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Artigo Original

Adesão ao tratamento da tuberculose após a instituição da estratégia de tratamento supervisionado no município de Carapicuíba, Grande São Paulo

Compliance with tuberculosis treatment after the implementation of the directly observed treatment, short-course strategy in the city of Carapicuíba, Brazil

Amadeu Antonio Vieira, Sandra Aparecida Ribeiro

ABSTRACT

Objective: To determine the compliance with tuberculosis treatment among patients enrolled the tuberculosis control program in the city of Carapicuíba, Brazil, before and after the implementation of the directly observed treatment, short-course (DOTS) strategy. Methods: A retrospective historical cohort study of operational aspects based on records of attendance and treatment evolution of patients in self-administered treatment (SAT) and of those submitted to DOTS. Monthly treatment outcome tables were created, and the probability of compliance with the treatment was calculated for both groups of patients. Results: A total of 360 patients with tuberculosis met the inclusion criteria: 173 (48.1%) in the SAT group; and 187 (51.9%) in the DOTS group. Treatment compliance was 6.1% higher in the DOTS group than in the SAT group. The proportion of patients completing the six months of treatment was 91.6% and 85.5% in the DOTS group and in the SAT group, respectively. Conclusions: The results of this study show that DOTS can be successfully implemented at primary health care clinics. In this population of patients, residents of a city with low incomes and a high burden of tuberculosis infection, DOTS was more effective than was SAT.

Keywords: Tuberculosis; Mycobacterium tuberculosis; Treatment outcome; Medication adherence.

RESUMO

Objetivo: Verificar a adesão ao tratamento dos casos atendidos no programa de controle da tuberculose do município de Carapicuíba (SP), antes e após a implantação da estratégia directly observed treatment, short-course (DOTS, tratamento supervisionado). Métodos: Estudo operacional do tipo coorte histórica a partir dos registros de comparecimento e evolução do tratamento dos pacientes submetidos ao tratamento autoadministrado (TAA) e daqueles submetidos a DOTS. Tábuas de desfecho de tratamento mês a mês foram elaboradas, e a probabilidade de adesão foi calculada para cada grupo de pacientes. Resultados: Um total de 360 pacientes com tuberculose preencheu os critérios de elegibilidade: 173 (48,1%) no grupo TAA e 187 (51,9%) no grupo TS. A adesão ao tratamento foi 6,1% maior no grupo DOTS do que no grupo TAA. Ao final de seis meses, 91,6% dos pacientes sob TS completaram o tratamento padrão, enquanto 85,5% dos pacientes do grupo TAA completaram o tratamento. Conclusões: Este estudo mostrou que a estratégia DOTS pode ser realizada com sucesso em unidades básicas de saúde e que essa estratégia foi mais efetiva que o TAA nesta população de pacientes de uma cidade com população de baixa renda e alta carga de tuberculose.

Palavras-chave: Tuberculose; Mycobacterium tuberculosis; Resultado de tratamento; Adesão ao medicamento.

Introdução

A tuberculose (TB) continua a ser um desafio e um grande problema de saúde pública em pleno século XXI, apesar de existirem esquemas terapêuticos com eficácia superior a 95% para os doentes com TB infectados por Mycobacterium tuberculosis suscetível aos medicamentos de primeira linha. Um grande número de pacientes não adere ao tratamento, especialmente nos países em desenvolvimento ou subdesenvolvidos, onde a carga de TB é muito maior, tais como Uganda (13,0%), Nigéria (10,0%), Federação Russa (9,6%), África do Sul (9,1%), Brasil (8,3%), entre outros.(1-3)

Na tentativa de explicar a baixa adesão ao tratamento, muitos fatores têm sido relatados, como os baixos valores investidos na manutenção e no financiamento dos programas, a baixa qualidade dos serviços de saúde, a desmotivação dos profissionais, a coinfecção por HIV, a pauperização da população marginalizada e a dificuldade de acesso aos serviços de saúde por parte de certos grupos considerados vulneráveis, marcadamente nos grandes centros urbanos, tais como desempregados, moradores de rua, alcoolistas crônicos e usuários de drogas.(4,5)

No ano 2000, a Organização das Nações Unidas elaborou metas para o "Desenvolvimento do Milênio" e o combate a certas doenças, entre elas a TB, originando a iniciativa chamada Stop TB, que estabeleceu para o ano de 2015 a redução da incidência e de óbitos por TB em 50%, tomando como base os dados obtidos em 1990. Os dados consolidados do Programa Nacional de Controle da Tuberculose (PNCT) brasileiro de 2008 mostraram uma incidência de 37,1/100.000 habitantes, sendo que 20,6/100.000 habitantes eram bacilíferos.(6,7)

A partir de 2003, a TB foi colocada na agenda de prioridades das políticas públicas no Brasil, sendo pactuada com os gestores estaduais e municipais a necessidade de detecção de pelo menos 70% dos casos de TB bacilíferos, assim como o aumento da taxa de cura para pelo menos 85%. Para o cumprimento dessa meta, o PNCT fortaleceu e descentralizou a estratégia de tratamento supervisionado, conhecida como directly observed therapy, short-course (DOTS, tratamento diretamente observado de curta duração). Anteriormente, o PNCT já havia elegido 230 municípios prioritários que concentravam a maioria dos casos de TB do país segundo critérios epidemiológicos e dados operacionais.(3,7,8)

Carapicuíba, cidade-dormitório localizada na região metropolitana da Grande São Paulo, é um dos municípios com maior densidade demográfica do país (10.936 habitantes/km2) e é considerado um desses municípios prioritários desde 1998 por apresentar uma das maiores incidências de TB do estado de São Paulo (54,2/100.000 habitantes, sendo que 32,3/100.000 habitantes eram bacilíferos - dados referentes a 2005).

A estratégia DOTS é composta por cinco pilares fundamentais, a saber: comprometimento político, detecção de casos bacilíferos, tomada supervisionada da medicação, fornecimento regular de tuberculostáticos de primeira linha e implementação de um sistema de notificação e de acompanhamento dos casos.(7-9)

Em 2008, o Brasil apresentava cerca de 40% dos casos de TB em tratamento sob regime supervisionado. No entanto, ainda há poucos estudos realizados sob condições não controladas que avaliem os resultados da estratégia DOTS nas unidades de saúde e em programas municipais.(8,9)

O objetivo do presente estudo foi verificar a adesão ao tratamento dos casos de TB atendidos no Programa de Controle da Tuberculose (PCT) no município de Carapicuíba, SP, antes e após a implementação da estratégia DOTS.

Métodos

Um estudo operacional do tipo coorte histórico foi realizado utilizando os casos de TB tratados pelo PCT do município de Carapicuíba, sob regime de tratamento autoadministrado (TAA), entre 1 de janeiro e 31 de dezembro de 2003, e entre 1 de julho de 2004 e 30 de junho de 2005, após a implantação da estratégia DOTS.

Os casos de TB sob DOTS realizaram a tomada da medicação supervisionada na unidade de saúde de referência ou na unidade mais próxima de sua residência, em horário pré-acordado, no mínimo três vezes por semana na fase de ataque e duas vezes por semana na fase de manutenção durante os dias de semana. Aos finais de semana, a medicação era autoadministrada. Para os pacientes com dificuldade de deambulação, a medicação supervisionada foi realizada na residência desses.

Foi considerado "caso de TB" o indivíduo com diagnóstico confirmado de TB por baciloscopia ou cultura, assim como aquele cujo médico, com base em dados clínico-epidemiológicos e no resultado de exames complementares (por exemplo, radiografia, exame anatomopatológico, dosagem de adenosina desaminase, etc.), firmasse o diagnóstico de TB e prescrevesse um dos esquemas de tratamento padrão na época da coleta de dados, com duração de seis meses, para casos novos (virgem de tratamento) ou para retratamentos após recidiva ou abandono.(10) Foi considerado "caso novo de TB" o paciente sem tratamento anterior, aquele submetido a tratamento por menos de 30 dias ou aquele submetido a tratamento anterior há mais de 5 anos, enquanto "caso de retratamento" como o paciente que retornou ao tratamento após o abandono do esquema básico ou que apresentou recidiva após a cura devido a um tratamento prévio realizado há mais de 5 anos. Os casos de TB meningoencefálica, monorresistente ou multirresistente, bem como os casos com transferências confirmadas ou ainda os casos de residentes em outros municípios, foram excluídos do estudo.

Como critério de encerramento do tratamento de TB, empregamos as definições do Ministério da Saúde(10):

 Alta por cura: Para os casos pulmonares inicialmente positivos, a alta por cura será dada se, durante o tratamento, o paciente apresentar duas baciloscopias negativas, uma na fase de acompanhamento e outra ao final do tratamento.
 Alta por completar o tratamento: Será dada com base em critérios clínicos e radiológicos, quando o paciente não tiver realizado o exame de baciloscopia por ausência de expectoração e tiver alta com base em dados clínicos e exames complementares, assim como casos de TB pulmonar inicialmente negativos e casos de TB extrapulmonar.
 Alta por abandono: O caso que após iniciado o tratamento para TB deixou de comparecer à consulta médica após a data agendada para retorno ou para a ingestão da medicação por mais de trinta dias consecutivos.
 Alta por mudança de diagnóstico: Será dada quando constatado erro no diagnóstico inicial.
 Alta por óbito: Será dada por ocasião do conhecimento da morte do paciente, durante o tratamento e independente da causa.
 Alta por transferência não confirmada: Será dada quando o doente for transferido para outro serviço de saúde e não foi possível a confirmação de que o paciente compareceu a nova unidade para prosseguimento do tratamento.

A partir das fichas de notificação e dos prontuários dos casos de TB, verificou-se a comparabilidade dos grupos TAA e DOTS segundo idade, sexo, grau de instrução, ocupação, sorologia para HIV, localização topográfica da TB, pesquisa de BAAR e tratamento prévio para TB, visto que os grupos são coortes não concorrentes de pacientes tratados no PCT do município e não uma amostra probabilística.(10) Um banco de dados foi elaborado por meio do pacote estatístico Epi Info 2000 versão 3.3. Realizou-se a digitação dupla dos dados para a verificação de sua consistência e eliminação de possíveis erros de digitação. Para a comparação das variáveis sociodemográficas e das características clínicas, foram realizadas análises bivariadas com o teste do qui-quadrado ou o teste exato de Fisher utilizando-se o mesmo pacote estatístico. O nível de significância adotado foi de p < 0,05.
Para a avaliação da adesão ao tratamento entre os dois grupos (TAA e DOTS) empregou-se o método atuarial, mais conhecido como técnica de análise de sobrevida ou tábua de sobrevida.(11) Considerou-se como sobrevida, no presente estudo, a adesão ao tratamento, ou seja, o tempo desde a entrada dos casos de TB no estudo (data do início do tratamento padrão do Ministério da Saúde) até a ocorrência do evento de interesse (data da alta por cura ou por completar tratamento) a variável dependente; quando ocorrer perda do segmento dos casos, exceto no caso de abandono, a técnica denomina esse evento de observações incompletas ou casos censurados (wx). Esse método calcula as probabilidades da adesão do tratamento em intervalos fixados previamente (consultas mensais de acompanhamento), e o número de expostos ao risco de abandono corresponde aos pacientes em tratamento ao início de cada intervalo x. O número de expostos (lx) é ajustado de acordo com o número de censuras que ocorreram nesse período, na suposição de que as censuras ocorreram uniformemente durante o período x. Assim, na presença de censura, é realizado um ajuste no número de pacientes em tratamento e expostos ao risco de abandono no início do período x (l*x), subtraindo-se metade das censuras do total de expostos ao risco no início do período, supondo que as censuras estiveram, em média, expostas ao risco de abandono apenas metade do intervalo de seguimento. Nessa técnica, o tempo também é dividido em intervalos fixos (mensal), e a probabilidade de abandono (qx) e a de adesão ao tratamento (px) são calculadas para cada um dos intervalos.(12,13) Tem-se, então:

(px = 1 - qx), (qx = dx/l*x), e
l*x = lx - (wx/2)
onde:

 px = probabilidade condicional de adesão ao tratamento no intervalo x
 qx = probabilidade condicional de abandono do tratamento no intervalo x
 l*x = número de expostos ao risco de abandono, no intervalo x, corrigidos de acordo com as censuras ocorridas no intervalo x
 lx = número de pacientes expostos ao risco de abandono no início do período
 dx = número de pacientes que abandonaram o tratamento
 wx = número de pessoas censuradas no intervalo x

Calcularam-se IC95% para as probabilidades de adesão ao tratamento em percentagem a partir das tabuas de sobrevida, que foram apresentadas em forma de gráficos, mostrando as probabilidades condicionais de adesão por intervalos x (mensais) até o último mês de acompanhamento (sexto mês), o que resultou na adesão final ao tratamento (alta por cura ou por completar tratamento). O protocolo deste estudo foi apresentado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo.

Resultados

Um total de 360 casos preencheu os critérios de elegibilidade, sendo 173 casos do grupo TAA (48,1%) e 187 do grupo DOTS (51,9%). Foram excluídos 39 casos, pelos seguintes critérios: 23 (59,0%) por transferência confirmada, 9 (23,1%) por presença de mono ou multirresistência, 4 (10,2%) por residência em outros municípios e 3 (7,7%) por TB meningoencefálica. A média de idade dos casos foi de 37,3 anos (variação: 4-84 anos), com predomínio do sexo masculino (60,6%). Com relação ao grau de instrução, 27,1% apresentavam até 3 anos de estudos, e somente 36,3% estudaram por mais de 8 anos. Quanto à ocupação, 26,9% dos casos eram do lar ou estudantes, 45,3% eram empregados com registro em carteira, e 27,8% não tinham registro em carteira ou estavam desempregados. Dos 237 indivíduos testados para HIV, 119 (50,2%) pertenciam ao grupo TAA e 118 (49,8%) ao grupo DOTS. Dos indivíduos testados, 18 (7,6%) tiveram resultados positivos (9 coinfectados em cada grupo).

Do total de casos estudados, 301 (83,6%) apresentavam TB pulmonar, dos quais 211 (70,1%) eram bacilíferos. Dos 59 casos diagnosticados como TB na forma clínica extrapulmonar, 35 (59,3%) apresentavam TB pleural, 10 (16,9%) apresentavam TB ganglionar periférica, 3 (5,1%) tinham a forma miliar, 2 (3,4%) tinham a forma óssea, e 9 (15,3%) apresentavam outras formas de TB. Na Tabela 1, verificamos que não houve diferenças significativas entre os pacientes dos grupos TAA e DOTS para as variáveis sociodemográficas, "coinfecção HIV/TB" e "localização topográfica da doença", descritas acima. Para a variável "tratamento prévio", o grupo TAA apresentou uma maior proporção de casos de retratamentos do que o grupo DOTS, e essa diferença foi significativa.




As Figuras 1-4 foram construídas segundo as informações colhidas das tábuas de sobrevida, com as probabilidades condicionais de adesão ao tratamento mensal (intervalos de x1 a x6), para verificar a porcentagem das altas por cura dos casos de TB em tratamento no PCT do município de Carapicuíba de acordo com a estratégia utilizada (TAA ou DOTS). Na Figura 1, observou-se ao final do intervalo de seis meses do início do tratamento uma diferença significativa de efetividade para o grupo DOTS em relação ao TAA (6,09%), visto que não houve interceptação entre as linhas segundo os dois grupos de comparação. A probabilidade de alta por cura dos casos do grupo DOTS foi de 91,61% (IC95%: 91,48-91,64) enquanto essa dos casos do grupo TAA foi de 85,52% (IC95%: 85,30-85,73).













Estratificando os casos de TB segundo o tipo de caso (novo ou retratamento), topografia da TB (pulmonar ou extrapulmonar) e TB pulmonar (bacilífera ou não) em relação aos grupos de atendimento (DOTS e TAA), as Figuras 2-4 mostram que a adesão dos casos sob a estratégia DOTS também foi significativamente superior. A probabilidade de cura dos casos novos de tratamento no grupo DOTS foi 2% superior àquela no grupo TAA (IC95%: 91,94-92,19 vs. 89,47-89,59; Figura 2a). Para os casos de retratamento, a cura foi de 80,33% e de 68,65% nos grupos DOTS e TAA (IC95%: 78,84-81,20 vs. 66,47-70,72; Figura 2b). Os casos de TB pulmonar do grupo DOTS apresentaram 91,13% de adesão (IC95%: 91,04-91,27), enquanto os do grupo TAA foram de 85,30% (IC95%: 85,15-85,44; Figura 3a); nos casos com localização extrapulmonar, a vantagem para o grupo DOTS em relação ao grupo TAA foi de 3,1% (Figura 3b), com proporção de cura de 90,09% (IC95%: 89,88-90,20) e de 87,00% (IC95%: 86,73-87,26), respectivamente. Para os casos bacilíferos, como mostrado na Figura 4A, a proporção de cura nos grupos DOTS e TAA foi de 90,75% (IC95%: 90,64-90,80) e 87,38% (IC95%: 85,51-87,24), respectivamente, enquanto para os casos não bacilíferos (Figura 4B), essa proporção foi de, respectivamente, 90,95% (IC95%: 90,56-91,02) e 79,06% (IC95%: 78,23-79,87).

Discussão

A adesão ao tratamento da TB é difícil de prever, mas pacientes com abandonos prévios, com problemas com alcoolismo, abuso de drogas ou problemas mentais, assim como moradores de rua ou pacientes HIV positivos, são habitualmente não aderentes.(4,14-17) O tratamento incorreto ou incompleto é uma causa de resistência adquirida.(4,18)
A estratégia DOTS é uma recomendação da Organização Mundial da Saúde para o tratamento da TB, especialmente em países em desenvolvimento.(2,5,7,14) Uma das principais linhas de pesquisa da TB é verificar a eficácia das intervenções terapêuticas e a efetividade da estratégia DOTS, avaliada em grupos selecionados e randomizados de pacientes. As pesquisas operacionais ajudam a verificar a aceitabilidade e a aplicabilidade de novas ou inovadoras modalidades de tratamento em diferentes cenários e situações quotidianas nos serviços e programas de saúde. No Brasil, dados epidemiológicos e operacionais indicam que a incidência, a mortalidade e as taxas de abandono e de cura não tiveram quedas expressivas nos últimos anos. Além disso, há poucos estudos como este no Brasil, com a análise da efetividade do tratamento supervisionado da TB em condições operacionais.(8,11,14-19)

Uma das limitações deste estudo foi a comparação entre os grupos TAA e DOTS, que, por razões éticas, foi feita em séries históricas de pacientes tratados em dois períodos diferentes, mas em anos consecutivos, o que pode garantir a não modificação das principais variáveis sociodemográficas relacionadas à TB, assim como de outros fatores importantes para os diferentes desfechos, com exceção da mudança de estratégia de TAA para DOTS. A diferença observada em relação ao maior número de óbitos no grupo DOTS pode ser explicada pela melhoria na qualidade dos dados do sistema de informação e de acompanhamento dos casos, pois, a partir da implantação do DOTS, houve o cruzamento de informações entre o Sistema de Informação de Mortalidade e o Sistema de Controle de Pacientes com Tuberculose do Estado de São Paulo, o que não era realizado como rotina antes da implantação da estratégia DOTS no município.

Sob condições operacionais, a implemen­tação do DOTS no município de Carapicuíba apresentou melhorias na adesão ao tratamento pelos pacientes do que aqueles submetidos ao TAA. Esses achados são consistentes e comparáveis com aqueles de estudos realizados nas cidades do Rio de Janeiro (RJ), Ribeirão Preto (SP) e Taboão da Serra (SP), assim como de estudos na China.(8,9,11,16) Nossos dados mostraram maior probabilidade de alta por cura ou completar o tratamento nos pacientes sob estratégia DOTS em relação àqueles em TAA. Ao final de seis meses, a probabilidade dos pacientes sob DOTS de receber alta por cura ou completar o tratamento foi de 91,6%, enquanto essa probabilidade daqueles sob TAA foi de 85,5%. Este estudo mostra que o DOTS pode ser realizado com sucesso pelas unidades básicas de saúde, mesmo em populações com alta carga de TB, baixa renda e residentes em grandes centros urbanos, tais como Carapicuíba e outros principais municípios prioritários do país. Achados semelhantes foram relatados em outros estudos.(11,14-16) A melhor adesão ao tratamento supervisionado também foi verificada naqueles que referiram tratamento prévio para TB comparados aos que fizeram TAA. Os pacientes tratados sob DOTS também tiveram maior probabilidade de alta por cura, independentemente da localização da doença ou da presença de baciloscopia positiva.

Alguns estudos demonstram que incentivos aos pacientes aumentam as taxas de alta por cura.(4,20-23) Neste estudo, era oferecido um desjejum para os pacientes sob DOTS após cada dose, assim como uma suplementação mensal de alimentos não perecíveis (cesta básica) e passagens para o transporte. Quando necessário, eram oferecidas aos pacientes facilidades, como a administração da medicação no local de trabalho ou no domicilio e horários estendidos nas unidades básicas de saúde, a fim de facilitar e individualizar o tratamento, como realizado em outras localidades.(9,16-24)

Bons resultados nos programas de TB são influenciados pelos gerentes e por profissionais de saúde treinados e motivados.(14,24-26) A maior efetividade e adesão ao tratamento podem estar relacionadas à melhoria na relação do paciente e de seus familiares com os profissionais de saúde.(13) A qualidade da interação entre pacientes e profissionais de saúde pode ser um dos principais fatores para explicar os excelentes resultados da estratégia DOTS ou da medicação supervisionada em diferentes programas em todo o mundo, inclusive em nosso PCT.(10,11,14-17)

A relação entre tratamento supervisionado e a taxa de cura é complexa, e os fatores que podem influenciar diferentes desfechos não são totalmente previsíveis e possíveis de serem determinados objetivamente, mas sabe-se que a supervisão do tratamento é importante para garantir altos números de alta por cura. Além do tratamento supervisionado, o compromisso político em garantir adequado e rápido acesso aos meios de diagnóstico, com equipes treinadas e motivadas, e o monitoramento sistemático dos dados são medidas importantes, todas componentes da estratégia DOTS.(14,18)

Este estudo verificou que a estratégia DOTS para TB melhorou a adesão ao tratamento dos casos inscritos no PCT do município de Carapicuíba (SP), aumentando a probabilidade de cura após seis meses do uso da medicação padrão, em condições operacionais, corroborando resultados apresentados em outros estudos.(13,23,24)


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* Trabalho realizado no Programa de Controle da Tuberculose da Secretaria de Saúde e Medicina Preventiva do Município de Carapicuíba, Carapicuíba (SP) Brasil e no Departamento de Medicina Preventiva da Universidade Federal de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Amadeu Antonio Vieira. Alameda dos Lírios, 150, Vila Lourdes, CEP 06394-010, Carapicuíba, SP, Brasil.
Tel. 55 11 4164-3866. E-mail: vieiratb@gmail.com
Apoio financeiro: Este estudo recebeu apoio financeiro da United States Agency for International Development (USAID-Brasil).
Recebido para publicação em 17/3/2010. Aprovado, após revisão, em 6/11/2010.



Sobre os autores

Amadeu Antonio Vieira
Interlocutor. Programa de Controle da Tuberculose da Secretaria de Saúde e Medicina Preventiva do Município de Carapicuíba; Carapicuíba (SP) Brasil. Professor Assistente. Instituto de Saúde, Universidade Bandeirante de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.

Sandra Aparecida Ribeiro
Professor Associado. Universidade Federal de São Paulo, São Paulo (SP) Brasil.

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