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Comparação dos efeitos das técnicas breath stacking e air stacking sobre a mecânica respiratória e o padrão ventilatório em pacientes traqueostomizados: ensaio clínico cruzado randomizado

Comparison of the effects of voluntary and involuntary breath stacking techniques on respiratory mechanics and lung function patterns in tracheostomized patients: a randomized crossover clinical trial

Luciano Matos Chicayban1,2,3, Alice Campos Hemétrio3, Liz Tavares Rangel Azevedo3

ABSTRACT

Objective: To compare the effects of voluntary breath stacking (VBS) and involuntary breath stacking (IBS) techniques on respiratory mechanics, lung function patterns, and inspiratory capacity in tracheostomized patients. Methods: This was a randomized crossover clinical trial involving 20 tracheostomized patients admitted to the ICU and submitted to the VBS and IBS techniques, in random order, with an interval of 5 h between each. Ten cycles of each technique were performed with an interval of 30 s between each cycle. In VBS, patients performed successive inspirations for up to 30 s through a one-way valve, whereas in IBS, successive slow insufflations were performed with a resuscitator bag until the pressure reached 40 cmH2O. Respiratory mechanics, inspiratory capacity, and the lung function pattern were evaluated before and after the interventions. Results: After IBS, there was an increase in static compliance (p = 0.007), which was also higher after IBS than after VBS (p = 0.03). There was no significant difference between the pre-VBS and post-VBS evaluations in terms of static compliance (p = 0.42). Inspiratory capacity was also greater after IBS than after VBS (2,420.7 ± 480.9 mL vs. 1,211.3 ± 562.8 mL; p < 0.001), as was airway pressure (38.3 ± 2.6 cmH2O vs. 25.8 ± 5.5 cmH2O; p < 0.001). There were no changes in resistance or lung function pattern after the application of either technique. Conclusions: In comparison with VBS, IBS promoted greater inspiratory capacity and higher airway pressure, resulting in an increase in static compliance.

Keywords: Mucociliary clearance; Respiratory care units; Respiratory mechanics; Physical therapy modalities.

RESUMO

Objetivo: Comparar os efeitos das técnicas breath stacking (BS) e air stacking (AS) sobre a mecânica respiratória, o padrão ventilatório e a capacidade inspiratória em pacientes traqueostomizados. Métodos: Ensaio clínico cruzado randomizado envolvendo 20 pacientes traqueostomizados internados em UTI e submetidos a ambas as técnicas, com intervalo de 5 h entre si, de acordo com a randomização. Foram realizados dez ciclos de cada técnica com intervalos de 30 segundos entre si. No BS, os pacientes realizaram inspirações sucessivas por até 30 s por meio de uma válvula unidirecional, enquanto no AS foram realizadas insuflações lentas sucessivas através de um ressuscitador manual até que a pressão atingisse 40 cmH2O. Os pacientes foram avaliados quanto a mecânica respiratória, capacidade inspiratória e padrão ventilatório antes e depois da realização das intervenções. Resultados: Com relação à mecânica respiratória no AS, houve aumento da complacência estática na comparação pré- e pós-intervenção (p = 0,007), assim como entre os momentos pós-AS e pós-BS (p = 0,03). Não houve diferença significativa da complacência estática na realização do BS (p = 0,42). A capacidade inspiratória foi maior após o AS que após o BS (2.420,7 ± 480,9 mL vs. 1.211,3 ± 562,8 mL; p < 0,001), bem como em relação à pressão nas vias aéreas (38,3 ± 2,6 cmH2O vs. 25,8 ± 5,5 cmH2O; p < 0,001). Não foram observadas alterações na resistência ou no padrão ventilatório em ambas as técnicas. Conclusões: Na presente amostra, o AS promoveu maior capacidade inspiratória e maior pressão nas vias aéreas que as observadas após o BS, com consequente aumento da complacência estática.

Palavras-chave: Depuração mucociliar; Unidades de cuidados respiratórios; Mecânica respiratória; Modalidades de fisioterapia.

INTRODUÇÃO

Pacientes internados em UTIs apresentam aumento da produção de muco e prejuízo do mecanismo de clearance mucociliar. Os efeitos deletérios do decúbito prolongado, a fraqueza muscular adquirida e a idade avançada dificultam a mobilização e eliminação do muco. (1) A fraqueza muscular inspiratória e expiratória adquirida pelo longo tempo de permanência na UTI diminui o volume pulmonar, os suspiros e o pico do fluxo da tosse (PFT), resultando em redução da expansão dos pulmões e da caixa torácica.(2) A perda progressiva da força dos músculos inspiratórios leva a um padrão restritivo, promovendo complicações como atelectasia, infecção pulmonar e disfunção nas trocas gasosas. Além disso, a deterioração muscular expiratória resulta em diminuição da eficácia da tosse.(1) A combinação do padrão restritivo com a incapacidade de realizar adequadamente o clearance de secreções pulmonares aumenta a incidência de complicações respiratórias.(3,4) Em pacientes com doença neuromuscular, o aumento da sobrevida está relacionado a medidas de higiene brônquica, como tosse assistida e hiperinsuflação manual.(4)

A técnica air stacking (AS, empilhamento de ar) pode ser definida como um método de insuflação pulmonar através de múltiplos esforços inspiratórios assistidos por meio de um ressuscitador manual. O AS é realizado com o auxílio de uma válvula unidirecional, com o objetivo de fornecer volumes maiores do que a capacidade inspiratória (CI) voluntária.(2) Os benefícios da técnica incluem aumento do volume inspirado, melhora da mobilidade torácica, prevenção de atelectasias e mobilização de secreções. O AS é amplamente utilizado em pacientes com doenças neuromusculares, como distrofia muscular de Duchenne, tetraplegia e esclerose lateral amiotrófica, com o objetivo de melhorar a eficácia da tosse devido à fraqueza respiratória.(2,5)

O breath stacking (BS) é fundamentado no incentivo à inspiração, através da incorporação da válvula unidirecional, bloqueando o ramo expiratório e permitindo apenas o fluxo inspiratório.(6) No entanto, o paciente deve mobilizar ativamente volumes progressivos de gás, através da contração muscular respiratória. O BS foi criado com base no método de mensuração da capacidade vital, pelo qual se observou que o método produzia valores superiores em comparação com o método convencional em pacientes com padrão obstrutivo ou restritivo, naqueles com doença neuromuscular e em indivíduos saudáveis.(7)

Não foram encontrados estudos que comparassem os efeitos terapêuticos entre as duas técnicas nem que tivessem analisado os volumes mobilizados e as pressões alcançadas em ambas as técnicas em pacientes traqueostomizados internados em UTI. A hipótese do presente estudo era a de que o AS aumenta a CI, promovendo efeitos clínicos sobre a complacência pulmonar. Por isso, o objetivo do presente estudo foi comparar os efeitos do BS e AS sobre a mecânica respiratória, o padrão ventilatório e a CI em pacientes traqueostomizados internados em UTI.

MÉTODOS

Foi realizado um ensaio clínico cruzado randomizado com 20 pacientes adultos, traqueostomizados, ventilando espontaneamente sem necessidade de suporte ventilatório por pelo menos 96 h, internados na UTI do Hospital Geral de Guarus, na cidade de Campos dos Goytacazes (RJ). Foram excluídos do estudo pacientes com derrame pleural e pneumotórax não drenados, aqueles com complacência estática menor que 25 mL/cmH2O ou com incapacidade de mensuração da mecânica respiratória (Figura 1). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa dos Institutos Superiores de Ensino do Centro Educacional Nossa Senhora Auxiliadora (CAAE no. 93156718.0.0.0000.5524). Os responsáveis pelos pacientes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.



Intervenção

Todos os pacientes foram submetidos a ambas as técnicas com um intervalo de 5 h entre elas. A ordem de aplicação das técnicas BS e AS foi gerada por permuta no computador e colocada em envelopes numerados de 1 a 10, totalizando 20 envelopes. Os envelopes eram abertos sequencialmente no momento da coleta de dados. O processo de randomização foi realizado por um segundo pesquisador, sendo cegado o pesquisador principal.

Para a realização das intervenções, os pacientes foram posicionados em decúbito dorsal com cabeceira elevada a 45°, e a pressão do cuff foi aumentada para evitar vazamentos. Antes da realização das intervenções, os pacientes foram submetidos à aspiração traqueal, de acordo com as recomendações da American Association for Respiratory Care.(8) O protocolo para ambas as técnicas consistiu de uma série de dez ciclos com um intervalo mínimo de 30 segundos entre os ciclos. Para a realização do BS e do AS, o sistema foi conectado à cânula de traqueostomia ao final da expiração basal, ao nível da capacidade residual funcional. Conforme demonstrado na Figura 2, o sistema foi composto por válvula unidirecional, manômetro de pressão e ventilômetro digital, sendo conectados ao filtro bacteriológico para ser acoplado à cânula de traqueostomia dos pacientes.



Para a realização do BS, os pacientes realizaram inspirações sucessivas durante o período máximo de 30 s ou até que não fosse observada abertura da válvula unidirecional ou aumento do volume inspirado do ventilômetro por dois esforços consecutivos. Para a realização do AS, foi utilizado um ressuscitador manual (RWR, São Paulo, Brasil) acoplado ao ventilômetro. Foram realizadas inspirações lentas e sucessivas através da compressão lenta do ressuscitador, até que a PImáx atingisse 40 cmH2O.

Avaliação

Os pacientes foram avaliados antes e depois da realização de ambas as técnicas em relação a mecânica respiratória, padrão ventilatório, CI e pressão nas vias aéreas.

Mecânica do sistema respiratório

A mecânica do sistema respiratório foi avaliada com um ventilador Vela (Bird Products Corporation, Palm Springs, CA, EUA) através do método de oclusão ao fim da inspiração. A manobra foi realizada no modo ventilação controlada a volume, fluxo constante de 40 L/min e pausa inspiratória de 3 s. Todos os pacientes foram submetidos a um período prévio de hiperventilação por 30 s através do aumento da FR para 35 ciclos/min. A tela do ventilador foi "congelada" para a obtenção de PImáx, pressão de platô e pressão expiratória final positiva, possibilitando o cálculo da complacência estática (Cest,sr) e resistência total (R,sr) do sistema respiratório. Foram efetuadas três medidas consecutivas aceitáveis em cada momento, sendo utilizada a média das duas medidas com menor desvio-padrão. Cada medida foi considerada aceitável se não fossem detectadas deflexões nas curvas de fluxo e pressão e/ou ausência de platô ao longo da pausa inspiratória, pois essas sugerem interferência do paciente e presença de vazamentos, respectivamente.(9-12)

CI

O volume máximo mobilizado durante as técnicas BS e AS foi mensurado partindo da capacidade residual funcional, determinando a CI. No BS, a CI foi medida ao final de 30 s de bloqueio do ramo expiratório ou caso o paciente não mobilizasse o volume em dois ciclos consecutivos. No AS, a CI foi registrada quando a pressão nas vias aéreas atingisse 40 cmH2O. A CI foi mensurada por meio do ventilômetro digital (Ohmeda, Oxnard, CA, EUA) em três ciclos, sendo utilizado o maior valor.(5,6,13)

Pressão nas vias aéreas

Em ambas as técnicas, a pressão nas vias aéreas foi mensurada ao nível da CI, na ausência de esforço muscular inspiratório ou expiratório. No BS, a pressão foi registrada ao final de 30 s ou até que o paciente não mobilizasse volume em dois ciclos consecutivos. No AS, a pressão foi registrada quando a meta de 40 cmH2O era alcançada. As pressões máximas atingidas no BS e AS foram registradas em três ciclos, sendo utilizada a média aritmética das duas medidas com menor desvio-padrão.(14)

Padrão ventilatório

O volume minuto (VE) e a FR foram mensurados antes e depois das intervenções. O ventilômetro digital (Ohmeda) foi acoplado à cânula de traqueostomia, registrando-se o volume de ar expirado durante 60 s (VE). O volume corrente (VT) médio basal foi calculado através da relação entre o VE e a FR (VE/FR), possibilitando o cálculo do índice de respiração rápida superficial (FR/VT).(15)

Análise estatística

Os dados obtidos foram organizados e revisados em planilhas do programa Microsoft Excel, possibilitando o cálculo de média e desvio-padrão para cada variável. Para a análise dos resultados e confecção dos gráficos foi utilizado o software SigmaPlot, versão 12.01 (Systat Software Inc., Richmond, CA, EUA). As medidas de mecânica (Cest,sr e R,sr) e de padrão ventilatório (VT, VE, FR e FR/VT) realizadas antes e depois das intervenções foram analisadas através do teste two-way ANOVA para medidas repetidas com pós-teste de Tukey para os resultados que apresentaram distribuição normal e os com homogeneidade de variâncias, verificados pelo teste de Shapiro-Wilk e teste de Levene, respectivamente. Caso a distribuição não fosse normal, era utilizado o teste de Friedman. Para a comparação da CI e das variações absolutas e relativas entre pré- e pós-intervenções das variáveis mecânicas e do padrão ventilatório foi utilizado o teste t pareado. Para todos os testes foi considerado um nível de significância de 5%. A comparação dos efeitos clínicos entre BS e AS foi avaliada através do effect size, utilizando o critério de Cohen. O ES foi avaliado através da diferença das variações absolutas e relativas entre os grupos pré- e pós-intervenções.

RESULTADOS

Foram analisados 20 pacientes no período entre agosto de 2018 e março de 2019. No dia da realização das intervenções, todos os pacientes estavam traqueostomizados e ventilando espontaneamente com auxílio de oxigênio via macronebulização. Na Tabela 1 estão apresentadas as características da amostra.



Ao analisar a mecânica respiratória, observou-se que somente o AS aumentou a Cest,sr na comparação com o pré-AS (p = 0,007), bem como houve uma diferença significativa entre as técnicas pós-BS e pós-AS (p = 0,03; d = 0,11). Na comparação entre AS e BS, o AS obteve maiores variações relativas (13,1 ± 11,9% vs. 1,3 ± 8,8%; p = 0,008; d = 0,49) e absolutas (4,6 ± 4,8 mL/cmH2O vs. 0,3 ± 4,0 mL/cmH2O; p = 0,043; d = 0,44) da Cest,sr. Não foram observadas diferenças entre pré-BS e pré-AS para a Cest,sr e R,sr, nem entre pós-BS e pré-BS em relação à Cest,sr (p = 0,85). Ambas as técnicas não modificaram a R,sr, não apresentaram diferenças entre os instantes pré-intervenção (p = 0,69) e pós-intervenção (p = 0,30; d = 0,14), nem apresentaram diferenças nas variações absolutas (p = 0,41; ES = 0,17) e relativas (p = 0,16; ES = 0,01). Os resultados sobre a mecânica respiratória estão apresentados na Tabela 2.



A CI foi superior no AS na comparação com o BS (2.420,7 ± 480,9 mL vs. 1.211,3 ± 562,8 mL; p < 0,001; ES = 0,76). Em comparação com o VT, o AS aumentou o volume inspiratório de 396,1 ± 94,5 mL para 2.420,7 ± 480,9 mL (p < 0,001), enquanto o BS aumentou de 398,0 ± 83,3 mL para 1.211,3 ± 562,8 mL (Figura 3). A diferença de volume mobilizado entre AS e BS foi de 2.024,6 ± 445,1 mL e 813,3 ± 530,9 mL (p < 0,001), respectivamente. Ao nível da CI, o AS obteve pressão nas vias aéreas superior ao BS (38,3 ± 2,6 cmH2O vs. 25,8 ± 5,5 cmH2O; p < 0,001). Com relação ao número de ciclos necessários para atingir a CI, não foram observadas diferenças significativas (p = 0,36). Para a obtenção da pressão inspiratória em torno de 40 cmH2O, o AS necessitou de 4,8 ± 0,9 ciclos de insuflação com o ressuscitador manual, enquanto o BS precisou de 5,0 ± 2,3 ciclos.



Com relação ao padrão ventilatório, não foram observadas alterações significativas entre pré- e pós-intervenções quanto a VE, FR, VT e FR/VT. O padrão ventilatório foi comparado entre os instantes pré- e pós-intervenção de cada técnica, na comparação entre as técnicas nos instantes pré- e pós-intervenção, bem como nas variações absolutas e relativas entre as técnicas. Os dados estão apresentados na Tabela 3.




DISCUSSÃO

Os principais achados do presente estudo foram que o AS aumentou a Cest,sr e atingiu maiores CI e pressão nas vias aéreas do que o BS. Ambas as técnicas não modificaram a R,sr ou o padrão ventilatório.

As técnicas de higiene brônquica que mobilizam maiores volumes pulmonares têm maior potencial de eliminar secreções. Quanto maior o volume inspirado, maiores serão a pressão de recolhimento elástico e o PFE e menor a R,sr. Dessa forma, o volume inspirado parece ser o principal fator na determinação do volume exalado e do PFT.(16) Ao atingir a capacidade máxima de insuflação, os pacientes podem ter alguns benefícios, como o aumento da efetividade da tosse, diminuição das atelectasias, aumento da complacência e aumento da amplitude de movimento torácico,(17) além do adiamento da ventilação mecânica ou até a redução de seu tempo de permanência.(18) Ambas as técnicas estudadas permitem a manutenção dos pulmões expandidos por tempo adicional, permitindo que as forças de interdependência possam recrutar volume, um processo que não é comumente concluído durante um único esforço inspiratório.(19)

Aumentos no PFT durante o uso do AS podem ser obtidos em diferentes populações, como indivíduos saudáveis, com fraqueza muscular respiratória ou com padrão obstrutivo.(20) Pacientes com padrão restritivo, a exemplo de pacientes com doença neuromuscular, são os que mais se beneficiam do AS, como aqueles com distrofia muscular de Duchenne,(21) amiotrofia espinhal e distrofia muscular congênita(22) ou esclerose lateral amiotrófica.(5,23,24) Outras aplicações incluem o pós-operatório de cirurgia cardíaca(25) ou doença de Parkinson.(26)

Um estudo comparou o PFT em 61 pacientes com distrofia muscular de Duchenne, realizado de quatro formas distintas: não assistida, com AS, com compressão abdominal ou com a associação de ambos. O AS promoveu PFT superiores aos da ausência de assistência ou com compressão abdominal. No entanto, a associação do AS com a compressão abdominal foi a que apresentou o melhor resultado sobre o PFT. (21) Embora o presente estudo não tenha avaliado o PFT, o maior aumento no volume pulmonar obtido através do AS parece ter sido crucial para o aumento da complacência pulmonar e da prevalência de tosse produtiva. Um estudo realizado em indivíduos saudáveis demonstrou que as insuflações com o ressuscitador manual promoveram uma média de aumento da CI de 599 mL (20,4%) acima da CI voluntária.(5) No presente estudo, o BS aumentou a média do volume inspirado basal em 813 mL, totalizando uma média de CI voluntária de 1.211 mL, enquanto, no caso do AS, o aumento da média do volume inspirado basal foi de 2.024 mL, totalizando uma média de CI voluntária de 2.420 mL. Considerando que a amostra investigada consistia de pacientes com fraqueza muscular respiratória adquirida devido a internação e ventilação mecânica prolongadas, a CI voluntária é consideravelmente menor quando comparada à de indivíduos jovens adultos saudáveis. Os achados sobre o volume e pressão estão associados a maiores PFT, mobilização de secreções e eficácia da tosse durante a aplicação das técnicas.(2,5)

Além de gerar maiores volumes pulmonares, o AS é um método passivo/assistido de insuflação pulmonar, sem a necessidade de grandes esforços musculares para atingir a CI máxima. No entanto, a insuflação do ressuscitador manual deve ser realizada em sincronia com as contrações musculares inspiratórias. Insuflações durante a fase expiratória provocam assincronia e picos de pressão nas vias aéreas. No entanto, complicações como barotrauma não foram observadas em pacientes neuromusculares com a aplicação do AS.(2) O mesmo resultado foi observado quando o AS foi utilizado em indivíduos saudáveis sem doença pulmonar intrínseca primária. Um estudo referiu que o insuflador manual estava bem calibrado e que a válvula de segurança abria automaticamente quando a pressão atingia 40 cmH2O.(5) No presente estudo, além da utilização da válvula de segurança, a pressão foi monitorada através da incorporação de um manômetro de pressão, sendo as insuflações manuais lentas interrompidas quando a pressão atingisse 40 cmH2O. No entanto, picos de pressão foram observados durante a tosse em pacientes que mobilizaram secreções, principalmente no AS. Durante a realização do AS, 17 dos 20 pacientes (85%) apresentaram tosse e necessidade de aspiração, enquanto apenas 2 (10%) as apresentaram durante o BS.

Outro benefício do AS é a possibilidade de ser realizado pelo próprio paciente através da autoinsuflação do ressuscitador manual. É indicado para pacientes com capacidade vital reduzida, redução do PFT, risco de atelectasia, retenção de secreções ou com dificuldade de sua eliminação.(17) Com o objetivo de avaliar os efeitos do treinamento diário com AS, 18 pacientes com amiotrofia espinhal e distrofia muscular congênita foram acompanhados no domicílio por 4-6 meses.(22) Foi prescrito um regime diário de 10 séries de 3-4 insuflações. Houve aumento no PFT assistido e não assistido, porém menos pronunciados nos pacientes com escoliose associada. Verificou-se ainda que a CVF aumentou nos pacientes sem escoliose.(22)

O AS consiste em insuflações consecutivas do ressuscitador manual e consequente empilhamento do volume pulmonar. Por outro lado, a manobra de hiperinsuflação manual consiste em apenas uma insuflação lenta com o ressuscitador manual, seguida de pausa inspiratória.(27) Assim, o volume mobilizado durante o AS é provavelmente superior em comparação com a hiperinsuflação manual. Vários autores utilizaram a hiperinsuflação manual em pacientes ventilados mecanicamente, avaliando seus efeitos terapêuticos ou em comparação com a hiperinsuflação com o ventilador mecânico. Estudos(10,28-30) têm demonstrado que a hiperinsuflação manual promove a melhora da mecânica respiratória, sem promover alterações hemodinâmicas, e utilizaram a Cest,sr para avaliar os efeitos terapêuticos, assim como no presente estudo. O deslocamento de secreções promove expansão/recrutamento de unidades colapsadas e/ou com elevadas constantes de tempo, com consequente aumento da Cest,sr. Esse efeito se deve ao aumento da ventilação colateral, da pressão de recolhimento elástico e do fluxo expiratório, com consequente aumento da interação gás-líquido.(28)

Durante o BS, a oclusão das vias aéreas na fase expiratória evoca mecanismos compensatórios aumentando o drive central progressivamente. O fluxo de ar resultante de cada esforço inspiratório aumenta o volume pulmonar e empilha o ar. Ao longo dos sucessivos esforços inspiratórios, os incrementos de volume tendem a diminuir, pois os músculos respiratórios entram em desvantagem biomecânica e a complacência diminui. O fluxo inspiratório continua até que o esforço inspiratório se torne insuficiente para abrir a válvula unidirecional. Nesse momento, o volume pulmonar se aproxima da capacidade pulmonar total.(7,19) Um estudo comparou a CI voluntária, CI voluntária com pausa e o BS em 26 pacientes cooperativos, nos quais a dor ou a fraqueza muscular prejudicavam a capacidade de obter ou sustentar a inspiração profunda. O BS mobilizou maior volume inspirado, indicando que a adição da válvula unidirecional é eficaz para aumentar a CI.(13) Outro estudo comparou a espirometria de incentivo com o BS sobre a CVF e o volume mobilizado em 35 pacientes ao longo de cinco dias de pós-operatório de cirurgia cardíaca. Os autores observaram que o BS recuperou completamente o volume inspirado a partir do segundo dia de pós-operatório, além de mobilizar maior volume pulmonar nos cinco dias de tratamento, embora não tenham observado diferenças na CVF entre as técnicas.(6)

A válvula unidirecional permite que o paciente relaxe os músculos inspiratórios sem exalar e que o volume aumente nas respirações sucessivas. Dois mecanismos podem ajudar a explicar a mobilização de volume durante o BS: maior estimulação neural e recrutamento pulmonar. Na maioria dos pacientes, volumes inspirados relativamente altos podem ser alcançados com pressões moderadas. No entanto, pacientes com mecânica comprometida, limitada pela dispneia ou dor, são incapazes de manter o esforço suficiente para alcançar seu volume máximo.(13) O volume mobilizado durante o BS depende exclusivamente da contração muscular respiratória, sendo esse um fator limitante para a mobilização de volume e consequente eficácia terapêutica. A fraqueza muscular respiratória diminui a efetividade da fase inspiratória da tosse, havendo uma relação direta entre PImáx e fluxo de tosse, o que enfatiza a necessidade do fortalecimento muscular respiratório.(17) No presente estudo, foi observado que alguns pacientes conseguiam abrir a válvula inspiratória após o término do tempo de oclusão de 30 s. Nesses casos, os pacientes poderiam ter atingido maior CI.

O AS atingiu maiores CI e pressão nas vias aéreas do que o BS, com consequente aumento da Cest,sr. No entanto, não foram observados efeitos sobre o padrão ventilatório em ambas as técnicas.

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