INTRODUÇÃO
Investigar a gravidade da hipertensão arterial pulmonar é essencial para a seleção da terapia ado-tada. O prognóstico dos pacientes pode ser inferi-do a partir de dados preditores de mortalidade.
Os principais marcadores de prognóstico in-cluem: classe funcional da New York Heart Association / Organização Mundial da Saúde; ava-liação da capacidade de exercício; variáveis eco-cardiográficas; medidas hemodinâmicas ao cate-terismo cardíaco direito; marcadores bioquímicos; questionário de qualidade de vida.
CLASSE FUNCIONAL
A classe funcional como marcador de gravida-de mostrou que pacientes classes I ou II têm uma sobrevida mediana de 58,6 meses, contra 31,5 me-ses dos pacientes da classe III e 6 meses daqueles da classe funcional IV.(1) A limitação da classe fun-cional como marcador isolado reside no fato de que ela depende do relato do paciente, que pode ser influenciado pela importância de determina-das atividades para si próprio. Ainda assim, a va-riação da classe funcional foi representativa de melhora de sobrevida em vários estudos, deven-do, portanto, ser utilizada na avaliação de rotina dos pacientes.
Além da classe funcional, alguns estudos têm utilizado escalas de dispnéia (Mahler, Borg) na avaliação basal e resposta terapêutica.(2) Não exis-tem ainda estudos que tenham avaliado o poder preditivo dessas escalas com outros marcadores prognósticos.
Atualmente, questionários de qualidade de vida começam a ser avaliados como marcadores de gra-vidade e de reposta terapêuticada na hipertensão arterial pulmonar (HAP). Dentre os questionários de qualidade de vida existentes, o SF-36 é o mais utilizado. Mais recentemente, um questionário es-pecífico para hipertensão pulmonar desenvolvido na Inglaterra (CAMPHOR) está sendo validado.
AVALIAÇÃO DA CAPACIDADE DE EXERCÍCIO
A avaliação da capacidade de exercício foi utili-zada como marcador principal de resposta terapêutica na maior parte dos estudos clínicos com paci-entes com HAP idiopática. O teste de caminhada de seis minutos é o mais utilizado por sua capacidade prognóstica, facilidade de realização e repro-dutibilidade, além de sua correlação com vários parâmetros do teste de exercício máximo (teste cardiopulmonar de esforço).
Em 2000, Miyamoto ...... estudaram vários marcadores prognósticos não invasivos e demons-traram que apenas o teste de caminhada de seis minutos poderia ser utilizado como marcador independente de mortalidade, em que os pacientes capazes de andar 332 metros apresentavam sobre-vida significativamente maior do que os pacientes que não obtinham essa distância durante o teste. (3) Sitbon ...... mostraram também que, sob tratamento, aqueles pacientes que conseguiam igualar ou superar a distância de 380 metros tinham sobrevida maior do que aqueles que não atingiam essa marca.(4) Paciocco ...... evidenciaram ainda que, a cada aumento de 50 metros no teste de caminhada de seis minutos, obtém-se uma redução do risco de morte da ordem de 18%.(5)
O teste cardiopulmonar de esforço, que avalia a capacidade máxima de exercício, pode mostrar elevada ventilação minuto, baixo limiar anaeróbico, aumento do gradiente alvéolo-arterial de oxigênio e diminuição do consumo de oxigênio máximo. Avaliando 86 portadores de HAP idiopática, Wensel ......(6) concluíram que um baixo consumo de oxi-gênio máximo é um forte e independente preditor de mortalidade. Porém, o custo do exame e a varia-bilidade dos resultados, em função da experiência local na realização dos testes, ainda limitam o uso rotineiro do teste cardiopulmonar de esforço na avaliação da resposta terapêutica.
VARIÁVEIS ECOCARDIOGRÁFICAS
O ecocardiograma é utilizado rotineiramente no manuseio de pacientes com hipertensão pulmonar, tanto na fase diagnóstica quanto na avaliação prognóstica. Dentre os achados ecocardiográficos,
o aumento do átrio direito e a presença de derrame pericárdico são os principais marcadores prognós-ticos já identificados, sendo que a presença de derrame pericádico se comporta como marcador independente de gravidade em vários estudos.(7-9) O ecocardiograma permite ainda a avaliação da função do ventrículo direito, por meio de medidas diretas ou através de índices como o índice de Tei, e a avaliação indireta da pré-carga do ventrículo esquer-do.(10) Embora estes dados não sejam avaliados de forma usual, eles podem ser facilmente obtidos durante o exame convencional. Convém salientar que a medida da pressão sistólica da artéria pulmonar, isoladamente, não constituiu fator prognóstico em nenhum dos estudos em que foi avaliada.
VARIÁVEIS HEMODINÂMICAS
A hemodinâmica pulmonar está profundamente alterada na HAP, com aumento acentuado dos níveis de pressão da artéria pulmonar, elevação da pressão do átrio direito e redução do débito cardíaco.(11) Em um ensaio de investigação de sobrevida em paci-entes com HAP idiopática, Alonso ......(1) demons-traram que uma elevação de 55 para 85 mmHg na pressão média da artéria pulmonar era associada a uma diminuição na sobrevida de 48 para 12 meses. O risco de morte correlacionou-se com o aumento da pressão do átrio direito (OR: 1,99) e a queda do índice cardíaco. Este estudo permitiu o desenvol-vimento de uma equação para predição de sobre-vida na ausência de tratamento específico.
A resposta aguda aos vasodilatadores, aferida durante o cateterismo direito, é um indicador de melhora sintomática com o tratamento e de aumento de sobrevida.(11-12) Nestas recomendações, existe o tópico específico de avaliação hemodi-nâmica, que aprofunda a discussão sobre a impli-cação diagnóstica e prognóstica dos achados do cateterismo cardíaco direito.
MARCADORES BIOQUÍMICOS
Vários marcadores bioquímicos foram estu-dados, tanto em sua capacidade de avaliar o prog-nóstico quanto na avaliação da resposta terapêutica, entre os quais a endotelina, o dímero D, peptídeos natriuréticos (BNP e proBNP), a troponina e o ácido úrico.
A endotelina-1 é um potente vasoconstritor pulmonar. Níveis elevados de endotelina-1 têm forte correlação com a gravidade da hipertensão pulmonar.(13) Em um estudo com 16 portadores de HAP idiopática, em que foram feitos exames hemodinâmicos e teste de caminhada de seis minutos, houve uma forte correlação entre os níveis
Critérios prognósticos em hipertensão arterial pulmonar.... plasmáticos de endotelina-1 e a resistência vascular pulmonar, a pressão média da artéria pulmonar, a resistência vascular pulmonar, o índice cardíaco e a prova de exercício.(14)
A pesquisa do dímero-D como marcador de doença trombótica tem crescido. Um ensaio clínico avaliando os níveis de dímero-D em 14 pacientes com HAP idiopática conduzido por Shitrit ...... revelou correlação positiva com a classificação funcional da New York Heart Association e pressão da artéria pulmonar, e correlação negativa com o teste de caminhada de seis minutos. Após um ano de observação, pacientes com níveis mais elevados de dímero-D tinham mortalidade significativamente maior.(15)
Os níveis séricos de ácido úrico estão significa-tivamente elevados na HAP quando comparados com um grupo controle, o que demonstra alteração no metabolismo oxidativo. Em um estudo reunindo 90 pacientes com HAP, o nível sérico do ácido úrico correlacionou-se positivamente com resistência vascular pulmonar e negativamente com o índice cardíaco. A terapia vasodilatadora associou-se à queda da resistência vascular pulmo-nar e diminuição da uricemia. Os níveis elevados de ácido úrico foram marcadores independentes de mortalidade, com sobrevida significativamente diminuída em casos com hiperuricemia(16).
Marcadores bioquímicos de sobrecarga e dano do miocárdio têm sido progressivamente incorpo-rados na investigação diagnóstica e prognóstica de pacientes com insuficiência ventricular esquer-da e síndromes coronarianas agudas.
A insuficiência ventricular direita é a principal causa de morte na HAP. Elevação da troponina T cardíaca indica dano ao miocárdio e pode sugerir progressiva falência do ventrículo direito. Recen-temente, ensaios clínicos acerca da importância da troponina T cardíaca como marcador de sobrevida na HAP estão sendo desenvolvidos. Num estudo(17) com 56 portadores de HAP, níveis de troponina T cardíaca acima de 0,01ng/mL correla-cionaram-se com pior performance no teste de caminhada, saturação venosa mista de oxigênio mais baixa e mortalidade significativamente aumen-tada em dois anos de observação: 29% versus 81%.
O mesmo raciocínio pode ser extrapolado para o uso dos peptídeos natriuréticos, tanto o BNP quanto o proBNP. Nagaya .....(18) relataram estudo avaliando 63 pacientes com HAP em que os níveis do BNP foram um marcador independente de mortalidade, sendo que a mudança desses níveis após três meses de tratamento se relacionou com a variação da resistência vascular pulmonar medida pelo cateterismo cardíaco. No primeiro estudo clínico nacional, avaliando a resposta terapêutica com o uso de antagonista dos receptores de endotelina, a melhora clínica e funcional dos pacientes foi acompanhada da diminuição significativa dos níveis séricos de proBNP.(19)
COMENTÁRIOS
Embora não exista consenso quanto à forma ideal de se seguir os pacientes portadores de HAP, é importante ressaltar a necessidade de avaliação contínua desses pacientes ao longo de todo o período de tratamento, a fim de se identificar precocemente quaisquer sinais de deterioração. Enquanto o real papel dos diversos marcadores não está estabelecido, recomendamos a realização do teste de caminhada de seis minutos como monitoração básica dos pacientes frente ao tratamento instituído.
REFERÊNCIAS
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4. Sitbon O, Humbert M, Nunes H, Parent F, Garcia G, Herve P, et al. Long-term intravenous epoprostenol infusion in primary pulmonary hypertension: prognostic factors and survival. J Am Coll Cardiol. 2002;40(4):780-8.
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