev Respir Med. 2016;10(1):39-51. https://doi.org/10.1586/17476348.2016.1114417
17. Halldin CN, Doney BC, Hnizdo E. Changes in prevalence of chronic obstructive pulmonary disease and asthma in the US population and associated risk factors. Chron Respir Dis. 2015;12(1):47-60. https://doi.org/10.1177/1479972314562409
18. Jie Y, Isa ZM, Jie X, Ju ZL, Ismail NH. Urban vs. rural factors that affect adult asthma. Rev Environ Contam Toxicol. 2013;226:33-63. https://doi.org/10.1007/978-1-4614-6898-1_2
19. Gershon AS, Guan J, Wang C, To T. Trends in asthma prevalence and incidence in Ontario, Canada, 1996-2005: a population study. Am J Epidemiol. 2010;172(6):728-36. https://doi.org/10.1093/aje/kwq189
20. Wehrmeister FC, Menezes AM, Cascaes AM, Martínez-Mesa J, Barros AJ. Time trend of asthma in children and adolescents in Brazil, 1998-2008. Rev Saúde Pública. 2012;46(2):242-50. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102012005000008
21. Arantes LJ, Shimizu HE, Merchán-Hamann E. Contribuições e desafios da Estratégia Saúde da Família na Atenção Primária à Saúde no Brasil: revisão da literatura. Ciên Saúde Coletiva. 2016;21(5):1499-510. https://doi.org/10.1590/1413-81232015215.19602015
22. Solé D, Cassol VE, Silva AR, Teche SP, Rizzato TM, Bandim LC, et al. Prevalence of symptoms of asthma, rhinitis, and atopic eczema among adolescents living in urban and rural areas in different regions of Brazil. Allergol Immunopathol. 2007;35(6):248-53.
23. Nunes BP, Flores TR, Garcia LP, Chiavegatto Filho AD, Thumé E, Facchini LA. Time trend of lack of access to health services in Brazil, 1998-2013. Epidemiol Serv Saúde. 2016;25(4):777-87. https://doi.org/10.5123/S1679-49742016000400011
24. Instituto de Geografia e Estatística. Censo demográfico 1940-2010. Estatísticas do século XX. Rio de Janeiro: Instituto de Geografia e Estatística; 2007 [cited 2017 Mar. 15]. Available from: http://seriesestatisticas.ibge.gov.br/series.aspx?vcodigo=POP122
25. Stelmach R, Cruz AA. O paradoxo da asma: negligência, fardo e big data. J Bras Pneumol. 2017;43(3):159-60. http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37562017000300002
26. Postma DS. Gender differences in asthma development and progression. Gend Med. 2007;4(Suppl. B):S133-46.
27. Boccolini CS, Souza Junior PRB. Inequities in Healthcare utilization: results of the Brazilian National Health Survey, 2013. Int J Equity Health. 2016;15:150. https://doi.org/10.1186/s12939-016-0444-3
28. Gao YH, Zhao HS, Zhang FR, Gao Y, Shen P, Chen RC, et al. The relationship between depression and asthma: a meta-analysis of prospective studies. PLoS One. 2015;10(7):e0132424. https://doi.org/10.1371/journal.pone.0132424
29. Bianco A, Nigro E, Monaco ML, Matera MG, Scudiero O, Mazzarella G, et al. The burden of obesity in asthma and COPD: Role of adiponectin. Pulm Pharmacol Ther. 2017;43:20-5. https://doi.org/10.1016/j.pupt.2017.01.004
30. Tay TR, Radhakrishna N, Hore-Lacy F, Smith C, Hoy R, Dabscheck E, et al. Comorbidities in difficult asthma are independent risk factors for frequent exacerbations, poor control and diminished quality of life. Respirology. 2016;21(8):1384-90. https://doi.org/10.1111/resp.12838
31. Jartti T, Saarikoski L, Jartti L, Lisinen I, Jula A, Huupponen R, et al. Obesity, adipokines and asthma. Allergy. 2009;64(5):770-7. https://doi.org/10.1111/j.1398-9995.2008.01872.x
32. Akerman MJ, Calacanis CM, Madsen MK. Relationship between asthma severity and obesity. J Asthma. 2004;41(5):521-6.
33. Nasreen S, Nessa A, Islam MF, Sultana R, Akter R. Body mass index in adult asthmatic patients. Mymensingh Med J. 2017;26(1):12-6.
34. Brisbon N, Plumb J, Brawer R, Paxman D. The asthma and obesity epidemics: The role played by the built environment - a public health perspective. J Allergy Clin Immunol. 2005;115(5):1024-8. https://doi.org/10.1016/j.jaci.2005.02.020
35. Lugogo NL, Kraft M, Dixon AE. Does obesity produce a distinct asthma phenotype? J. Appl. Physiol. 2010;108(3):729-34. https://doi.org/10.1152/japplphysiol.00845.2009
36. Dias-Júnior SA, Reis M, de Carvalho-Pinto RM, Stelmach R, Halpern A, Cukier A. Effects of weight loss on asthma control in obese patients with severe asthma. Eur Respir J. 2014;43(5):1368-77. https://doi.org/10.1183/09031936.00053413
37. Freitas PD, Ferreira PG, Silva AG, Stelmach R, Carvalho-Pinto RM, Fernandes FL, et al. The role of exercise in a weight-loss program on clinical control in obese adults with asthma. A Randomized Controlled Trial. Am J Respir Crit Care Med. 2017;195(1):32-42. https://doi.org/10.1164/rccm.201603-0446OC

Indexes

Development by:

© All rights reserved 2024 - Jornal Brasileiro de Pneumologia