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Mortalidade por asma no Brasil, 1980-2012: uma perspectiva regional

Asthma mortality in Brazil, 1980-2012: a regional perspective

Thaís de Sá Brito1,a, Ronir Raggio Luiz2,b, José Roberto Lapa e Silva3,c, Hisbello da Silva Campos4,5,d

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37562017000000235

ABSTRACT

Objective: To estimate asthma mortality rates in Brazil for the period 1980-2012. Methods: On the basis of data from the Brazilian National Ministry of Health Mortality Database, we estimated mortality rates by calculating moving averages from a municipal perspective that would allow an evaluation differentiating between urban, rural, and intermediate (rurban) Brazil during the period 2002-2012. Trends were assessed using simple linear regression. Results: On average, 2,339 asthma-related deaths were reported per year during the study period. Asthma ranged from the 53rd to 95th leading cause of death. There was a decrease in asthma mortality rates in the country, from 1.92/100,000 population in 1980 to 1.21/100,000 population in 2012. From the municipal perspective, rates fell in urban and rurban Brazil, but increased in rural Brazil, except in the 5-34-year age group. Asthma mortality rates fell in the population under 25 years of age and increased among those over 74 years of age. Rates were always higher in females. Conclusions: Asthma mortality rates in Brazil have been decreasing slightly, with the decrease being more marked in the decade 2002-2012. Only the northeastern region of Brazil showed the opposite trend. Asthma mortality rates in urban and rurban Brazil showed a downward trend similar to that of the national scenario, whereas rural Brazil showed the opposite behavior. Analysis by age group showed that rates decreased among younger individuals and increased among the elderly aged ≥ 75 years.

Keywords: Asthma/mortality; Brazil; urban population; rural population.

RESUMO

Objetivo: Estimar as taxas de mortalidade por asma no Brasil no período de 1980-2012. Métodos: A partir dos dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde, as taxas de mortalidade foram estimadas pelo cálculo de médias móveis numa perspectiva municipal que permitisse a avaliação diferenciada entre Brasil urbano, rural e intermediário (rurbano) no período de 2002-2012. As tendências foram avaliadas através de regressão linear simples. Resultados: Em média, foram notificadas 2.339 mortes anuais por asma no período estudado. A asma variou entre 53ª e 95ª causa de óbito. Houve decréscimo das taxas de mortalidade no país: 1,92/100.000 habitantes em 1980 e 1,21/100.000 habitantes em 2012. Na perspectiva municipal, as taxas caíram no Brasil urbano e rurbano, mas aumentaram no Brasil rural, exceto na faixa etária de 5-34 anos. As taxas de mortalidade caíram na população com até 24 anos e aumentaram entre os maiores de 74 anos. O coeficiente de mortalidade foi sempre superior no sexo feminino. Conclusões: As taxas de mortalidade por asma estão diminuindo no Brasil de modo discreto, sendo mais marcante na década 2002-2012. Apenas a região Nordeste teve tendência oposta. As taxas de mortalidade no Brasil urbano e rurbano tiveram comportamento de queda semelhante ao do cenário nacional, enquanto o Brasil rural teve comportamento oposto. Quando consideradas as faixas etárias, as taxas diminuíram entre os mais jovens e aumentaram entre idosos ≥ 75 anos.

Palavras-chave: Asma/mortalidade; Brasil; População urbana; População rural.

INTRODUÇÃO

Globalmente, a asma compromete de 1-16% da população em diferentes países (cerca de 300 milhões de pessoas)(1) e causa 346.000 óbitos anuais.(2) Duas epidemias de mortalidade por asma foram descritas no século XX; a primeira, nos anos 60 no Reino Unido, Austrália e Nova Zelândia; a segunda, na Nova Zelândia, uma década após. A primeira foi atribuída ao efeito cardiotóxico de doses elevadas de isoprenalina. A segunda epidemia foi associada ao uso disseminado de fenoterol e outros broncodilatadores inalatórios potencialmente cardiotóxicos.(3-6)

Dimensionar o impacto da mortalidade por asma não apenas sob a perspectiva nacional, mas também regional, é particularmente importante em países com dimensões continentais nos quais há diversidade regional nas condições socioeconômicas, de desenvolvimento e de infraestrutura. Diferentes cenários epidemiológicos emergem ao incluir os diferenciais intraurbanos em estudos de prevalência.

A urbanização tanto pode exercer impactos negativos na saúde das populações, decorrente de aspectos das condições de vida e moradia e de poluição do ar, como melhorar a oferta de serviços de saúde, influenciando positivamente a saúde das populações.(7) Os resultados obtidos serão melhores se as diferenças regionais forem consideradas na programação das ações de controle, independentemente do grau regional de urbanização.(8-10)

As taxas de mortalidade por asma e suas tendências são apresentadas tanto nas perspectivas nacional e macrorregional como na municipal. Nessa última, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divide o país em duas áreas: urbana e rural. Enquanto a primeira é definida como "interna ao perímetro urbano, criada através de lei municipal, seja para fins tributários ou de planejamento urbano (Plano Diretor, zoneamento, etc.)", a segunda (rural) é definida como "aquela que não foi incluída no perímetro urbano por lei municipal". (11) Como essa classificação pode gerar vieses na análise do acesso e do grau de resolutividade da rede de saúde quando focada a população de municípios considerados rurais e fronteiriços a grandes centros urbanos, a análise municipal realizada no presente estudo tomou como base as definições de áreas urbanas e rurais de José Eli da Veiga,(12) validadas por diversos autores e descritas adiante.

MÉTODOS

O comportamento das taxas de mortalidade por asma no período de 1980 a 2012 foi analisado a partir dos dados oficiais do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DATASUS), disponíveis para a população. A busca das informações no site seguiu esta sequência: 1) informações de saúde e estatísticas vitais; 2) filtro: mortalidade geral, Brasil por região e unidade da federação e asma como causa de óbito; 3) óbitos por ocorrência; 4) ano do óbito; 5) sexo, idade e municípios de ocorrência. No período de 1980-1995, foi utilizada a Classificação Internacional das Doenças, 9ª versão (CID-9; código 493: asma; no período de 1996-2012, foi utilizada a 10ª versão (CID-10; códigos J45: asma e J46: estado de mal asmático). Os índices foram calculados segundo o gênero, faixa etária, macrorregião e grupos de municípios. O período escolhido foi aquele no qual as informações estavam completas no DATASUS.

A análise das taxas de mortalidade segundo gênero, faixa etária e macrorregião foi efetuada através de regressão linear simples, no período de 1980-2012. A análise das taxas de mortalidade segundo grupos de municípios foi efetuada apenas de 2002-2012 e foi realizada através de médias móveis; em seguida, as médias de tendências foram avaliadas através de regressão linear simples. Optou-se por realizar a análise por grupos de municípios apenas a partir de 2002, já que em 2001 foram criados 54 novos municípios no Brasil, o que atrapalharia a análise, pois muitos municípios novos são criados dentro de outros já existentes. Portanto, a análise foi feita com base em 5.564 municípios.

As taxas de mortalidade por asma foram calculadas da seguinte forma: número absoluto de óbitos × 100.000/população. Na análise por gênero utilizaram-se as populações masculina e feminina de cada ano. A análise segundo a idade separou as faixas etárias de acordo com a classificação usada pela Organização Pan-Americana da Saúde e pelo DATASUS.(13) Na análise das taxas de mortalidade por municípios, utilizou-se a população de cada município a cada ano e se fez o mesmo cálculo.

Considerando que os estudos sobre mortalidade por asma costumam analisar a faixa etária de 5-34 anos separadamente como balizador das taxas globais, já que, nesse grupo, há menos vieses de confusão diagnóstica com bronquiolite e DPOC principalmente,(3,14) todas as taxas calculadas foram comparadas às equivalentes a essa faixa etária.

A classificação usada pelo IBGE define cidade como o distrito sede de um município. Nessa classificação, toda sede de município (cidade) e de distrito (vila) é considerada área urbana. Um decreto do Estado Novo, de 1938, transformou em cidades todas as sedes municipais, fazendo com que a classificação usada pelo IBGE considere urbana qualquer sede municipal,(11) independentemente de suas características demográficas. Essa norma pode acarretar vieses relevantes na análise do acesso aos cuidados de saúde de uma população residente em município pequeno e vizinho a um grande centro. Mesmo que aquele município disponha apenas de uma estrutura mínima de saúde, sua população tem acesso à rede de saúde do grande centro, seu vizinho. Assim, se usada a classificação do IBGE, a população daquele município seria considerada rural mesmo tendo, na prática, acesso aos cuidados de saúde do mesmo modo que a população urbana do grande centro. Por essa razão, diversos autores e instituições têm preferido usar outra classificação de população urbana ou rural, já validada, que leva em consideração outros fatores demográficos. Essa última classificação, proposta por Veiga,(12) segue uma metodologia mais adequada às condições municipais locais, aliando o tamanho populacional do município (grande, médio ou pequeno) com a densidade demográfica e o grau de urbanização: "municípios integrantes de regiões metropolitanas" (RM) e "municípios fora de regiões metropolitanas" (FRM).(12) Nessa metodologia, além dos conceitos de urbano - municípios RM, segundo o tamanho (grandes, médios ou pequenos) e municípios FRM grandes - e rural - municípios FRM pequenos - consta um novo conceito: "rurbano" - municípios FRM médios. Com essa classificação, retira-se o viés potencial citado acima, sendo utilizada para a análise municipal das taxas de mortalidade por asma e suas tendências no Brasil no presente estudo.

Para fins de cálculo, para os municípios RM, utilizou-se a soma das populações dos municípios RM no Brasil; da mesma forma, calculou-se a soma das populações dos municípios FRM. O estudo incluiu 5.564 municípios. A classificação usada para categorizá-los segundo seu tamanho foi a seguinte(12):

 Grande: mais de 100.000 habitantes

 Médio: população entre 50.000 e 100.000 habitantes ou cuja densidade ≥ 80 habitantes/km2, mesmo que houvesse menos de 50.000 habitantes

 Pequeno: menos de 50.000 habitantes e densidade < 80 habitantes/km2

Como a análise também considerou o grau de urbanização, todos os 5.564 municípios brasileiros foram separados em outros dois grupos: RM e FRM.

A análise estatística utilizou o programa IBM SPSS Statistics, versão 24.0 (IBM Corporation, Armonk, NY, EUA). Foram realizadas regressões lineares com intervalos de confiança de 95% para os coeficientes angulares. Na análise dos municípios, foram realizadas as médias móveis dos coeficientes lineares objetivando suavizar a série temporal. O estudo foi aprovado pelo Conselho de Ética em Pesquisa do Instituto Fernandes Figueira da Fundação Oswaldo Cruz.

RESULTADOS

A asma variou entre a 53ª e a 95ª causa de morte no país no período estudado. Em média, houve 2.339 óbitos anuais devido à asma no Brasil entre 1980 (n = 2.286) e 2012 (n = 2.354). Na Figura 1, são apresentados os coeficientes de mortalidade por 100.000 habitantes. Em todo o período, observa-se uma tendência discreta de queda global (−0,007), passando de 1,92/100.000 habitantes em 1980 para 1,21/100.000 habitantes em 2012. A tendência não foi uniforme, havendo alternância entre queda (1980-1991; 1999-2005; 2006-2012) e crescimento (1992-1999; 2005-2006), de modo semelhante ao ocorrido no grupo etário de 5-34 anos (−0,002 óbitos/ano), conferindo consistência aos dados.
 



A Figura 2 mostra que as taxas de óbito foram significativamente superiores no sexo feminino, e essa diferença aumentou com o passar dos anos. As maiores taxas de mortalidade foram encontradas na faixa etária de 75 anos ou mais (20,37/100.000 habitantes, em média). As menores taxas foram observadas na faixa entre 15 e 24 anos (0,20/100.000 habitantes, em média). A análise proporcional dos óbitos segundo as faixas etárias (Figura 3) demonstra que a participação proporcional nas taxas de óbito aumentou ao longo do tempo a partir dos 25 anos, marcantemente na faixa etária de 75 anos ou mais (17,6% dos óbitos em 1980 vs. 40,8% em 2012). Houve redução das participações proporcionais nos óbitos entre os menores de 25 anos, principalmente na faixa de 0-4 anos. A proporção de óbitos por asma foi mais baixa na faixa etária de 5-14 anos, seguida pela de 15-24 anos. Na perspectiva das macrorregiões (Figura 4), as taxas caíram discretamente nas regiões Norte (−0,004 óbitos/ano), Sudeste (−0,023 óbitos/ano), Sul (−0,017 óbitos/ano) e Centro-Oeste (−0,007 óbitos/ano). A única exceção foi a região Nordeste, onde observou-se um crescimento discreto das taxas de mortalidade (0,025 óbitos/ano). As médias dos coeficientes por 100.000 habitantes em cada região no período de 1980-2012 foram as seguintes: 1,73 (Sul), 1,58 (Sudeste), 1,48 (Nordeste), 1,10 (Centro-Oeste) e 0,79 (Norte).
 

 


 




A evolução temporal das médias móveis das taxas de mortalidade foi analisada de acordo com a classificação adotada para os municípios. Houve queda das taxas tanto nos municípios RM como nos FRM (Figura 5).
 





O Brasil urbano engloba os municípios RM grandes, médios e pequenos e os municípios FRM grandes. A análise detalhada do Brasil urbano mostrou uma tendência de queda das médias móveis das taxas de mortalidade para os municípios grandes (tanto RM quanto FRM). O mesmo foi observado no Brasil "rurbano". Entretanto, o oposto foi observado nos municípios RM médios e pequenos, onde a mortalidade aumentou. No Brasil rural, representado pelos municípios FRM pequenos, as médias móveis das taxas de mortalidade mostraram uma tendência de crescimento (0,11 ao ano; Figura 6).
 



A análise da população de 5-34 anos corrobora os resultados acima, exceto para o Brasil rural, já que nos municípios FRM pequenos houve uma tendência de queda das médias móveis das taxas de mortalidade para essa faixa etária.

DISCUSSÃO

As taxas de mortalidade por asma no Brasil são elevadas, apesar de apresentarem uma tendência de queda durante o período estudado, mais marcantemente nos últimos 3 anos. Entre 1980 e 2012, ocorreram, em média, 2.339 mortes/ano. A queda detectada na última década do estudo (2002 a 2012) foi confirmada pelo observado na população de 5-34 anos.

Quando avaliadas as diferentes macrorregiões, observou-se que, em média, os coeficientes de mortalidade por 100.000 habitantes foram maiores na região Sul (1,73), seguida das regiões Sudeste (1,58), Nordeste (1,48), Centro-Oeste (1,10) e Norte (0,79). Se comparados à média nacional (1,48), o coeficiente da região Nordeste é equivalente, os das regiões Sudeste e Sul são superiores e os das regiões Centro-Oeste e Norte são inferiores. A análise da tendência das taxas de mortalidade nas diferentes macrorregiões revela uma tendência uniforme de queda, com exceção da região Nordeste. Resultados semelhantes foram descritos por Souza-Machado(15) (coeficientes de 1,68 em 1998 e de 1,32 em 2009), que também descreveu um crescimento das taxas de mortalidade apenas no Nordeste. Possivelmente, diferenças regionais no acesso e na qualidade dos cuidados médicos, além de diferenças climáticas, ambientais e socioeconômicas, estão envolvidas na variedade observada entre as taxas de mortalidade nas diferentes regiões.

A situação epidemiológica diferenciada da asma nos ambientes urbanos e rurais motivou a análise dos dados coletados também sob a perspectiva municipal. Por essa razão, optou-se por utilizar uma classificação de municípios que os separava em urbanos e rurais, assim como em grandes, médios e pequenos. Dentre os motivos para esse tipo de análise dos dados, pode-se citar que fatores positivos das RM, como redes de saúde mais desenvolvidas e equipadas, contrapõem-se a fatores negativos, como poluição ambiental, causando impactos nas taxas de mortalidade.(7) Apesar de permitir vieses, classificar um município como RM confere-lhe um perfil populacional com maior acesso a serviços, como transporte, saúde e educação, quando comparado a um município FRM. Dentre os vieses possíveis dessa classificação, deve-se lembrar que a população de um município FRM pequeno, porém adjacente a outro município RM grande, tem quase o mesmo grau de acesso a esses serviços da população vizinha.

O ambiente urbano pode ter relação com o aumento da prevalência da asma.(16) Essa hipótese vai ao encontro do observado em um estudo nacional em que se encontrou uma maior prevalência de asma em adolescentes que viviam em áreas urbanas do que em áreas rurais.(17) Entretanto, a literatura especializada revela divergências sobre o papel do ambiente urbano na modulação da prevalência da asma.(7) Um estudo feito no Brasil observou uma maior prevalência da asma em adolescentes que vivam em áreas urbanas do que naqueles moradores de áreas rurais.(17) Um estudo nos EUA não encontrou diferenças na prevalência da asma em regiões metropolitanas e não metropolitanas (classificadas como rurais) no estado de Montana, sendo contrário ao argumento de que a urbanização aumentaria a prevalência da doença.(18) Ao mesmo tempo, aparentemente, a maior oferta de redes de saúde pode ter influência positiva na saúde dos indivíduos em regiões urbanizadas.(7) Um estudo no Brasil analisou dados de prevalência da asma em crianças e adolescentes nas diferentes regiões do país (dados coletados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, realizada pelo IBGE nos anos de 1998, 2003 e 2008). Esse estudo também avaliou a prevalência da doença de acordo com o local de residência dos indivíduos: urbano ou rural. O incremento anual da prevalência da asma foi de 0,6% na zona urbana e de 1,8% na zona rural; portanto, o maior incremento na prevalência da doença ocorreu entre os moradores da zona rural. Apesar de esse estudo não avaliar taxas de mortalidade, ele mostra o impacto da asma em regiões rurais no Brasil.(19)

As médias móveis das taxas de mortalidade apresentaram queda nos municípios RM ou FRM grandes (grande parte do Brasil urbano) e queda também no Brasil "rurbano"; porém, houve um aumento das taxas de mortalidade nos municípios RM pequenos e médios (pequena parte do Brasil urbano). Por outro lado, no Brasil rural (municípios FRM pequenos), observou-se um aumento da mortalidade. Esse resultado foi confirmado pelo observado na população de 5-34 anos, exceto na situação particular dos municípios FRM pequenos (Brasil rural). Nessas últimas localidades, ao contrário do observado na população geral (crescimento das taxas), houve redução das taxas de mortalidade na população de 5-34 anos. A perspectiva regional dos dados de mortalidade indica que deve ser dada prioridade às ações de controle da asma em parte do Brasil urbano (nos municípios RM pequenos e médios onde há crescimento da mortalidade) e no Brasil rural (para a população geral, mesmo que as taxas de mortalidade caiam na população de 5-34 anos).

O declínio das taxas de mortalidade por asma também foi observado em outros países no mesmo período (1980-2012), mas numa escala maior. Nossa taxa de queda (0,67%) é inferior à notificada nos EUA (de 33% entre 1994 e 2001),(20) onde o número de óbitos em 2009 foi 27% menor que em 1999(21); no Brasil, a diferença foi de 20%. Na Europa, essas taxas caíram 80% entre 1985 e 2012(21); no Brasil, caíram 16% no mesmo período. Entre 2000 e 2011, houve queda de 80% nos óbitos por asma na Costa Rica(22) e de 17% no Brasil. Em Cuba, o coeficiente de mortalidade por asma por 100.000 habitantes caiu de 4,5 em 1982 para 2,3 em 2010 (49%),(23) mais expressivo que o observado em nosso país: 1,72 e 1,38 (20%), respectivamente. No Brasil, o Ministério da Saúde passou a oferecer medicamentos gratuitos para pacientes com asma grave a partir de 2002(15) e, desde 2005, também para outras formas da doença,(15) sendo provavelmente um fator relevante para a redução dessas taxas.(24,25)

A mortalidade foi menor nas faixas etárias mais jovens, particularmente entre 5 e 14 anos. Aparentemente, as faixas etárias mais elevadas estão aumentando a contribuição proporcional dos óbitos, e o inverso vem ocorrendo entre os mais jovens. Seria interessante desenhar um estudo para avaliar se isso se deve a um viés na notificação do óbito entre os mais idosos ou se a letalidade da asma vem aumentando com a idade. As taxas de mortalidade, embora declinantes em ambos os sexos, foram consistentemente maiores entre as mulheres. Taxas mais elevadas no sexo feminino também foram encontradas em outro estudo nacional realizado no estado do Rio Grande do Sul de 1981 a 2003.(26) A superioridade das taxas de mortalidade no sexo feminino foram relatadas também em outros estudos em outros países.(20,22)

O estudo de Graudenz et al.(27) apresentou taxas de mortalidade e tendências equivalentes em todas as faixas etárias, além de enfatizar a tendência expressiva de queda nas taxas nos últimos anos do estudo (conforme é mostrado na Figura 1). O estudo de Campos,(3) que indicou uma variação das taxas na faixa etária de 5-34 anos de 0,18/100.000 habitantes para 0,28/100.000 habitantes no período entre 1980 e 1998, assim como o estudo de Lotufo & Bensenor,(4) que indicou, na população de 5-34 anos, um declínio das taxas de mortalidade por asma entre 1980 e 1991, mas seu aumento entre 1992 e 1996, apresentaram resultados equivalentes. Entretanto, o estudo de Lotufo & Bensenor(4) apontou uma tendência de queda não significativa entre 1997 e 2010, enquanto o presente estudo encontrou um crescimento discreto (0,96%).

O trabalho de Ponte et al.,(28) analisando a faixa etária de 5-24 anos, demonstrou taxas maiores entre indivíduos vivendo em áreas urbanas. Nosso estudo também mostrou um crescimento das taxas de mortalidade em parte do Brasil urbano (municípios RM pequenos e médios), embora, nos municípios grandes do Brasil urbano (tanto RM como FRM), se evidencie queda nas médias móveis das taxas de mortalidade. Esse resultado foi encontrado tanto na população total quanto na da faixa etária de 5-34 anos. As diferenças entre os resultados encontrados no presente estudo e aqueles do estudo de Ponte et al.(28) se devem ao fato de esse último ter avaliado a população de 5-24 anos e, separadamente, dois períodos de 3 anos (1999-2001 e 2009-2011), enquanto nosso estudo analisou 10 anos consecutivos (2002-2012). Além disso, houve diferenças nas metodologias utilizadas; o presente estudo utilizou médias móveis e regressão linear simples, enquanto o de Ponte et al.(28) utilizou regressão logística binária.

Cabe ressaltar que o Sistema de Informações sobre Mortalidade do Brasil utiliza dados oriundos dos atestados de óbito, o que gera vieses potenciais capazes de subestimar as taxas reais de mortalidade e as conclusões do presente estudo.(29)

Finalizando, há desigualdade no comportamento das taxas de mortalidade na perspectiva regional, com tendência de queda nos grandes municípios (Brasil urbano) e de aumento nos municípios RM pequenos e médios (também Brasil urbano). No Brasil rural, as taxas aumentaram na população geral e caíram na faixa etária de 5-34 anos. As taxas de mortalidade foram consistentemente mais elevadas no sexo feminino durante todo o período estudado. A mortalidade foi mais baixa no grupo etário de 5-14 anos, e houve uma tendência de queda entre aqueles com até 24 anos. De modo oposto, as taxas aumentaram no grupo com 75 anos ou mais. Essa última observação pode ser decorrente de vieses diagnósticos na notificação da morte, mas a investigação sobre os fatores envolvidos na dinâmica das taxas de mortalidade não fez parte dos objetivos do presente estudo. Ao apontar diferentes impactos regionais e etários, as informações apresentadas aqui podem contribuir para o planejamento de políticas públicas de controle da asma.

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