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Comunicação Breve

Evolução do estado nutricional de pacientes desnutridos ou com excesso de peso candidatos a transplante pulmonar

Giuliana Bastos Esteves, Alessandra Macedo, Miyoko Nakasato, Maria Lúcia Mendes Bruno

ABSTRACT

A retrospective study using anthropometric data to assess the evolution of nutritional status in lung transplant candidates who are initially malnourished or overweight. We included patients with an initial body mass index (BMI) < 17 kg/m2 (malnourished, n = 10) or > 27 kg/m2 (overweight, n = 20). Each patient subsequently had three appointments with a nutritionist (nutritional interventions). In the malnourished group, there were no significant post-intervention changes in the anthropometric variables. In the overweight group, however, nutritional intervention had a positive impact on weight, BMI and waist circumference.

Keywords: Lung transplantation; Nutritional status; Body mass index; Anthropometry.

RESUMO

Estudo retrospectivo, que avaliou a evolução do estado nutricional, por meio de antropometria, de candidatos a transplante pulmonar desnutridos ou com excesso de peso. Foram incluídos pacientes com índice de massa corpórea (IMC) < 17 kg/m2 (desnutrido, n = 10) ou IMC > 27 kg/m2 (sobrepeso, n = 20) no momento da avaliação inicial. Estes pacientes foram submetidos por três consultas com um nutricionista (intervenções nutricionais). Não houve diferenças significantes nas variáveis antropométricas após as intervenções no grupo desnutrido. Porém, os resultados do grupo sobrepeso mostraram o impacto positivo da intervenção nutricional no peso, IMC e circunferência da cintura dos pacientes.

Palavras-chave: Transplante de pulmão; Estado nutricional; Índice de massa corporal; Antropometria.

O transplante pulmonar pode ser indicado para o tratamento de doenças pulmonares, e essa indicação é baseada no histórico do paciente, sua condição física, achados laboratoriais, idade, entre outros.(1)

Os cuidados com esses pacientes devem ser iniciados já no período pré-operatório, incluindo a avaliação antropométrica, para auxiliar na identificação do grau de comprometimento do estado nutricional e, se necessário, realizar uma intervenção nutricional imediata,(2) pois é sabido que a doença pulmonar afeta, com frequência, a ingestão de nutrientes, deixando os pacientes em risco de desnutrição ou de sobrepeso.(3)

Em um estudo retrospectivo realizado em Toronto,(4) a relação entre o estado nutricional pré-operatório e a mortalidade pós-transplante pulmonar foi analisada, concluindo-se que pacientes com índice de massa corpórea (IMC) menor que 17 kg/m2 ou maior de 27 kg/m2, antes do transplante, tinham um risco significantemente maior de morte após o transplante. Baseado nessa evidência, sugere-se que esse intervalo de IMC (17-27 kg/m2) deva ser considerado como o mais indicado para o paciente ser submetido ao transplante.

Baseado nos resultados obtidos em um estudo previamente realizado na instituição,(5) notou-se uma maior prevalência de desnutrição nos pacientes com fibrose cística e bronquiectasias e uma maior prevalência de obesidade nos pacientes com fibrose pulmonar. A partir desse fato, observou-se a necessidade de realizar um estudo com o objetivo de verificar as alterações ponderais dos pacientes candidatos a transplante pulmonar que não se encontravam dentro da faixa de IMC considerada como ideal.

O estudo foi retrospectivo e avaliou os dados dos pacientes desnutridos e/ou com excesso de peso candidatos a transplante de pulmão, sem distinção de gênero, faixa etária ou tipo de doença pulmonar prévia.
Foram incluídos pacientes atendidos ambulatorialmente entre agosto de 2003 e agosto de 2008, que apresentavam IMC < 17 kg/m2 ou IMC > 27 kg/m2 no momento da avaliação inicial (grupo desnutrido e grupo sobrepeso, respectivamente). Esses pacientes tiveram três consultas individuais com um nutricionista. O intervalo entre a primeira e a terceira consulta foi de, no máximo, 180 dias.

As variáveis utilizadas foram coletadas dos prontuários dos pacientes e incluíram: nome, gênero, idade, doença pulmonar de base, número de dias de acompanhamento, peso (kg) e altura (m).

A partir dos dados de peso e altura, calculou-se o IMC(6) de cada paciente, utilizando-se para a classificação os padrões de referência recomendados conforme a faixa etária.(7-9)

As variáveis categóricas foram apresentadas em tabelas contendo frequências absolutas (n) e relativas (%). A associação dessas variáveis com o estado nutricional foi avaliada pelo teste do qui-quadrado.(10)
As variáveis quantitativas com distribuição normal foram apresentadas como média e desvio-padrão e avaliadas pelo teste t de Student pareado para cada grupo; as variáveis sem distribuição normal foram avaliadas pelo teste não-paramétrico de Mann-Whitney.(10)

As variáveis foram calculadas por meio do programa Statistical Package for the Social Sciences, versão 15.0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA), e os valores de p < 0,05 foram considerados significantes.

O projeto foi aprovado pela comissão científica da instituição e pela Comissão de Ética para Análise de Projetos de Pesquisa.
A amostra consistiu de 30 pacientes, sendo 10 incluídos no grupo desnutrido e 20 no grupo sobrepeso.

A Tabela 1 mostra as características dos grupos estudados.
Foi encontrada uma diferença significante na relação entre a doença de base e o estado nutricional, mostrando que pacientes com bronquiectasias e fibrose cística estão mais relacionados com desnutrição, e aqueles com fibrose pulmonar e enfisema pulmonar apresentavam excesso de peso. O fato de que pacientes fibrocísticos são desnutridos é conhecido.(3,11) No entanto, dados da literatura também indicam a desnutrição de pacientes com enfisema pulmonar,(12) o que não vai de encontro com os nossos resultados.



A relação entre pacientes com fibrose pulmonar e o excesso de peso já foi estabelecida,(3) e os nossos achados foram semelhantes.
O tempo de seguimento dos pacientes candidatos a transplante pulmonar do estudo foi maior no grupo desnutrido do que no grupo sobrepeso. Mesmo assim, o primeiro grupo não obteve recuperação do estado nutricional estatisticamente significante, o que indica que o tempo não foi um fator determinante.

A oscilação das variáveis de peso e IMC no grupo desnutrido não foi estatisticamente significante, conforme descrito na Tabela 2. No entanto, os resultados mostraram que o programa de intervenção nutricional teve um impacto positivo na intervenção nutricional realizada com o grupo sobrepeso.



O guia prático de tratamento de excesso de peso elaborado pelo National Heart, Lung and Blood Institute(13) refere que a diminuição de 10% do peso corpóreo atual, em um período de até 180 dias, diminui os fatores de risco para desenvolver doenças. No presente estudo, houve uma redução de 4,6 kg (5,5%) em 79 dias no grupo sobrepeso, de acordo com a mediana de dias de acompanhamento.

Os resultados encontrados podem ser comparados aos relatos de outro estudo,(14) no qual pacientes com DPOC foram acompanhados por 1 ano, e divididos em três grupos: desnutridos, eutróficos e com excesso de peso. Observou-se uma redução de 1,7 kg no grupo com excesso de peso após três meses de intervenção nutricional. Ressalta-se que, no presente estudo, a redução ponderal observada no mesmo período de tempo foi maior quando comparada àquela do estudo citado.

Analisando-se os resultados obtidos neste estudo, conclui-se, então, que a evolução do estado nutricional dos pacientes candidatos a transplante pulmonar foi considerada satisfatória somente para o grupo sobrepeso, que foi orientado a reduzir o peso para atingir a meta ponderal.


Referências

1. Camargo JJ. Transplante pulmonar. Rev AMRIGS. 2003;47(1):7-13.

2. Sachs A, Lerario MC. Doenças pulmonares. In: Cuppari L. Guia de nutrição: nutrição clínica no adulto. Guias de medicina ambulatorial e hospitalar. Barueri: Manole; 2005. p. 273-86.

3. Calanãs-Continente AJ, Cervero Pluvins C, Munoz Gomariz E, Lama Martinez R, Font Ugalde P, Molina Puerta MJ, et al. Prevalencia de desnutrición en enfermos candidatos a transplante pulmonar. Nutr Hosp. 2002;17(4):197-203.

4. Madill J, Gutierrez C, Grossman J, Allard J, Chan C, Hutcheon M, et al. Nutritional assessment of the lung transplant patient: body mass index as a predictor of 90-day mortality following transplantation. J Heart Lung Transplant. 2001;20(3):288-96.

5. Souza SM, Nakasato M, Bruno ML, Macedo A. Nutritional profile of lung transplant candidates. J Bras Pneumol. 2009;35(3):242-7.

6. Kamimura MA, Baxmann A, Sampaio LR, Cuppari L. Avaliação nutricional. In: Cuppari L. Guia de nutrição: nutrição clínica no adulto. Guias de medicina ambulatorial e hospitalar. Barueri: Manole; 2005. p.89-128.

7. World Health Organization. Obesity: preventing and managing the global epidemic. Geneva: WHO; 1997.

8. Burr ML, Phillips KM. Anthropometric norms in the elderly. Br J Nutr. 1984;51(2):165-9.

9. Must A, Dallal GE, Dietz WH. Reference data for obesity: 85th and 95th percentiles of body mass index (wt/ht2) and triceps skinfold thickness. Am J Clin Nutr. 1991;53(4):839-46. Erratum in: Am J Clin Nutr 1991;54(5):773.

10. Bussab WO, Morettin PA. Estatística básica. São Paulo: Saraiva; 2004.

11. Reis FJ, Oliveira MC, Penna FJ, Oliveira MG, Oliveira EA, Monteiro AP. Quadro clínico e nutricional de pacientes com fibrose cística: 20 anos de seguimento no HC-UFMG. Rev Ass Med Brasil. 2000;46(4):325-30.

12. Wouters EF. Nutrition and metabolism in COPD. Chest. 2000;117(5 Suppl 1):274S-80S.

13. National Heart, Lung, and Blood Institute; North American Association for the Study of Obesity. The practical guide identification, evaluation, and treatment of overweight and obesity in adults. NIH publication, no. 00-4084. Bethesda: The Institute; 2000.

14. Slinde F, Grönberg AM, Engström CR, Rossander-Hulthén L, Larsson S. Individual dietary intervention in patients with COPD during multidisciplinary rehabilitation. Respir Med. 2002;96(5):330-6.




Trabalho realizado no Instituto do Coração, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - InCor/HC-FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.
Endereço para correspondência: Giuliana Bastos Esteves. Rua Manoel da Cunha, 30, Jardim São Paulo, CEP 02301-120, São Paulo, SP, Brasil.
Tel 55 11 3542-8411. E-mail: nutrigiu@gmail.com
Apoio financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 17/2/2009. Aprovado, após revisão, em 20/7/2009.




Sobre os autores

Giuliana Bastos Esteves
Nutricionista Aprimoranda. Instituto do Coração, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - InCor/HC-FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Alessandra Macedo
Nutricionista. Instituto do Coração, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - InCor/HC-FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Miyoko Nakasato
Nutricionista Chefe. Área de Controle de Qualidade, Ensino e Treinamento, Serviço de Nutrição e Dietética, Instituto do Coração, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - InCor/HC-FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

Maria Lúcia Mendes Bruno
Nutricionista. Seção de Assistência Nutricional a Pacientes Internados, Serviço de Nutrição e Dietética, Instituto do Coração, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo - InCor/HC-FMUSP - São Paulo (SP) Brasil.

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