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Variações climáticas e uso de serviços de saúde em crianças asmáticas menores de cinco anos de idade: um estudo ecológico

Climate variations and health services use for the treatment of asthmatic children under five years of age: an ecological study

Celso Taques Saldanha, Ageo Mário Cândido da Silva, Clovis Botelho

ABSTRACT

Objective: To study variations in climate (dry or rainy periods) and health services use for the treatment of asthma in children under five years of age. Methods: An ecological study was conducted and involved analysis of the medical charts of all children under the age of five that were diagnosed with asthma and treated in the Municipal Emergency Room of the city of Cuiabá, located in the state of Mato Grosso, Brazil. In accordance with the geographic location of Cuiabá, two climatic periods were identified: a dry season (from May to October) and a rainy season (from November to April). Results: The percentage of children treated that were diagnosed with asthma was 12.2% (3140/25,802), with no gender-based difference. Children from 3 to 5 years of age were most often affected. The overall asthma hospitalization rate was 1.3% (336/25,802), rising to 10.7% (336/3140) among the asthmatic children treated in the emergency room. In the rainy season, the percentage of outpatients seeking treatment for asthma was higher than in the dry season: 39.1% (1228/3140) versus 60.9% (1912/3140). However, during the dry season, a greater proportion of such patients were hospitalized: 52.3% (176/336) versus 47.7% (160/336). These differences were statistically significant (p < 0.05). Conclusions: The dry season, which was correlated with higher asthma hospitalization rates, seems to be related to more severe cases of asthma in children under five years of age.

Keywords: Asthma/prevention & control; Allergens/adverse effects; Respiratory hypersensitivity; Environmental monitoring;

RESUMO

Objetivo: Analisar a variação dos períodos climáticos (seco ou chuvoso) e o uso de serviços de saúde para a asma em crianças menores de cinco anos de idade. Métodos: Estudo ecológico, com coleta de dados secundários, através de análise dos prontuários das crianças com até cinco anos de idade e diagnóstico de asma, atendidas no Pronto-Socorro Municipal de Cuiabá. Obedecendo às características geográficas de Cuiabá (MT), foram considerados dois períodos climáticos: o período seco (maio a outubro) e o chuvoso (novembro a abril). Resultados: O percentual de atendimentos das crianças consideradas com diagnóstico de asma foi de 12,2% (3.140/25.802), sem diferença entre os sexos. A faixa etária mais acometida foi a de três a cinco anos de idade. A taxa de hospitalização por asma foi de 1,3% (336/25.802), sendo de 10,7% (336/3.140) entre as crianças asmáticas atendidas no pronto-socorro. No período chuvoso o percentual de atendimento ambulatorial por asma foi maior que no período seco: 39,1% (1.228/3.140) versus 60,9% (1.912/3.140). Entretanto, no período seco houve maior percentual de hospitalização: 52,3% (176/336) versus 47,7% (160/336). As diferenças foram significativas (p < 0,05). Conclusão: O período climático seco, associado à maior taxa de hospitalização, parece estar relacionado aos casos mais graves de asma em crianças menores de cinco anos.

Palavras-chave: Asma/prevenção & controle; Alérgenos/efeitos adversos; Hipersensibilidade respiratória; Monitoramento ambiental; Clima; Crianças

INTRODUÇÃO

Os fatores ambientais atuam sobre a dinâmica da asma, aumentando as suas taxas de morbidade e gravidade. Dentre esses fatores destacam-se a presença de poluentes no ar atmosférico, tanto externo quanto interno, e as condições meteorológicas do local, como a temperatura, a umidade relativa do ar e a velocidade dos ventos, que podem aumentar a duração da exposição aos poluentes e impedir sua dissipação.(1-3)

Entre as variáveis climáticas, a velocidade do vento e a umidade relativa do ar têm sido implicadas no aumento de incidência de exacerbações de asma quando em interação com a poluição atmosférica. Corroborando esse fato, um estudo descrevendo a distribuição das crises asmáticas em relação aos fatores meteorológicos locais (temperatura, umidade relativa do ar e precipitação pluviométrica) constatou correlação da umidade relativa do ar com asma brônquica em adultos.(4)

Outro fato importante a destacar é que esporos de fungos do ar, que compõem a maior parte do material biológico em suspensão na atmosfera, e várias outras substâncias encontradas no ar dependem de variáveis ambientais, como temperatura, precipitações pluviométricas, ventos e umidade relativa do ar.(5) Pode-se resumir, didaticamente, a ação das variáveis climáticas nos indivíduos asmáticos do seguinte modo: ação direta irritante do frio e umidade sobre a mucosa respiratória; ação sobre o sistema neurovegetativo de regulação da temperatura do corpo, variando o nível de reatividade do organismo e favorecendo a hipersensibilidade e, conseqüentemente, a crise de asma; favorecimento das infecções respiratórias; aumento da quantidade de mofo ou fungos e da população de ácaros, o que torna a poeira domiciliar muito mais alergizante; modificação das condições de vida, principalmente das crianças, com prejuízo da prática de esportes e brincadeiras ao ar livre, o que as mantém mais em casa, agasalhadas e em contato íntimo com a poeira domiciliar.(6)

Nesse contexto, possivelmente nas localidades com grande concentração de poluentes respiratórios ou com condições climáticas inadequadas para a sua dispersão, o que reforça a ação desses poluentes, os indivíduos com predisposição para doenças respiratórias, como a asma, têm a sua doença exacerbada.

O município de Cuiabá (MT) está situado na unidade geomorfológica classificada como Depressão Cuiabana, e tem clima predominantemente tropical, alternadamente seco e úmido. De modo geral, esse tipo de clima caracteriza-se por apresentar um período climático considerado como seco (quando a massa de ar tropical continental fica estacionada na região), com altas temperaturas (chegando a mais de 40oC) e baixa umidade relativa do ar na maioria dos dias (abaixo de 30%). Às vezes, nesse período, acontecem alguns dias de inversão térmica, com a temperatura atingindo cerca de 10 a 15oC. Aliadas a essas características climáticas desse período encontram-se as queimadas nas matas, nos cerrados e do lixo doméstico, que lançam grande quantidade de material particulado no ar. O período climático considerado como chuvoso (quando a massa de ar equatorial continental predomina em todo o Estado), que vai de novembro a abril, é caracterizado por intensas chuvas e maior umidade relativa do ar, com temperatura média anual em torno de 28 ºC.(7) Neste período, há o favorecimento do aumento de substâncias alergizantes nos domicílios devido ao maior crescimento de algumas espécies de ácaros e fungos.

Sabe-se que as crianças asmáticas constituem o grupo mais susceptível aos efeitos dos fatores ambientais, pois há aumento da hiperresponsividade brônquica e da sensibilidade a agentes do meio ambiente.(8) Assim, a possibilidade de que as mudanças climáticas sejam determinantes para o controle e o uso dos serviços de saúde em asma pode se justificar. Diante disso, o presente estudo tem o objetivo de sugerir uma possível relação dos períodos climáticos, seco e chuvoso, com o controle da asma em crianças menores de cinco anos de idade, através do estudo das variações do número de atendimentos de emergência por asma na cidade de Cuiabá entre janeiro e dezembro de 1999.

MÉTODOS

Foram avaliados os prontuários de atendimento do Pronto-Socorro Municipal de Cuiabá, de crianças menores de cinco anos de idade, de ambos os sexos, residentes em Cuiabá, que tiveram diagnóstico de asma, durante o período de janeiro a dezembro de 1999. Os seguintes procedimentos foram efetuados: todos os prontuários das crianças de zero a cinco anos foram separados e agrupados por mês do atendimento; destes, foram separados os que tiveram diagnóstico de asma e outros diagnósticos; foram coletados os dados relativos ao sexo, idade (zero a um ano; um a três anos; três a cinco anos), diagnóstico (asma ou outros diagnósticos), número de atendimentos e necessidade de internação hospitalar.

Foram consideradas como asmáticas todas as crianças cujos prontuários de atendimento tinham assinalado: asma, bronquite alérgica ou bronquite asmática. Excetuando-se a asma, as outras doenças encontradas foram referidas como outros dia-gnósticos.

Obedecendo-se às características climáticas da Baixada Cuiabana, foram considerados dois períodos durante o ano, para efeito de estudo de sua associação com a freqüência de atendimentos por asma: período seco (maio a outubro) e período chuvoso (novembro a abril).(7)

O teste do qui-quadrado, com intervalo de confiança de 95%, para diferenças de proporções, foi utilizado para a verificação de associações entre as co-variáveis e a variável resposta. O software utilizado para a análise estatística foi o EPI-INFO 6 versão 6.04.

RESULTADOS

A freqüência de atendimentos por asma encontrada foi de 12,2% (3.140/25.802), e a distribuição por sexo foi de 56,5% para o sexo masculino e 43,5% para o feminino, diferença esta estatisticamente não significativa (p = 0,05). A faixa etária mais acometida foi a de três a cinco anos (36,1% x 30,7%), diferenças que foram estatisticamente significativas (p < 0,05).

Na Figura 1 encontra-se a freqüência mensal de atendimentos das crianças com diagnóstico de asma, que variou de 4% a 14%, onde se verifica que ela é maior nos meses de março, abril e maio (período chuvoso) e menor nos meses de julho, agosto, setembro e outubro (período seco).





Na Tabela 1 vê-se a distribuição das crianças estudadas, segundo o diagnóstico do problema (agravo) e o tipo de atendimento (hospitalar ou não), e observa-se que a taxa de hospitalização por asma foi de 1,3% (336/25.802). Dentre as crianças com diagnóstico de asma, 10,7% (336/3.140) necessitaram de tratamento hospitalar, enquanto que para outros diagnósticos o percentual foi de 7,8% (1.763/22.662), diferença esta estatisticamente significativa (p = 0,01).





A Figura 2 mostra a freqüência mensal de atendimentos das crianças estudadas com diagnóstico de asma e que necessitaram de tratamento hospitalar, a qual variou entre 5% e 20%, com maior percentual de internações nos meses de julho, agosto e setembro (período seco).





Na Tabela 2 encontra-se a distribuição das crianças estudadas, segundo o período climático (seco ou chuvoso) e o problema diagnosticado. Nota-se que 60,9% dos diagnósticos de asma (1.912/3.140) e 49,4% dos outros diagnósticos (11.192/22.662) ocorreram no período chuvoso, sendo as diferenças estatisticamente significativas (p < 0,05).





A distribuição das crianças estudadas com dia-gnóstico de asma, segundo o tipo de atendimento (hospitalar ou não) encontra-se na Tabela 3. Comparando-se o tipo de atendimento, hospitalar ou não hospitalar, nota-se que ocorreram mais hospitalizações entre as crianças com diagnóstico de asma no período seco, 52,5% (176/336), em relação ao chuvoso. Por outro lado, observa-se o contrário com relação às crianças com diagnóstico de asma e que tiveram somente o atendimento não hospitalar: período seco com 37,5% (1.052/2.804) e chuvoso com 62,5% (1.752/2.804), diferenças estatisticamente significativas (p < 0,05).





DISCUSSÃO

A freqüência de atendimentos de emergência por asma em menores de cinco anos encontrada durante o ano de estudo (12,2%) foi, provavelmente, influenciada pelo local (serviço de urgência). As taxas de morbidade da asma são variadas, principalmente quando se compara a sua prevalência, sendo que em algumas regiões fica próxima a zero e em outras chega a até 30%, sendo que os principais fatores responsáveis por essa variação são as diferenças genéticas entre as diversas etnias, as características ambientais locais, os meios diagnósticos empregados e as diferenças na sua conceituação.(9-10)

A distribuição das crianças estudadas por sexo foi a esperada, não havendo diferença significativa entre as do sexo masculino e do feminino. Vários estudos têm demonstrado que a asma não difere de forma significativa quanto aos aspectos evolutivos analisados entre os meninos e as meninas.(11-12) Por outro lado, vários outros autores citam maior prevalência da asma entre os meninos. Entretanto, não está claro se esta diferença é devida a algum fator ligado ao sexo ou às diferenças geométricas entre as vias aéreas dos dois sexos, à menor resistência ao fluxo aéreo dos brônquios nas meninas, ou à maior freqüência de infecções das vias aéreas entre os meninos.(13-17)

Em relação à faixa etária, a prevalência de asma foi maior entre as crianças de um a três anos, ficando em segundo lugar o grupo de crianças de três a cinco anos de idade. Estes resultados estão de acordo com o relato de um estudo que refere que 82,4% das crianças manifestam a primeira crise de asma até os cinco anos de idade.(12)
Em um serviço de urgência e emergência da rede pública foi verificado que, de todos os atendimentos por doenças respiratórias, a asma está entre as três primeiras causas de consultas, com predomínio em crianças com idades abaixo de três anos de idade.(18) Sabe-se que a hiper-responsividade brônquica pode ser demonstrada a partir da quarta semana de vida. Porém, como a asma é uma doença crônica e de fácil confusão com outras doenças respiratórias da criança, o seu diagnóstico é difícil em crianças menores de um ano de idade.(16-17) É importante ressaltar que na criança pode haver confusão diagnóstica com bronquite, bronquiolite e infecções respiratórias agudas, principalmente naqueles casos em que as crises de asma são desencadeadas por infecções.

Com relação às internações por asma, foi verificada maior taxa também para a faixa etária de um a três anos, seguida pelas faixas etárias de três a cinco anos e de zero a um ano. A taxa de internação hospitalar para asma encontrada foi de 1,3% do total das crianças estudadas. Se forem consideradas somente as crianças com diagnóstico de asma essa taxa sobe para 10,7%. Como a asma se coloca entre as principais causas de internações das crianças menores de cinco anos, essa informação é um alerta para os gerentes dos serviços de saúde, pois ela tanto pode indicar que a asma seja ainda mais relevante nas estatísticas dos atendimentos, como indicar a presença de uma baixa resolutividade dos serviços de saúde.

No Brasil, as taxas de internações por asma são variadas, conforme o local de estudo e as características ambientais regionais. Foi verificada freqüência de 1,8% de internações no Pronto-Socorro do Hospital do Servidor Público de São Paulo.(19) Maior proporção dessas hospitalizações ocorreu em hospitais localizados no interior do Brasil, pelos serviços médicos credenciados pelo Sistema Único de Saúde, no ano de 1996, quando elas representaram a quinta maior causa de todas as internações no país, excluindo-se partos e puerpérios, sendo a terceira na região Nordeste, quarta nas regiões Norte e Sul e quinta no Centro-Oeste e Sudeste.(9)

Outros estudos brasileiros mostram a importância da asma como causa de hospitalização. Em todos os hospitais pediátricos de Porto Alegre (RS), de julho de 1983 a junho de 1994, a asma foi responsável por cerca de 18,6% das internações por doenças respiratórias agudas nos menores de cinco anos de idade.(20) Em Santo André (SP), observou-se que a crise de asma se situa entre as três principais causas de hospitalizações em crianças em pronto-socorro.(21) Em várias localidades as internações por asma ocorrem mais freqüentemente em crianças menores de cinco anos, concentrando-se mais na faixa etária igual ou menor a dois anos.(15, 22) As crianças asmáticas, com quadro de maior gravidade, têm uma tendência a repetir suas crises e, conseqüentemente, apresentam diversas hospitalizações.

A influência das variáveis ambientais no desencadeamento das crises de asma é descrita por diversos autores. Em uma análise de crianças asmáticas de zero a catorze anos de idade, verificou-se que os principais precipitantes possivelmente associados às crises foram as mudanças de clima (78%), infecções das vias aéreas superiores (65%) e exposição à poeira domiciliar (52%).(14) Em outro estudo, a influência do clima também é relacionada (temperatura e umidade relativa do ar) à incidência de crises asmáticas.(23) Há um relato em que, independentemente do sexo, as mudanças climáticas representaram os principais agentes desencadeantes de crises asmáticas no primeiro ano da doença, além das infecções de vias áreas superiores.(12)

A influência das mudanças climáticas, particularmente as quedas bruscas de temperatura, possivelmente está associada a uma maior dispersão de aeroalérgenos. Nessa situação, observa-se maior freqüência de crises de asma.(2,17,24-25) Caracteristicamente, o clima de Cuiabá é dividido em um período seco (de maio a outubro) e outro chuvoso (novembro a abril), não existindo inverno propriamente dito.(7) A hipótese deste estudo é a de que, no período seco, com a influência da baixa umidade relativa do ar e das altas temperaturas, o controle da asma seria alterado, com intensificação das crises e da sua gravidade.(26)

Ao contrário do esperado, foi surpreendente a análise dos resultados encontrados, pois se verificou que nos atendimentos de emergência ocorreu maior freqüência de atendimentos por asma nos meses de março, abril e maio, justamente o período chuvoso. A freqüência nesses meses foi de duas a três vezes maior que no período seco. A maior taxa de atendimento da asma em emergência encontrada no período chuvoso, possivelmente, deve estar relacionada ao excesso de umidade dos ambientes de convívio da criança, pelas chuvas intensas e constantes, o que poderia provocar desde um simples resfriado até um quadro mais grave de infecção respiratória aguda, que são fatores desencadeantes e de confusão no diagnóstico de crise asmática. Além disso, a criança passa maior tempo dentro do domicílio e em contato com todas as substâncias alergizantes, que estão em maior concentração nesse período, pelo maior crescimento de fungos relacionados à umidade excessiva.(27)

Ao se analisar a taxa de internações por asma das crianças estudadas e cotejá-la com o período climático, ao contrário do ocorrido com o total das taxas de atendimentos de emergência, verificou-se que a taxa de internação do período seco foi maior que a do período chuvoso, sendo mais freqüente nos meses de julho, agosto e setembro. Em outras palavras, o período climático seco é responsável não pela maior freqüência de crises asmáticas e sim pela maior gravidade das mesmas, vista pela maior necessidade de hospitalizações das crianças estudadas.

Corroborando os resultados encontrados em Cuia-bá, em que os atendimentos de emergência por crises de asma apresentaram sazonalidade, um estudo observou que nos meses de junho, agosto e setembro há maior freqüência de internação por asma, em coincidência com os meses de maior variação climática e com outras variáveis ambientais.(19) Em Brasília (DF), também foi relatado que mais da metade dos atendimentos realizados nos serviços de urgência por asma ocorreu nos meses de dezembro a maio (63,8%), período correspondente aos meses de maior densidade pluviométrica naquela localidade.(28) Em um outro estudo foi evidenciado maior numero de atendimentos por crises asmáticas nos meses de maio, junho, julho e agosto.(29)

Em relação à necessidade de hospitalização das crianças asmáticas em crise, foi realizada uma pesquisa no Hospital da Santa Casa do Rio Grande (Rio Grande - RS), com o objetivo de estudar essa tendência, nas duas últimas décadas. Foi observada maior taxa de hospitalização em crianças de cinco anos, com pequena concentração entre março e julho, tendo o mês de maio a maior freqüência.(15) Diferentemente de Cuiabá, onde o fator climático determinante foi o período seco (calor e baixa umidade relativa do ar), houve, possivelmente, a influência dos meses mais frios naquele Estado (Rio Grande do Sul) como fator determinante.
Sabe-se que nos meses em que foram encontradas as maiores taxas de internações a demanda nos serviços de saúde pela asma, tanto relativa a atendimentos ambulatoriais quanto a hospitalizações, estava aumentada.(13, 29)

A utilização de dados secundários registrados em prontuários de serviços de saúde (pronto-socorro) pode ter ocasionado alguns vieses. Assim, alguns comentários a respeito do método são pertinentes. Em primeiro lugar, deve-se considerar a falta de informações que poderiam ajudar nas análises das variáveis de estudo, como acontece com fontes de registros de saúde feitos com outros propósitos. Dados sobre a presença de asma ou atopia na família, de tabagismo passivo e acerca do estado nutricional das crianças, entre outros, não foram encontrados. Isto dificulta a compreensão do processo como um todo, por limitar a profundidade da análise dos resultados encontrados, o que impossibilita a realização de desenhos de estudo para medir também a exposição individual da criança aos fatores de risco para as crises asmáticas.

Em segundo lugar, deve-se considerar a qualidade dos dados registrados quanto ao diagnóstico firmado, após o exame clínico da criança no atendimento de urgência. Sabe-se que a margem de erro aumenta muito devido ao tipo de serviço que o pediatra do pronto-socorro enfrenta, já que a demanda é enorme e cansativa. Esta situação leva à dedicação de menos tempo a cada criança, o que facilita a ocorrência de erros de interpretação dos sinais e sintomas apresentados por ela.

Em terceiro lugar, deve-se discutir a forma de análise dos dados efetuada. Devido ao tipo de coleta, os dados de morbidade obtidos através da análise dos prontuários foram agrupados mensalmente, o que impossibilitou a comparação dia a dia com as variáveis climáticas, impedindo a realização de metodologias analíticas mais recomendadas.
Assim, este estudo não teve a pretensão de construir um modelo preditor que pudesse estimar precisamente o número de internações por asma de acordo com o período climático do ano, mas apenas mostrar a associação existente, levando-se em conta a relevância de se conhecer as características epidemiológicas da doença frente às peculiaridades climáticas da região. Contudo, apesar das diversas limitações relatadas, o presente estudo assume importância na medida que indica a existência da associação entre variações climáticas e internações por asma, apontando a necessidade da realização de novos estudos com métodos mais aprimorados, que aprofundem a análise das variáveis envolvidas, para melhor compreensão desse processo em Cuiabá e em regiões com características climáticas semelhantes.

Conclui-se que pode existir influência dos fatores climáticos no controle da asma em crianças, principalmente na determinação dos casos mais graves. Ficou claro que no período considerado como seco, as crianças menores de cinco anos estão mais predispostas às complicações das crises asmáticas, necessitando maior atendimento hospitalar.

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*Trabalho realizado na Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT - Cuiabá (MT) Brasil.
1. Mestrando do Curso de Ciências da Saúde da Universidade de Cuiabá - UNIC - Cuiabá (MT) Brasil.
2. Mestre em Saúde e Ambiente pela Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT - Cuiabá (MT) Brasil.
3. Professor Titular da Universidade Federal de Mato Grosso - UFMT - Cuiabá (MT) Brasil.
Endereço para correspondência: Clovis Botelho. Rua Dr. Jonas Correa da Costa, 210 - CEP: 78030-510, Cuiabá - MT, Brasil.
Tel. 55 65 637-1471. E-mail: fbotelho@terra.com.br
Recebido para publicação em 11/6/03. Aprovado, após revisão, em 6/5/05.

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