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Tuberculose pleural

2006 - Vol.32 - Supplement 4

INTRODUÇÃO

O comprometimento pleural representa a forma mais freqüente da tuberculose (TB) extrapulmonar. Freqüências variáveis são observadas em diferentes países, de acordo com a prevalência da TB e da sorologia positiva para o vírus da imunodeficiência humana (HIV).(1)

A TB pleural pode ser uma manifestação tanto da forma primária da doença (primo-infecção) quanto da reativação de uma infecção latente pelo Mycobacterium tuberculosis. Em ambas a TB pleural está freqüentemente associada à forma pulmonar.(2) Nos países com alta prevalência, a TB ocorre mais em jovens como manifestação da TB primária, enquanto que nos países com baixa prevalência ela atinje mais a população idosa, como conseqüência da reativação de um foco de infecção latente, caracterizando a reativação endógena da doença.(3-4)

EPIDEMIOLOGIA

Em todo o mundo, cerca de nove milhões de pessoas desenvolvem TB a cada ano. Aproximadamente 80% delas vivem em 22 diferentes países, sendo que o Brasil ocupa o 15º lugar, com cerca de 80 mil casos notificados a cada ano. Em alguns estados, a incidência da doença supera 100 casos por 100 mil habitantes. Além disto, há uma estimativa de 50 milhões de pessoas infectadas.(5)

No Brasil, dados do Centro de Vigilância Epidemiológica do Estado de São Paulo, onde há o maior contingente de casos do país, demonstram que em adultos com sorologia negativa para o HIV, a TB pleural é reponsável por cerca de 8% dos casos novos da doença. Em indivíduos menores de quinze anos e co-infectados pelo HIV esta freqüência é menor (em torno de 5%). Ocorre predomínio do sexo masculino (2:1) na faixa etária dos mais jovens (com menos de 50 anos).

Em faixas etárias maiores, a TB pleural pode ser decorrente tanto da evolução de infecção recente quanto por reativação de infecção latente (principlamente associada a imudeficiências, diabetes, insuficiência renal e outras co-morbidades).

Em pacientes idosos, o diagnóstico de TB pleural às vezes é tardio ou subestimado,(6) devido ao amplo espectro de possíveis etiologias do derrame pleural nesta faixa etária (hepatopatia, insuficiência cardíaca, insuficiência renal, câncer, etc).

PATOGENIA

O derrame pleural na TB expressa o processo inflamatório de hipersensibilidade tardia do tipo IV (imunidade mediada por células), resultante da presença do bacilo ou de antígenos do M. tuberculosis no espaço pleural. Esses bacilos ou antígenos podem entrar no espaço pleural após ruptura de foco caseoso pulmonar na região subpleural, por contigüidade da lesão pulmonar, por ruptura de gânglio mediastinal ou por via hematogênica/linfática.(6)

A presença do bacilo ou do antígeno do M. tuberculosis no espaço pleural provoca afluxo de células do compartimento sangüíneo. Nas primeiras 24 horas há o aumento de neutrófilos, seguido do recrutamento das diferentes populações de monócitos-macrófagos. Os neutrófilos são predominantes de início, havendo posteriormente predomínio de linfócitos. A liberação local de citocinas representa um mecanismo importante no recrutamento da população celular envolvida na resposta inflamatória, com ação direta nas células mesoteliais e no endotélio vascular. As células mesoteliais ativadas são envolvidas na regulação do afluxo celular, na liberação de óxido nítrico, no balanço da coagulação e fibrinólise, na proliferação celular e na fibrogênese. As alterações descritas direcionam o influxo de líquido, proteínas e células inflamatórias para o espaço pleural.(7)

Em humanos com TB pleural, a proporção de linfócitos T é maior no líquido pleural do que no sangue. Esses linfócitos T de memória (CD4+, CDw29+) são responsáveis pela produção de interferon-gama quando estimulados com derivado protéico purificado.(8)

CLÍNICA

A apresentação clínica pode variar, podendo ser tanto em forma de doença aguda como crônica. A forma aguda pode simular uma pneumonia bacteriana, com tosse não produtiva, dor torácica ventilatório-dependente, dispnéia e febre alta. A forma crônica, de evolução lenta, manifesta-se com tosse não produtiva, febre vespertina, sudorese noturna, adinamia, anorexia e perda de peso.

No exame físico do tórax observamos abolição do murmúrio vesicular e do frêmito tóraco-vocal, e macicez à percussão.

DIAGNÓSTICO

Proteínas e desidrogenase lática
O aspecto do líquido pleural é geralmente amarelo citrino ou turvo. Em um estudo de coorte prospectivo de 182 casos de TB pleural realizado no ambulatório de pleura do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo no período de 1999 a 2000, 88,5% dos casos apresentaram líquido pleural amarelo-citrino ou turvo, 11% hemorrágico e 0,5% purulento.(9)

A determinação das proteínas e da atividade da desidrogenase lática de forma simultânea no líquido pleural e no sangue permite a identificação dos exsudatos em até 90% dos casos quando se utiliza os critérios de Light.(10) A TB pleural é caracteristicamente um exsudato e geralmente os níveis de proteína no líquido pleural são superiores a 4,5 g/dl, mais elevados do que geralmente
encontrados nos exsudatos por câncer.(11)

Citologia
A contagem de células nucleadas geralmente demonstra 1.000 a 6.000 células/mm3, com predominio de linfócitos em 60% a 90% dos casos nas fases subaguda e crônica da inflamação. Em pacientes com sintomas há menos de quinze dias, pode haver predomínio de neutrófilos, caracterizando a fase aguda da inflamação.
No entanto, em humanos é desconhecido o tempo de transição em que ocorre a mudança de predomínio neutrófilico para linfocítico.(7,11-12) O número relativo de células mesoteliais é geralmente inferior a 5%. O achado de mais de 5% de células mesoteliais no derrame pleural tuberculoso não é habitual, e sugere a necessidade de maior exploração para confirmação do diagnóstico. Em pacientes com sorologia positiva para o HIV, tem sido descrita a presença de um número maior de células mesoteliais. A presença de eosinofilia no líquido pleural maior que 10% usualmente exlcui o diagnóstico de tuberculose pleural, a não ser que o paciente tenha tido múltiplas punções ou pneumotórax.(11)

Bacteriologia e cultura
O rendimento da baciloscopia direta do líquido pleural é próximo de zero.(13) A positividade da cultura em meio de Löwestein-Jensen varia de 10% a 35% para o líquido pleural e de 39% a 65% para o fragmento pleural obtido através de biópsia por agulha.(11) Em um estudo recente realizado no Brasil(2) foi demonstrado que os rendimentos da baciloscopia direta e da cultura para M. tuberculosis do escarro induzido de pacientes com derrame pleural por TB, mesmo na ausência de lesão no parênquima pulmonar radiologicamente visível, alcançaram 50%. Desta forma, em pacientes com derrame pleural e suspeita de etiologia tuberculosa, a realização do escarro induzido está indicada independentemente do aspecto da radiografia de tórax. A Tabela 1 mostra o rendimento dos diversos exames diagnósticos, incluindo bacteriologia e cultura, em 84 casos de TB pleural.(2)





Lisozima
É uma enzima bacteriolítica encontrada no soro e em líquidos de derrame, decorrente principalmente da decomposição dos leucócitos. Níveis elevados dessa enzima são encontrados no líquido pleural por tuberculose e nos empiemas. O valor da relação líquido pleural/sangue acima de 1,0 pode ser utilizado no diagnóstico diferencial com exudatos de outras etiologias. Porém, excluindo-se empiema, o aumento significativo desta enzima (acima de 50 U/I), pode ser indicativo de tuberculose.(2)

Adenosina deaminase
A adenosina deaminase (ADA), uma enzima proveniente do catabolismo das purinas que cataliza a conversão da adenosina em inosina e da desoxiadenosina em desoxiinosina, é importante para a diferenciação de linfócitos, principalmente da população T.(7,14) Esta enzima tem sua atividade aumentada em líquidos pleurais de pacientes com tuberculose, principalmente a ADA2, indepedentemente da co-infecção com o vírus HIV.(15) Um estudo recente revelou uma correlação entre a atividade da ADA e o alto número de células CD4 no líquido pleural de pacientes com TB, comparados a pacientes com câncer.(16) Em diferentes estudos de diagnóstico de derrame pleural, a ADA demonstrou sensibilidade de 90% a 100% e especificidade de 89% a 100%, quando se utilizou valor de corte maior que 40 U/l. A ADA pode apresentar resultados falso positivos em alguns tipos de linfoma, na artrite reumatóide, no lúpus, em alguns adenocarcinomas e no empiema. Entretanto, a história clínica, a análise de imagem e a evolução clínica permitem que estes casos sejam mais facilmente discriminados.(1-18)

Com base nestas constatações, recomenda-se a pesquisa rotineira da ADA para o diagnóstico da tuberculose pleural.

Radiografia de tórax
A radiografia de tórax é o método de imagem de escolha na avaliação inicial e no acompanhamento de pacientes com TB pleural. O comprometimento da pleura pode se manifestar através de derrame, espessamento ou calcificação pleural.

O derrame pleural geralmente é unilateral, com volume que varia de pequeno a moderado; derrames pleurais bilaterais ou volumosos são mais raros. A presença de imagens parenquimatosas sugestivas de atividade de TB, associadas ao derrame pleural, contribui para o diagnóstico. Estas imagens incluem cavidades de paredes espessas, nodulações ou consolidações.

A presença de líquido pleural nas fissuras interlobares ou no mediastino pode ocorrer em virtude de aderências entre os folhetos visceral e parietal da pleura. Essas coleções podem simular massas pulmonares ou mediastinais ou derrame pleural subpulmonar. No derrame pleural subpulmonar observa-se a lateralização do ponto mais alto da cúpula diafragmática. Linfonodomegalias são de difícil visualização na radiografia do tórax.

Espessamento e calcificações pleurais podem estar presentes, especialmente nos casos em que o diagnóstico ocorre tardiamente. Após a cura, estes achados são representativos das seqüelas da tuberculose pleural.(19)

Ultra-sonografia
A ultra-sonografia é um método sensível na detecção do derrame pleural, que permite avaliar derrames subpulmonares ou de pequeno volume e a existência de aderências pleurais. É muito útil na orientação da toracocentese diagnóstica e no controle dinâmico da evolução do derrame pleural.

Os achados ultra-sonográficos da tuberculose pleural ativa incluem, além do derrame, o espessamento dos folhetos parietal e visceral e as septações. A presença de pequenos nódulos na superfície pleural sugere fortemente o diagnóstico de tuberculose.

Tomografia computadorizada do tórax
Na tomografia computadorizada do tórax é possível, com base em seus respectivos coeficientes de atenuação, a diferenciação entre doença pleural e parenquimatosa, além da caracterização do líquido pleural, do tecido muscular e das calcificações. A tomografia computadorizada é útil ainda na avaliação da extensão do derrame ou do espessamento pleural e na orientação da punção nos derrames septados ou com pequenas quantidades de líquido.

A tomografia computadorizada apresenta um importante papel na avaliação da TB pleural, especialmente na presença de sinais sugestivos de atividade no parênquima pulmonar, não visualizados pela radiografia do tórax. Estes sinais, observados em 30% a 60% dos pacientes com TB pleural, incluem nódulos centrolobulares de distribuição segmentar, confluência de pequenos nódulos, nódulos ou massas, consolidações, cavidades de paredes espessas, espessamento de paredes brônquicas e o aspecto de "árvore em florescência" (preenchimento bronquiolar por material exsudativo com conseqüente dilatação). A presença de bandas, principalmente apicais, pode sugerir infecção pregressa.

A TB pleural freqüentemente evolui para cura sem seqüelas. As possíveis seqüelas incluem mínimos espessamentos da pleura (menores que 1 cm), visualizados como obliterações do seio costofrênico ou até mesmo espessamentos maiores, calcificações pleurais e fibrotórax.

O espessamento pleural mais acentuado, denominado fibrotórax, pode estar associado a calcificações pleurais, redução volumétrica do pulmão e restrição da função pulmonar. A evidência de estrias no parênquima pulmonar e de calcificações pleurais sugere a etiologia tuberculosa do fibrotórax, enquanto que a presença de placas ou o comprometimento bilateral podem indicar outras etiologias.

As fístulas broncopleurais, que podem aparecer durante a fase ativa da tuberculose pleural ou como uma complicação tardia da doença, devem ser avaliadas através de tomografia que pode demonstrar a presença de ar no espaço pleural com ou sem evidência de comunicação com o parênquima pulmonar. No empiema, a tomografia mostra um derrame loculado em associação com espessamento pleural e calcificações.

Tomografia por emissão de pósitrons
A captação aumentada na tomografia por emissão de pósitrons pode ocorrer nas doenças infecciosas, sendo decorrente do processo inflamatório local, do tecido de granulação em formação ou da presença do agente causal. Na tuberculose pleural, a captação aumentada pode ser observada durante as suas fases ativas, representando o processo inflamatório local desencadeado pelo M. tuberculosis. A tomografia por emissão de pósitrons não tem indicação no diagnóstico de tuberculose, em virtude da baixa especificidade para o diagnóstico diferencial entre tuberculose e neoplasia.(9)

Teste tuberculínico
Na população com alta incidência de TB ou em países onde a vacinação com BCG é rotineira, a presença de reação positiva no teste tuberculínico tem valor discutível como método auxiliar no diagnóstico da TB pleural se realizada nos primeiros dez anos após a vacinação. No Brasil é realizado com a aplicação de 2 UT de PPD RT 23, conforme padronização do Ministério da Saúde. Em pacientes imunossuprimidos ou anérgicos, o teste negativo não afasta o diagnóstico de doença.

Na fase inicial ou aguda da TB pleural o teste cutâneo pode ser negativo. Nesta fase, existe normalmente uma linfopenia periférica transitória, pois os linfócitos T CD4+ se encontram recrutados no espaço pleural.
Após aproximadamente dois meses, pode haver a viragem do teste tuberculínico. A evidência desta viragem, caracterizada pelo aumento em 10 mm de induração entre o primeiro e o segundo testes, indica a ocorrência de contato recente com o bacilo M. tuberculosis.(21)

Marcadores moleculares (interferon)
A dosagem de interferon-g no líquido pleural é um dos novos métodos de melhor rendimento para o diagnóstico da TB pleural.
Utilizando um ponto de corte de 140 pg/ml, a sensibilidade pode variar de 86% a 97%, enquanto que a especificidade tem sempre valores acima de 90%.(22) Embora sua utilidade ainda não tenha sido avaliada em países com alta prevalência de TB, o seu rendimento diagnóstico tem se mostrado semelhante ao da dosagem da ADA no líquido pleural. No entanto, uma recente meta-análise demonstrou que a dosagem de ADA seria mais efetiva em termos de custo do que a dosagem de interferon-g para o diagnóstico de TB.(23) Por esses motivos, não recomendamos o uso rotineiro do interferon-g na prática clínica atual.

Marcadores genéticos
Testes que avaliam marcadores genéticos utilizam técnicas de amplificação de seqüências de ácidos nucléicos do M. tuberculosis. As principais técnicas são: reação em cadeia da polimerase ou polymerase chain reaction; amplificação mediada por transcrição; amplificação por deslocamento de fita; e reação em cadeia da ligase.

Embora mostrem elevada sensibilidade (95%) e especificidade (98%) em amostras de escarro de pacientes com TB pulmonar e baciloscopia direta positiva, já foi demonstrado que a sensibilidade e a especificidade dos marcadores genéticos em amostras com baciloscopia direta negativa são muito variáveis.(23) Um estudo avaliando o rendimento da reação em cadeia da polimerase no líquido pleural de 111 pacientes (57 com TB pleural) mostrou sensibilidade de 17% e especificidade 98%.(24) Além disso, as técnicas de amplificação de seqüências de ácidos nucléicos ainda não foram validadas para uso em amostras não respiratórias como o líquido pleural.
Assim, embora a detecção do ácido nucléico do M. tuberculosis no líquido pleural seja o suficiente para se estabelecer o diagnóstico de TB pleural, seu uso na rotina de investigação de derrames pleurais não se justifica no momento.

Biópsia e exame anatomopatológico
De maneira geral, recomenda-se a coleta de dois a três fragmentos para a realização do exame anatomopatológico e mais um para a realização da cultura.(25) A associação da biópsia e cultura do fragmento permite diagnóstico em até 87% dos casos. O diagnóstico etiológico de certeza requer a demonstração por cultura do M. tuberculosis no líquido pleural ou no fragmento de pleura.
Embora outras condições como sarcoidose, presença de fungos e artrite reumatóide também sejam granulomatosas, a demonstração de granulomas com ou sem necrose de caseificação é normalmente considerada como compatível com TB, por ser esta a responsável por mais de 95% dos casos de granuloma pleural.

A morfologia da lesão causada pela micobactéria pode variar amplamente, assumindo desde um padrão exsudativo até um padrão identificado como granulomatoso.
O granuloma completo consiste de uma lesão com resposta macrofágica contendo células epitelióides e células gigantes, envolvendo área central com material necrótico acelular. A multiplicação bacilar é mínima neste tipo de lesão. O granuloma incompleto consiste de lesão com supuração central contendo numerosos neutrófilos polimorfonucleares, que é envolvida por reação inflamatória granulomatosa com combinações variáveis de células polimorfonucleares, linfócitos e plasmócitos, sem caseificação.

A formação do granuloma requer imunidade celular bem preservada, a qual é prejudicada na imunodepressão causada pelo HIV, como resultado da perda progressiva dos linfócitos.

O encontro de um bacilo em uma amostra histológica de um granuloma de 1 cm3 indica a existência de pelo menos 2.000 bacilos no interior do granuloma. A cultura deste material poderá resultar em crescimento da micobactéria, assim como a utilização da técnica de reação em cadeia da polimerase pode demonstrar o genoma do bacilo.

Como a TB pleural é freqüentemente paucibacilar, o padrão anatomopatológico predominante é o de formação de granulomas completos ou incompletos. Em pacientes com sorologia positiva para o HIV e/ou diabéticos graves pode não haver formação destes granulomas, o que dificulta o diagnóstico pela análise anatomopatológica.(26)

Biópsia por toracoscopia
A toracoscopia deve ser indicada quando as técnicas menos invasivas não tiverem sido suficientes para o diagnóstico. Está indicada principalmente quando, após duas biópsias percutâneas, o diagnóstico mantém-se inconclusivo e existe alta suspeita de outras patologias como mesotelioma ou linfoma.

Perspectivas diagnósticas futuras
Os métodos de diagnóstico da TB pleural (biópsia e cultura) apresentam limitações pela dificuldade de realização em serviços não especializados e demora na obtenção do resultado. A análise do líquido pleural é mais rápida, menos onerosa e parece ser efetiva para o diagnóstico da maioria dos casos de TB pleural, principalmente em países com alta prevalência da doença, bem como em pacientes co-infectados pelo HIV.(1)

A história clínica, o conhecimento sobre a prevalência da TB na região, a análise bioquímica e citológica do líquido pleural, a dosagem de ADA (baixo custo e fácil realização) e a indução de escarro (fácil realização e bom rendimento) podem permitir o diagnóstico presuntivo de forma rápida, agilizando o tratamento. Além disso, é indispensável que na ausência do diagnóstico de certeza os pacientes tenham acompanhamento clínico muito próximo e cuidadoso, de forma a permitir a confirmação do diagnóstico sugerido ou a rápida intervenção nas situações em que a evolução com o tratamento empírico não se acompanhar de evolução clínica satisfatória.

No entanto, é importante que sejam realizados estudos operacionais com grande número de pessoas e em diferentes cenários epidemiológicos, para que o real valor dessa forma altenativa de diagnóstico da TB pleural possa ser proposta de modo seguro na prática diária.

TRATAMENTO

A resolução da tuberculose pleural pode ser espontânea, mesmo sem tratamento. A ausência de diagnóstico e tratamento pode levar, nos cinco anos subseqüentes, à ocorrência de TB pulmonar e/ou extrapulmonar em 65% dos casos.

A punção pleural deve ser realizada para colheita de material para exames diagnósticos e para alívio dos sintomas, não sendo obrigatória a retirada total do líquido. A drenagem total do líquido parece não ter relação com a evolução para espessamento pleural.(27) Após o início do tratamento com antibióticos, o líquido é freqüentemente absorvido em aproximadamente quinze dias, sendo que o paciente apresenta acentuada melhora clínica.

O tratamento quimioterápico preconizado é o esquema I (2RHZ/4RH) durante seis meses, esquema IR (2RHZE,4RHE) em casos de retratamento ou retorno após abandono, e esquema III (3SEZEt/9EEt) para os pacientes com falência ao esquema I comprovada com teste de sensibilidade. Em pacientes com hepatopatias graves, nas quais não for possível a utilização da rifampicina, o esquema I poderá ser substituído por um dos esquemas especiais com estreptomicina, etambutol e ofloxacino, prolongando-se o tratamento para doze meses.(28)

Na co-infecção com o HIV prioriza-se inicialmente o tratamento da tuberculose. A terapia anti-retroviral deverá ser avaliada após dois meses do início do tratamento da tuberculose, com contagem de células T CD4+ e carga viral. Devem ser utilizados esquemas anti-retrovirais compatíveis com o uso concomitante de rifampicina.(28)

O espessamento pleural é uma seqüela muitas vezes circunscrita a pequenas áreas pleurais, sendo mais raro quando o tratamento quimioterápico é instituido precocemente. O uso de corticóide não parece interferir na diminuição das seqüelas ou na evolução da doença, portanto não é recomendado.(29)

Níveis elevados no líquido pleural de desidrogenase lática, lisozima e baixos níveis de glicose e pH são preditores de evolução para espessamento pleural.(1) A avaliação radiológica da reabsorção de líquido pleural deve ser acompanhada clínica e radiologicamente após um a dois meses de tratamento. A manutenção do derrame pleural ou a presença de grandes espessamentos exige uma avaliação com tomografia computadorizada antes da indicação do tratamento definitivo. A indicação precoce da intervenção cirúrgica permite que o procedimento seja realizado através de videotoracoscopia, pois o processo de fibrose ainda não está totalmente completo.

EMPIEMA TUBERCULOSO

É uma forma de derrame pleural decorrente da ruptura, para o espaço pleural, de uma lesão pulmonar ricamente habitada por bacilos, representando uma infecção ativa com a contaminação pleural por material caseoso. É caracterizado por um líquido purulento, que pode estar associado a infecção bacteriana secundária, principalmente se houver fístula broncopleural. Pneumotórax pode ocorrer como complicação de fístulas ou ruptura de cavidades por TB no espaço pleural.

O empiema deve ser considerado uma apresentação de TB pós-primária ou de reinfecção, pois geralmente está acompanhado de um foco pulmonar. Pode ocorrer também como complicação da cirurgia da TB.

O diagnóstico deve ser realizado através da pesquisa e/ou cultura de bacilos álcool-ácido resistentes, cultura para bactérias e/ou biópsia de pleura. A ADA pode estar elevada, acima de 40 U/l, não podendo ser, porém, utilizada como critério diagnóstico diferencial porque pode estar aumentada tanto na tuberculose quanto no empiema bacteriano não específico. A citologia quantitativa apresenta grande número de neutrófilos, a glicose é baixa, o nível de desidrogenase lática é elevado e o pH é inferior a 7,2.
Diferentemente do que ocorre na TB pleural habitual, o rendimento da pesquisa de bacilos álcool-ácido resistentes e da cultura para TB no empiema tuberculoso é alto, servindo de parâmetro para monitoramento da efetividade do tratamento enquanto houver líquido.

O tratamento consiste no efetivo esvaziamento do líquido pleural através de um sistema fechado de drenagem, até que ocorra a fixação do mediastino.
Posteriormente, pleurostomia ou drenagem aberta (por dreno ou próteses) podem estar indicadas.

A pleuroscopia para lise de bridas e aderências deve ser indicada precocemente. Porém, em casos onde há significativo espessamento pleural e não se observa expansão pulmonar pode ser necessária a decorticação pulmonar através de toracotomia para ressecção de toda a fibrose que recobre as pleuras visceral e parietal, permitindo assim reexpansão do pulmão.
Complicações ocorrem por dificuldade desta expansão devido às lesões pleurais ou pulmonares. As seqüelas mais observadas são o espessamento pleural, as fístulas e a fibrose do parênquima pulmonar.

Os esquemas quimioterápicos sempre devem ser associados ao tratamento cirúrgico. A fibrose localizada pode, por vezes, impedir que o nível sérico adequado do medicamento seja atingido, situação esta que pode levar à ocorrência rara de multirresistência.(30)

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* Trabalho realizado em conjunto pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP), Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro - FMUFRJ - Rio de Janeiro (RJ) e Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUCRJ - Rio de Janeiro (RJ), Brasil.
1. Professora Assistente da Disciplina de Pneumologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.
2. Professor Adjunto da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ - Rio de Janeiro (RJ) Brasil.
3. Professora Adjunta da Pontíficia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC- Rio de Janeiro (RJ) Brasil.
Endereço para correspondência: Márcia Seiscento. Disciplina de Pneumologia da USP. Rua Dr. Enéas de C. Aguiar, 44, Laboratório de Pleura, Prédio II, 10º andar. Cerqueira César - CEP: 01246-903, São Paulo, SP, Brasil. Tel: 55 11 3069-5695.

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