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Relato de Caso

Hérnia intercostal transdiafragmática: aspectos de imagem em três casos

Transdiaphragmatic intercostal hernia: imaging aspects in three cases

Ana Carolina Sandoval Macedo, Fernando Uliana Kay, Ricardo Mingarini Terra, José Ribas Milanez de Campos, André Galante Alencar Aranha, Marcelo Buarque de Gusmão Funari

ABSTRACT

Transdiaphragmatic intercostal hernia is uncommon and mostly related to blunt or penetrating trauma. We report three similar cases of cough-induced transdiaphragmatic intercostal hernia, highlighting the anatomic findings obtained with different imaging modalities (radiography, ultrasonography, CT, and magnetic resonance) in each of the cases.

Keywords: Hernia, diaphragmatic; Radiography; Ultrasonography; Tomography; Magnetic resonance imaging.

RESUMO

Hérnias intercostais transdiafragmáticas são eventos raros e são geralmente relacionadas a traumas abertos ou fechados, com risco de complicações. Relatamos três casos semelhantes, decorrentes de crises de tosse, destacando o aspecto das alterações anatômicas nos exames de imagem obtidos em cada situação (radiografia, ultrassonografia, TC e ressonância magnética).

Palavras-chave: Hérnia diafragmática; Radiografia; Ultrassonografia; Tomografia; Imagem por ressonância magnética.

Introdução

A ocorrência de herniação do conteúdo abdominal através do diafragma e da musculatura intercostal é um fenômeno raro, que pode estar relacionado a traumas abertos ou fechados.(1-4) O reflexo protetor de tosse tem sido associado, esporadicamente, à gênese dessa entidade.(2,5-7) A falha em reconhecer as hérnias intercostais transdiafragmáticas pode ser potencialmente fatal, em decorrência de eventuais complicações, como o estrangulamento.(8)

Relatamos o caso de três pacientes que evoluíram com herniação de alças intestinais através do diafragma e do espaço intercostal, associada à fratura de costelas, após crise de tosse. Serão apontados os achados de imagem em radiografia, ultrassonografia, TC e ressonância magnética (RM) realizados nesses casos.

Relato de casos

Caso 1
Homem de 53 anos procurou atendimento médico ambulatorial, relatando abaulamento na região torácica inferolateral direita, além de plenitude gástrica pós-prandial e ruídos "estranhos" na região. O paciente associou o início do quadro (há mais de 1 ano) a uma crise intensa de tosse, seguida de dor persistente e de forte intensidade na transição toracoabdominal direita, com piora aos esforços. Relatava que aquele episódio havia sido diagnosticado na ocasião como "pneumonia na base direita". Subsequentemente, observou-se uma área de equimose em toda a região lateral direita do tórax e abdome. Houve regressão da dor e do hematoma ao longo das semanas, persistindo o abaulamento progressivo da região, que piorava à posição ortostática. Ao exame físico, apresentava abdome globoso, flácido, indolor à palpação, com abaulamento não redutível no oitavo espaço intercostal direito, mais evidente à manobra de Valsalva. Havia um distanciamento anômalo entre os arcos do espaço citado, com sinais de separação anterior na junção costocondral. A TC de tórax evidenciou fraturas na porção anterior do oitavo arco costal, alargamento do oitavo espaço intercostal e descontinuidade diafragmática, por onde alças do intestino delgado, parte do cólon e epíplon se insinuavam até ocupar o tecido subcutâneo da parede torácica. Frente ao diagnóstico de herniação intercostal transdiafragmática, o paciente foi submetido a cirurgia através de toracotomia direita. Foi identificado o saco herniário, foram recolocadas as vísceras abdominais na cavidade e foi fechado o orifício herniário com uma tela de prolene, com camada dupla e vários pontos separados, com drenagem da cavidade pleural. No fechamento da toracotomia, para a aproximação do espaço intercostal alargado, também foi utilizado um reforço com a mesma tela, fixando-a nos arcos costais inferior e superior. O paciente teve evolução pós-operatória favorável, com alta hospitalar no sexto dia, sem evidências de complicações imediatas (Figura 1).



Caso 2

Homem de 71 anos relatava abaulamento na região toracoabdominal direita há 2 anos, com início após uma crise de tosse, associada a dor em "pontada" de forte intensidade naquela região, com piora ao tossir e melhora com analgésicos. Observou também uma área de equimose em toda a região lateral do abdome após o aparecimento da dor. A dor regrediu progressivamente, surgindo um abaulamento da região com crescimento progressivo. Ao exame físico, apresentava abdome globoso, flácido, indolor à palpação, com abaulamento redutível no oitavo espaço intercostal, mais evidente à manobra de Valsalva. Havia um distanciamento de 4-5 cm entre os arcos do espaço citado, com sinais de separação anterior na sua junção costocondral. A radiografia de tórax mostrava fraturas na porção posterior do oitavo arco costal e alargamento do oitavo espaço. A ultrassonografia direcionada da região com transdutor de alta frequência demonstrou insinuação de uma formação com ecotextura semelhante à do fígado através do referido espaço intercostal até a região subcutânea. A TC sem contraste confirmou tratar-se de uma herniação transdiafragmática e intercostal de parte do segmento hepático V. Foi realizada a correção cirúrgica através de toracotomia, sendo identificado esgarçamento diafragmático junto à parede torácica. Foi realizada a reinserção do diafragma aos arcos costais e a aproximação dos rebordos costais com fio inabsorvível (Figura 2).



Caso 3

Homem de 64 anos, ex-tabagista (55 anos-maço), fazia tratamento irregular para DPOC. Teve um episódio de tosse incoercível que provocou dor aguda e intensa no hipocôndrio direito, seguida de surgimento de equimose extensa, visível localmente. Procurou assistência médica, sendo tratado apenas com sintomáticos. Evoluiu com piora progressiva da dispneia, tornando-se evidente aos pequenos esforços após 4 meses. Naquele momento, procurou um pneumologista, que solicitou radiografia de tórax, revelando opacificação da base pulmonar direita e aumento das partes moles na parede torácica inferolateral direita, com imagens gasosas de permeio. O paciente estava taquidispneico (FR, 26 ciclos/min) e com diminuição de murmúrios na base direita, notando-se à palpação uma área de fraqueza da parede torácica ipsilateral. A TC de tórax demonstrou herniação de tecido gorduroso abdominal para a base pulmonar direita e parede torácica, através de descontinuidades dos planos musculares diafragmático e intercostal, associada à presença de fraturas dos últimos arcos costais à direita. A RM confirmou a extensa herniação do conteúdo abdominal através das descontinuidades musculares. Foi então submetido à correção cirúrgica das alterações, com confirmação da presença de alças intestinais nas regiões subcutâneas e intratorácicas após a toracotomia. À inspeção da cavidade, destacava-se a laceração da porção anterolateral do diafragma, por onde se insinuava o conteúdo abdominal. Após a redução das estruturas ao seu local de origem, foi feita a sutura diafragmática reforçada com tela de polipropileno. O paciente apresentou boa evolução pós-operatória, recebendo alta no sexto dia, com melhora da dispneia (Figura 3).



Discussão

As hérnias intercostais geralmente são causadas por um trauma na região toracoabdominal, seja contuso ou penetrante.(9) A ocorrência de ruptura diafragmática "espontânea" com herniação de estruturas abdominais é rara.(2,10) Geralmente estão associadas a fatores que levam ao aumento súbito da pressão abdominal, como levantamento de pesos, dança, parto, vômitos e tosse, sendo essa última a causa mais frequente.(10,11)

A hérnia intercostal transdiafragmática pode ser aguda ou progredir ao longo do tempo, levando até alguns anos para ser diagnosticada.(9) Ocorre por ruptura do diafragma e dos músculos intercostais, geralmente associada à fratura de arcos costais. Existem dois locais mais suscetíveis: a junção costocondral com o esterno anteriormente, pela ausência do músculo intercostal externo, e o ângulo do arco costal com a vértebra posteriormente, pela ausência do músculo intercostal interno.(9)

Quando a hérnia intercostal está relacionada a crises incoercíveis de tosse, geralmente é associada à fratura de costelas. Durante o mecanismo da tosse estão presentes forças opostas da musculatura abdominal e da parede torácica sobre a costela, levando a fraturas e esgarçamento muscular.(1,2,9)

Apresenta-se clinicamente como abaulamento redutível na região do espaço intercostal acometido.(9) Nossos três pacientes relataram a formação de equimose na região toracoabdominal, com abaulamento progressivo. A radiografia de tórax pode demonstrar a opacificação da base pulmonar acometida, com imagens gasosas sugestivas de alças intestinais, que se estendem para a parede torácica através de espaço intercostal alargado. O conteúdo herniário pode ser mais bem avaliado através da ultrassonografia, principalmente quando se trata de órgão sólido, como o fígado. Entretanto, esse método nem sempre consegue definir o conteúdo herniário, em especial quando a interposição de alças distendidas com gás bloqueia a janela acústica, sendo então a TC superior nesses casos.(9) Com base no melhor do nosso conhecimento, esse parece ser o primeiro relato a demonstrar o aspecto de uma hérnia intercostal transdiafragmática à RM.

O tratamento desses casos é cirúrgico, envolvendo a redução da hérnia, sutura do defeito diafragmático e aproximação dos arcos costais. Em virtude da possibilidade de recorrência, há a possibilidade de se realizar reforço com uma tela protética.

Referências

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