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ISSN (on-line): 1806-3756

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Artigo de Revisão

Novos fármacos e fármacos repropostos para o tratamento da tuberculose multirresistente e extensivamente resistente

New and repurposed drugs to treat multidrug- and extensively drug-resistant tuberculosis

Denise Rossato Silva1,a, Margareth Dalcolmo2,b, Simon Tiberi3,c, Marcos Abdo Arbex4,5,d, Marcela Munoz-Torrico6,e, Raquel Duarte7,8,9,f, Lia D'Ambrosio10,11,g, Dina Visca12,h, Adrian Rendon13,i, Mina Gaga14,j, Alimuddin Zumla15,k, Giovanni Battista Migliori10,l

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37562017000000436

ABSTRACT

Multidrug-resistant and extensively drug-resistant tuberculosis (MDR-TB and XDR-TB, respectively) continue to represent a challenge for clinicians and public health authorities. Unfortunately, although there have been encouraging reports of higher success rates, the overall rate of favorable outcomes of M/XDR-TB treatment is only 54%, or much lower when the spectrum of drug resistance is beyond that of XDR-TB. Treating M/XDR-TB continues to be a difficult task, because of the high incidence of adverse events, the long duration of treatment, the high cost of the regimens used, and the drain on health care resources. Various trials and studies have recently been undertaken (some already published and others ongoing), all aimed at improving outcomes of M/XDR-TB treatment by changing the overall approach, shortening treatment duration, and developing a universal regimen. The objective of this review was to summarize what has been achieved to date, as far as new and repurposed drugs are concerned, with a special focus on delamanid, bedaquiline, pretomanid, clofazimine, carbapenems, and linezolid. After more than 40 years of neglect, greater attention has recently been paid to the need for new drugs to fight the "white plague", and promising results are being reported.

Keywords: Tuberculosis/therapy; Tuberculosis, multidrug-resistant; Extensively drug-resistant tuberculosis; Antitubercular agents.

RESUMO

A tuberculose multirresistente (TB-MDR, do inglês multidrug-resistant) e a extensivamente resistente (TB-XDR, do inglês extensively drug-resistant) continuam representando um desafio para os clínicos e as autoridades de saúde pública. Infelizmente, embora haja relatos encorajadores de taxas de sucesso maiores, a taxa global de desfechos favoráveis do tratamento da TB-MDR/XDR é de apenas 54%, ou muito menor quando o espectro de resistência aos fármacos vai além do da TB-XDR. O tratamento da TB-MDR/XDR continua sendo uma tarefa difícil, em razão da alta incidência de eventos adversos, do longo tempo de tratamento, do alto culto dos esquemas utilizados e da drenagem dos recursos de saúde. Diversos ensaios e estudos foram realizados recentemente (alguns já publicados e outros em andamento), todos visando a melhorar os desfechos do tratamento da TB-MDR/XDR por meio da alteração da abordagem geral, redução do tempo de tratamento e desenvolvimento de um esquema universal. O objetivo desta revisão foi resumir o que se conseguiu até o momento, no que se refere a novos fármacos e fármacos repropostos, dando foco especial para delamanid, bedaquilina, pretomanida, clofazimina, carbapenêmicos e linezolida. Após mais de 40 anos de negligência, recentemente foi dada mais atenção á necessidade de novos fármacos para se combater a "praga branca", e resultados promissores estão sendo relatados.

Palavras-chave: Tuberculose/terapia; Tuberculose resistente a múltiplos medicamentos; Tuberculose extensivamente resistente a drogas; Antituberculosos.

INTRODUÇÃO

Em seu Relatório Global de Tuberculose de 2017, a Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou que houve 1,67 milhão de óbitos atribuídos à tuberculose em 2016, indicando que a chamada "praga branca" continua sendo uma prioridade de saúde pública.(1) Como 490.000 casos de tuberculose multirresistente (TB-MDR, do inglês multidrug-resistant; resistência a pelo menos isoniazida e rifampicina) foram relatados em 2016 e 6,2% desses casos foram atribuídos a infecção por cepas de tuberculose extensivamente resistente (TB-XDR, do inglês extensively drug-resistant; isto é, cepas de TB-MDR com resistência adicional a fluoroquinolonas e a pelo menos um dos fármacos injetáveis de segunda linha), há uma grave preocupação de que a epidemia mundial esteja se tornando resistente aos tratamentos existentes. Infelizmente, embora haja relatos encorajadores de taxas maiores de sucesso,(2) a taxa global de desfechos favoráveis do tratamento da TB-MDR/XDR é de apenas 54%,(1) ou muito menor quando o espectro de resistência aos fármacos vai além do da TB-XDR.(3)

O tratamento da TB-MDR/XDR continua sendo uma tarefa difícil para os clínicos, em razão da alta incidência de eventos adversos, do longo tempo de tratamento, do alto culto dos esquemas utilizados e da drenagem dos recursos de saúde.(4-9) Diversos ensaios e estudos foram realizados recentemente (alguns já publicados e outros em andamento), todos visando a melhorar os desfechos do tratamento da TB-MDR/XDR por meio da alteração da abordagem global e talvez até da redução do tempo de tratamento.(1,4,10-12) O objetivo desta revisão foi resumir o que se conseguiu até o momento, no que se refere a novos fármacos e fármacos repropostos.

MÉTODOS

Realizamos uma revisão não sistemática da literatura, utilizando o Google, o Google Scholar, a base de dados PubMed e o site ClinicalTrials.gov, para a identificação de relatos em inglês, espanhol ou português publicados entre 1º de novembro de 2014 e 1º de novembro de 2017. Inúmeras buscas foram realizadas utilizando-se os seguintes termos: "TB", "MDR-TB", "XDR-TB", "drugs", "trials" e "drug development". Buscas individuais também foram realizadas para os seguintes novos fármacos ou fármacos repropostos para tuberculose: bedaquilina, delamanid, clofazimina, levofloxacina, moxifloxacina, pretomanida (anteriormente conhecida como Pa-824), pirazinamida, rifapentina, rifampicina, linezolida, delpazolida, sutezolida, carbapenêmicos, imipenem, meropenem, ertapenem e faropenem. Também realizamos uma busca no Relatório Global de Tuberculose da OMS de 2017 por informações sobre novos fármacos e fármacos repropostos, bem como em sites relevantes: Global Alliance for Tuberculosis Drug Development (TB Alliance, Aliança Global para o Desenvolvimento de Fármacos contra a Tuberculose); Unitaid; Treatment Action Group (Grupo de Ação de Tratamento); e Stop TB Partnership Working Group on New Drugs (Grupo de Trabalho sobre Novos Fármacos da Parceria Stop TB). As apresentações orais e os pôsteres apresentados na conferência da International Union Against Tuberculosis and Lung Disease (IUATLD, União Internacional contra a Tuberculose e Doenças Pulmonares) de 2017 também foram revisados. Empregamos definições aceitas pela OMS.(13) Os resultados das buscas estão divididos em três tópicos principais: fármacos repropostos, novos fármacos e ensaios.

FÁRMACOS REPROPOSTOS

A clofazimina é uma riminofenazina originalmente utilizada para tratar a hanseníase. Não é tradicionalmente utilizada contra a tuberculose, pois tem pouca atividade bactericida. No entanto, estudos recentes mostraram que ela tem potenciais de esterilização e de encurtamento do tratamento, embora os mecanismos de ação ainda não estejam totalmente esclarecidos. A clofazimina escurece a pele (um efeito colateral que é inaceitável para uma proporção significativa dos pacientes). A clofazimina também pode causar desconforto gastrointestinal e prolonga o intervalo QT (o tempo entre o início da onda Q e o final da onda T no eletrocardiograma). Além disso, pode ocorrer resistência cruzada entre a clofazimina e a bedaquilina. Um ensaio de fase 1 de uma molécula modificada, a TBI-166, concebido para reduzir a ocorrência de escurecimento da pele, encontra-se atualmente em andamento.(14) O maior estudo sobre a clofazimina realizado no Brasil conseguiu uma taxa de sucesso de 62%, confirmando resultados anteriores em coortes menores.(15) A clofazimina, que estava no grupo 5 de fármacos da classificação anterior da OMS, está atualmente classificada como fármaco do Grupo C da OMS (outros agentes centrais de segunda linha), conforme mostrado no Quadro 1.
 



Em razão da sua potente beta-lactamase, BlaC, os carbapenêmicos não são ativos contra o Mycobacterium tuberculosis; tornam-se ativos na presença do ácido clavulânico, causando ruptura da parede celular via modulação do peptidoglicano e tornando-se então fortemente bactericidas. Estão atualmente no Grupo D3 da OMS (fármacos não centrais), e a combinação de carbapenêmico com clavulanato provou ser ativa contra TB-MDR/XDR, com excelente tolerabilidade.(16-18) As principais desvantagens dos carbapenêmicos são seu alto custo, sua possível contribuição para maior resistência antimicrobiana em bactérias comensais e a necessidade de administração parenteral. Infelizmente, o faropenem, um carbapenêmico oral, não se mostrou ativo contra o M. tuberculosis. No entanto, o ertapenem recentemente mostrou ser uma opção adequada de "troca de terapia" para administração por via intramuscular ou intravenosa uma vez por dia em casa.(19)

A linezolida, uma oxazolidinona, inibe a subunidade 50S do ribossomo na síntese proteica, demonstra eficácia antimicobacteriana e está incluída em muitos esquemas de fármacos em ensaios.(20) No entanto, seu perfil de toxicidade limita seu uso para além da tuberculose resistente. No passado, a OMS classificava a linezolida como fármaco do Grupo 5, enquanto agora ela é considerada um agente central de segunda linha, no novo Grupo C da OMS (Quadro 1). A sutezolida e a delpazolida são duas oxazolidinonas de geração mais recente utilizadas em ensaios clínicos iniciais; a esperança é que sejam tão eficazes quanto à linezolida e menos tóxicas. Embora ainda não sejam recomendados pela OMS, os inibidores de bomba de efluxo como o verapamil e a tioridazina possivelmente têm um papel na redução da resistência a fármacos como a bedaquilina e no aumento da atividade antimicrobiana desses fármacos.(21,22)

NOVOS FÁRMACOS

Bedaquilina

A bedaquilina é uma nova diarilquinolina com atividade específica contra micobactérias, pois inibe a adenosina trifosfato sintase mitocondrial. Atualmente, a OMS recomenda o uso da bedaquilina para o tratamento da TB-MDR/XDR apenas em combinação com três outros fármacos eficazes, excluindo-se o delamanid (Quadros 1 e 2). Uma recente revisão sistemática sobre o uso da bedaquilina foi publicada no European Respiratory Journal em 2017, atualizando os resultados de uma revisão realizada em 2016.(23,24)
 



Até setembro de 2017, estima-se que mais de 10.000 casos de TB-MDR tenham sido tratados com bedaquilina, a grande maioria na África do Sul.(25) Preocupações quanto à segurança da bedaquilina se basearam nos 10 óbitos (tardios) que ocorreram no braço intervencionista do ensaio de fase 2b (C208) e no risco de prolongamento do Q.(26)

Recentemente, um grande estudo observacional retrospectivo relatou os desfechos de 428 casos de TB-MDR tratados com esquemas contendo bedaquilina em 15 países sob condições específicas.(2) As taxas de conversão da baciloscopia e cultura do escarro alcançadas ao final do tratamento foram de 88,7% e 91,2%, respectivamente; a taxa de sucesso na coorte como um todo foi de 77%, 10% maior do que a relatada no estudo realizado na África do Sul.(25) O risco de prolongamento do QT parece ser menor do que se pensava inicialmente: a bedaquilina foi interrompida por causa de efeitos colaterais em apenas 5.8% dos casos. Um paciente faleceu após ter apresentado anormalidades eletrocardiográficas, que não se mostraram relacionadas à bedaquilina.(2)

A bedaquilina, que está sendo estudada atualmente no ensaio Nix-TB da TB Alliance, é eficaz no tratamento de casos de TB-XDR e de pré-TB-XDR (resistência a fluoroquinolonas ou fármacos injetáveis), bem como no tratamento de pacientes que sofrem de intolerância medicamentosa ou não respondem ao tratamento prescrito. O Nix-TB é um ensaio aberto e de braço único que avalia o esquema de 6 meses com bedaquilina, pretomanida e linezolida (600 mg duas vezes ao dia); se os pacientes persistem com cultura de escarro positiva após 4 meses de tratamento, os fármacos são administrados por mais 3 meses.(27) Os dados mais recentes do ensaio Nix-TB (relatados em 2017) mostram que 26 (86,7%) dos 30 pacientes que concluíram o tratamento permaneceram livres de recidivas nos 6 meses subsequentes de acompanhamento, embora 4 pacientes tenham falecido na fase inicial do tratamento. É importante mencionar que houve conversão da cultura em todos os pacientes até o 4º mês, a qual ocorreu nas primeiras 8 semanas de tratamento em 65%.(28) Em novembro de 2017, o ensaio Nix-TB deu lugar ao novo ensaio ZeNix, que visa a avaliar diferentes doses de linezolida.

Entre os ensaios existentes avaliando a bedaquilina, os mais relevantes são o ensaio Standard Treatment Regimen of Anti-Tuberculosis Drugs for Patients With MDR-TB (STREAM, Esquema de Tratamento Padrão com Fármacos Antituberculose para Pacientes com TB-MDR), que está em andamento (no estágio II), com resultados esperados até 2021(29); o ensaio NEXT(30); o Pragmatic Clinical Trial for a More Effective Concise and Less Toxic MDR-TB Treatment Regimen (TB-PRACTECAL, Ensaio Clínico Pragmático para um Esquema de Tratamento para TB-MDR Mais Eficaz, Conciso e Menos Tóxico) (31); e o ensaio Evaluating Newly Approved Drugs for Multidrug-resistant TB (endTB, Avaliando Fármacos Recentemente Aprovados para TB Multirresistente).(32)

O ensaio (aberto) NEXT avalia um esquema sem injeções que consiste em 6-9 meses de tratamento com bedaquilina, etionamida (ou isoniazida em altas doses), linezolida, levofloxacina e pirazinamida, em comparação com o recentemente introduzido esquema mais curto da OMS disponível para uso em pacientes com TB-MDR que preenchem critérios específicos. O TB-PRACTECAL, que é um ensaio de fase 2-3 com delineamento adaptativo, visa a avaliar a segurança e eficácia do esquema de 6 meses de tratamento com bedaquilina, pretomanida e linezolida, com ou sem moxifloxacina ou clofazimina, administrado em pacientes adultos com TB-MDR/XDR. O endTB, um ensaio de fase 3, é delineado para avaliar diferentes esquemas (contendo bedaquilina, delamanid ou ambos; moxifloxacina ou levofloxacina; e pirazinamida mais linezolida, clofazimina ou ambas), em diversas combinações, em comparação com o esquema individualizado padrão, quanto a sua eficácia no tratamento da TB-MDR/XDR.

Os achados iniciais do ensaio de fase 2 NC-005, em andamento, conforme relatados em 2017, sugerem que a combinação de bedaquilina, pretomanida, moxifloxacina e pirazinamida (o esquema BPaMZ) tem boa atividade bactericida e parece ser bem tolerada.(33) Outro ensaio de fase 3,(34) realizado pela TB Alliance, está avaliando ainda mais esse esquema por meio do estudo dos efeitos de diferentes doses de linezolida (variando de 600 a 1.200 mg/dia) para determinar a dose e tempo de tratamento ideais.

O estudo A5343 do AIDS Clinical Trials Group (ACTG, Grupo de Ensaios Clínicos em AIDS) visa a avaliar a combinação de delamanid e bedaquilina dentro do esquema mais curto da OMS para TB-MDR. Em seus três braços, avalia o uso de bedaquilina, delamanid e uma combinação dos dois; a clofazimina é retirada para prevenir o aumento do prolongamento do QT.

Uma revisão sistemática de casos publicados tratados com bedaquilina forneceu, pela primeira vez, detalhes sobre o prolongamento do QT.(26) Os autores dessa revisão constataram que informações sobre prolongamento do QT ≥ 450 ms estavam disponíveis para apenas 35 (10,6%) de 329 casos, e que informações sobre prolongamento do QT ≥ 500 ms estavam disponíveis para apenas 42 (3,2%) de 1.293 casos. Embora a bedaquilina tenha sido suspensa por causa de efeitos colaterais em 44 (3,4%) de 1.293 casos, ela foi suspensa especificamente por causa do prolongamento do QT em apenas 8 (0,9%) de 857 casos. É importante mencionar que a bedaquilina foi reiniciada em 2 desses 8 casos.

Delamanid

O delamanid, que é da mesma classe de fármacos que o metronidazol (a dos nitroimidazólicos), inibe a biossíntese do ácido micólico. Para o tratamento da TB-MDR/XDR, a OMS recomenda o delamanid apenas se ele for utilizado em combinação com três outros fármacos de eficácia comprovada, excluindo-se a bedaquilina (Quadros 1 e 2).

Estima-se que aproximadamente 700 pacientes tenham realizado tratamento com delamanid até o final de 2017, seja através dos projetos dos Médecins sans Frontières (Médicos sem Fronteiras) ou do programa de uso compassivo da European Respiratory Society/TB Consilium da OMS.(25,35,36) O ensaio de fase 3 do delamanid, batizado de Otsuka, aparece como "concluído" no ClinicalTrials.gov, e espera-se que os resultados finais sejam submetidos para publicação no primeiro ou segundo trimestre de 2018. Resultados encorajadores foram apresentados na Conferência da IUATLD em Guadalajara, no México, em outubro de 2017.(37-40) Os estudos Otsuka do delamanid forneceram resultados consistentes com uma alta proporção de desfechos favoráveis: 74,5% (192 casos) no ensaio de fase 2 204 (37); 81,4% (339 casos) no ensaio de fase 2 213(38); e 84,2% (19 casos) em um estudo programático realizado na Letônia.(39) Os resultados dos casos de uso compassivo são encorajadores, sendo que houve conversão da cultura de escarro em 53 (80,3%) dos 66 casos avaliados.(40)

Há dados que apoiam a eficácia e segurança do delamanid em crianças acima dos 6 anos de idade. O ensaio 232, que avalia o perfil farmacocinético e de segurança de 18 dias em um grupo de peso específico, deve disponibilizar resultados em 2018.(41,42) O ensaio Otsuka 233 está em andamento, avaliando o perfil farmacocinético e de segurança de 6 meses em todos os grupos de peso pediátricos, com resultados esperados para 2020. O delamanid também está sendo testado em uma série de novos ensaios, com especial destaque para o ensaio endTB (Quadro 2). O ensaio MDR-END está avaliando esquemas de 9 e 12 meses contendo delamanid, linezolida, levofloxacina e pirazinamida. O ensaio H-35265 avaliará os mesmos esquemas avaliados no ensaio MDR-END, com braços para diversas durações mais curtas.

O tratamento combinando bedaquilina e delamanid foi avaliado recentemente, embora, na ausência de dados de ensaios, ele ainda não seja recomendado. No entanto, evidências recentes sugerem que a combinação bedaquilina-delamanid possivelmente seja mais bem tolerada do que se considerava anteriormente. Em um estudo, relatou-se prolongamento do QT em apenas 1 de 5 casos,(43) e a condição era transitória, sendo reduzida após uma curta interrupção do fármaco e a inclusão do verapamil no esquema, sem consequência clínicas, conforme relatado em um segundo estudo desse mesmo caso.(44) Há dois ensaios que estão atualmente recrutando pacientes para um estudo da combinação bedaquilina-delamanid, embora resultados não sejam esperados até 2020 ou 2021.(45) Embora não recomende o uso da combinação bedaquilina-delamanid, a OMS reconhece que os médicos possivelmente necessitem de orientação e forneceu recomendações, incluindo o monitoramento ativo de segurança dos fármacos, que poderia proporcionar uma coleta de dados de segurança de fase 4 mais rápida e robusta.(46,47)

Pretomanida

A pretomanida é um nitroimidazol (da mesma classe que o delamanid), desenvolvida pela TB Alliance para testar três diferentes esquemas para o tratamento da tuberculose sensível bem como da TB-MDR. Resultados promissores do ensaio NC-005 apoiam o uso do esquema BPaMZ.(33) No ensaio Shortening Treatments by Advancing Novel Drugs (STAND, Encurtamento dos Tratamentos por meio do Avanço de Novos Fármacos), ensaio de fase 3, a pretomanida está sendo combinada com moxifloxacina e pirazinamida em esquemas de tratamento com duas durações distintas (4 e 6 meses). No ensaio Nix-TB, a pretomanida é um dos fármacos centrais. A TB Alliance também planeja estudar a combinação bedaquilina-moxifloxacina e pirazinamida dentro do ensaio NC-008. O ensaio NC-008 SimpliciTB é um ensaio de fase 3 que testa um esquema incluindo pretomanida e bedaquilina. A pretomanida está sendo estudada em múltiplos braços no ensaio de fase 2-3 TB-PRACTECAL.

ENSAIOS EXISTENTES

Um resumo dos ensaios mais importantes é apresentado no Quadro 2. Há diversos ensaios em andamento que visam a identificar o melhor meio de se manejar a infecção por cepas de tuberculose monorresistentes à isoniazida.(48-50) Os ensaios ACTG 5312 e NEXT estão avaliando os efeitos da isoniazida em altas doses quando se identifica resistência de baixo nível. Os ensaios RIFASHORT e STAND são centrados no encurtamento do atual esquema de tratamento pan-sensível enquanto analisam o papel da rifapentina, da rifampicina em altas doses e de um esquema completamente novo. Um recente ensaio de fase 2 demonstrou que uma alta dose de rifampicina (20 mg/kg) não aumentou a taxa de eventos adversos, embora a eficácia tenha permanecido a mesma.(51)

O ensaio PanACEA testou três diferentes doses de rifampicina ((35, 20 e 10 mg/kg) em comparação com o esquema padrão. Os autores constataram que o tempo de conversão da cultura foi menor no braço 35 mg/kg e que a inclusão de SQ109 e moxifloxacina não aumentou a eficácia do esquema.(52)

No ensaio TBTC S31/ACTG A5349, um ensaio de fase 3, a rifapentina está sendo testada na dose padrão de 1.200 mg/dia.(53) O ensaio de fase 2c estratégia TRUNCATE-TB testará a possibilidade de se encurtar o tratamento da tuberculose sensível para 2 meses por meio da combinação de fármacos novos e fármacos repropostos, incluindo as rifamicinas.(54) Recentemente, houve melhora dos desfechos do tratamento com o uso da rifabutina.(55)

O ensaio de fase 2 Opti-Q foi delineado para identificar a dose diária ideal de levofloxacina (11, 14, 17 ou 20 mg/kg) para o tratamento da TB-MDR.(56) A levofloxacina também está sendo estudada nos ensaios H-35265, NEXT, STREAM e MDR-END.(57)

A moxifloxacina está em avaliação em diferentes ensaios como substituta para a isoniazida ou o etambutol em casos monorresistentes ou em pacientes com problemas de tolerabilidade. A OMS lançou recentemente o chamado "esquema mais curto", também conhecido como "esquema Bangladesh", que é um esquema padronizado de 9 a 11 meses - que consiste em 4-6 meses de tratamento com gatifloxacina/moxifloxacina, canamicina/amicacina, etionamida/protionamida, clofazimina, isoniazida em altas doses (10 mg/kg, máximo de 600 mg/dia), etambutol e pirazinamida, seguido de 5 meses de tratamento com gatifloxacina/moxifloxacina, clofazimina, etambutol e pirazinamida. (58,59) O regime mais curto é indicado para todos os pacientes com TB-MDR pulmonar ou tuberculose resistente à rifampicina (excluindo-se mulheres grávidas e pacientes com tuberculose extrapulmonar), não tratada anteriormente com fármacos de segunda linha e sensível a fluoroquinolonas e aminoglicosídeos.(4) É importante que testes de resistência adequados sejam realizados para se evitar resistência adicional.(60-62) Uma meta-análise recente relatou que esquemas mais curtos são eficazes, embora falhas e recidivas tenham sido associadas à resistência às fluoroquinolonas (OR = 46).(63)

Há dados limitados disponíveis sobre o uso de esquemas mais curtos.(64-67) Resultados provisórios do ensaio STREAM, apresentados na Conferência da IUATLD em Guadalajara, não demonstraram inferioridade dos esquemas mais curtos em comparação com o esquema mais longo e individualizado da OMS, sendo que desfechos favoráveis foram alcançados em aproximadamente 78.1% dos pacientes tratados com o esquema mais curto, contra 80.6% dos tratados com o esquema mais longo.(68) A proporção de pacientes que apresentaram prolongamento do QT corrigido foi maior entre os pacientes tratados com o esquema mais curto do que entre os tratados com o esquema mais longo. O segundo estágio do ensaio está avaliando o papel da bedaquilina dentro do esquema mais curto.

Em conclusão, após mais de 40 anos de negligência, a OMS e organizações parceiras agora estão dando mais atenção à necessidade de fármacos e esquemas novos e melhores para se combater a "praga branca". Esperam-se resultados favoráveis.

AGRADECIMENTOS

O trabalho é parte de um projeto organizado em conjunto pela European Respiratory Society, a Asociación Latinoamericana del Tórax e a Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia.

REFERÊNCIAS

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