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Editorial

O diagnóstico histológico de micrometástases de tumores de pulmão

Histological diagnosis of lung cancer micrometastases

Simone Gusmão Ramos

Atualmente, o câncer pulmonar causa mais mortes que o câncer de próstata, do sistema linfático, mama e cólon, todos juntos. É a principal causa de morte por câncer nos Estados Unidos e na Europa e, no Brasil, esta estimativa vem aumentando nos últimos anos. Segundo o Instituto Nacional de Câncer, em 2008, teremos 17.810 novos casos em homens e 9.460 em mulheres, correspondendo a um risco estimado de 19/100.000 nos homens e 10/100.000 nas mulheres.(1)

A disseminação para linfonodos loco-regionais é um fator determinante no prognóstico do câncer pulmonar. Sabe-se que pacientes com estadiamento I do câncer de pulmão não-pequenas células (CPNPC) e sem metástases linfonodais detectadas podem desenvolver recidivas precoces, mesmo após a completa remoção cirúrgica do tumor. Nesses pacientes, o tempo de sobrevida estimado em 5 anos mantém-se entre 64 e 75%,(2) sugerindo que o estadiamento patológico, como rotineiramente feito com cortes histológicos corados com hematoxilina e eosina (H&E), pode estar sendo subestimado, ou seja, metástases ocultas podem não estar sendo detectadas. Portanto, a avaliação acurada da presença ou não de células tumorais nos linfonodos regionais é fundamental na determinação do estadiamento, do tratamento e do prognóstico dos pacientes com câncer pulmonar.

O maior problema, mesmo para patologistas mais experientes, é identificar a presença de células isoladas ou mesmo agrupamentos mínimos de células malignas, em cortes histológicos de rotina corados com H&E. Estas células podem passar despercebidas entre linfócitos e histiócitos sinusais e isso pode levar a um resultado falso-negativo. Na tentativa de melhorar isso, técnicas imunoistoquímicas (IMH) com diferentes anticorpos, entre eles Ber-Ep4, CAM-5.2, MNF116 ou AE1/AE3,(3,4) assim como técnicas de biologia molecular,(5) vêm sendo utilizadas na identificação de micrometástases ocultas em linfonodos regionais no CPNPC. Entretanto, o significado desses achados permanece controverso.

No trabalho conduzido por Franco et al. e publicado neste número do Jornal Brasileiro de Pneumologia,(6) é proposto um método alternativo para detectar micrometástases em linfonodos previamente negativos à técnica habitual (H&E) em CPNPC. Associou-se uma técnica mais sofisticada de biologia molecular: o arranjo em matriz de amostras teciduais (tissue microarray - TMA) com a IMH, técnica já previamente utilizada com essa finalidade. A utilização do bloco de TMA apresentou múltiplas vantagens em relação ao corte tradicional, entre elas: grande economia de reagentes e de tempo para a realização das reações, uniformização das reações, facilidade na interpretação comparativa dos casos, possibilidade de repetição das reações em múltiplos níveis do bloco e simplificação do trabalho. Além disso, diminuiu-se o custo total das reações em quase 85% e multiplicou-se por 12 a área de superfície analisada, aumentando a possibilidade de encontrar metástases ocultas. O material coletado não prejudica a análise do bloco original e ainda permite estudos genéticos mais elaborados. O mais importante: considerando o conjunto dos anticorpos utilizados, encontraram-se micrometástases em 50% dos linfonodos examinados e dados previamente como negativos. Um dado interessante do trabalho foi o achado de células neuroendócrinas positivas em cerca de 13% dos pacientes com CPNPC. Esse achado foi relacionado a um pior prognóstico dos pacientes. Embora os autores não discutam no texto o significado desse achado, é interessante observar a heterogeneidade destes tumores, implicando talvez numa futura revisão da classificação final dos tumores pulmonares mais comuns. A maioria dos trabalhos prévios utilizando somente IMH mostraram aumento (de 4 e 27,8%).(7) Portanto, a associação das duas técnicas mostrou-se realmente mais eficiente.

Infelizmente, estes dados não são facilmente comparáveis. As variáveis são muitas, incluindo o estadiamento inicial do tumor, histologia e a presença ou não de metástases linfonodais. Sem a recomendação explícita do American Joint Committee on Cancer para sua utilização nos CPNPC,(8) a maioria dos autores não especificou entre células tumorais isoladas (células tumorais únicas ou pequenos aglomerados celulares menores que 0,2 mm em seu maior diâmetro) e micrometástases (aglomerados celulares medindo entre 0,2 e 2 mm no seu maior diâmetro), generalizando o termo micrometástases. Não há dúvidas que a presença de células malignas nos linfonodos regionais em CPNPC altera o estadiamento do paciente e, conseqüentemente, seu prognóstico. entretanto, ainda não está bem definida a diferença entre esses dois achados e sua associação com outros fatores clínicos, como idade e tipo histológico do tumor, entre outros. Alguns autores não encontraram diferenças significativas quanto ao prognóstico de pacientes com linfonodos negativos e com a presença de células tumorais isoladas.(9,10) O único elemento de concordância é que quanto mais sofisticado o método, maior o número de pacientes com metástases ocultas nos linfonodos regionais, tanto que a utilização simultânea de mais uma técnica pode aumentar consideravelmente a detecção de linfonodos positivos. Portanto, enquanto não descobrirmos a real importância de células malignas isoladas ou micrometástases nos linfonodos regionais, é fundamental o desenvolvimento de novas técnicas que possam auxiliar nesta detecção. Só com grandes casuísticas, critérios histopatológicos semelhantes e análises das possíveis associações relacionadas ao prognóstico é que poderemos, num futuro breve, descobrir a real importância destes achados.

Referências

1. Instituto Nacional de Câncer - INCA [homepage on the Internet]. Brasília: Ministério da Saúde [cited 2008 Feb 4]. Estimativa 2008: Incidência de Câncer no Brasil. Available from: http://www.inca.gov.br/estimativa/2008

2. Nesbitt JC, Putnam JB Jr, Walsh GL, Roth JA, Mountain CF. Survival in early-stage non-small cell lung cancer. Ann Thorac Surg. 1995;60(2):466-72.

3. Nicholson AG, Graham AN, Pezzella F, Agneta G, Goldstraw P, Pastorino U. Does the use of immunohistochemistry to identify micrometastases provide useful information in the staging of node-negative non-small cell lung carcinomas? Lung Cancer. 1997;18(3):231-40.

4. Passlick B, Izbicki JR, Kubuschok B, Nathrath W, Thetter O, Pichlmeier U, et al. Immunohistochemical assessment of individual tumor cells in lymph nodes of patients with non-small-cell lung cancer. J Clin Oncol. 1994;12(9):1827-32.

5. Betz C, Papadopoulos T, Buchwald J, Dämmrich J, Müller-Hermelink HK. Surfactant protein gene expression in metastatic and micrometastatic pulmonary adenocarcinomas and other non-small cell lung carcinomas: detection by reverse transcriptase-polymerase chain reaction. Cancer Res. 1995;55(19):4283-6.

6. Franco MR, Parra ER, Takagaki TY, Soares FA, Capelozzi VL. Detection of micrometastases in pN0 non-small cell lung cancer: an alternative method combining tissue microarray and immunohistochemistry. J Bras Pneumol. 2008;34(3):129-135.

7. Rena O, Carsana L, Cristina S, Papalia E, Massera F, Errico L, et al. Lymph node isolated tumor cells and micrometastases in pathological stage I non-small cell lung cancer: prognostic significance. Eur J Cardiothorac Surg. 2007;32(6):863-67.

8. American Joint Committee on Cancer. AJCC cancer staging manual. 6th ed. New York: Springer; 2002.

9. Gu CD, Osaki T, Oyama T, Inoue M, Kodate M, Dobashi K, et al. Detection of micrometastatic tumor cells in pN0 lymph nodes of patients with completely resected nonsmall cell lung cancer: impact on recurrence and survival. Ann Surg. 2002;235(1):133-9.

10. Marchevsky AM, Qiao JH, Krajisnik S, Mirocha JM, McKenna RJ. The prognostic significance of intranodal isolated tumor cells and micrometastases in patients with non-small cell carcinoma of the lung. J Thorac Cardiovasc Surg. 2003;126(2):551-7.


Simone Gusmão Ramos
Professora Doutora de Patologia
Departamento de Patologia
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto
Universidade de São Paulo


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