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ISSN (on-line): 1806-3756

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Mesotelioma pleural maligno: uma atualização

Malignant pleural mesothelioma: an update

Glaucia N. M. Hajj1,2, Carolina H. Cavarson1,2, Clóvis Antônio Lopes Pinto3, Gabriela Venturi1,4, João R. Navarro4, Vladmir C. Cordeiro de Lima2,5

DOI: 10.36416/1806-3756/e20210129

ABSTRACT

Malignant mesotheliomas are rare types of cancers that affect the mesothelial surfaces, usually the pleura and peritoneum. They are associated with asbestos exposure, but due to a latency period of more than 30 years and difficult diagnosis, most cases are not detected until they reach advanced stages. Treatment options for this tumor type are very limited and survival ranges from 12 to 36 months. This review discusses the molecular physiopathology, current diagnosis, and latest therapeutic options for this disease.

Keywords: Pleural Mesothelioma; Treatment; Molecular Alterations.

RESUMO

Mesoteliomas malignos correspondem a um tipo raro de câncer que afeta as superfícies mesoteliais, normalmente a pleura e o peritônio. São associados à exposição ao amianto, porém, devido ao período de latência de mais de 30 anos e seu difícil diagnóstico, a maioria dos casos não é detectada até que estágios avançados sejam alcançados. As opções de tratamento para esse tipo de tumor são bastante limitadas e a taxa de sobrevida varia de 12 a 36 meses. Esta revisão discute a fisiopatologia molecular, o diagnóstico atual e as opções terapêuticas mais recentes para a doença.

Palavras-chave: Mesotelioma pleural; Tratamento; Alterações moleculares.

INTRODUÇÃO
 
O mesotelioma maligno (MM) é um tipo raro de câncer associado à exposição ocupacional ou ambiental ao amianto em 80% dos casos.(1) O primeiro caso de MM associado ao amianto foi reportado nos EUA, em 1967, decorrente de uma epidemia de MM entre mineiros, determinando assim à associação entre a exposição ao amianto e o desenvolvimento da doença. Embora raro, a incidência de MM vem aumentando desde a segunda metade do século 20, contexto no qual o MM tem sido ligado ao uso indiscriminado de amianto ao longo do último século.(2) A verdadeira extensão dessa epidemia de MM pelo mundo permanece desconhecida. Atualmente, a maior carga de uso de amianto se concentra no Brasil, na Rússia, Índia e China.(3)
 
A pleura é a região mais comum de origem do MM (73-85%), seguida do peritônio (7-18%).(4-6) O MM afeta predominantemente homens (proporção de 5:1 entre homens e mulheres), e seu risco aumenta com a idade, vindo a ser mais prevalente em indivíduos com >65 anos de idade.(7,8)
 
Reino Unido, Austrália e Nova Zelândia têm as mais altas taxas de incidência de MM, enquanto o Japão e países da Europa Central possuem os menores frequências.(9) Estima-se que entre 2005 e 2050, aproximadamente 94.000 casos de mesotelioma pleural maligno (MPM) e 15.000 casos de mesotelioma peritoneal maligno terão sido diagnosticados nos EUA.(10)
 
O Brasil é considerado um dos mais importantes produtores e exportadores de amianto. A taxa de mortalidade no MM vem crescendo continuamente no Brasil, passando de 0,64 morte por milhão de habitantes em 1980 a 1,18 morte por milhão de habitantes em 2002. Entre 1980 e 2010, registrou-se um total de 3.718 mortes por mesotelioma, a maioria (2.180) tendo ocorrido no sudeste do país. A taxa de mortalidade entre homens e mulheres mostrou-se equilibrada, sendo que 80,7% das mortes ocorreram em pessoas com mais de 50 anos. No entanto, muitos pacientes permanecem sem receber um diagnóstico, o que resulta na atual baixa incidência de MM no Brasil.(11-13)
 
Mutações germinativas em genes de predisposição ao câncer são descritas em aproximadamente 12% dos pacientes com MPM, sendo mais comuns em pacientes mais jovens e mulheres com pouca ou nenhuma exposição ao amianto, bem como aqueles com histórico familiar de câncer ou histórico pessoal de câncer (melanoma, mesotelioma, câncer de mama). BAP1 é o gene mais frequentemente mutado nessas situações, contabilizando 3-7% dos casos.(14-16)
 
O PAPEL DO AMIANTO NA PATOGENIA DO MESOTELIOMA
 
Amianto é o nome genérico de seis variedades de minerais fibrosos encontrados em rochas ígneas e metamórficas: crisotila (serpentina – amianto branco), amosita e actinolita (anfibólio – amianto marrom), e antofilita, arocidolita e tremolita (anfibólio - amianto azul).(14) A associação entre a exposição a anfibólios e o mesotelioma pleural maligno (MPM) é amplamente descrita, sendo a crocidolita considerada o tipo mais oncogênico. Acredita-se que, quanto mais finas e longas sejam as fibras (especialmente aquelas de comprimento acima de 8,0μm e espessura maior que 0,25μm), mais perigosas elas são, uma vez que penetram os pulmões, persistem por mais tempo na pleura, causando ciclos de dano e recuperação recorrentes no tecido, e inflamação local.(17) A exposição ao amianto e outros minerais fibrosos pode causar asbestose, câncer de pulmão, pleurisia benigna, placas pleurais e MPM.(18,19) Contudo, a exposição ao amianto é muito pouco associada ao mesotelioma peritoneal maligno (33-50% dos pacientes reportam exposição prévia ao amianto), assim como a época e a duração da exposição não se correlacionam diretamente ao desenvolvimento da doença.(9)
 
Embora a associação entre a exposição ao amianto e a patogênese do mesotelioma seja amplamente aceita, nenhuma hipótese comum foi alcançada para explicar a doença até então. Até 80% dos pacientes com MPM foram previamente expostos ao amianto. Entretanto, a razão pela qual apenas uma pequena proporção de indivíduos expostos ao amianto desenvolve o MM (2-10%) ainda é desconhecida(17) (Figura 1).


 
Células mesoteliais (CM) são altamente suscetíveis à citotoxicidade do amianto, e muitos eventos patogênicos podem contribuir para carcinogênese do MPM durante o longo período de latência entre a exposição ao amianto e o desenvolvimento do tumor.(20) As CM são afetadas por várias mudanças celulares induzidas pelo amianto, tais como dano ao DNA, inibição do ciclo celular e apoptose.(21-24) Inversamente, as CM produzem muitos mediadores inflamatórios em resposta ao amianto.(25)
 
Os mecanismos por meio dos quais a inflamação afeta o desenvolvimento do MM ainda não são completamente compreendidos, contudo, as evidências vêm indicando uma ligação entre o local da resposta inflamatória sistêmica e o prognóstico do paciente.(26) A resposta inflamatória intensa e sustentada é caracterizada pela migração de leucócitos e secreção de citocina, promovendo a transformação maligna da célula mesotelial.(27,28) Células malignas atraem células supressoras derivadas da medula óssea (MDSCs), macrófagos associados ao tumor (TAMs) e linfócitos reguladores (Treg). Essas células potencializam o desenvolvimento tumoral e promovem evasão imune, remodelação da matriz extracelular e angiogênese(29,30) (Figura 1).
 
O envolvimento da sinalização do fator de necrose tumoral alfa (TNFA) e do fator-kB nuclear (NF-kB) também foi indicado na resposta das CM ao amianto. A crocidolita causa acúmulo de macrófagos na pleura e no pulmão, que, por sua vez, liberam TNFA, além disso induz as CM a expressarem os receptores TNFA e TNF-R1 e a secretarem TNFA (gerando respostas parácrinas e autócrinas).(31) A ativação da via NF-kB por TNFA permite que as CM que contêm danos no DNA induzido pelo amianto evoluam para MM. De fato, ao causar a liberação de espécies reativas de oxigênio (ROS) e espécies reativas de nitrogênio (RNS), cuja produção é catalisada pelo ferro, as fibras de amianto podem indiretamente induzir genotoxicidade, o que pode gerar um amplo espectro de mutações.(32) Portanto, considera-se que parte do mecanismo patogênico das fibras de amianto seja associada à sua persistência na pleura por longos períodos, desencadeando assim ciclos recorrentes de lesão/recuperação na região de inflamação.(33-35) De fato, a presença de células inflamatórias no tumor é um fator prognóstico(26,36-39) (Figura 1).
 
QUADRO CLÍNICO, DIAGNÓSTICO E CLASSIFICAÇÃO DO MPM
 
O período de latência entre a primeira exposição ao amianto e o diagnóstico de MM é de cerca de 30 anos. A indisponibilidade de um método eficiente para que a doença seja detectada em um estágio inicial dificulta seu diagnóstico.(40) Por sua vez, o diagnóstico é seguido de uma sobrevida de 12 e 30 meses quando há doença localizada, e entre 8 e 14 meses para a doença avançada.(41,42) A maior parte dos pacientes é diagnosticada com doença avançada, nesse sentido, a terapia de primeira linha prolonga a sobrevida em cerca de três meses.(8,43)
 
A manifestação clínica mais comum em casos de MPM é a dispneia progressiva, normalmente secundária à formação de efusão pleural, associada ou não a dor não pleurítica no peito causada pela invasão da parede torácica. Tosse produtiva, febre, astenia, hipóxia, perda de peso ou suores noturnos também podem estar presentes. A doença é normalmente unilateral (95%) e predominantemente localizada no hemitórax direito (60%). Os sintomas geralmente se manifestam insidiosamente e por um longo período desde a apresentação inicial até o diagnóstico (3 a 6 meses), finalmente conduzindo ao diagnóstico em um estágio avançado.(14,43)
 
O diagnóstico depende da integração entre quadro clínico, imagens e análise anatomopatológica. Especificamente, a efusão pleural aparece em exame físico ou radiografia torácica em até 95% dos casos, mas seu volume diminui conforme a doença progride. A presença de dor no peito ou uma massa palpável sugere invasão da parede torácica e representa a inoperabilidade cirúrgica. A tomografia torácica, assim como a imagem de ressonância magnética torácica, permite visualizar a efusão pleural, a presença de massas pleurais e avaliar os gânglios linfáticos hilares e mediastinais. Entretanto, a ressonância magnética é o método mais sensível e deveria ser considerada em casos potencialmente ressecáveis.(43) Por sua vez, o PET-CT (tomografia computorizada acoplada à tomografia por emissão de pósitrons) é útil para detectar comprometimento dos gânglios linfáticos, comprometimento contralateral torácico e metástases à distância.(14,44) A Figura 2 ilustra imagens radiológicas representativas de MPM.

 
A classificação da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2015 divide o MM de acordo com os subtipos epitelioide (60-80%), bifásico (10-15%) e sarcomatoide (10%), Os MPM com características desmoplásicas (2%) englobados no subtipo sarcomatoide. Em alguns casos, a classificação pode ser bastante difícil devido à presença de mais de um subtipo tumoral.(45,46)
 
Os mesoteliomas epitelioides têm características arquitetônicas, citológicas e estromais que geram uma variedade de diagnósticos diferenciais em relação a outras neoplasias. No mesotelioma epitelioide, atipia e necrose nuclear são fatores prognósticos independentes que permitem classificá-los em baixo e alto graus histológicos.(47,48)
 
Nos mesoteliomas sarcomatoides, as células são fusiformes e distribuídas em fascículos ou apresentam arquitetura desorganizada, com atipia citológica de leve a severa, além da possibilidade de conter elementos heterólogos. O mesotelioma bifásico deve conter pelo menos 10% de componentes epitelioides e sarcomatoides, enquanto o mesotelioma desmoplásico deve conter pelo menos 50% de estroma fibroso hialinizado. Pacientes com tumores sarcomatoides e bifásicos têm uma sobrevida significativamente pior que aqueles com mesotelioma epitelioide.(49)
 
A citologia de fluido pleural permite que o diagnóstico de MPM seja estabelecido em 1/3 dos casos. Contudo, o diagnóstico limita-se ao subtipo epitelioide, uma vez que a variante sarcomatoide não descama no espaço pleural. A biópsia por aspiração de agulha fina (FNAB) oferece uma acurácia de aproximadamente 30%.(50) A biópsia pleural não guiada aumenta a precisão da FNAB, porém, a biópsia pleural por tomografia computadorizada é mais sensível e pode estabelecer o diagnóstico em ~87% dos casos.(43) O uso de videotoracoscopia/pleuroscopia atinge uma acurácia de ≥95%, representando, assim, o método diagnóstico ideal.(51)
 
O diagnóstico histopatológico de lesões mesoteliais envolve grandes desafios, incluindo a diferenciação entre lesões malignas e tumores benignos e hiperplasia mesotelial reativa ou pleurisia fibrosa reativa. Em biópsias pleurais, pode ser difícil diferenciar o mesotélio hiperplásico reativo do mesotelioma, uma vez que ambas as situações envolvem atipia citológica, maior celularidade e mitoses. Características de infiltração, padrão vascular, padrão de crescimento, extensão da necrose e características das papilas são critérios importantes que nem sempre são avaliados nas biópsias. Recentemente, a perda de expressão de BAP1 (proteína 1 associada a BRCA1) detectada por IHC, deleção homozigótica de CDKN2A (p16) determinada por FISH e expressão de metil-tio-adenosina fosforilase (MTAP) por IHC foram adicionados como marcadores para a distinção entre células neoplásicas e não neoplásicas quando a proliferação mesotelial se limita à superfície serosa. Isso pode contribuir para o diagnóstico diferencial entre hiperplasia mesotelial reativa e mesotelioma maligno in situ, bem como proliferações mesoteliais reativas (pleurisia) que podem se estender ao estroma e simular mesotelioma infiltrante.(52,53) A expressão nuclear da proteína BAP1 é preservada em células mesoteliais reativas. Em mesoteliomas epitelioides, a perda total de expressão de BAP1 e deleção de CDKN2A está presente em até 70% dos casos.(50)
 
O diagnóstico histopatológico do mesotelioma também é dificultado pois os padrões morfológicos do MPM podem simular uma variedade de malignidades epiteliais e não epiteliais, incluindo carcinomas, sarcomas, melanomas, linfomas, entre outros.(50) A imuno-histoquímica (IHC) é fundamental para diferenciar tais entidades.(52) Contudo, não há marcador de IHC que seja por si só suficientemente sensível ou específico para identificar o MPM. Portanto, recomenda-se o uso de painéis compostos de pelo menos dois marcadores de carcinoma (ex., pCEA BER -EP4, MOC -31, Claudin 4, HEG1) e dois marcadores mesoteliais (ex., WT1, calretinina, CK5/6, D2-40)(45,50) (Tabela 1).
 

 
O tumor adenomatoide pleural aparece de maneira solitária, com nódulo não infiltrado, podendo contribuir com o diagnóstico diferencial para mesotelioma adenomatoide/microcístico. A mutação somática de TRAF7 e a preservação de BAP1 favorecem o diagnóstico de um tumor adenomatoide.(55)
 
Para o diagnóstico de carcinomas metastáticos, recomenda-se a adição de anticorpos específicos para regiões primárias, como adenocarcinomas do pulmão (TTF-1, napsin A), carcinomas de células escamosas (p63, p40), carcinomas de célula renal (PAX-8, CAIX), adenocarcinomas colorretais (CDX2) e adenocarcinomas da próstata (PSA, NKX.3), além do painel de IHC anteriormente descrito. O anticorpo GATA-3 expresso em carcinomas da mama e uroteliais também pode ser positivo em mesoteliomas. Melanomas metastáticos expressam S-100, Melan-A, HMB-45 e SOX-10. Tumores vasculares epitelioides (hemangioendotelioma e angiossarcoma) expressam CD34, CD31 e ERG, normalmente ausentes em mesoteliomas. O tumor pleural solitário pode imitar o mesotelioma sarcomatoide, porém, eles expressam STAT6 e CD34 e possuem a fusão genética NAB2-STAT6. No diagnóstico diferencial entre mesotelioma sarcomatoide ou bifásico e sarcoma sinovial (monofásico e bifásico), recomenda-se a testagem molecular para procurar por fusões SYT-SSX1 ou SYT-SSX2, uma vez que ambos apresentam marcação nuclear para TLE1. É desafiador conseguir estabelecer um diagnóstico diferencial por IHC entre mesotelioma sarcomatoide e sarcoma primário na parede torácica ou metástases de sarcoma para a pleura, especialmente quando componentes heterólogos estão presentes no mesotelioma.(50,56) A Figura 3 ilustra fotomicrografias representativas de MPM.


 
VIAS MOLECULARES DE MM
 
Alterações genômicas
 
A compreensão dos mecanismos moleculares associados ao desenvolvimento do MM (Tabela 2) inicia-se a partir de análises citogenéticas convencionais e hibridização genômica comparativa (CGH), indicando alterações numéricas em todos os cromossomos e mostrando que perdas são mais comuns que ganhos.(85,86) Esses estudos têm revelado um complexo padrão de aberrações cromossômicas em MPM e sugerem que alterações no número de cópias (CNA) são um importante mecanismo de carcinogênese para a doença.(87) Múltiplas regiões de perda cromossômica têm sido encontradas em 1p, 3p, 4, 6q, 9p, 11q, 13q, 14q, 15q, 17p, 18q e 22q,(64,65,86,87) sugerindo o comprometimento de genes supressores tumorais em regiões deletadas. Embora menos comuns, ganhos cromossômicos em 5p, 7p, 8q, 12p, 17q e 18q também têm sido reportados.(88)



 
Entre as regiões mais comumente deletadas estão aquelas que contêm supressores tumorais CDKN2A (inibidor de quinase dependente da ciclina 2A), localizados em 9p21.3,(57) NF2 (neurofibromina 2), 22q12,(59,60) BAP1(proteína-1 associada a BRCA1), em 3p21.3(67,89) e TP53, em 17p13. CDKN2A, que codifica p16-INK4 e ARF, é o gene supressor tumoral mais frequentemente inativado em MM, possui uma incidência de deleções de 50%.(57,58,77) A perda de CDKN2A é associada à histologia não epitelial(90) e menor sobrevivência.(64,91,92) NF2 decodifica a proteína Merlin,(59) um coativador transcricional associado aos complexos de ubiquitina-ligase e à via de Hippo.(93,94)
 
Aproximadamente 20-40% dos casos de MM envolvem deleções ou mutações em BAP1,(67,77,78) sendo que mutações germinativas aumentam o risco de desenvolver mesotelioma.(89) Em modelosmurinos, a inativação de apenas um alelo de BAP1 aumenta a tumorigenicidade do amianto.(89) Mutações em TP53 estão presentes em aproximadamente 8% dos casos de MM. Embora a incidência de alterações em TP53 seja muito menor que em outros tipos de tumor,(77) é importante enfatizar que CDKN2A, que codifica ARF, consequentemente reduzindo a expressão de MDM2, é normalmente perdido. Portanto, a deleção de CDKN2A resulta em um aumento na expressão de MDM2, desencadeando a ubiquitinação e degradação de p53.(95,96) Deste modo, o fenótipo de menor de expressão p53 devido a CDKN2A é semelhante àquele da mutação em TP53. De fato, modelos animais heterozigotos para TP53 desenvolvem MM mais rapidamente quando expostos ao amianto.(97)
 
Não se identificou nenhum oncogene associado ao desenvolvimento de MM, sugerindo que o MM é uma malignidade resultante da inibição de genes supressores tumorais e não transformação por ativação de oncogenes.(98)
 
O avanço nas tecnologias de sequenciamento permitiu que vários grupos oferecessem uma análise mais ampla das alterações moleculares em MM, não apenas confirmando os achados anteriores acerca de CNA, mas demonstrando também que genes frequentemente alterados por CNAs também têm mutações pontuais semelhantes.(69,99,100)
 
Bueno et al.(77) publicaram uma análise de 95 MM confirmando os achados anteriores quanto a CNA em gene supressores de tumor (e.g., BAP1, NF2, CDKN2B, and TP53). Além disso, mutações recentemente identificadas foram descritas em genes que incluem modificadores de histona, tais como SETD2, SETDB1 e SETD5, membros de helicases de RNA DDX3X e DDX51, alvos de mTOR como ULK2, além de um componente de canal de cálcio RYR2.
 
Em outro estudo pioneiro envolvendo amostras de 74 casos de MM, o TCGA demonstrou a deleção de CDKN2A e perda de NF2 por deleção ou mutação. Deleções de CDKN2A frequentemente envolvem MTAP, que codifica para metiltioadenosina fosforilase.(81) A perda de CDKN2A foi fortemente associada a uma menor sobrevida e histologia não epitelioide.(64,90-92)
 
Dois estudos, envolvendo 42 pacientes(73), e um de coorte mais amplo, com 266 casos,(84) empregaram sequenciamento-alvo de genes frequentemente mutados em MPM (incluindo BAP1, NF2, TP53, SETD2, LATS2 e o promotor de TERT). Foi proposta uma classificação molecular entre grupo epitelioide e sarcomatoide, com alterações em BAP1 encontradas preferencialmente no grupo epitelioide, enquanto as alterações em TP53 e LATS2 ocorreram principalmente no subtipo sarcomatoide.(84)
 
Além das alterações consistentes em genes supressores tumorais, alterações genéticas mais raras também foram descritas. Por exemplo, mutações ativadoras nas vias de MAPK ou PI3K/AKT foram reportadas em duas coortes,(70,101) mas não foram identificadas na coorte do TCGA.(81) Uma amplificação inédita de RASSF7 foi observada em um conjunto de 121 pacientes, sugerindo, juntamente a alterações em outros genes da via Hippo (NF2, LATS1, and LATS2), sua significativa contribuição nos processos tumorigênicos associados ao MM.(83)
 
BAP1
 
Embora o risco de desenvolver MM seja muito maior entre trabalhadores da indústria do amianto,(102) nem todos os trabalhadores expostos desenvolvem a doença. Esse cenário levou a uma busca por fatores genéticos que possam predispor um indivíduo ao MM, especialmente em famílias com vários indivíduos afetados,(103) levando assim à identificação do papel do gene BAP1.
 
A BAP1 é uma enzima da família hidrolase c-terminal com atividades pleiotrópicas encontradas em complexos de reparo de DNA associados à BRCA1 e às funções de de-ubiquitinase.(104-106) A expressão de BAP1 é associada à redução do crescimento tumoral em vários modelos experimentais e interage com proteínas do ciclo celular.(107) Além disso, a BAP1 forma vários complexos nucleares capazes de regular a transcrição gênica. Portanto, espera-se que a BAP1 afete uma variedade de funções celulares, tais como remodelamento da cromatina,  progressão do ciclo celular, diferenciação celular e reparo de DNA. Sabe-se, ainda, que a proteína BAP1 desempenha um papel importante como inibidor da apoptose causado por estresse metabólico.(108)
 
Deleções ou mutações em BAP1 têm sido descritas em aproximadamente 60% dos MM,(67,68,70,71,77,78,81) nos quais quase 85% dos tumores peritoneais possuem alterações no BAP1, em comparação a apenas 20-30% dos tumores pleurais.(109) BAP1 é também consistentemente inativado no carcinoma renal de células claras, melanoma uveal e colangiocarcinoma.(110) A maioria das mutações em BAP1 são do tipo “frameshift” ou “missense”, resultando em perda de expressão proteica.(67,77,78) Deste modo, a perda de expressão proteica em BAP1 pode ser identificada por imuno-histoquímica no tecido tumoral, observada em aproximadamente 60% dos casos.(71)(111) Apesar da alta prevalência, a perda na expressão de BAP1 não parece influenciar a sobrevida global,(71) mas afeta a resposta à quimioterapia.(107)
 
Mutações pontuais também estão presentes em BAP1 e podem acarretar a substituição de aminoácido, cujo efeito na atividade proteica nem sempre é óbvio. Por exemplo, as mutações I47F, F81V, A95D e G178V causam perda de estabilidade proteica e agregação amiloide.(112) Por outro lado, mutações como A95D, Y724X e 10 F679LfsX37 levam a uma mudança na localização subcelular de nuclear à citoplasmática.(113)
 
Mutações germinativas em BAP1 estão associadas a uma síndrome altamente penetrante que predispõe ao MM. A chamada síndrome de predisposição tumoral do BAP1 (BAP1-TPDS) foi identificada por três grupos de pesquisa independentes que investigaram o mesotelioma, melanoma cutâneo e melanoma uveal. Mais tarde, outros tipos de tumores, como colangiocarcinoma, carcinoma renal de células claras, carcinoma basocelular, câncer de pulmão, carcinoma de mama/ovário, meningioma, tumores neuroendócrinos e alguns tipos de sarcomas foram adicionados ao espectro da síndrome.(89,114) Entretanto, os mecanismos moleculares envolvidos nesses tipos específicos de tumor e na progressão da doença ainda não são compreendidos. Assim como outros genes supressores tumorais, as mutações germinativas em BAP1 são transmitidas de uma forma autossômica dominante. Embora a penetrância seja incompleta e o tumor possa variar em diferentes membros da mesma família, mais de 80% dos portadores do gene são afetados por pelo menos um tipo de câncer.(115)
 
O MPM é o segundo tumor mais comumente identificado em BAP1-TPDS, abrangendo 22% dos tumores. Comparando ao MPM esporádico, a média de idade para o surgimento do MPM hereditário ocorre significativamente mais cedo (74 e 46 anos, respectivamente)(111) e as taxas de sobrevida são 7 vezes maiores.(116)
 
Apesar da forte relevância das mutações germinativas em BAP1 em relação ao maior risco de desenvolvimento de mesotelioma hereditário e outros tumores da síndrome, uma proporção significativa de famílias com múltiplos casos de mesotelioma não apresenta mutações nesse gene, sugerindo que outros genes possam oferecer predisposição a esses tumores.(117,118) Nesse sentido, um estudo recente examinou 94 genes associados à predisposição a câncer hereditário em 93 pacientes com mesotelioma e detectou prováveis mutações patogênicas em 10% dos casos, com aumento nas mutações em genes de recombinação homóloga e via de reparo de DNA. Curiosamente, pacientes com mutações nesses genes reportaram ter sido expostos ao amianto com menos frequência.(118)
 
Perfil de expressão gênica
 
O conhecimento de que alterações gênicas que acarretam distúrbios fenotípicos produzem perfis de expressão gênica alterados, pode aumentar nosso entendimento a cerca das vias moleculares mais relevantes para o MM. Os primeiros estudos que usaram perfis de expressão gênica em MM sugeriram a existência de dois subtipos moleculares importantes associados à classificação histológica: epitelioide e sarcomatoide.(119-121) Interessantemente, genes associados à transição epitélio-mesênquima (EMT) mostraram-se aumentados no grupo sarcomatoide, indicando um fenótipo mais mesenquimal.(121) Um estudo sequencial sugeriu que 4 subtipos podem ser identificados e são associados ao espectro histológico de epitelioide a sarcomatoide, confirmando, também a expressão diferencial de genes EMT.(77,81) Esse dado foi corroborado por meio de uma reanálise que demonstrou que grupos moleculares representam um gradiente contínuo ou histomolecular no qual os tumores podem ser dissecados em uma combinação das assinaturas dos tipos epitelioide (escore E) e sarcomatoide (escore S), cujas proporções são associadas ao prognóstico.(122)
 
TRATAMENTO DO MPM
 
Fatores prognósticos
 
Os indicadores prognósticos estabelecidos, como subtipo histológico, idade e sexo, podem fornecer algumas informações para estimar a sobrevida do paciente, mas há poucos indicadores prognósticos específicos e definitivos que sejam rotineiramente usados para prever prováveis desfechos individuais. A European Organization for Research and Treatment of Cancer (EORTC) – Organização Europeia de Pesquisa e Tratamento do Câncer – sugere que baixo performance clínico, leucocitose, sarcomatoide e sexo masculino são fatores associados a um prognóstico ruim.(123) Por sua vez, o escore do CALGB inclui idade ≥75 anos, histologia não epitelioide, LDH >500UI/L, comprometimento pleural, plaquetas >400.000/mm3, dor no peito e baixo performance clínico como fatores prognósticos desfavoráveis.(124) Outros índices prognósticos são perda de peso, hemoglobina, albumina sérica(125) e contagens de leucócitos.(126)
 
Além do seu envolvimento na patogênese, a inflamação sistêmica é também associada à sobrevida global e resposta ao tratamento. Fatores prognósticos baseados em resposta inflamatória, que incluem as combinações de proteína C-reativa e albumina, contagem de neutrófilos e linfócitos (relação neutrófilos/linfócitos, NLR) e contagem de plaqueta e linfócito, são associados à sobrevida em pacientes com diversos tipos de câncer, incluindo o MPM, com níveis mais elevados indicando pior prognóstico.(39)
 
Cirurgia
 
No escopo das doenças ressecáveis, o tratamento do MPM é baseado em terapia trimodal: cirurgia, quimioterapia (neoadjuvante ou adjuvante) e radioterapia, especialmente em pacientes sem comprometimento dos gânglios linfáticos.(127)
 
Geralmente, o prognóstico é desanimador, uma vez que a maioria dos pacientes apresenta doença irressecável no momento do diagnóstico ou são considerados inoperáveis devido à idade, performance clínica ou comorbidades. É importante que pacientes que são candidatos à cirurgia sejam submetidos a EBUS (ultrassom endobronquial) ou mediastinoscopia, uma vez que disseminação para gânglios linfáticos mediastinais é um fator de mau prognóstico em MPM.(14)
 
Para tumores ressecáveis, os três procedimentos cirúrgicos mais comumente utilizados no tratamento do mesotelioma são toracoscopia com pleurodese, pleurectomia/decorticação e pneumonectomia extrapleural.(43)
 
A pleurectomia/decorticação é um procedimento cirúrgico cujo objetivo é reduzir a carga tumoral. É conduzido por meio de toracotomia aberta e consiste na remoção da pleura parietal, incluindo a porção adjacente ao mediastino, pericárdio e diafragma (frequentemente necessitando que a porção do diafragma seja removida) e retirada da pleura visceral para a decorticação do pulmão. O tratamento oferece alívio dos sintomas locais e previne a recidiva de efusão pleural, mas normalmente implica numa alta taxa de recidiva locorregional (80% a 90%) ou à distância (10% a 36%), além de não ser curativo.(43)
 
O papel da pleurectomia/decorticação é discutível contudo. O ensaio MesoVATS comparou pleurodese por talco com pleurectomia parcial toracoscópica vídeo-assistida (VAT -PP). A VAT-PP não resultou em melhor SG (HR =1,04; 95%CI 0,76-1,42; p=0,81) e apresentou taxa mais alta de complicações cirúrgicas (31% x 14%, p=0,019). Além disso, uma melhor qualidade de vida em 6 meses foi indicada para o grupo VAT -PP.(128)
 
A pneumonectomia extrapleural (EPP) é considerada uma técnica mais agressiva por envolver remoção em bloco de todo tecido no hemitórax, incluindo a pleura visceral e parietal, além de afetar o pulmão, os gânglios linfáticos mediastinais, o diafragma e o pericárdio. A técnica normalmente não é considerada para pacientes com comorbidades limitantes, baixo performance clínico, comprometimento dos gânglios linfáticos mediastinais ou histologia sarcomatoide devido à maior morbidade e mortalidade e pior prognóstico entre esses pacientes.(129)
 
A pleurodese é um procedimento que remove o acúmulo de fluido no espaço pleural através de drenagem por meio de toracoscopia sob anestesia geral ou sedação ou, ainda, pela inserção de um tubo torácico por meio de toracostomia. Após a remoção do fluido, produtos químicos esclerosantes são introduzidos na cavidade pleural a fim de evitar que o fluido se acumule novamente.(130)
 
Uma comparação entre pneumonectomia extrapleural e pleurectomia/decorticação em 663 pacientes apontou para diferenças significativas quanto à sobrevida, com um risco 1,4 mais alto de morte para a pneumonectomia extrapleural (p=0,001) após ajuste para estádio da doença, histologia, gênero e terapia multimodal.(131) Em outro ensaio, pacientes que receberam quimioterapia neoadjuvante à base de platina foram randomizados ou não para pneumonectomia extrapleural. Não foi identificada nenhuma diferença quanto à sobrevida ou qualidade de vida entre os grupos.(132)
 
Radioterapia
 
As principais indicações atuais para radioterapia em casos de MPM são as seguintes: radioterapia hemitorácica antes e após a pneumonectomia extrapleural, radioterapia hemitorácica após decorticação/pleurectomia e radioterapia paliativa para o alívio de sintomas locais.(133)
 
A radioterapia radical hemitorácica (RHR) pode ser conduzida após a pneumonectomia extrapleural para melhorar o controle local, embora esteja associada com uma taxa de falha no campo de irradiação de 15% e 35%.(134) Embora esse tema ainda necessite ser mais debatido, várias diretrizes de tratamento recomendam o uso de RHR, como, por exemplo, o NCCN (National Comprehensive Cencer Center).
 
O ensaio de fase II prospectivo, SAKK 17/04,(135) explorou o papel do adjuvante RHR após quimioterapia neoadjuvante à base de platina seguida de pneumonectomia extrapleural. Os pacientes foram randomizados para receberem radioterapia vs observação. Não houve diferença significativa entre os grupos. Mais recentemente, um estudo de fase III comparou RHR com radioterapia paliativa após cirurgia não radical poupadora de pulmão e quimioterapia, alcançando melhor SG no braço de RHR (SG de dois anos 58% x 28%; HR 0,58, 95CI 0,31-0,95, p=0,031) às custas de maior toxicidade de grau 3/4.(136)
 
A razão para o uso da radioterapia hemitorácica neoadjuvante à pneumonectomia extrapleural parte da observação da disseminação frequente do tumor até o pulmão contralateral e peritônio, o que pode estar relacionado à cirurgia. A estratégia SMART (Surgery for Mesothelioma After Radiation Therapy – Cirurgia de Mesotelioma Após Radioterapia)(137) foi desenvolvida para alcançar taxas de disseminação associadas à intervenção cirúrgica mais baixas. Os autores observaram uma média de sobrevida global de 51 meses e uma média de sobrevida livre de doença de 47 meses para mesotelioma epitelioide pleural, sugerindo que a estratégia oferece algum benefício à população em questão.
 
Após a publicação dos dados controversos do estudo MARS-1, o uso de pneumectomia extrapleural tem diminuído nos últimos anos, sendo substituído por técnicas que buscam poupar o pulmão, tais como a pleurectomia/decorticação. O estudo IMPRINT, um ensaio de fase II prospectivo, demonstrou a segurança de se aplicar radioterapia com modulação de intensidade no hemitórax simultaneamente à quimioterapia em pacientes que foram submetidos à pleurectomia/decorticação.(138)
 
No contexto paliativo, a radioterapia pode ser usada para controlar uma variedade de sintomas para os quais o tratamento medicamentoso pode ser inadequado, tais como dor associada à invasão da parede torácica, hemoptise, tosse ou dispneia, assim como para evitar compressão da medula espinhal.(139)
 
Tratamento sistêmico
 
A quimioterapia sistêmica é o tratamento de escolha no escopo de doenças irressecáveis, para pacientes considerados refratários ou aqueles que não desejam se submeter a cirurgias(9) (Figura 4). Na quimioterapia de primeira linha, regimes que contêm platina têm taxas de resposta mais altas que regimes sem platina.(140) Regimes à base de pemetrexede têm sido a opção de quimioterapia sistêmica de primeira linha na maioria das instituições, embora ainda não exista consenso a cerca de qual(is) agente(s) deveria(m) ser empregado(s) para suplementar o pemetrexede.(9) A substituição de cisplatina por carboplatina resultou em uma taxa de resposta objetiva (TRO) de 25-29%, mas com um melhor perfil de toxicidade e SG semelhante.(141)

 
A adição do bevacizumabe à cisplatina e ao pemetrexede no cenário da primeira linha melhorou a SG (18,8 meses vs. 16,1 meses) e a sobrevida livre de progressão (SLP) (9,2 meses vs. 7,3 meses) em relação ao uso de cisplatina e pemetrexede num recente estudo de fase III (MAPS).(142) Entretanto, o uso de medicações antiangiogênicas em combinação com quimioterapia não é muito disseminado, uma vez que outros ensaios em que inibidores de angioquinase, tais como cediranibe e nintedanibe, foram testados resultaram negativos.(5,143,144) No entanto, ramucirumabe, um anticorpo anti-VEGFR-2, foi combinado a gencitabina em um ensaio randomizado de fase II (ensaio RAMES) e comparado ao uso de gencitabina como agente único em segunda linha para MPM sem tratamento prévio com medicações antiangiogênicas. A combinação dobrou a mediana de SG (7,5 x 13,8 meses) e de SLP (3,3 x 6,2 meses), embora nenhuma diferença tenha sido indicada para a TRO.(145)
 
O uso de inibidores de checkpoints imune tem revolucionado o tratamento de vários tipos de tumor nos anos mais recentes.(26) A imunoterapia é uma modalidade de tratamento que explora o sistema imunológico do próprio paciente para promover a eliminação de células tumorais. Exemplos de imunoterapias atualmente em estudo incluem inibidores de checkpoints imune ou agonistas das vias de ativação da célula T, uso de citocinas como IL-12 e IL-15, vacinas terapêuticas, depleção de células imunossupressoras e modulação de outros componentes da resposta imune.(146)
 
O CTLA4 é um receptor co-inibitório (checkpoint imuneZ) de célula T que desempenha um papel essencial na prevenção da hiperativação da célula T.(147) A sinalização de CTLA4 diminui a ativação da célula T e da habilidade de células T de memória sustentarem a resposta imune.(148) Maior inibição de crescimento do tumor foi observada após a administração de anticorpo monoclonal anti-CTLA4 entre ciclos de cisplatina em modelos murinos de mesotelioma.(149) Além disso, o bloqueio de CTLA4 alternadamente ao tratamento com cisplatina inibiu a proliferação da célula tumoral, ao mesmo tempo em que aumentou o número de linfócitos T infiltrados no tumor. Apesar desses resultados, o estudo DETERMINE, um ensaio de fase IIB, multicêntrico, randomizado, controlado por placebo, não conseguiu demonstrar nenhuma melhora na SG com o uso de tremelimumabe (anticorpo anti-CTLA4) em relação ao placebo em segunda ou terceira linhas(150) (Tabela 3).


 
O PD1 também é um checkpoint imune e tem dois ligantes: PD-L1 e PD-L2. A superexpressão do receptor PD1 desempenha um papel-chave na exaustão da célula T e representa um importante fator durante a resposta imune normal a fim de prevenir o surgimento da autoimunidade.(158) O PD-L1 é altamente expresso no MPM,(159) sendo que sua expressão foi reportada em 40% de 106 espécimes de mesotelioma avaliados em um estudo (21% no subtipo epitelioide, 94% no subtipo sarcomatoide e 57% no subtipo bifásico).(160) Alguns estudos reportaram taxas de sobrevida menores em casos de MM com expressão tumoral de PD-L1,(161,162) enquanto outros não encontraram diferença significativa quanto à sobrevida entre casos de MM com e sem expressão de PD-L1.(163)
 
Vários ensaios de fase II analisaram a atividade dos anticorpos anti-PD1 como terapia de segunda linha para MPM e reportaram uma TRO de 9,4%-29% e uma SLP mediana de 2,6-6,2 meses. Recentemente, entretanto, um ensaio de fase III (PROMISE-meso) incluiu 144 pacientes com MM avançado que haviam progredido após quimioterapia sistêmica prévia e randomizou-os para receberem pembrolizumabe ou quimioterapia (gencitabina ou vinorelbina). Não houve diferença significativa em SLP (parâmetro primário) ou SG, mas a taxa de resposta foi mais alta entre pacientes tratados com pembrolizumabe (22% x 6%). Não houve associação com a expressão de PD-L1.(164) Em contrapartida, o ensaio CONFIRM comparou o nivolumabe com um placebo na mesma situação e foi observada melhora na SG (9,2 vs 6,6 meses; HR 0,72; 95%CI 0,55-0,94; p=0,02) e SLP (3,0 vs 1,8 meses; HR 0,62; 95%CI 0,49-0,78; p 0,001)(165). Esses resultados sugerem que imunoterapia é ativa contra o MM, embora não seja superior à quimioterapia quando usados em segunda linha ou linhas posteriores.
 
Um estudo francês multicêntrico, randomizado de fase II (MAPS-2) comparou o uso de nivolumabe (anti-PD1) ao uso de nivolumabe em combinação com ipilimumabe (anti-CTLA4) em pacientes que não tiveram sucesso nas terapias de primeira e segunda linhas. A taxa de controle de doença em 12 semanas atingiu 44% para o grupo com nivolumabe e 50% para o grupo com a combinação. A alta expressão de PD-L1 foi associada a maior alta taxa de resposta.(5) Outros estudos de fase II encontraram resultados semelhantes (Tabela 3).
 
Com base nesses resultados promissores, o ensaio randomizado de fase III, CheckMate-743, comparou a combinação de ipilimumabe e nivolumabe (IO+IO) com cisplatina/carboplatina associada a pemetrexede como terapia de primeira linha para MPM irressecáve;. O estudo mostrou uma SG mais longa no grupo de pacientes tratado com IO+IO (18,1 x 14,1 meses; HR 0,74 95%CI 0,6-0,91; p=0,002). A SG aos 2 anos foi de 41% e 27% para IO+IO e quimioterapia, respectivamente. Ambas as histologias se beneficiaram do tratamento com IO+IO, embora a melhora relativa tenha sido maior em pacientes com tumores não epitelioides. O CheckMate-743 estabeleceu a combinação de nivolumabe e ipilimumabe como o novo padrão de terapia de primeira linha para MPM metastático ou irressecável.
 
Não há consenso quanto à terapia sistêmica de segunda linha para mesotelioma pleural avançado, sendo que as medicações comumente usadas são associadas a taxas de resposta pobres e sobrevidas medianas curtas.(166) Pacientes que foram beneficiados pelo tratamento anterior com regimes contendo pemetrexede ou aqueles que não receberam pemetrexede previamente podem ser tratados com pemetrexede (re-expostos ou tratados de novo),(167,168) caso contrário, os pacientes são tratados com gencitabina, vinorelbina ou doxorrubicina.(169) A vinorelbina é a única medicação diretamente comparada melhor suporte clínico como terapia de segunda linha em MM avançado em um ensaio randomizado (ensaio VIM), tendo sido associada a uma melh SLP (SLP mediana: 4,2 x 2,8 meses; HR 0,59; 95%CI 0,41-0,85; p unicaudado=0,0017), mas sem ter gerado impacto na SG.(165) A Figura 4 resume o tratamento atual do MPM.
 
Mais recentemente, dois ensaios fase II de um braço único investigaram o papel do durvalumabe em combinação com quimioterapia à base de platina e pemetrexede no tratamento de primeira linha para MPM. O primeiro estudo (PrECOG 0505) mostrou uma SG mediana de 20,4 meses.(170) A SG foi de 70,4% aos 12 meses e de 44,2% aos 24 meses. O segundo estudo (DREAM) mostrou uma SG mediana de 18,4 meses, SLP mediana de 6,7 meses e TRO de 48%.(171) Considerando os resultados promissores, um ensaio de fase III será iniciado em breve.
 
Atualmente, vários ensaios clínicos estão em curso para explorar novas terapias para o MPM (Tabela 4) e o futuro deve oferecer novas esperanças a esses pacientes.


 
CONCLUSÃO
 
O MPM pode ser amplamente prevenido, sendo assim, esforços em nível global devem ser empregados para que a indústria do amianto seja definitivamente banida. Apesar de alguns avanços recentes, essa rara, porém grave condição ainda representa uma necessidade médica não atendida e carente de estudos prospectivos robustos que ofereçam um melhor entendimento a cerca da sua fisiopatologia, bem como ensaios randomizados para a definição de tratamentos mais eficientes.
 
AGRADECIMENTOS
 
Este trabalho foi apoiado pelo Instituto Nacional de Oncologia Translacional e Inovação (INCITO-INOTE). Agradecemos a concessão das bolsas CAPES para CHC e GV.
 
CONTRIBUIÇÃO DOS AUTORES
 
GNMH: revisão e submissão do manuscrito final, elaboração do rascunho inicial, revisão de literatura, construção de tabelas e gráficos. CHC: elaboração do rascunho inicial, revisão de literatura. CALP: elaboração do rascunho inicial, revisão de literatura, fotomicrografias dos espécimes patológicos. GV: elaboração do rascunho inicial, revisão da literatura. JRN: elaboração do rascunho inicial, revisão de literatura. VCCL: revisão do manuscrito final, elaboração do rascunho inicial, revisão de literatura, construção de tabelas e gráficos.
 
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