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ISSN (on-line): 1806-3756

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Editorial

Atendimento de pacientes com risco de SDRA: o papel da pressão de distensão

Caring for patients at risk of ARDS: the role of driving pressure

Glauco Cabral Marinho Plens1a, Eduardo Leite Vieira Costa1,2a

DOI: 10.36416/1806-3756/e20210013

 Estratégias de proteção pulmonar em pacientes com SDRA sob ventilação mecânica (VM) estão associadas à redução da mortalidade.(1-3) A adesão a essas estratégias tem aumentado progressivamente nas últimas duas décadas, pois médicos e fisioterapeutas respiratórios têm cada vez mais reconhecido a proteção pulmonar como a pedra angular da terapia de suporte.(4) Estratégias de proteção pulmonar representam um conjunto de intervenções para reduzir a lesão pulmonar agravada pela própria VM, a chamada lesão pulmonar induzida pelo ventilador. Essas estratégias geralmente têm como objetivo aplicar baixos volumes correntes (4-6 mL/kg de peso corporal previsto), baixas pressões de platô (< 30 cmH2O) e PEEP suficiente para atingir as metas de oxigenação. O raciocínio é evitar a hiperdistensão pulmonar e minimizar o estresse mecânico imposto aos pulmões, que são os principais mecanismos fisiopatológicos da lesão pulmonar induzida pelo ventilador.(5) Recentemente, a pressão de distensão de vias aéreas (expressa como a diferença entre pressão de platô e PEEP) foi proposta como a principal variável-alvo para evitar lesão pulmonar. A ideia é que limitar a pressão de distensão pode ser mais seguro em pacientes com pulmões lesionados. Nesses pacientes, o tamanho do pulmão funcional e aerado pode ser consideravelmente pequeno, um pulmão de bebê, tomando emprestado o termo criado por Gattinoni et al. (6) A aplicação de volumes correntes normalizados pelo peso corporal previsto leva em consideração o tamanho do paciente mas não o tamanho do pulmão de bebê, o qual acaba sendo hiperdistendido e submetido a estresse excessivo.(7) A pressão de distensão nada mais é do que o volume corrente normalizado pela complacência do sistema respiratório, a qual, segundo demonstrado, acompanha de perto o tamanho do pulmão funcional. (8) Uma meta-análise de dados individuais de ensaios envolvendo pacientes com SDRA mostrou que pressões de distensão menores se associaram a melhora da sobrevida.(9) Mais importante ainda, o benefício de sobrevida das estratégias de VM protetora foi mediado pela pressão de distensão, não pelo volume corrente ou pela PEEP.(9)
 
O papel das estratégias de proteção pulmonar em pacientes sem SDRA é menos conclusivo.(10) Neste número do Jornal Brasileiro de Pneumologia, Bastos-Netto et al.(11) fornecem dados importantes sobre o impacto das estratégias de proteção pulmonar em pacientes sem SDRA inicialmente que apresentavam fatores de risco para a doença. Em uma coorte de 116 pacientes sob VM, os autores constataram que os pacientes com pressão de distensão máxima < 15 cmH2O apresentaram menor taxa de mortalidade em 28 dias. A pressão de distensão máxima, uma substituta para a pressão de distensão, foi definida como a diferença entre pressão máxima das vias aéreas e PEEP. Em pacientes sob VM estritamente controlada, a diferença entre pressão de distensão máxima e pressão de distensão é simplesmente a pressão resistiva. Como resultado, essa diferença tende a ser pequena, especialmente quando a resistência das vias aéreas é baixa ou quando tanto o fluxo inspiratório quanto o expiratório estão próximos de zero. Na presença de esforços inspiratórios ou expiratórios, a pressão de distensão máxima pode subestimar consideravelmente a pressão de distensão. Nesse cenário, manobras de oclusão das vias aéreas inspiratórias finais e expiratórias finais podem ser utilizadas para avaliar o grau de esforço. (12) Curiosamente, mesmo quando consideradas essas limitações na utilização das pressões de distensão máxima, a proteção pulmonar foi mais bem definida quando baseada nas pressões de distensão do que quando baseada no volume corrente: não houve benefício de sobrevida com volumes correntes < 8 mL/kg de peso corporal previsto. Esse achado é semelhante ao encontrado em pacientes com SDRA por Amato et al.(9) e sugere que, mesmo em pacientes sem SDRA, deve-se prestar atenção às pressões de distensão, especialmente naqueles com fatores de risco para SDRA.
 
Bastos-Netto et al.(11) deram um passo importante para um melhor entendimento dos determinantes de desfechos ruins em pacientes sob VM. À medida que novas evidências revelam a importância da pressão de distensão, deveremos ser capazes de ver mais de seus efeitos em cenários imprevistos.
 
O que um homem vê depende tanto daquilo que ele olha quanto daquilo que sua experiência visual-conceitual prévia o ensinou a ver.
- Thomas S. Kuhn
 
REFERÊNCIAS
 



  1. Amato MB, Barbas CS, Medeiros DM, Magaldi RB, Schettino GP, Lorenzi-Filho G, et al. Effect of a protective-ventilation strategy on mortality in the acute respiratory distress syndrome. N Engl J Med. 1998;338(6):347-354. https://doi.org/10.1056/NEJM199802053380602

  2. Acute Respiratory Distress Syndrome Network, Brower RG, Matthay MA, Morris A, Schoenfeld D, Thompson BT, et al. Ventilation with lower tidal volumes as compared with traditional tidal volumes for acute lung injury and the acute respiratory distress syndrome. N Engl J Med. 2000;342(18):1301-1308. https://doi.org/10.1056/NEJM200005043421801

  3. Briel M, Meade M, Mercat A, Brower RG, Talmor D, Walter SD, et al. Higher vs lower positive end-expiratory pressure in patients with acute lung injury and acute respiratory distress syndrome: systematic review and meta-analysis. JAMA. 2010;303(9):865-873. https://doi.org/10.1001/jama.2010.218

  4. Bellani G, Laffey JG, Pham T, Fan E, Brochard L, Esteban A, et al. Epidemiology, Patterns of Care, and Mortality for Patients With Acute Respiratory Distress Syndrome in Intensive Care Units in 50 Countries [published correction appears in JAMA. 2016 Jul 19;316(3):350]. JAMA. 2016;315(8):788-800. https://doi.org/10.1001/jama.2016.0291

  5. Slutsky AS, Ranieri VM. Ventilator-induced lung injury [published correction appears in N Engl J Med. 2014 Apr 24;370(17):1668-9]. N Engl J Med. 2013;369(22):2126-2136. https://doi.org/10.1056/NEJMra1208707

  6. Gattinoni L, Pesenti A, Pesenti M. ARDS: the non-homogeneous lung; facts and hypothesis. Intensive Crit Care Dig. 1987;6:1-4.

  7. Terragni PP, Rosboch G, Tealdi A, Corno E, Menaldo E, Davini O, et al. Tidal hyperinflation during low tidal volume ventilation in acute respiratory distress syndrome. Am J Respir Crit Care Med. 2007;175(2):160-166. https://doi.org/10.1164/rccm.200607-915OC

  8. Gattinoni L, Pesenti A, Avalli L, Rossi F, Bombino M. Pressure-volume curve of total respiratory system in acute respiratory failure. Computed tomographic scan study. Am Rev Respir Dis. 1987;136(3):730-736. https://doi.org/10.1164/ajrccm/136.3.730

  9. Amato MB, Meade MO, Slutsky AS, Brochard L, Costa EL, Schoenfeld DA, et al. Driving pressure and survival in the acute respiratory distress syndrome. N Engl J Med. 2015;372(8):747-755. https://doi.org/10.1056/NEJMsa1410639

  10. Simonis FD, Barbas CSV, Artigas-Raventos A, Canets J, Determan RM, Anstey J, et al. Potentially modifiable respiratory variables contributing to outcome in ICU patients without ARDS: a secondary analysis of PRoVENT. Ann Intensive Care. 2018;8(1):39. https://doi.org/10.1186/s13613-018-0385-7

  11. Bastos-Netto C, Reboredo MM, Vieira RS, Fonseca LMCD, Carvalho EV, Holanda MA, et al. Protective mechanical ventilation in patients with risk factors for ARDS: prospective cohort study. J Bras Pneumol. 2021;47(1):e20200360.

  12. Bellani G, Grassi A, Sosio S, Foti G. Plateau and driving pressure in the presence of spontaneous breathing. Intensive Care Med. 2019;45(1):97-98. https://doi.org/10.1007/s00134-018-5311-9



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