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Comunicação Breve

Determinação não-invasiva da pressão inspiratória em pacientes com lesão medular traumática: qual é o melhor método?

Noninvasive determination of inspiratory pressure in patients with spinal cord injury: what is the best method?

Andrea Ponte Rocha, Sergio Ricardo Menezes Mateus, Thomas Anthony Horan, Paulo Sérgio Siebra Beraldo

ABSTRACT

The aim of the study was to evaluate the performance of sniff nasal inspiratory pressure (SNIP) and MIP in individuals with spinal cord injury. We evaluated 26 patients with spinal cord injury. Mean FVC in those with tetraplegia was 52 ± 19% of predicted, compared with 78 ± 23% of predicted in those with paraplegia (p < 0.05). In contrast, the percentage of predicted SNIP was lower in those with tetraplegia than in those with paraplegia (p < 0.05). In all participants, SNIP correlated significantly with the level of the injury (r = 0.489; 95% CI: 0.125‑0.737). The impact that the greater discriminatory power of SNIP has on the diagnosis of impaired pulmonary function in spinal cord-injured patients should be investigated further.

Keywords: Spinal cord injuries; Respiratory function tests; Respiratory muscles; respiratory paralysis.

RESUMO

O objetivo deste estudo foi verificar o desempenho da pressão inspiratória nasal durante o fungar (PInas) e da PImáx em indivíduos com lesão medular traumática. Foram avaliados 26 pacientes com lesão medular traumática. Os pacientes tetraplégicos e paraplégicos exibiram diferentes médias do percentual do previsto da CVF, respectivamente, 52 ± 19% e 78 ± 23% (p < 0,05). Ao contrário da PImáx, o percentual do previsto médio da PInas foi inferior nos tetraplégicos (p < 0,05) e, em todos os participantes, a correlação com o nível da lesão foi significativa (r = 0,489; IC95%: 0,125-0,737). O impacto do melhor discernimento da PInas no diagnóstico das alterações da função inspiratória de pacientes com lesão medular traumática merece ser aprofundado.

Palavras-chave: Traumatismos da medula espinal; Testes de função respiratória; Músculos respiratórios; Paralisia respiratória.

As complicações pulmonares são responsáveis por taxas elevadas de morbidade e mortalidade em pacientes tetraplégicos.(1) A lesão medular traumática (LMT) pode causar fraqueza e paralisia dos músculos respiratórios em graus variáveis, dependendo do nível e completude da lesão.(2,3) As investigações tradicionais usadas em pacientes com LMT são a espirometria e a determinação dos volumes pulmonares. Porém, vários fatores podem influenciar os resultados de PImáx e PEmáx,(4-7) e o valor da PImáx como um índice de capacidade inspiratória tem sido questionado.(6) Uma alternativa é determinar a pressão inspiratória nasal durante o fungar (PInas). Até o momento, não há estudos clínicos que avaliem o uso da PInas em pacientes com LMT. Porém, em pacientes com outras doenças neuromusculares, o valor prognóstico da PInas para a avaliação da força diafragmática mostrou-se comparável ao dos testes não-volumétricos e invasivos.(8-11) A determinação da PInas é um procedimento rápido, de fácil execução, e utiliza equipamento portátil. A fim de examinar a hipótese que a PInas pode detectar a redução da força dos músculos inspiratórios em pacientes com LMT, comparamos PInas, PImáx e outros parâmetros de função pulmonar em pacientes com LMT que apresentavam perda total da função motora, estratificando a amostra de acordo com o grau da lesão.

De junho a outubro de 2005, 26 pacientes com LMT foram avaliados no Hospital Sarah-Brasília. Os critérios de inclusão foram os seguintes: ser do gênero masculino; ter mais de 16 anos de idade; apresentar lesão cervical completa ou lesão motora torácica entre C5 e T12 (grau A ou B segundo a American Spinal Injury Association)(12); e ser clinicamente estável. Foram aplicados os seguintes critérios de exclusão: ter qualquer doença sistêmica; precisar de suporte ventilatório; e apresentar congestão nasal ou alergias respiratórias. Os pacientes foram divididos em dois grupos, com base no grau da lesão (cervical ou torácica, correspondendo aos pacientes tetraplégicos e paraplégicos, respectivamente). Os dois grupos se assemelharam em termos de características clínicas e demográficas (Tabela 1).



O protocolo de pesquisa foi aprovado pela Comissão de Ética do Hospital Sarah-Brasília, e todos os pacientes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido.

O protocolo consistiu de espirometria, determinação de pressões respiratórias máximas e medidas de PInas. Os sujeitos foram testados individualmente durante uma única sessão à tarde, sentados em suas próprias cadeiras de rodas. A espirometria (MasterScope; Jaeger, Hoechberg, Alemanha) foi realizada de acordo com os padrões da American Thoracic Society,(13) ajustados para pacientes com LMT.(14)
Em seguida, as pressões respiratórias máximas foram medidas através de um medidor de pressão respiratória Micro Medical (Micro Medical Ltd, Kent, Reino Unido) em sequência aleatória. O aparelho incorpora um escape padrão a fim de evitar o fechamento da glote no momento dos esforços inspiratórios e expiratórios. Os dados obtidos foram analisados através do banco de dados de pressão respiratória PUMA e de software para análise, versão 1.4 (http://puma.princeton.edu).

Para as medidas de pressões respiratórias máximas, os pacientes respiravam através de um bocal tipo flange com clipes nasais e produziam um esforço de pelo menos 2 segundos de duração. As medidas de PImáx foram obtidas próximo ao nível de volume residual, enquanto as de PEmáx foram obtidas próximo ao nível da capacidade pulmonar total.(7,15) A PInas foi obtida próximo ao nível da capacidade residual funcional através de um plugue ajustado a uma das narinas dos participantes, enquanto a outra narina era fechada manualmente pelo técnico. Todas as manobras de PImáx, PEmáx e PInas foram realizadas quatro vezes, com intervalos de pelo menos 60 s entre cada medida. Foram registrados os valores mais altos. Para as medidas de PInas, o procedimento foi realizado duas vezes em cada narina. Para a espirometria, adotamos as equações de valores previstos de Pereira et al.(16); para PImáx e PEmáx, usamos aquelas de Neder et al.(15); e, para PInas, as de Uldry e Fitting.(17)

Os testes estatísticos restringiram-se aos testes t de Student, visto que todas as variáveis apresentavam distribuição normal de dados. Na análise de correlação (de Pearson), consideramos o nível mais cranial de perda da função motora. Designamos, arbitrariamente, um valor unitário para cada nível da segmentação da medula espinhal: aos níveis de C5 a T12 foram designados valores numéricos de 5 a 20. As análises foram realizadas através do programa Statview, versão 5.0.1 (SAS Institute Inc., Cary, NC, EUA). Foi adotado como nível de significância p < 0,05.

Com a exceção da razão VEF1/CVF, os valores médios (em porcentagem do previsto) dos parâmetros de espirometria foram mais baixos nos pacientes tetraplégicos (grupo de lesão cervical) do que nos pacientes paraplégicos (grupo de lesão torácica; p < 0,05; Tabela 1). Houve correlação significativa entre CVF porcentagem do previsto e o grau da lesão (r = 0,631; p < 0,001; IC95%: 0,323 a 0,818; Figura 1).



Os valores médios de PEmáx e PImáx (observados e porcentagem do previsto) foram mais baixos no grupo de lesão cervical que no grupo de lesão torácica, embora a diferença não tenha sido significativa (Tabela 1). O valor médio de PInas foi mais baixo para os pacientes tetraplégicos do que para os pacientes paraplégicos (p = 0,011). Quando os valores foram corrigidos pelos valores previstos, a diferença entre os grupos permaneceu (p < 0,001; Tabela 1). Como se pode ver na Figura 1, a correlação entre a porcentagem média do previsto e o grau da lesão foi significativa para PEmáx (r = 0,611; IC95%: 0,293 a 0,807) e PInas (r = 0,489; IC95%: 0,125 a 0,737), embora não para PImáx (r = 0,246; IC95%: −0,157 a 0,578).

Nossos achados mostram que a PInas correlacionou-se positiva e significativamente com o grau da lesão. O espectro de distúrbio observado através da medida da CVF foi paralelo ao observado através da determinação da PInas, sendo que os valores mais baixos para ambos os parâmetros foram obtidos em pacientes tetraplégicos. As PEmáx e PImáx não foram suficientemente sensíveis para diferenciar os pacientes tetraplégicos daqueles com lesões medulares torácicas, e a PImáx não conseguiu apresentar nenhuma correlação significativa com o nível exato da lesão.

A avaliação da força muscular respiratória em pacientes com doenças neuromusculares é um desafio. A fraqueza muscular significativa não pode ser clinicamente excluída em tais pacientes, mesmo naqueles que apresentam volumes pulmonares normais ou próximos do normal.(8)
Além disso, é difícil determinar volumes pulmonares em tais casos, visto que isso depende da cooperação do paciente e, portanto, de seu controle voluntário adequado. A força muscular respiratória é geralmente avaliada com base na PImáx e PEmáx, que devem ser interpretadas com cautela em indivíduos com doença neuromuscular. Valores baixos (resultados falso-positivos) podem ser causados por esforço inadequado do paciente, bem como por escapes de ar, fadiga ou outros fatores.(11)

A técnica invasiva de medir a pressão transdiafragmática e esofágica durante o fungar é considerada o método mais acurado e reprodutível de avaliação da capacidade total do diafragma.(9) A determinação da PInas é uma alternativa não-invasiva, acurada e reprodutível de avaliação da capacidade muscular inspiratória.(11) Ela se correlaciona fortemente com a pressão esofágica durante o fungar em indivíduos normais e pacientes com doenças esqueléticas e ­neuromusculares.(9) Nos pacientes com esclerose lateral amiotrófica, a PInas provou ser mais sensível que a CVF para medir pequenas mudanças na força muscular e para predizer o declínio da função respiratória com o avanço da doença.(9)

Até onde vai nosso conhecimento, não há estudos investigando o uso da PInas em pacientes com LMT, embora vários estudos tenham demonstrado os benefícios da PInas na avaliação de pacientes com doenças neuromusculares. Um estudo usou pressão transdiafragmática durante um fungar máximo, PImáx e capacidade vital a fim de estudar o efeito de diferentes posições do corpo e constritores abdominais na respiração de pacientes tetraplégicos.(6) Os autores não encontraram relação alguma entre a PImáx e as várias condições testadas. Eles afirmaram que a PImáx era "muito variável para que pudesse ser um índice valioso de capacidade respiratória".(6) Um outro estudo envolvendo 30 pacientes com lesão cervical tampouco encontrou relação entre a PImáx e o grau da lesão.(18)

Nosso estudo apresenta limitações. Não empregamos nenhum teste de padrão ouro (por ex.: pressão esofágica) como comparação. Além disso, o número de manobras poderia ter sido maior. Outrossim, a possibilidade da existência de um erro de tipo II existe, já que havia apenas 5 pacientes com lesão em T6-T12 disponíveis para o estudo.
Além do mais, uma avaliação post hoc, usando uma análise monocaudal e um alfa de 0,05, revelou uma capacidade inferior a 80% para PImáx e PEmáx. Apesar do número insuficiente de pacientes, o estudo mostrou que a PInas saiu-se significativamente melhor que a PImáx na discriminação do efeito da LMT sobre a função inspiratória. O método que usamos para obter os valores de PInas constitui outro motivo de preocupação. Na maioria dos estudos anteriores, a PInas foi medida em uma narina durante um fungar máximo realizado enquanto a narina contralateral permanecia aberta.(19) Já que muitos pacientes com tetraplegia tendiam a fazer poucos esforços e frequentemente necessitavam encorajamento, optamos por ocluir a narina contralateral, como defendido por Morgan et al.(9) Conforme as recomendações da American Thoracic Society e European Respiratory Society,(19) usamos a equação preditiva de Uldry e Fitting(17) para sujeitos saudáveis. Portanto, nossos valores de porcentagem do previsto podem ter sido superestimados, o que tenderia a diminuir qualquer diferença. Não obstante, observamos uma diferença significativa na PInas entre os grupos, e os valores de PInas correlacionaram-se com o grau da lesão, mesmo quando analisados pelo coeficiente de correlação de Spearman. Estas falhas metodológicas tenderiam a reduzir a chance de encontrar diferenças significativas entre os grupos, e estamos, portanto, mais confiantes que nossos resultados reflitam diferenças reais. Porém, nossos resultados são preliminares e devem ser interpretados com cautela.

Há grandes diferenças entre PImáx e PInas.(20) Há que se notar que os procedimentos empregados para determinar estas pressões inspiratórias não são equivalentes, já que são realizados com diferentes volumes pulmonares. Além disso, a PInas tem lugar durante um esforço balístico, enquanto a PImáx requer um esforço suportado. A determinação da PInas é um procedimento fácil e natural que permite aos pacientes ativar seus músculos inspiratórios mais completamente do que na determinação da PImáx. Adicionalmente, a ativação dos padrões do músculo inspiratório difere entre os dois procedimentos.(20)

Nossos resultados preliminares sugerem que, em pacientes com LMT, a PInas é uma medida mais acurada da função inspiratória do que a PImáx. Outros estudos podem esclarecer esta questão através da comparação com uma medida de padrão ouro tal como a medida da pressão esofágica. A medida da PImáx a partir da capacidade residual funcional também deveria ser considerada. Estas manobras talvez devessem ser usadas em combinação com a espirometria para uma avaliação sequencial completa da capacidade muscular inspiratória em pacientes com LMT.

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer Luiz Guilherme Nadal Nunes, estatístico no Departamento de Controle de Qualidade da Rede SARAH de Hospitais de Reabilitação, SARAH-Brasília, sua assistência analítica.

Referências

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Estudo realizado no Centro SARAH de Estudo e Pesquisa, Rede SARAH de Hospitais de Reabilitação, SARAH-Brasília, Brasília (DF) Brasil.
Endereço para correspondência: Paulo Sérgio Siebra Beraldo. SMPW Q 18, Conjunto 5, Lote 3, Casa H, CEP 71741-805, Brasília, DF, Brasil.
Tel 55 61 3319-1424. Fax 55 61 3319-1538.
E-mail: beraldo8@terra.com.br ou pauloberaldo@sarah.br
Apoio financeiro: Nenhum.
Recebido para publicação em 25/2/2008. Aprovado, após revisão, em 1/9/2008.


Sobre os autores

Andrea Ponte Rocha
Fisioterapeuta. Rede SARAH de Hospitais de Reabilitação, SARAH-Brasília, Brasília (DF) Brasil.
Sergio Ricardo Menezes Mateus
Fisioterapeuta. Rede SARAH de Hospitais de Reabilitação, SARAH-Brasília, Brasília (DF) Brasil.
Thomas Anthony Horan
Cirurgião torácico. Rede SARAH de Hospitais de Reabilitação, SARAH-Brasília, Brasília (DF) Brasil.
Paulo Sérgio Siebra Beraldo
Médico do Departamento de Medicina Interna. Centro SARAH de Estudo e Pesquisa, Rede SARAH de Hospitais de Reabilitação, SARAH-Brasília, Brasília (DF) Brasil.

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