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Série de Casos

Manifestações respiratórias na doença de Pompe de início tardio: uma série de casos no Brasil

Respiratory manifestations in late-onset Pompe disease: a case series conducted in Brazil

Bruna de Souza Sixel1,2, Luanda Dias da Silva3, Nicolette Celani Cavalcanti4, Glória Maria Cardoso de Andrade Penque5, Sandra Lisboa3, Dafne Dain Gandelman Horovitz6, Juan Clinton Llerena Jr6

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37562015000000343

ABSTRACT

Objective: To describe respiratory function in a series of patients with late-onset Pompe disease after the definitive diagnosis and before enzyme replacement therapy. Methods: This was a cross-sectional study involving patients with a definitive molecular diagnosis of late-onset Pompe disease. The data analyzed included age at symptom onset; age at definitive diagnosis; type of initial symptoms; time from symptom onset to diagnosis; FVC in the sitting and supine positions; six-minute walk distance; and locomotor ability. Analyses were carried out using frequencies, medians, minimum values, and maximum values. Results: Six patients were included in the study. The median age at symptom onset was 15 years (range, 13-50 years), and the median age at diagnosis was 39.5 years (range, 10-64 years). The median time from symptom onset to diagnosis was 8 years (range, 0-45 years). In all cases, the initial manifestation of the disease had been motor weakness. The median FVC in percentage of the predicted value (FVC%) in the sitting and supine positions was 71.0% (range, 22.9-104.6%) and 58.0% (range, 10.9-106.9%), respectively. The median ΔFVC% was 24.5% (range, −4.59 to 52.40%).The median six-minute walk distance was 391.7 m (range, 97-702 m). Conclusions: In this case series, the time from symptom onset to diagnosis was long. Although respiratory signs or symptoms were not the initial manifestations of the disease, 66.7% of the patients showed reduced FVC% in the sitting and supine positions at diagnosis.

Keywords: Glycogen storage disease type II; Respiratory function tests; Respiratory muscles/pathology.

RESUMO

Objetivo: Descrever a função respiratória em uma série de pacientes com doença de Pompe de início tardio após o diagnóstico definitivo e antes do início do tratamento através de terapia de reposição enzimática. Métodos: Estudo transversal em pacientes com diagnóstico molecular de doença de Pompe de início tardio. As informações analisadas incluíram idade ao início dos sintomas e ao diagnóstico, tipo de sintoma inicial, tempo entre início dos sintomas e diagnóstico, CVF em posição sentada e supina, distância percorrida no teste de caminhada de seis minutos e capacidade de locomoção. Análises por frequência, mediana, valor mínimo e valor máximo foram realizadas. Resultados: Foram incluídos seis pacientes no estudo. A mediana de idade ao início dos sintomas foi de 15 anos (variação, 13-50 anos) e a de idade ao diagnóstico foi de 39,5 anos (variação, 10-63 anos). A mediana de tempo entre o início dos sintomas e a confirmação diagnóstica foi de 8 anos (variação, 0-45 anos). A manifestação inicial da doença foi de sintomas motores de fraqueza muscular em todos os casos. As medianas da CVF em porcentagem do previsto (CVF%) em posição sentada, em supino e ΔCVF% foram de, respectivamente, 71,0% (variação, 22,9-104,6%), 58,0% (variação, 10,9-106,9%) e 24,5% (−4,59 a 52,40%). A mediana da distância percorrida no teste de caminhada de seis minutos foi de 391,7 m (variação, 97-702 m). Conclusões: Nesta série, o tempo entre o início dos sintomas e o diagnóstico foi longo. A manifestação inicial da doença não foi de sinais ou sintomas respiratórios, embora 66,7% dos pacientes apresentassem redução da CVF% em posição sentada e em supino no momento do diagnóstico.

Palavras-chave: Doença de depósito de glicogênio tipo II; Testes de função respiratória; Músculos respiratórios/patologia.

INTRODUÇÃO

A doença de Pompe (DP), também conhecida como doença de depósito de glicogênio tipo II, é uma doença heredi-tária autossômica recessiva causada por mutações no gene que codifica a enzima alfa-glicosidase ácida, responsá-vel pela degradação do glicogênio, principalmente em nível muscular.

Informações relativas à incidência são pouco acuradas, devido a raridade, subdiagnóstico e distribuição étnica da doença. Dados norte-americanos estimam que a incidência combinada seja em torno de 1:40.000.(1) Estudos mais recentes com base nos programas de triagem neonatal em Taiwan e Áustria revelam incidências mais elevadas, de aproximadamente 1:28.000.(2,3) Na América Latina, apenas 88 pacientes foram registrados com a doença até 2012.(4) Dados brasileiros não estão disponíveis.

A DP caracteriza-se pelo acúmulo lisossomal de glicogênio, principalmente na musculatura estriada esquelética e cardíaca, que se inicia quando a atividade da enzima alfa-glicosidase ácida cai abaixo do nível crítico de 30%. Clas-sifica-se, na forma infantil, a forma clássica, com início dos sintomas antes do primeiro ano de vida, abrangendo aproximadamente 28% dos acometidos; e, em forma tardia, quando os sintomas aparecem após esse período, inclu-indo crianças, jovens e adultos. A progressão na forma tardia é mais lenta que na forma infantil, porém bastante variável. As manifestações clínicas e a gravidade da doença variam com a idade do início dos sintomas, a taxa de progressão e a extensão dos órgãos envolvidos.(5-7)

Até recentemente, o tratamento da DP era considerado apenas paliativo. Em 2006, o uso comercial da terapia de reposição enzimática (TRE) com a alfa-glicosidase recombinante humana (alglucosidase alfa; Myozyme®, Genzyme, Cambridge, MA, EUA) foi aprovado nos EUA e Europa e, em 2007, também no Brasil. O tratamento parece melhorar as funções respiratória e locomotora, assim como a sobrevida, em ambas as formas da doença.(8-10)

A fraqueza muscular é o principal sintoma da forma tardia. Os músculos paravertebrais e proximais de membros inferiores costumam ser os primeiros a serem afetados, dificultando as atividades de vida diária e favorecendo as alterações posturais.(5) As consequências respiratórias da fraqueza muscular resultam em um distúrbio ventilatório restritivo, com redução da capacidade vital acompanhada pela redução do VEF1. Inicialmente, a respiração está comprometida apenas durante o sono, seguindo com hipoventilação também durante o dia. Há um prejuízo do meca-nismo de tosse e clearance de vias aéreas, favorecendo infecções respiratórias recorrentes. A disfunção respiratória ocorrerá em aproximadamente 75% dos pacientes. (11) Sem tratamento, espera-se uma redução anual da CVF de 1,0% até 4,6%.(5,12,13) A falência respiratória é sua principal causa de morte.(14-16)

O predomínio da fraqueza diafragmática frente aos outros músculos respiratórios parece ser uma característica da DP.(17,18) Nesse sentido, a utilização de métodos capazes de avaliar isoladamente a ação do diafragma pode ser útil para a descrição e a monitorização do agravo. A mensuração da pressão transdiafragmática é o padrão ouro para o diagnóstico de disfunção diafragmática; porém, outros métodos mais simples, como a medida de CVF na posição supina e a diferença de CVF entre a posição sentada e supina também estão descritos e são recomendados para o acompanhamento clínico da DP.(16,19-21)

No momento, pouco se conhece sobre as manifestações pulmonares em pacientes com DP no Brasil, contribuindo para a dificuldade do manejo nessa população. O objetivo do presente estudo foi caracterizar o perfil dos pacientes com DP e descrever a função respiratória de uma série de casos de pacientes acompanhados em um centro de refe-rência em doenças raras no Brasil após o diagnóstico e antes do início do tratamento medicamentoso através da TRE.

MÉTODOS

Foi realizado um estudo transversal com informações obtidas através da análise de prontuários dos pacientes com diagnóstico molecular de DP de início tardio e acompanhados pelo Centro de Genética Médica do Instituto Nacional de Saúde da Mulher, da Criança e do Adolescente Fernandes Figueira, Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), localizado na cidade do Rio de Janeiro (RJ), no período entre 2010 e 2015. Informações sobre a história clínica e a função respi-ratória referentes ao período após o diagnóstico e antes do início do tratamento medicamentoso com a TRE foram analisados. Como exclusão foi considerada a inexistência de informações acerca da função respiratória à época do diagnóstico. O estudo foi aprovado pelo comitê de ética em pesquisa da instituição, como parte do Registro Interna-cional da Doença de Pompe.

A caracterização dos pacientes e a história clínica foram baseadas nas informações relativas ao sexo, tipo de mu-tação patogênica encontrada, idade ao início dos sintomas, tipo de sintoma inicial (motor ou respiratório), idade ao diagnóstico e tempo entre o início dos sintomas e o diagnóstico molecular definitivo. Os principais sintomas motores iniciais comumente relatados e descritos para a DP e que foram buscados nos prontuários incluíram fraqueza muscu-lar proximal de membros inferiores e/ou superiores; dificuldade para correr, subir escadas ou deambular; quedas frequentes; fraqueza muscular de tronco; e escoliose. Os sintomas respiratórios compreenderam ortopneia; dispneia após exercício; dispneia em repouso; e distúrbios respiratórios do sono.(22) Para complementar a caracterização da amostra, a função locomotora foi descrita através da escala de Walton Gardner-Medwin (WGM)(23) e da distância percorrida no teste de caminhada de seis minutos (DTC6). A WGM é uma escala com pontuação de 0 a 10 que carac-teriza a capacidade de locomoção, atribuindo-se o valor 0, quando todas as atividades são realizadas normalmente, até 10, quando há restrição completa ao leito. A DTC6 foi registrada em metros e em percentual do valor previsto de acordo com as equações descritas por Iwama et al.(24) e Priesnitz et al.(25) para cada faixa etária.

As variáveis funcionais respiratórias de interesse incluíram a CVF, medida em posição sentada e supina e VEF1, expressos através de percentual do previsto (CVF% e VEF1%), assim como relação VEF1/CVF (em %)(26); diferença da CVF entre as posições sentada e supina (∆CVF%), calculada através da equação [(CVFsentado − CVFsupi-no)/CVFsentado] × 100; uso de suporte ventilatório mecânico (invasivo ou não invasivo); e presença de via aérea artificial. As medidas volumétricas foram realizadas utilizando o espirômetro MasterScope® (Jaeger, Hoenberg, Ale-manha), de acordo com os critérios estabelecidos pela American Thoracic Society,(27) sendo que valores de CVF ≥ 80% do previsto foram considerados normais para a posição sentada.

Os dados foram analisados através de estatística descritiva utilizando o pacote estatístico IBM SPSS Statistics for Windows, versão 20.0 (IBM Corp., Armonk, NY, EUA). As variáveis nominais foram apresentadas utilizando a análise por frequências e, para as variáveis numéricas, a mediana e o valor mínimo e máximo.

RESULTADOS

Durante o período do estudo, sete pacientes com DP de início tardio foram identificados, sendo todos acompanha-dos pela instituição. Apenas um paciente foi excluído por não possuir exame espirométrico referente ao período em questão. Os resultados individuais estão descritos nas Tabelas 1 e 2. Dos pacientes incluídos, quatro (66,7%) eram do sexo masculino. Todos eram heterozigotos compostos para a mutação encontrada. A mutação intrônica c-32-13T>G estava presente em 100% dos casos, conhecida como sendo potencialmente leve, e a mutação nonsense c.2560C>T estava presente em três (50%) dos casos, conhecida como muito grave.(28)
 

 




A mediana do início dos sintomas foi de 15 anos de idade (variação, 13-50 anos), estando a fraqueza muscular presente como sintoma inicial em todos os pacientes, exceto no paciente 2, que era assintomático no momento do diagnóstico. Quedas frequentes, dificuldade para subir escadas, correr ou realizar exercícios vigorosos foram relata-das. A mediana da idade ao diagnóstico foi de 39,5 anos (variação, 10-63 anos), ocorrendo em dois adolescentes e quatro adultos de acordo com os critérios estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde. A mediana do tempo entre os primeiros sintomas e a confirmação diagnóstica de DP foi de 8 anos (variação, 0-45 anos), variando entre 0 e 2 anos para os adolescentes e entre 4 e 45 anos para os adultos. Todos foram capazes de deambular, com escore na escala WGM mínimo de zero e máximo de 6, este último representando deambulação apenas com auxílio. A mediana da DTC6 foi de 391,7 m (variação, 97-702 m e 19-110% do valor previsto para a idade).

Considerando a CVF em posição sentada, quatro pacientes (66,7%) apresentaram comprometimento do sistema respiratório ao diagnóstico, com CVF% < 80% do previsto e relação VEF1/CVF normal, caracterizando um distúrbio ventilatório restritivo, como esperado para as doenças neuromusculares. Apenas um paciente já fazia uso de suporte ventilatório mecânico não invasivo de forma intermitente, sendo esse o que apresentou o menor valor de CVF% na posição sentada e supina (22,9% e 10,9%, respectivamente) e a maior ∆CVF% (52,38%). Nenhum paciente fazia uso de suporte ventilatório invasivo ou havia sido traqueostomizado. As medianas da CVF% em posição sentada foram de 71% (variação, 22,9-104,6%), da CVF% em posição supina de 58% (variação, 10,9-106,9%), de ∆CVF% de 24,5% (variação, −4,59% a 52,4%), de VEF1% de 70,35% (variação, 27,0-106,8%) e da relação VEF1/CVF (em %) de 102,4% (variação, 96,3-118,0%). Estratificando por faixa etária, apenas os dois adolescentes apresentaram espiro-metria na faixa de normalidade.

DISCUSSÃO

A descrição das características da história clínica de nossos pacientes com DP foi semelhante às encontradas na literatura. O tipo de sintoma inicial foi predominantemente motor, a mediana da idade ao diagnóstico foi de 39,5 anos, com atraso entre os sintomas iniciais e o diagnóstico de 8 anos. Dados de Byrne et al.,(16) obtidos através da análise do registro de pacientes com DP administrado pela Genzyme Corporation, revelaram uma predominância de sintomas motores, mediana da idade ao diagnóstico de 37,1 anos e atraso no diagnóstico de 4 anos. Esse atraso foi um pouco maior na análise feita por Kishnani et al.(22) A mediana da idade ao início dos sintomas foi menor no nosso grupo (15,0 anos vs. 28,8 anos).

A raridade da doença, a variabilidade da apresentação clínica, a sobreposição de sinais e sintomas com outras do-enças neuromusculares e a dificuldade de acesso ao sistema de saúde fazem, em muitos casos, com que o tempo até o diagnóstico seja muito longo. O atraso no diagnóstico parece maior em indivíduos mais velhos, o que nos aponta para uma melhora no conhecimento da doença nos dias atuais.(16,22) Considerando que pacientes mais jovens e menos acometidos apresentam resultados mais favoráveis à administração da TRE,(13) a importância do diagnóstico e do início do tratamento precoces é evidente.

Atualmente, mais de 500 mutações já foram identificadas, com efeitos esperados variando entre muito graves e não patogênicos.(28) A mutação mais frequente observada em nosso grupo também é a mais frequentemente relatada por outros autores. (16,29) Entretanto, o comportamento fenotípico não é explicado exclusivamente pelo genótipo en-contrado, especialmente na forma tardia da doença. Diferenças fenotípicas estão presentes mesmo em membros de uma mesma família, incluindo irmãos.(29) Os casos 1 e 2 e 4 e 5, respectivamente, tratam-se de irmãos portadores da doença. Em ambos os casos, diferenças na apresentação e na gravidade foram observadas. Contudo, o diagnóstico do irmão mais novo foi facilitado pela história familiar, possibilitando uma condição funcional melhor no momento do diagnóstico. Registros revelam que 32% dos pacientes com DP tardio tiveram um irmão com diagnóstico de DP(16); dessa forma, acreditamos que o rastreamento familiar pode ser útil para a identificação de pacientes assintomáticos e contribuir para um melhor prognóstico.

O acompanhamento da função respiratória em pacientes com DP é imperativo.(6,7,20) Em 2013, Ambrosino et al.(21) descreveram o manejo básico da disfunção respiratória na DP, incluindo avaliações periódicas a cada 3-12 meses, de acordo com a velocidade de progressão da doença, monitorização dos sinais e sintomas respiratórios, espirome-tria em posição sentada e em supino, medida de PImáx, pico de fluxo de tosse, análise dos gases sanguíneos e, em alguns casos, polissonografia e estudo da deglutição. Consensos e diretrizes para o manejo da DP também apresen-tam recomendações semelhantes.(6,7,20,30)

A fisiopatologia da insuficiência respiratória crônica nas doenças neuromusculares inclui não só a fraqueza dos músculos respiratórios, mas também alterações da complacência da parede torácica, do controle central respiratório e da deglutição, que, por sua vez, são responsáveis pela ineficácia da tosse, hipoventilação alveolar, deformidades torácicas, apneia do sono, atelectasias, hiper-reatividade de vias aéreas e pneumonias de repetição.(31) Diferente-mente de outras doenças neuromusculares nas quais a perda da capacidade de deambulação precede a insuficiência ventilatória,(5,17) na DP, os sintomas respiratórios podem se manifestar precocemente, podendo ser o sintoma inicial em 8,5% dos casos.(4) Apesar do pequeno tamanho amostral, os resultados encontrados para a capacidade de loco-moção e para a DTC6 quando comparados com os resultados espirométricos parecem corroborar a hipótese de heterogeneidade no comprometimento dos sistemas respiratório e locomotor.(32) O paciente com a maior DTC6 já apresentava reduções de CVF% em posição sentada, em supino e de ∆CVF%, e o paciente com a menor DTC6 não apresentou o distúrbio ventilatório mais grave.

No nosso estudo, nenhum dos pacientes acompanhados apresentou sintomas respiratórios como a primeira mani-festação. Entretanto, ao diagnóstico, em 66,7% deles observamos sinais de comprometimento do sistema respiratório através da redução da CVF% na posição sentada (CVF < 80% do previsto). Apesar da ausência de sintomas respira-tórios como manifestação inicial da doença e do atraso entre o início dos sintomas e a primeira espirometria, não podemos excluir a existência de algum grau de comprometimento respiratório em fases bem iniciais da DP, porém, sem ignorar que a idade e o tempo de doença sintomática parecem também contribuir com a piora dos achados funcionais. É possível que sintomas respiratórios mais brandos estivessem presentes, mas que não tenham sido percebidos devido à sobreposição com sintomas motores mais proeminentes. Indagação e descrição padronizada dos sinais e sintomas encontrados, especialmente no início da apresentação da doença, podem facilitar o conheci-mento e o acompanhamento dos pacientes.

As medidas de força muscular respiratória através da PImáx e PEmáx podem ter grande relevância na identifica-ção do início do comprometimento dos músculos respiratórios, visto que sua alteração pode preceder a redução volumétrica identificada através da capacidade vital. Infelizmente, em nosso grupo, não foi encontrada essa informa-ção nos registros de um dos pacientes, e dois não conseguiram realizar a manobra de forma aceitável e reprodutível. Assim, as medidas de PImáx e PEmáx não puderam ser incluídas na análise, representando uma limitação do estu-do.

A fraqueza diafragmática é uma disfunção característica da DP,(17,18) sendo considerada a principal causa de dis-túrbios respiratórios durante o sono e de insuficiência respiratória.(33) Prigent et al.,(34) através da estimulação mag-nética do nervo frênico, e Wens et al.,(18) através de ressonância magnética, confirmaram o predomínio da fraqueza diafragmática frente aos músculos respiratórios torácicos na DP. O método mais acurado para a avaliação da função diafragmática é a mensuração da pressão transdiafragmática durante um esforço respiratório máximo ou durante respiração espontânea ou ainda através de estimulação magnética bilateral do nervo frênico. Esses testes têm a desvantagem de serem invasivos e pouco aceitos pelos pacientes, principalmente quando precisam ser repetidos várias vezes, tornando sua indicação limitada na pratica clínica.(35) De forma mais simples, a avaliação da fraqueza diafragmática pode ser inferida pela mensuração da CVF% em supino e por sua diferença entre sentado e em supino, apresentando forte correlação com a variação do diâmetro crânio-caudal observado através da ressonância magné-tica.(18,36) Indivíduos normais podem apresentar uma redução de CVF% de sentado para supino de até 10%.(37) Re-duções > 25% caracterizam fraqueza diafragmática, com sensibilidade de 79% e especificidade de 90%.(19) Em nossa amostra, 66,7% dos pacientes apresentaram ∆CVF% > 10%, e 50% deles, ∆CVF% > 25%. Essa avaliação é recomendada para o diagnóstico e o acompanhamento dos pacientes com DP por ser um potencial marcador de gravidade da disfunção respiratória. Uma redução > 10% fortalece o diagnóstico de DP.(30) Outros métodos também estão descritos para a avaliação diafragmática, como a fluoroscopia, ultrassonografia, eletromiografia e pletismogra-fia optoeletrônica,(38) porém ainda com baixa utilização na pratica clínica na DP.

A justificativa para o predomínio do acometimento diafragmático na disfunção respiratória ainda não está clara. Estudos em modelo animal sugerem que a lesão muscular pode estar associada à patologia dos motoneurônios espinhais, em especial do motoneurônio frênico, o que contribui para o déficit motor diafragmático mais acentua-do.(17,39,40)

Com a progressão da fraqueza muscular respiratória, o uso do suporte ventilatório não invasivo tem sido indicado, auxiliando no controle da hipoventilação noturna e na síndrome da apneia do sono, assim como na insuficiência respiratória aguda e crônica. (14,21) Apenas um paciente em nossa série fazia uso desse recurso. Indicações específi-cas em relação ao momento de se iniciar o uso de suporte ventilatório na DP não estão descritas. O uso de recomen-dações para doenças neuromusculares em geral contribui para esse processo.

O acometimento do sistema respiratório estava presente em 66,7% dos pacientes, com disfunção diafragmática caracterizada por ∆CVF% > 25% em 50% de nossa série no momento do diagnóstico, sugerindo que mesmo não sendo a manifestação inicial, esse pode ocorrer precocemente em um número significativo de casos. Mais estudos são necessários para o melhor entendimento desse acometimento, em especial da disfunção diafragmática. O perfil de sinais e sintomas utilizado por Llerena et al.(7) e Kishnani et al.,(22) as recomendações inseridas no Registro Inter-nacional da Doença de Pompe e o manejo respiratório proposto por Ambrosino et al.(21) podem ser de grande impor-tância na abordagem dos pacientes com suspeita ou já diagnosticados com DP.

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