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Artigo Original

Função pulmonar de crianças e adolescentes com bronquiolite obliterante pós-infecciosa

Pulmonary function in children and adolescents with postinfectious bronchiolitis obliterans

Rita Mattiello, Javier Mallol, Gilberto Bueno Fischer, Helena Teresinha Mocelin, Belkys Rueda, Edgar Enrique Sarria

ABSTRACT

Objective: To describe the pulmonary function in children and adolescents with postinfectious bronchiolitis oblite­rans (PIBO), as well as to evaluate potential risk factors for severe impairment of pulmonary function. Methods: The pulmonary function of 77 participants, aged 8-18 years, was assessed by spirometry and plethysmography. The following parameters were analyzed: FVC; FEV1; FEF25-75%; FEV1/FVC; RV; TLC; RV/TLC; intrathoracic gas volume; and specific airway resistance (sRaw). We used Poisson regression to investigate the following potential risk factors for severe impairment of pulmonary function: gender; age at first wheeze; age at diagnosis; family history of asthma; tobacco smoke exposure; length of hospital stay; and duration of mechanical ventilation. Results: The mean age was 13.5 years. There were pronounced decreases in FEV1 and FEF25-75%, as well as increases in RV and sRaw. These alterations are characteristic of obstructive airway disease. For the parameters that were the most affected, the mean values (percentage of predicted) were as follows: FEV1 = 45.9%; FEF25-75% = 21.5%; RV = 281.1%; RV/TLC = 236.2%; and sRaw = 665.3%. None of the potential risk factors studied showed a significant association with severely impaired pulmonary function. Conclusions: The patients with PIBO had a common pattern of severe pulmonary function impairment, characterized by marked airway obstruction and pronounced increases in RV and sRaw. The combination of spirometric and plethysmographic measurements can be more useful for assessing functional damage, as well as in the follow-up of these patients, than are either of these techniques used in isolation. Known risk factors for respiratory diseases do not seem to be associated with severely impaired pulmonary function in PIBO.

Keywords: Respiratory function tests; Airway obstruction; Bronchiolitis obliterans

RESUMO

Objetivo: Descrever a função pulmonar de crianças e adolescentes com bronquiolite obliterante pós-infecciosa (BOPI) e avaliar potenciais fatores de risco para pior função pulmonar. Métodos: A função pulmonar de 77 participantes, com idades de 8-18 anos, foi avaliada por meio de espirometria e pletismografia. Os seguintes parâmetros foram analisados: CVF, VEF1, FEF25-75%, VEF1/CVF, VR, CPT, VR/CPT, volume de gás intratorácico e specific airway resistance (sRaw, resistência específica das vias aéreas). Foi utilizada a regressão de Poisson para investigar os seguintes potenciais fatores de risco para pior função pulmonar: sexo, idade do primeiro sibilo, idade ao diagnóstico, história familiar de asma, exposição ao tabaco, tempo de hospitalização e tempo de ventilação mecânica. Resultados: A idade média foi de 13,5 anos. Houve uma diminuição importante de VEF1 e FEF25-75%, assim como um aumento de VR e sRaw, característicos de doença obstrutiva das vias aéreas. Os parâmetros mais afetados e as médias percentuais dos valores previstos foram VEF1 = 45,9%; FEF25-75% = 21,5%; VR = 281,1%; VR/CPT = 236,2%; e sRaw = 665,3%. Nenhum dos potenciais fatores de risco avaliados apresentou uma associação significativa com pior função pulmonar. Conclusões: As crianças com BOPI apresentaram um padrão comum de comprometimento grave da função pulmonar, caracterizado por uma obstrução importante das vias aéreas e um expressivo aumento de VR e sRaw. A combinação de medidas espirométricas e pletismográficas pode ser mais útil na avaliação do dano funcional, assim como no acompanhamento desses pacientes. Fatores de riscos conhecidos para doenças respiratórias não parecem estar associados a pior função pulmonar em BOPI.

Palavras-chave: Testes de função respiratória; Obstrução das vias respiratórias; Bronquiolite obliterante.

Introdução

A bronquiolite obliterante (BO) é uma forma incomum de doença pulmonar crônica que ocorre após uma agressão grave ao trato respiratório inferior. De uma perspectiva patológica, ela se caracteriza por obstrução luminal parcial ou completa das pequenas vias aéreas por tecido cicatricial, secundária a inflamação e fibrose.(1,2) Em razão de o transplante de órgãos ter melhorado a sobrevida dos pacientes com doença pulmonar, a incidência de BO como manifestação de rejeição do enxerto aumentou.(3) Em crianças e adolescentes, porém, a forma mais comum de BO, especialmente em países em desenvolvimento, é a bronquiolite obliterante pós-infecciosa (BOPI).(4)

Há relatos de BOPI na maioria dos continentes, com dados interessantes vindos de países da América do Sul que correspondem às epidemias por adenovírus que ocorreram na década de 1990.(4-6) Em BOPI, como em outras doenças pulmonares crônicas, é crucial determinar a função pulmonar para o diagnóstico, assim como para classificar a gravidade do quadro e monitorar sua evolução. Infelizmente, há apenas informações esparsas sobre a função pulmonar de pacientes com BOPI na literatura.

Dois estudos (ambos realizados pelo mesmo grupo de pesquisa) avaliaram a função pulmonar de lactentes com BOPI.(5,7) Esses dois estudos produziram resultados consistentes, uma vez que ambos incluíram um número representativo de pacientes. Esse não é o caso de estudos sobre crianças e adolescentes com BOPI; os poucos artigos que forneceram dados de função pulmonar apresentavam tamanho pequeno das amostras e diferenças na metodologia ou no foco, o que não permite uma caracterização apropriada da função pulmonar.(8-11) Isso efetivamente impede que se tirem conclusões confiáveis em relação às características da função pulmonar nessa faixa etária.

Traçar o perfil da função pulmonar de crianças e adolescentes com BIPO poderia nos dar uma melhor compreensão dos efeitos respiratórios de longo prazo da doença. Isso poderia ser de interesse não apenas para os que estudam e tratam pacientes com BOPI, mas também para aqueles na área de transplante pulmonar, uma vez que as semelhanças histopatológicas entre transplante e BOPI(12) poderiam se traduzir em semelhanças na função pulmonar. O objetivo deste estudo foi descrever a função pulmonar de crianças e adolescentes com BOPI e avaliar os potenciais fatores de risco para pior função pulmonar.

Métodos

Trata-se de um estudo transversal envolvendo crianças e adolescentes (8-18 anos de idade) com BOPI, no Brasil e no Chile. Os participantes foram acompanhados periodicamente em dois ambulatórios de pneumologia pediátrica (atendimento terciário): o do Hospital da Criança Santo Antônio, localizado em Porto Alegre, RS, Brasil, ou o do Centro de Referencia de Salud del Hospital El Pino, localizado em Santiago, Chile. Os funcionários de ambos os ambulatórios têm vasta experiência clínica no diagnóstico e acompanhamento de pacientes pediátricos com BOPI, fazendo isso há mais de 15 anos. Para este estudo, analisamos os resultados dos testes de função pulmonar realizados em 2007. Dos 83 pacientes inicialmente elegíveis para inclusão no estudo, 5 apresentaram resultados de testes de função pulmonar que não preenchiam os critérios de aceitabilidade/reprodutibilidade da American Thoracic Society/European Respiratory Society (ATS/ERS) e outro se recusou a participar do estudo.

Esses 6 pacientes foram, portanto, excluídos. Consequentemente, a amostra final foi composta por 77 pacientes: 41 do Brasil e 36 do Chile.

Os critérios para o diagnóstico de BOPI basearam-se em relatos anteriores(1,8,13,14) e incluíram o seguinte: bronquiolite aguda grave/pneumonia viral durante os 3 primeiros anos de vida em crianças previamente hígidas;

 evidência de obstrução persistente das vias aéreas após o evento agudo (identificada por exame físico ou teste de função pulmonar) que não respondeu a pelo menos duas semanas de tratamento com corticoide sistêmico e broncodilatador;
 radiografia de tórax sugestiva de doença pulmonar crônica (por ex., hiperinsuflação, atelectasia, espessamento da parede das vias aéreas e bronquiectasia);
 TC de tórax mostrando padrão em mosaico e aprisionamento aéreo;
 exclusão de outros quadros que evoluem para sintomas respiratórios permanentes, incluindo doenças pulmonares crônicas, como tuberculose, fibrose cística e displasia broncopulmonar, assim como imunodeficiência e deficiência de alfa-1 antitripsina.

Os parâmetros espirométricos - CVF, VEF1, FEF25-75%, e VEF1/CVF - e os parâmetros pletismográficos - volume de gás intratorácico (VGIT), VR, CPT, VR/CPT e specific airway resistance (sRaw, resistência específica das vias aéreas) - foram medidos de acordo com as recomendações internacionais para aceitabilidade e reprodutibilidade.(15,16) Os parâmetros de função pulmonar foram medidos apenas se os pacientes estivessem livres de exacerbações respiratórias e clinicamente estáveis há pelo menos duas semanas. Os β2-agonistas de curta e de longa duração foram suspensos, respectivamente, por 12 h e 48 h antes dos testes, embora os corticoides inalatórios tenham sido mantidos conforme a prescrição. Antes da realização dos testes, os pacientes eram familiarizados com as manobras básicas para as medidas espirométricas e pletismográficas.

Em cada instituição, as medidas foram realizadas por um técnico de laboratório credenciado. Todas as medidas foram feitas pela manhã (pletismografia seguida por espirometria). Ambos os centros utilizaram o mesmo tipo de espirômetro (MasterScreen Body com software v4.3; Jaeger, Würtzburg, Alemanha), o qual foi calibrado diariamente utilizando-se uma seringa de 3 L, e as medidas foram corrigidas eletronicamente para temperatura corporal e pressão, condições saturadas.(15-17)

Durante a pletismografia, os pacientes eram orientados a respirar calmamente através de um bocal até alcançarem um nível expiratório final estável. O shutter então se fechava automaticamente por 2-3 s enquanto o paciente realizava uma série de manobras de respiração curta (contra 0,5-1,0 Hz de resistência), com ambas as mãos sustentando as bochechas.

Os resultados de três a cinco manobras tecnicamente satisfatórias eram registrados para posterior análise. O shutter era aberto, e os pacientes expiravam lentamente o mais completamente possível (para permitir a determinação do volume de reserva expiratório). Posteriormente, os pacientes inspiravam lentamente até a CPT, e isso era seguido de uma manobra expiratória forçada na qual os pacientes expiravam até o VR. O esforço com a maior CV e a melhor manobra do shutter, que incluía a alça mais próxima ao eixo pressão-volume, era considerado o melhor esforço.

As medidas espirométricas eram realizadas após o paciente ter descansado por 5 min. Valores apropriados eram selecionados a partir das três melhores manobras de CVF aceitáveis e reprodutíveis, e a manobra selecionada era aquela com a maior soma de CVF e VEF1.

Empregamos os valores de referência e as equações desenvolvidas por Perez-Padilla et al. e Zapletal et al. para espirometria e pletismografia, respectivamente.(18,19) Todos os dados de função pulmonar são expressos em percentual do valor de referência previsto. A gravidade do comprometimento para os parâmetros espirométricos se baseou no VEF1, de acordo com as recomendações da ATS/ERS,(20) e os limites de normalidade aceitos para os volumes foram os recomendados pela Sociedad Española de Neumología y Cirugía Torácica (Sociedade Espanhola de Pneumologia e Cirurgia Torácica).(21) Definimos função pulmonar gravemente comprometida como aquela classificada como comprometimento grave ou muito grave, de acordo com os critérios da ATS.(20)

As variáveis contínuas são expressas em média e IC95%, enquanto a variáveis categóricas são expressas em frequência absoluta e relativa. As razões de prevalência ajustadas dos potenciais fatores de risco para função pulmonar gravemente comprometida foram calculadas pela regressão de Poisson com variância de erro robusto em análises bivariadas e multivariadas. A isso se seguiu um procedimento interativo, inicialmente considerando todas as covariáveis com um valor de p < 0,10 em um modelo de regressão múltipla. As covariáveis com os maiores valores de p foram retiradas do modelo, o qual foi então recalculado. O modelo final foi composto apenas por covariávies com um valor de p < 0,10. As seguintes variáveis foram incluídas como potenciais fatores de risco: sexo, idade do primeiro sibilo, idade ao diagnóstico, história familiar de asma, exposição ao tabaco, tempo de hospitalização e tempo de ventilação. A correlação entre VR/CPT e VEF1, assim como a correlação entre VR/CPT e FEF25-75%, foi avaliada utilizando-se o coeficiente de correlação de Pearson (r). O nível de significância considerado foi de p < 0.005.

O estudo foi aprovado pelos comitês de ética em pesquisa de ambas as instituições. Os pais ou responsáveis pelos participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido, e os pacientes participantes concordaram verbalmente em ser incluídos no estudo.

Resultados

Os dados demográficos são mostrados na Tabela 1. Em ambos os grupos, houve predominância do sexo masculino (Brasil: 75,6%; Chile: 52,8%). As médias gerais (e as médias de grupo para Brasil e Chile, respectivamente) foram as seguintes: idade, 13,3 anos (11,5 e 15,1 anos); altura, 150,5 cm (144,6 e 157,3 cm); e IMC, 19,5 kg/m2 (17,9 e 21,4 kg/m2). O início da doença ocorreu entre 1 e 24 meses de idade na maioria dos pacientes (97% do grupo do Brasil e 97% do grupo do Chile).





A Tabela 2 mostra os parâmetros de função pulmonar. Em ambos os grupos, os valores médios de todas as variáveis espirométricas, especialmente VEF1 e FEF25-75%, foram baixos. Correspondentemente, os valores médios da maioria das variáveis pletismográficas (VGIT, VR, VR/CPT e sRaw) foram significativamente altos, com exceção da CPT, que ficou dentro dos limites da normalidade.



No modelo de regressão, nenhum dos potenciais fatores de risco apresentou associação significativa com função pulmonar gravemente comprometida. Houve uma correlação moderada entre VR/CPT e VEF1 (r = −0,657, p < 0,001) e entre VR/CPT e FEF25-75% (r = −0,669, p < 0,001).

Discussão

O presente estudo descreve a função pulmonar em uma das maiores amostras de pacientes pediátricos com BOPI avaliadas até o momento.

Nossos resultados mostram que, em ambas as instituições evolvidas, as crianças e os adolescentes com BOPI apresentavam obstrução moderada a muito grave das vias aéreas.(20) Esse comprometimento, o qual provavelmente reflete lesão crônica importante nas pequenas e médias vias aéreas, se caracteriza por redução do fluxo aéreo expiratório, juntamente com aumento de VR e sRaw.

Para elucidar o grande impacto da BOPI nos principais componentes morfológicos e funcionais do sistema respiratório, uma combinação de métodos deve ser empregada. Um desses métodos é o teste de função pulmonar, o qual permite avaliar, de uma forma relativamente prática e não invasiva que é muito adequada para as rotinas diagnósticas e de acompanhamento, como as propriedades viscoelásticas e fluxo-resistivas do sistema são comprometidas.(22)

 Em razão de a BOPI ser uma doença rara com um número relativamente pequeno de pacientes em qualquer país, a utilização e os resultados dos testes de função pulmonar em pacientes com BOPI foram abordados em apenas alguns estudos, seis dos quais notáveis: Estudando uma amostra de 13 lactentes na Argentina, Teper et al. sugeriram que o comprometimento funcional causado pela BOPI se estabelece em seus estágios iniciais.(7)
 Kim et al. descreveram a função pulmonar de 14 crianças dentro de um grupo de 31 crianças com BOPI nos Estados Unidos e na Coreia do Sul. Os autores observaram que todas as 14 apresentavam grave obstrução fixa das vias aéreas.(9)
 Castro-Rodriguez et al., utilizando a técnica de impulso oscilométrico, encontraram evidências de disfunção das vias aéreas periféricas em 18 pré-escolares no Chile.(23)
 Cazzato et al. realizaram um estudo longitudinal sobre a função pulmonar de 14 crianças na Itália e observaram um declínio anual de 1% nos valores preditos de VEF1, VEF1/CVF e FEF25-75%.(10)
 No Brazil, Mattiello et al. avaliaram a capacidade funcional de 20 crianças durante o teste cardiopulmonar de esforço e compararam os resultados aos do teste de função pulmonar convencional. As crianças apresentavam um consumo reduzido de oxigênio, que se correlacionou positivamente com CVF, VEF1 e VR/CPT.(11)
 Mattiello et al. também estudaram um grupo de 21 crianças no Brasil e mostraram que os achados da TC no início da vida parecem prever função pulmonar gravemente comprometida uma década depois.(24)

Nossos resultados corroboram e expandem uma conclusão a que se chegou com base nesses estudos: o marcador funcional da doença é uma obstrução importante das vias aéreas com aprisionamento aéreo.

Outro grupo de autores descreveu pacientes com BOPI que apresentavam um padrão restritivo ou misto de obstrução.(25) Entretanto, esses autores basearam sua análise exclusivamente em CVF reduzida que se associava a uma relação VEF1/CVF normal ou baixa.(25) Portanto, seu achado pode ser explicado no contexto de uma obstrução considerável das vias aéreas que leva a um aprisionamento aéreo expressivo, cujo grau é melhor determinado por meio da avaliação dos volumes pulmonares.(20) Tanto a ATS quanto a ERS recomendam a determinação dos volumes pulmonares em pacientes com doenças pulmonares obstrutivas, como a BOPI, porque isso permite uma melhor compreensão do comprometimento respiratório de base.(16,20) De fato, quando a obstrução das vias aéreas se torna mais grave como resultado da redução no retrocesso elástico do pulmão ou de alterações nos mecanismos dinâmicos, VGIT, VR, CPT e VR/CPT tendem a aumentar.

Encontramos apenas dois estudos avaliando volumes pulmonares em pacientes pediátricos com BOPI.(9,10) Agrupamos os dados de sua amostra conjunta (n = 25) e, desconsiderando quaisquer diferenças metodológicas, observamos que todos os pacientes mostravam um aumento importante do VR. Na amostra do nosso estudo (n = 77), também identificamos pacientes com CVF reduzida. Entretanto, nesses pacientes, a CPT também estava consideravelmente acima de 80% do valor do predito, com um aumento notável de VR e VR/CPT. Esses dados sobre volumes pulmonares, obtidos por meio de pletismografia, não deixam dúvida quanto à natureza obstrutiva da BOPI. Além disso, observamos que, de forma geral, VR/CPT apresentou boas correlações com dois dos parâmetros espirométricos, VEF1 e FEF25-75%, indicando que o grau de hiperinsuflação acompanhou a gravidade da obstrução das vias aéreas. Essa situação pode levar a progressivas consequências clínicas, tais como uma necessidade permanente de oxigenoterapia ou perda da qualidade de vida.

Embora VEF1/CVF e VEF1 sejam os parâmetros espirométricos mais frequentemente empregados para determinar a obstrução das vias aéreas, FEF25-75%também tem sido considerado um relevante indicador precoce dessa anormalidade, uma vez que ele parece mostrar uma redução proporcionalmente maior do que VEF1 ou VEF1/CVF.(9,10,20)

Nossos resultados mostram que todos os pacientes tinham valores anormais para FEF25-75% e VEF1, sendo que aquele era metade deste. Isso está de acordo com as recomendações atuais para o diagnóstico da síndrome da bronquiolite obliterante (SBO) em pacientes transplantados.

Como foi observado que FEF25-75% se deteriora mais cedo após o início da SBO do que VEF1,(3) os critérios para a detecção precoce da SBO agora incluem um declínio do FEF25-75% e uma redução do VEF1.(26)

Uma vez que FEF25-75% apresenta variabilidade considerável, conforme evidenciado em um estudo recente,(27) seu uso rotineiro na prática clínica tem sido controverso. Entretanto, sua considerável e consistente redução em nossos pacientes com BOPI sugere que FEF25-75% deve ser considerado em conjunto com o duo estabelecido VEF1 e VEF1/CVF para definir a extensão do dano funcional, assim como no acompanhamento rotineiro desses pacientes. O fato de ele ser obtido simultaneamente com outros parâmetros espirométricos e por meio da mesma técnica reforça a sua viabilidade.

Uma limitação do nosso estudo é que nossos dois grupos de pacientes com BOPI eram cada um de um país diferente. Entretanto, como ambos os países estão na porção sul da América do Sul, há similaridades geográficas, étnicas e nutricionais entre os dois grupos. Além disso, todos eles desenvolveram a doença em idades (jovens) semelhantes, correspondendo a surtos regionais simultâneos de infecções respiratórias por adenovírus durante o início e a metade dos anos 90.(28)
Além do mais, as medidas correspondiam a testes de função pulmonar obtidos durante o mesmo ano, os dois laboratórios de testes de função pulmonar são certificados, ambos seguem as recomendações da ATS/ERS, e ambos utilizaram o mesmo aparelho e software. Os resultados dos grupos são apresentados juntos com aqueles da amostra como um todo, e fica claro que os dois grupos de pacientes eram semelhantes em termos de função pulmonar.

O tamanho da nossa amostra foi adequado para executar o modelo estatístico utilizado, e nossas análises revelaram que nenhum dos fatores estudados constituiu um risco para função pulmonar gravemente comprometida.

Acreditamos que o valor de nosso estudo está no grande número de participantes e na faixa etária ampla da amostra, assim como na utilização e na análise de um extenso número de variáveis de função pulmonar. Esses aspectos nos permitiram obter dados que são consistentes e confiáveis. Nossos dados podem ajudar nas decisões sobre a avaliação e o tratamento de pacientes com BOPI, assim como nas decisões sobre futuros estudos com crianças ou adolescentes com BO pós-transplante.

Em conclusão, pacientes pediátricos com BOPI apresentam um padrão comum de comprometimento grave da função pulmonar, caracterizado por uma obstrução importante das vias aéreas e um expressivo aumento de VR e sRaw. Nossos resultados sugerem que a utilização conjunta de medidas espirométricas e pletismográficas é mais útil do que a utilização de cada método isoladamente para a avaliação do dano funcional num dado momento e para o acompanhamento de crianças ou adolescentes que sofrem dessa doença rara.

Agradecimentos

Os autores gostariam de agradecer à Dra. Sonia Buist e ao Dr. Gordon Rubenfeld, ambos professores do Curso ATS-MECOR (http://www.thoracic.org/global-health/mecor-courses/mecor-program-description.pdf), o apoio e as sugestões em relação a este manuscrito.


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* Trabalho realizado no Programa de Pós-Graduação em Pediatria. Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS - Porto Alegre (RS) Brasil.
Endereço para correspondência: Rita Mattiello. Hospital da Criança Santo Antonio, Avenida Independência, 155, 5º andar, CEP 90035‑074, Porto Alegre, RS, Brasil.
Tel 55 51 3214-8646. E-mail: rimattiello@hotmail.com
Apoio financeiro: Rita Matiello é bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
Recebido para publicação em 11/12/2009. Aprovado, após revisão, em 15/3/2010.


Sobre os autores

Rita Mattiello
Doutor em Pediatria. Faculdade de Medicina, Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS - Porto Alegre (RS) Brasil.

Javier Mallol
Médico. Departamento de Pneumologia Pediátrica, Centro de Referencia de Salud del Hospital El Pino - Hospital-CRS El Pino, Centro de Referência em Saúde do Hospital El Pino - Universidade de Santiago,
Santiago, Chile.

Gilberto Bueno Fischer
Professor de Pediatria. Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre - UFCSPA - Porto Alegre (RS) Brasil.

Helena Teresinha Mocelin
Médico. Serviço de Pneumologia Pediátrica, Hospital da Criança Santo Antônio, Porto Alegre (RS) Brasil.

Belkys Rueda
Médico. Departamento de Pneumologia Pediátrica, Centro de Referencia de Salud del Hospital El Pino - Hospital-CRS El Pino, Centro de Referência em Saúde do Hospital El Pino - Universidade de Santiago, Santiago, Chile.

Edgar Enrique Sarria
Pesquisador em Pneumologia Pediátrica. Indiana University, Indianapolis (IN) EUA.

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