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Artigo Original

Ambulatório de apoio ao tabagista no Ceará: perfil dos pacientes e fatores associados ao sucesso terapêutico

Outpatient smoking cessation program in the state of Ceará, Brazil: patient profiles and factors associated with treatment success

Maria Penha Uchoa Sales, Mara Rúbia Fernandes de Figueiredo, Maria Irenilza de Oliveira, Helano Neiva de Castro

ABSTRACT

Objective: To evaluate patient profiles and factors associated with successful treatment. Methods: A retrospective study of patients enrolled in the smoking cessation program at the Hospital de Messejana, located in the state of Ceará, Brazil, from October of 2002 to April of 2005. The treatment was evaluated based on patient profile, type of medication prescribed and time on that medication. Results: Of the 320 patients enrolled, 65.5% were women. The mean age at the outset of treatment was 48 years, and the mean duration of the smoking habit was 33 years. More than 90% of the patients had started smoking before the age of 20. Of the 258 individuals who had enrolled in the program at least one year prior, 50.8% had achieved treatment success; 17.8% had relapsed, and 31.4% had not quit smoking. On average, partial success was achieved in the fifth week of the treatment, and relapse occurred predominantly in the fourth month. Approximately 60% of the patients were treated with medication. Conclusion: Quitting smoking was significantly associated with the use of medication, regardless of the profile of the smoker evaluated. In the second year of the program, quitting smoking was more strongly associated with the use of bupropion and nicotine replacement, resulting in a higher success rate and a trend toward a reduction in the relapse rate.

Keywords: Smoking/therapy; Tobacco use cessation; Bupropion; Nicotine

RESUMO

Objetivo: Avaliar o perfil dos pacientes e fatores associados ao sucesso do tratamento do fumante. Métodos: Estudo retrospectivo dos pacientes que foram atendidos no ambulatório de apoio ao tabagista do Hospital de Messejana, no Ceará, durante o período de outubro de 2002 a abril de 2005. O tratamento foi avaliado considerando-se o perfil do tabagista, tipo de medicação e período de utilização da mesma. Resultados: Do total de 320 pacientes atendidos, 65,6% eram mulheres. A média de idade do início do tratamento foi de 48 anos, sendo 33 anos o tempo médio de uso do tabaco. Acima de 90% deles iniciaram o tabagismo antes dos vinte anos de idade. Daqueles que se encontravam no programa havia pelo menos um ano (258 pessoas), 50,8% atingiram o sucesso terapêutico, 17,8% recaíram e 31,4% não pararam de fumar. Sucesso parcial foi atingido, em média, na quinta semana do tratamento e a recaída foi predominante no quarto mês. Cerca de 60% dos pacientes utilizaram terapia medicamentosa. Conclusão: A chance de parar de fumar foi associada significativamente ao uso de medicação, independentemente do perfil tabágico avaliado. No segundo ano do programa, observou-se maior associação da bupropiona à terapia de reposição nicotínica, com conseqüente elevação da taxa de sucesso e tendência à redução da recaída.

Palavras-chave: Tabagismo/terapia; Abandono do uso de tabaco; Bupropiona; Nicotina

INTRODUÇÃO

A expectativa de vida em tabagistas é oito anos menor quando comparada com a de não fumantes. A cessação tabágica, por sua vez, promove redução significativa na taxa de mortalidade antes dos 35 anos de idade e em menor escala na faixa etária acima de 65 anos, além de produzir inúmeros benefícios à saúde, representando uma intervenção custo-efetiva.(1-2) Porém, parar de fumar, na maioria dos casos, não é uma decisão simples e abrupta.

A partir de 1992, a Organização Mundial de Saúde passou a classificar o tabagismo como transtorno mental e comportamental, revolucionando, assim, o entendimento e a abordagem do fumante, que deixou de ser considerado "um viciado". Aspectos psíquicos e medicamentosos passaram a fazer parte do tratamento, objetivando a abstinência e sua manutenção. O tratamento atual do fumante requer atitude diferenciada com base na associação da abordagem cognitivo-comportamental e utilização de antidepressivo associado ou não à reposição nicotínica.(1-2)
A terapia medicamentosa tem- se mostrado eficaz e bem tolerada pelos pacientes.(3-4) A reposição nicotínica apresenta resultados similares, independentemente da forma de apresentação: adesivo, spray nasal, tablete sublingual ou chiclete.(5) A chance de parar de fumar é dobrada com o uso da bupropiona e eleva-se com a associação desta com a reposição nicotínica.(6)

Esta proposta terapêutica foi seguida pelo Ambulatório de Apoio ao Tabagista do Hospital de Messejana e modificada ao longo de dois anos e seis meses do programa, de acordo com a demanda dos grupos atendidos, com o objetivo de elevar a taxa de abstinência e evitar as recaídas.

O objetivo deste estudo foi avaliar o perfil dos pacientes que procuraram o ambulatório a fim de parar de fumar e os fatores associados ao sucesso terapêutico do programa.

MÉTODOS

O estudo foi resultado da experiência do Ambulatório de Apoio ao Tabagista do Hospital de Messejana durante o período de outubro de 2002 a abril de 2005.

Foram incluídos no programa os pacientes que manifestaram desejo próprio de abandonar o tabagismo. Após o contato inicial, o paciente era submetido à triagem médica, sendo preenchido questionário (padronizado pelo Instituto Nacional de Câncer) para se avaliar os perfis tabágico, psicológico, presença de co-morbidades, grau de dependência nicotínica (caracterizada de acordo com a pontuação do teste de Fagerstrom: 0 - 2 : muito baixa; 3 - 4: baixa; 5: média; 6 - 7: alta e 8 - 10: muito alta), motivação e preparação para a tarefa de parar de fumar, além de ser solicitada avaliação radiológica (radiograma de tórax ou tomografia computadorizada, quando necessário) e funcional pulmonar (espirometria).

Estabelecido o diagnóstico da dependência tabágica (teste de Fagerstron), na presença de pneumopatia ou outra co-morbidade, e de desejo e aptidão para participação individual em dinâmica de grupo, o paciente foi encaminhado para o grupo de apoio para a realização das sessões de abordagem cognitivo-comportamental. Essas sessões foram programadas com duração de duas horas, com a participação de dois facilitadores, que, além de discutirem aspectos da dependência e abstinência tabágicas, coordenaram vivências com o objetivo de favorecer o auto-conhecimento da dependência nicotínica e a mudança de comportamento dos pacientes, visando à abstinência.

O tratamento medicamentoso foi baseado nos dados da triagem e na evolução do paciente durante as sessões, sendo indicados ou não o uso de drogas (antidepressivo e/ou nicotina suplementar) e terapia complementar (acupuntura).

Durante os seis primeiros meses do programa, a distribuição da medicação foi irregular. O tratamento de manutenção, durante os primeiros dezesseis meses de funcionamento do ambulatório, foi baseado na consulta de retorno mensal. No último ano o retorno passou a ser realizado a cada quinze dias durante os três primeiros meses de tratamento e, a partir daí, eram estabelecidos retornos mensais até se completar um ano.

A abstinência foi definida segundo informação do próprio paciente. Considerou-se sucesso parcial o fato de o paciente parar de fumar por tempo inferior a doze meses; sucesso terapêutico, o abandono do hábito tabágico por período maior ou igual a doze meses; insucesso, persistência do hábito tabágico apesar do tratamento; recaída, retorno ao hábito tabágico em qualquer período do tratamento; e abandono, a desistência de participação no programa.

Para facilitar a avaliação do perfil dos pacientes e fatores associados à abstinência ao longo dos anos de experiência do programa, os pacientes atendidos foram distribuídos em três grupos: grupo I, compreendido por aqueles que entraram no programa entre outubro de 2002 e novembro de 2003; grupo II, correspondendo ao período de fevereiro de 2004 a janeiro de 2005, e grupo III, incluindo os pacientes desde fevereiro até abril de 2005.

Para caracterizar o perfil dos pacientes do ambulatório foram avaliadas as seguintes variáveis: sexo, idade de início e tempo de tabagismo, número de cigarros fumados quanto ao sexo, teste de Fagerstrom, idade de início do tratamento e número de tentativas prévias frustradas para se parar de fumar.

Para os fatores associados ao sucesso terapêutico avaliaram-se: ano de inclusão no programa, idade de início do tabagismo e do tratamento, tempo de uso do tabaco, teste de Fagerstron, tipo e duração do tratamento, e utilização de terapia complementar (acupuntura). Para o tratamento, foram registrados apenas os dados dos grupos do primeiro e segundo anos de experiência, uma vez que haviam parado de fumar há pelo menos um ano, tempo estabelecido para a caracterizar sucesso e recaída.

Após a aprovação do Comitê de Ética e Pesquisa em Seres Humanos do Hospital de Messejana, os dados foram obtidos através de análise de questionário utilizado pelo Instituto Nacional de Câncer, modificado para a realidade local e aplicado por residente de Pneumologia.

A análise estatística foi realizada através de análises descritivas, testes de qui-quadrado e de Pearson e teste exato de Fisher para análise de associações em tabelas de contingência, em que, existindo associação entre as variáveis também foi estimado o risco relativo e o intervalo de confiança de 95% (IC95%). O teste t de Student foi usado para a comparação de média para populações independentes quando a distribuição das variáveis era normal. No caso de não normalidade usou-se o teste de Mann-Whitney. Para a comparação de médias de três ou mais populações independentes usou-se a ANOVA quando a distribuição das variáveis era normal e, no caso de não normalidade, o teste de Kruskal Wallis.

RESULTADOS

No total, 320 pacientes que procuraram o ambulatório de apoio ao tabagista foram avaliados e distribuídos nos três grupos (I, II e III), de acordo com o ano de experiência no programa. Destes, 210 eram mulheres (65,6%). Ao longo dos três anos, observou-se que os homens passaram a procurar mais o ambulatório (25%, 38,6% e 38,7%, respectivamente) notando-se um acréscimo significativo (p< 0,05) do primeiro para o segundo ano. A média de idade para o início do tratamento foi de 48,47 anos (+ 10,5). A maioria iniciou o tabagismo antes dos vintes anos (15,43 + 4,3), sendo 33 anos o tempo médio de duração do tabagismo. Mais de 50% fumavam acima de vinte cigarros ao dia e tiveram mais de uma tentativa frustrada de parar de fumar. As mulheres apresentaram tendência a fumar menor número de cigarros do que os homens. Cerca de 78% dos pacientes apresentavam dependência moderada a grave, com pontuação no teste de Fagerstrom de pelo menos 5 (Tabela 1).





Para avaliar o resultado do tratamento foram estudados apenas os dois primeiros grupos, já que os mesmos se encontravam no programa por período de doze meses. Deste grupo, 50,8% atingiram o sucesso terapêutico, 17,8% recaíram e 31,4% não pararam de fumar por insucesso e abandono (Tabela 2). O sucesso parcial foi conseguido em média na quinta semana do tratamento e a recaída ocorreu em tempo médio de quatro meses (Tabela 3).









No período de até três meses, a bupropiona foi utilizada em 65,5% das vezes e o adesivo de nicotina em 68,4%. A chance de parar de fumar definitivamente foi associada ao uso da medicação, bupropiona ou adesivo isoladamente (p< 0,001) (Tabela 4) e não apresentou diferença com relação ao perfil do tabagista.





O sucesso parcial do terceiro ano foi de 56,7%. Com relação à chance de um paciente parar de fumar parcialmente, ao entrar no programa, ela foi significativa para aquele que usou antidrepressivo ou adesivo por um período médio de três meses. A recaída foi mais freqüente naqueles que utilizaram terapia complementar. Comparando-se os dois primeiros anos, observou-se que, no segundo, os pacientes utilizaram menos antidepressivo isoladamente (IC95%: 0,115 a 0,49; risco relativo de 0,237). Em contrapartida, houve maior associação das duas drogas, bupropiona e adesivo de nicotina (IC95%: 1,142 a 2,220; risco relativo de 1,592); a chance de sucesso foi significativamente maior (IC95%: 1,059 a 1,820; risco relativo de 1,389) e houve tendência à redução da recaída (IC95%: 0,376 a 1,000; risco relativo de 0,633) (Tabela 5).





DISCUSSÃO

Alguns autores facilitaram o entendimento do processo de parar de fumar através da definição dos estágios de mudança, que englobam desde o período de pré-contemplação até a ação. Durante a primeira entrevista, um dos critérios que identifica o candidato ao tratamento que esteja mais comprometido com a meta é o fato de ele se encontrar no estágio de preparação para a ação, ou seja, pretender seriamente parar de fumar no espaço de um mês.(2)

No presente trabalho, optou-se pela escolha prioritária deste paciente e daquele que se encontrava sem fumar, porém necessitando de ajuda para a manutenção da abstinência. Aqueles que desejavam parar de fumar em período acima de 30 dias foram estimulados a mudar de fase e orientados a procurar o ambulatório no tempo devido.

Assim como em outros estudos, o perfil do tabagista que procurou o referido ambulatório demonstrou que a maioria iniciou o tabagismo na adolescência (92%),(4) os pacientes haviam fumado por 33 anos antes de procurar o tratamento, o que ocorreu em média na faixa etária de 48 anos, acima de 50% deles fumavam mais de vinte cigarros ao dia, e tiveram mais de uma tentativa frustrada para parar de fumar.

Observou-se, também, que a população predominante foi de mulheres de meia-idade, fato justificado inicialmente pelo horário e disponibilidade de tempo para se dedicar ao tratamento. Os homens encontraram dificuldade para liberação do trabalho. Entretanto, na evolução do primeiro para o segundo ano de funcionamento do programa, foi observado um fenômeno interessante: houve acréscimo significativo de pacientes do sexo masculino que procuraram o tratamento (25% e 38,6%, respectivamente). Mulheres fumavam menor número de cigarros do que homens e como havia mais mulheres no estudo, isto refletiu sobre o grau de dependência tabágica determinado pelo teste de Fagerstron, que prevaleceu em grau moderado em 47% dos pacientes.

O tratamento do tabagismo é fundamentado na abordagem cognitivo-comportamental e terapia medicamentosa.(1-6) A revisão da literatura mostra eficácia no tratamento do fumante com esta abordageml(7) e que a mesma não pode ser substituída pela terapia medicamentosa.(2)

Na avaliação do resultado do tratamento do fumante um ano após a
introdução de antidepressivo e da reposição nicotínica (TRN), observou-se que a taxa de sucesso apenas dobrou quando comparada com o uso do placebo, ou seja, elevou-se de 10% a 15% para 20% a 30%, a despeito da terapia usada.(1) O presente estudo, em que se utilizaram as duas drogas, revelou taxa de abstinência de 50% para o período mínimo de doze meses e máximo de dois anos e seis meses. O sucesso parcial ocorreu em 67% dos casos, enquanto que 17, 8% recaíram e 31,4% não pararam de fumar em virtude de insucesso terapêutico ou abandono do programa.

A TRN pode ser utilizada sob a forma de adesivo, chiclete, spray nasal ou tablete sublingual, com o objetivo de aliviar os sintomas da síndrome de abstinência, especialmente a fissura, associados à cessação tabágica.(1-2,5,8-9) Embora uma revisão de 123 artigos tenha demonstrado que o resultado desta terapia seja favorável independentemente da formulação (IC95%: 1,66 a 1,88; odds ratio: 1,77),(5) alguns autores mostraram que o uso do adesivo é mais efetivo para a redução da dependência nicotínica em virtude da manutenção de nível de nicotina sangüíneo por um período entre 16 e 24 horas.(1)

Até o presente momento, o programa avaliado neste estudo contempla somente a forma de apresentação do adesivo de nicotina, que foi utilizado por 54,9% das pessoas, durante o período de até três meses. Utilizaram TRN associada ao antidepressivo 42% dos pacientes. Faz-se necessário mencionar o fato de que durante os seis primeiros meses, por questões burocráticas, o programa não disponibilizou adequadamente o adesivo, o que pode ter justificado a baixa taxa de abstinência do primeiro ano.

Um grande número de antidepressivos tem sido utilizado durante a abstinência tabágica, uma vez que esta pode desencadear sintomas depressivos ou episódio de depressão maior. Uma revisão sistemática de trabalhos aleatorizados, realizada em março de 2004 pela colaboração Cochrane, demonstrou que o uso de inibidores da MAO, venlafaxina, fluoxetina e paroxetina não surtiram beneficio para o tratamento do fumante. Por outro lado, a utilização isolada de bupropiona ou de nortriptilina dobrou a taxa de cessação tabágica (IC95%: 1,77 a 2,40; odds ratio: 2,06 e IC95%: 1,70 a 4,59; odds ratio: 2,79, respectivamente).(1,5-6,10)

O presente estudo incluiu somente a bupropiona e revelou que 67,6% dos pacientes utilizaram esta droga durante um período mínimo de três meses, e apresentaram duas vezes mais chances de parar de fumar. Apenas 12,8% do total fizeram uso isoladamente da bupropiona, tendo sido preferido o uso associado desta com o adesivo de nicotina (42%).

Dos fatores relacionados ao sucesso terapêutico deste estudo, o sexo, o
grau de dependência tabágica e o número de cigarros fumados não apresentaram significância estatística. Aqueles que tiveram mais de uma tentativa prévia de parar de fumar apresentaram tendência ao sucesso.
Do total, 63,3% atingiram abstinência e utilizaram associação da TRN e antidepressivo (p < 0,01), sendo, também, significativo (p < 0,01) o sucesso alcançado para aqueles que utilizaram somente bupropiona ou TRN (66,2% e 63,5%, respectivamente).

Com relação ao período da terapia medicamentosa, a bupropiona foi estendida até três meses em 65,6% dos casos e a TRN em 68,4% das vezes. O insucesso apresentou associação significativa (p < 0,001) com a não utilização de medicação, seja bupropiona (68,1%) ou adesivo de nicotina (67,5%).

A recaída apresentou associação significativa (p = 0,006) com a necessidade de utilização de formas complementares de tratamento (acupuntura e/ou atendimento psicológico individual), o que sugere que pessoas com maior dependência psicológica apresentam recaídas mais freqüentemente.

Neste estudo, comparando-se os dois primeiros anos, observou-se que, no segundo, os pacientes utilizaram menos antidepressivos isoladamente. Por outro lado, houve maior associação das duas drogas do tratamento padrão, já que se passou a dispor do adesivo de nicotina continuamente. Esta modificação contribuiu para elevar significativamente a taxa de abstinência e reduzir o índice de recaída. As chances de sucesso total e parcial foram associadas ao uso da medicação, bupropiona ou adesivo isoladamente, e não apresentaram diferença com relação ao perfil do tabagista avaliado neste protocolo.

Os melhores resultados do segundo ano foram atribuídos a algumas alterações na estrutura das sessões grupais da abordagem cognitivo-comportamental e na maior disponibilidade dos medicamentos. Novas vivências e depoimentos de ex-fumantes foram introduzidos com o objetivo de estimular a reflexão sobre o autoconhecimento da dependência, a busca de recursos pessoais para enfrentamento das dificuldades, mudanças de comportamento e criação de estratégias para se evitar a recaída.

Outro aspecto interessante a se considerar é o tempo ideal do tratamento. A duração do tratamento medicamentoso padronizado, três meses, pode ser insuficiente para aqueles pacientes que apresentam elevado grau de dependência e preocupação com o ganho de peso, importante fator de risco para recaída.(11-14) Pesquisas têm mostrado que a terapia medicamentosa prolongada não é prejudicial à saúde quando comparada com os riscos tabágicos, mas ainda se faz necessário definir com clareza o tipo de medicação e a população que se beneficiaria desta estratégia.(4) Este fato pode ter repercutido em nossos resultados, uma vez que a taxa de sucesso foi maior naqueles indivíduos que usaram medicação por tempo superior a três meses, e a recaída predominou no quarto mês, sendo mais comum naqueles que necessitaram de terapia complementar. De maneira que atualmente tendemos a prolongar o tempo de medicação para os pacientes com dependência tabágica mais grave.

As recomendações do Guideline do serviço público de saúde norte-americano deste ano definiram a associação de antidepressivo e TRN como padrão para o tratamento do fumante, por ser mais eficaz do que a reposição nicotínica isolada, até porque há atuação em mecanismos farmacológicos diferentes e o uso prolongado do antidepressivo foi útil para a redução da recaída.(15) Apesar da eficácia desta medicação, ela é efetiva somente para uma fração dos fumantes, o que provocou um novo direcionamento para as pesquisas em torno do tratamento ideal para o tabagismo. A farmacogenética tem explorado como a variação genética altera o metabolismo das drogas e conseqüentemente a resposta terapêutica. Uma vez identificado o genótipo seria possível individualizar o tipo, dosagem e duração do tratamento.

Com relação ao tratamento complementar, trabalhos aleatorizados e revisados pela colaboração Cochrane, com a utilização de acupuntura, terapia a laser e eletroestimulação, não mostraram eficácia na cessação do hábito tabágico.(16) A utilização da acupuntura nos nossos pacientes mostrou melhora no nível de ansiedade dos mesmos, porém não alterou a taxa de sucesso.

Com base nos resultados deste trabalho e com o objetivo de aumentar o vínculo do grupo com os facilitadores, elevar a taxa de abstinência e reduzir o número de pacientes que abandonam o programa, a partir de fevereiro deste ano criou-se um ambulatório com retornos quinzenais, realizados pela mesma equipe que atendeu inicialmente o grupo, e um ambulatório para atender a demanda de pacientes com dificuldade para parar de fumar e com recaída.

Concluiu-se que, quanto ao perfil do paciente do Ambulatório de Apoio ao Tabagista, o sexo feminino foi predominante (65,6%), e que a média de idade para iniciar o tabagismo e o tratamento foi, respectivamente, de 15,4 e 48,47 anos, sendo 33 anos o tempo médio de uso do tabaco.
Acima de 50% dos pacientes fumavam mais de vinte cigarros ao dia e apresentaram mais de uma tentativa frustrada para parar de fumar. O grau de dependência tabágica moderada prevaleceu em 47% dos pacientes. Com relação aos fatores associados ao sucesso terapêutico, aqueles que apresentaram mais de uma tentativa prévia para abandonar o tabagismo demonstraram tendência ao sucesso terapêutico. A chance de parar de fumar foi significativamente maior com o uso da medicação, bupropiona ou TRN (p < 0,001), e não apresentou diferença com relação ao perfil do tabagista avaliado neste estudo. Comparando-se os dois primeiros anos, observou-se que no segundo os pacientes utilizaram mais vezes associação medicamentosa (bupropiona e TRN). A chance de sucesso terapêutico elevou-se significativamente, com tendência à redução da recaída. Insucesso apresentou associação significativa com aqueles pacientes que não utilizaram medicação. A recaída foi significativamente maior no grupo que necessitou de terapia complementar e ocorreu mais freqüentemente no quarto mês do tratamento.

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* Trabalho realizado no Ambulatório de Apoio ao Tabagista do Hospital de Messejana, Fortaleza (CE) Brasil.
1. Doutora em Pneumologia; Professora da Faculdade Integrada do Ceará - FIC - Fortaleza (CE) Brasil.
2. Residente em Pneumologia do Hospital Messejana, Fortaleza (CE) Brasil.
3. Especialista em Planejamento Familiar e Gestão de Política Pública; Assistente Social do Hospital Messejana, Fortaleza (CE) Brasil.
4. Médico Pneumologista do Hospital de Messejana, Fortaleza (CE) Brasil.
Endereço para correspondência: Maria da Penha Uchoa. Rua Gotardo Morais, 155, apto 1.002-A, Papicú - CEP: 60190-801, Fortaleza, CE, Brasil. Tel: 55 85 3486-6004. Email: penhauchoa@hotmail.com
Recebido para publicação em 20/10/05. Aprovado, após revisão, em 10/2/06.

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